Tip:
Highlight text to annotate it
X
BitsnBytes apresenta
um documentário sobre a crise financeira
mundial, europeia, grega.
de Aris Chatzistefanou e Katerina Kitidi
Investigação Leonidas Vatikiotis
Música Yiannis Aggelakas, Ermis Georgiadis, Aris RSN
DEBITOCRACIA
Edição Aris Triantafyllou
E, por uma vez, vou fazer uma comparação com médicos.
Temos aqui um paciente, engessado.
Não lutem contra o médico, às vezes ele tem de prescrever
remédios desagradáveis, mas mesmo que não gostemos do remédio,
o médico só está tentando nos ajudar.
Como se costuma dizer, a história tem este hábito desgraçado
de se repetir como "farsa".
Por isso, de um ditador/pseudo-médico, passamos para a fase dos médicos do FMI.
Todos temos de participar na luta, plenamente conscientes de que
ou a nação destrói esta dívida imensa, ou a dívida imensa destrói a nação.
Este ano, a política salarial vai ser rígida e austera.
Não vai haver aumentos de qualquer espécie.
Não temos outro remédio senão acabar com benefícios e reduções fiscais.
Temos de cortar na despesa pública, temos de arrumar a casa.
E isto não se consegue com as suas promessas vazias
de distribuir dinheiro e privilégios em tempos de crise como estes.
Infelizmente, o nosso país está nos cuidados intensivos. O impasse fiscal da nação
ameaça a nossa soberania pela primeira vez desde 1974.
Nos últimos 40 anos, dois partidos políticos e três famílias de políticos,
juntamente com alguns empresários, levaram o país à bancarrota.
Suspenderam os pagamentos devidos às pessoas, para salvar os credores.
Após décadas de austeridade contínua, os czares da economia
anunciaram que a Grécia passara a ser uma superpotência financeira.
Fizemos um excelente trabalho. Fomos os primeiros a resolver os problemas econômicos.
Mais uma vez, a nossa economia vai demonstrar que é o nosso principal trunfo.
A economia deu um salto em frente e foi promovida da divisão de honra à primeira liga.
Quando o que haviam criado desmoronou, essas pessoas disseram, nas nossas costas,
que, devido a uma perturbação genética qualquer, éramos incapazes de gerir
a nossa economia sem ajuda externa.
Talvez os estadunidenses tenham alguma dificuldade em perceber isto,
mas a Grécia é incapaz de exercer controle ou disciplina.
O nosso governo nos chama de parasitas, e os nossos credores porcos (PIIGS)
como em todos os países periféricos da União Europeia.
E os nossos ministros tentaram convencer-nos de que todos somos responsáveis.
Reconheço que falhamos em termos do nosso sistema político
Mas sejamos francos, todos fizemos parte disso.
Respondemos às pessoas que acusam os políticos do país
perguntando-nos o que fizemos com o seu dinheiro:
"Nós os tornamos funcionários públicos!" Todos contribuímos para a atual situação
Ou seja, seremos os filhos pródigos de uma economia global limpa
numa Europa de sucesso?
Ou estará o sistema doente desde tenra idade?
A Câmara do Comércio dos EUA apresenta:
"Isto diz respeito a todos"
Destino - Terra
A economia capitalista no período pós-guerra divide-se em duas partes.
Nos primeiros 25 anos depois da 2a. Guerra Mundial, a taxa de crescimento foi alta.
O rendimento real aumentou tal como o consumo de bens.
Foram circunstâncias inéditas na história do capitalismo.
"O Joe é o maior porque consegue comprar mais com o seu salário
do que qualquer outro trabalhador."
Não existe capitalismo sem crises.
Por isso vai haver sempre uma crise em algum lugar.
Este período feliz terminou em meados dos anos 70.
A partir de então, entramos num período de menor crescimento e crises cíclicas,
pequenos aumentos de salários, quando houve algum, e níveis altos de desemprego.
Os países capitalistas mais desenvolvidos começaram a ter dificuldade
em acumular riqueza.
Essa crise foi a consequência do poder do trabalho, que nessa altura
era muito forte nas principais regiões capitalistas, na Europa e América do Norte.
O resultado foi um grande peso do valor dos salários, os sindicatos estavam bem organizados,
eles tinham um grande poder sobre o Estado nas eleições.
Mas isto era um problema para o capital.
Por isso, eles tiveram de disciplinar o trabalho, e fizeram-no de várias formas.
Fizeram-no principalmente através da abertura da economia nacional à competição global
abrindo acesso aos recursos mundiais de mão-de-obra. Assim que, como é óbvio, a China entrou em cena.
Este período foi marcado por um enorme crescimento do sistema financeiro,
a que se chamou financeirização.
