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Você pode imaginar suas células
como a cozinha de um movimentado restaurante.
Às vezes, seu corpo pede frango.
Outras vezes, pede bife.
Suas células precisam produzir
aquilo que o corpo precisa,
e rápido.
Quando chega um pedido,
a "chef" verifica o livro de receitas, seu DNA,
buscando a receita.
Ela então transcreve a mensagem
para um pedaço de papel, chamado RNA,
e volta para a bancada, o ribossomo.
Lá, ela pode transformar a receita em uma refeição,
ou, para suas células, em proteína,
seguindo as instruções que ela copiou do livro.
Mas o RNA faz mais pela célula
do que apenas agir como mensageiro
entre uma cozinheira e seu livro de receitas.
Ele pode fazer o caminho inverso, e criar DNA,
pode direcionar aminoácidos aos seus alvos,
ou pode participar da interferência de RNA,
ou RNAi.
Mas espere.
Por que o RNA iria querer interferir em si mesmo?
Bem, às vezes uma célula não quer transformar
em proteína todo o RNA mensageiro que criou,
ou talvez precise destruir o RNA injetado na célula
por um vírus invasor.
Digamos, por exemplo, em nossa cozinha celular,
que alguém quisesse cancelar um pedido
ou decidisse que queria batatas chips em vez de fritas comuns.
É aí que o RNAi entra.
Felizmente, suas células têm as facas perfeitas
só para esse tipo de trabalho.
Quando a célula encontra ou produz
moléculas de RNA longas e de fita dupla,
ela pica essas moléculas
com uma proteína que se chama, de fato, picador.
Bom, esses pequenos fragmentos de RNA
ficam boiando dentro da célula
e são coletados por uma coisa chamada RISC,
ou Complexo Silenciador Induzido por RNA.
Ele é composto de algumas proteínas diferentes,
sendo a mais importante a fatiadora.
É outra proteína de nome apropriado,
e já vamos dizer por quê.
O RISC corta esses pequenos pedaços
de RNA de fila dupla ao meio,
usando a fila separada para encontrar o RNAm que combine,
buscando pedaços que se encaixem
como duas metades de um sanduíche.
Quando encontra um pedaço de RNAm que combine,
a proteína fatiadora do RISC o fatia.
A célula então percebe
que há pedaços esquisitos, de tamanhos estranhos,
de RNA boiando
e os destrói,
evitando que o RNAm se transforme em proteína.
Então, temos o RNA de fita dupla,
que é picado
e procura o RNAm,
e aí ele é fatiado também.
Voilà!
Você evitou reclamações
e se livrou de alguns clientes insatisfeitos.
Então, como foi que descobriram isso?
Bem, esse processo foi originalmente descoberto em petúnias,
quando botânicos, ao tentarem criar flores de tom violeta intenso,
introduziram um gene produtor de pigmento nas flores.
Mas, em vez de flores mais escuras,
eles encontraram flores com machas brancas,
sem pigmento algum.
Em vez de usarem o RNA produzido pelo novo gene
para criarem mais pigmento,
na verdade, as flores o estavam usando
para derrubar o percurso de produção do pigmento,
destruindo o RNA
dos genes originais da planta com RNAi,
deixando-os com flores brancas sem pigmentos.
Os cientistas perceberam um fenômeno similar
em minúsculos vermes chamados C. elegans
e, quando descobriram o que acontecia,
perceberam que poderiam usar o RNAi
em seu benefício.
Quer ver o que acontece
quando determinado gene é retirado de um verme
ou de uma mosca?
Introduza uma construção de RNAi para esse gene
e bam!
Sem mais atividade de proteína.
Você pode até usar a criatividade
e direcionar esse efeito a certos sistemas,
excluindo genes apenas no cérebro,
ou apenas no fígado,
ou apenas no coração.
Entender o que acontece
quando excluímos um gene em determinado sistema
pode ser um passo importante
para descobrir o papel desse gene.
Mas o RNAi não serve apenas para entender
como as coisas acontecem.
Ele também pode ser uma ferramenta terapêutica poderosa
e poderia ser uma forma de manipularmos
o que acontece dentro de nossas células.
Pesquisadores têm feito experiências
utilizando-o em benefício da medicina,
inclusive RNA direcionado e células cancerosas,
com a esperança de desligar os genes causadores do câncer.
Na teoria, nossas cozinhas celulares
poderiam atender a um pedido das células:
conter o câncer.