A financeirização provocou e intensificou as crises.
O Capital podia deslocar-se para onde quisesse, com acesso abundante a mão-de-obra barata.
Mas depois surgiu o problema da parcela correspondente a salários e rendimentos
estar baixando em todo o lado. E, como é óbvio, os salários são uma grande parte
do mercado. E depois surgiu o problema de como vender as mercadorias
se o poder de compra desapareceu.
E a resposta foi dar crédito a toda a gente.
E assim tivemos a invenção da economia de crédito que ganhou força nos anos 80 e 90
para cobrir a diferença entre o que os trabalhadores recebiam e aquilo que compravam.
E foi nessa altura que muitas pessoas perceberam, no fim dos anos 90, 2000,
que isto era a parte insustentável.
Mas foi a forma como escapamos à crise dos anos 70
que abriu caminho para este tipo de crise.
FIM
Quando a bolha imobiliária dos EUA rebentou,
o sistema financeiro esteve muito perto do colapso total.
Em consequência, afetou a economia real, que já tinha os seus próprios problemas estruturais.
Os EUA tomaram medidas de salvamento e recorreram ao dinheiro dos contribuintes
para salvar os bancos e repor a procura.
E assim, a crise financeira tornou-se fiscal.
E os mesmos bancos que foram salvos pelo dinheiro dos contribuintes
decidiram morder a mão que os alimentou, fazendo apostas com a bancarrota dos estados.
A especulação também veio piorar as coisas na Grécia.
Só que, desta vez, o problema foi ainda mais grave.
Chegou a hora da Zona Euro pagar.
E o rei Euro afinal está nu, sobretudo porque é um rei sem estado.
Não é possível uma moeda sem um estado.
Apesar das fraquezas, uma das vantagens do dólar estadunidense
entre outras coisas, é a existência de um estado chamado EUA.
A Europa não existe enquanto entidade política.
Não existe um poder político legítimo que una os estados-membros.
Na minha opinião, a Zona Euro não é viável.
Ao contrário dos EUA, onde o governo federal
e o sistema da Reserva Federal intervêm para diminuir as desigualdades
entre estados, a Zona Euro reforça a desigualdade.
Foi assim que os PIIGS, os parentes pobres da UE, vieram ao mundo.
A Zona Euro está dividida, de forma muito clara, em estados centrais e periféricos.
A crise faz-se sentir com mais intensidade nos estados periféricos.
Os estados centrais, especialmente a Alemanha, saem vencedores por causa do Euro.
A competitividade nos estados da UE acaba por variar muito
e a competitividade dos países periféricos tem ficado sistematicamente para trás.
Isto deveu-se diretamente ao Euro.
ÉRIC TOUSSAINT, Pres. do Comitê para Anulação da Dívida do Terceiro Mundo (CADTM) A crise na União Europeia é o resultado da forma como foi feita a integração europeia.
No caso da Grécia, era como colocar no ringue o Cassius Clay,
campeão de pesos pesados, com um peso-pluma,
e dizer aos dois: "comecem a lutar, quem for melhor vai ganhar."
Porque é que os países periféricos estão ficando para trás em termos de competitividade?
E acima de tudo, o que faz com que essa divergência não pare de aumentar?
O mito da "periferia preguiçosa" e da "Alemanha esforçada"
com a sua "alta produtividade", não passa disso de mito mesmo.
Tudo o que o governo alemão conseguiu foi declarar guerra a seus próprios trabalhadores
e congelar seus salários durante uma década.
Nos últimos anos, o aumento nominal dos salários (na Alemanha) foi de 7%,
enquanto na Zona Euro foi de 27%.
Esta diferença resulta, logicamente, numa perda de competitividade dos outros países.
Se os salários diminuem num país ao mesmo tempo que aumentam nos restantes,
não é de estranhar que a competitividade da economia alemã tenha disparado
enquanto os outros países tenham sido incapazes de a acompanhar.
Os países da Zona Euro já não podem desvalorizar as respectivas moedas.
Isto resultou na instituição de um mecanismo
que levaria inevitavelmente aos resultados que temos hoje.
A perda de competitividade manifestou-se de duas formas,
e ambas desempenharam um papel decisivo na crise.
Em primeiro lugar, surgiram grandes déficits nas transações correntes,
e a Grécia tinha o maior déficit de todos. Quando não é possível competir,
as transações com o resto do mundo resultam em déficit.
E o déficit grego é enorme.
Mas isto também é verdade para os outros países periféricos.
Este fenômeno foi paralelo à acumulação de dívidas.
Quando se tem um déficit destas dimensões, é necessário equilibrá-lo de algum modo.
Na UE, a Grécia é o parente pobre.
A Grécia pertence aos países semi-periféricos do continente europeu.
É óbvio que a Grécia estava condenada a acumular dívida pública,
dadas as circunstâncias da sua integração nos mercados europeus.
Não vale a pena sequer comentar o rumor de que os gregos são preguiçosos.
Isso é puro racismo.
A Zona Euro destrói o sistema imunitário dos países periféricos,
deixando-os expostos à crise global.
O calcanhar de Aquiles destes países é o déficit e a dívida.
No nosso caso, a dívida tem raízes
profundas na história do estado grego.
Desde os tempos da Revolução de 1821, o nosso país
começou a pedir empréstimos, e o tem feito desde então.
Com uma única exceção.
Durante um período extraordinariamente "feliz", a Grécia conseguiu tornar-se credora.
Durante a ocupação alemã, a Grécia emprestou dinheiro à Alemanha.
Os alemães obrigaram a Grécia a tornar-se credora em vez de devedora.
Quando a ocupação alemã chegou ao fim, o país voltou ao seu papel tradicional,
o de devedor.
E a dívida pública que vemos hoje começou a crescer nos anos 80.
Os altos níveis de endividamento público na Grécia
estão associados à estrutura social e de classes da Grécia.
Até o tipo de economia que a Grécia assumiu nas últimas décadas
está relacionado com a incapacidade sistemática do estado grego
de implementar um sistema de tributação justo e eficaz.
História da dívida soberana grega
Andreas Papandreou fundou o necessário estado social
sem aumentar a carga fiscal sobre empresas e rendimentos mais elevados.
Salvou empregos ao nacionalizar empresas privadas que davam prejuízo.
Mas principalmente salvou os donos das empresas.
O déficit público e dívida soberana aumentaram dramaticamente.
O governo de Mitsotakisí continuou a contrair empréstimos.
O Tratado de Maastricht impôs os mercados mundiais como único mecanismo
para controlar o déficit, proibindo outras formas de criar dinheiro.
A dívida disparou, com as taxas de juro mais altas da história da Grécia.
Costas Simitis teve mais sorte.
"Contabilidade criativa", a queda dos juros europeus,
e o crescimento econômico ajudaram-no.
E assim, pôde esconder a bomba
que plantou na dívida soberana.
A percentagem da dívida pareceu diminuir ligeiramente.
Costas Karamanlis diminuiu os impostos sobre o capital em 10%,
a queda livre da economia se acentuou,
e a dívida voltou a explodir.
George Papandreou entrou em cena, lançando a Grécia
para os braços dos credores estrangeiros.
No fim do "Mnemonium", a dívida soberana chegou aos 167% do PIB.
FIM
A maior parte dos países em situação semelhante recebeu a visita do FMI.
Mas nenhum pagou tão caro como a Argentina,
o espelho da Grécia do outro lado do Atlântico.
A Argentina caiu na armadilha da dívida ao mesmo tempo que a Grécia,
em 1824, com os primeiros empréstimos britânicos.
Mas o nó foi apertando no fim do século XX.
A Argentina garantiu uma taxa fixa para a conversão entre peso e dólar estadunidense,
o que impossibilitou a execução de qualquer política monetária.
A Argentina viveu a sua própria Zona Euro.
Só que, em vez da Alemanha, tinham pela frente Washington, DC.
...numa forma de entrar no novo século
de uma forma muito, muito sólida.
Ao mesmo tempo, o FMI transformava o país em
mais um laboratório de experiências do neoliberalismo.
(Excerto do documentário 'The Take')
Em primeiro lugar, o FMI teve um papel determinante em CRIAR a crise na Argentina,
implementando as mesmas políticas de desregulamentação e privatização
que levaram aos gigantescos lucros corporativos
e realmente destruíram as finanças do Estado.
Eles eram, de forma muito clara, os agentes do poder dos EUA no mundo,
assim como eram, de forma muito clara, os agentes do neoliberalismo
ou seja, agentes das elites das empresas neoliberais, em que o único objetivo
era aumentar os rendimento de forma formidável, mas fizeram-no à custa desta crise.
Depois do colapso econômico da Argentina em 2001,
o FMI e as suas teorias neoliberais
caíram no ridículo perante economistas do mundo inteiro.
Mas há monstros que se recusam a morrer.
O FMI é como uma instituição "zumbi". Não tem como matá-lo.
O FMI ressurgiu como a personagem que vem "salvar" os países em problemas,
impondo medidas de austeridade, como está acontecendo pela Europa,
e de uma forma perversa e aterradora na Grécia. E não há qualquer sinal de que esta
instituição aprendeu seja o que for da experiência da Argentina.
(Tenho 3 filhos e estou desempregado, por favor ajude-me)
A intervenção do FMI vai sair muito cara à Grécia.
E, em alguns casos, vai até pagar adiantado.
Ron Paul - Congressista republicano A ironia desta promessa é que, com este novo acordo,
a Grécia vai contribuir com 2,5 bilhões de dólares (para o fundo do FMI).
Acho que só um sistema monetário fiduciário mundial (FMI)
poderia ter a idéia de usar a Grécia para resgatar "a Grécia"!
e ainda ter que estar estar pronta para salvar outros países.
A Argentina só teve de enfrentar o FMI.
Mas a Grécia acabou servindo a dois senhores.
Porque, na Europa, as teorias neoliberais também são promovidas
pelo Banco Central Europeu.
O Banco Central Europeu foi uma ferramenta para a imposição de políticas neoliberais na Europa.
Ironicamente, no caso da Grécia,
o FMI foi mais brando do que a União Europeia (UE).
As medidas aplicadas em colaboração com o FMI, o BCE e a UE ( a troika)
não são apenas injustas e perigosas para o povo grego,
também estão condenadas a falhar, desde o princípio.
Têm um impacto trágico na qualidade de vida das pessoas,
e até no seu quotidiano.
E é muito improvável que tenham um efeito positivo
na economia em geral, e na gestão da dívida pública.
Como na Argentina, o objetivo não foi salvar a economia,
mas primeiramente os bancos e as grandes empresas.
O FMI fez uma enorme pressão para que a Argentina pagasse essas dívidas.
Muitas dessas dívidas cresceram, ou melhor, dispararam
devido à transferência de dívida das grandes corporações,
incluindo alguns dos maiores bancos do mundo, para o erário público,
algo que o FMI também forçou.
As medidas agora tomadas são medidas de estabilização
que visam evitar que a Grécia se veja impedida de cessar os pagamentos acertados.
Não são medidas para reduzir a dívida.
É mais do que óbvio que a dívida vai continuar aumentando e depressa,
independentemente das medidas e na verdade precisamente por causa delas.
As medidas visam claramente proteger os credores
e proteger os bancos.
Em poucos meses, o governo grego deu aos bancos
108 bilhões de Euros,
o que equivale praticamente à totalidade do pacote de ajuda recebido do FMI e da UE.
Quando a Argentina viveu uma situação semelhante,
muitos dos responsáveis foram punidos.
A imagem dos presidentes deixando o palácio presidencial de helicóptero
ainda persegue tanto o FMI como os seus colaboradores.
Numa noite mágica, como na Argentina,
ainda vamos ver quem é que vai ser o primeiro a saltar para o helicóptero.
Um ano depois da intervenção do FMI:
A Grécia enveredou por um programa intensivo de "procedimentos de purga",
"utilização de ativos", medidas de "racionalização" e "limpezas".
Os delegados do FMI, da UE e do BCE mudaram-se permanentemente para Atenas
e estão impondo as suas políticas através de um memorando inconstitucional.
Um marco histórico foi atingido agora com as reformas das pensões,
mas a principal questão agora é alinhar o valor dos salários com a produtividade.
O que é hoje a Grécia?
Somos um país livre? Sim.
Somos independentes? Não, fomos reduzidos a vassalos.
A liberdade é uma coisa, e a soberania outra bem diferente.
O problema do nosso país é ter perdido a soberania.
Em plena colaboração com os credores estrangeiros,
o governo ataca as pessoas com medidas extremamente austeras.
O resultado é pobreza, empresas quebrando e desemprego.
Consideramos que o centro de Atenas está
vivendo uma crise humanitária. Todos os sintomas estão lá.
Gente com fome ou sem casa, sem acesso a medicamentos ou cuidados de saúde,
simplesmente deambulando pelas ruas.
Não é muito diferente do que vemos nos países do terceiro mundo.
Lembrem-se que nós trabalhamos com os mais pobres dos pobres.
Há pessoas que ainda mantêm alguns direitos em termos de segurança social,
mas isso não basta, como nos explicou uma pensionista pobre.
Disse ela: "Ou compro comida ou medicamentos. Não dá para as duas coisas."
As medidas do governo não estão apenas agravando
as condições de vida das pessoas. Elas constituem uma ameaça direta a suas vidas.
Até agora, em todos os países que receberam 'ajuda' financeira do FMI
registrou-se uma queda dramática no tempo médio de vida das pessoas,
o que normalmente designamos como esperança média de vida.
Há países onde, depois da chegada do FMI,
a esperança média de vida caiu 5 a 10 anos. Com os cortes que estamos enfrentando agora,
é certo que a nossa esperança média de vida será imensamente reduzida.
As pessoas reagem.
A resposta do governo viola os princípios mais básicos da democracia.
A proibição de usar capuz, as prisões injustificadas e
os policiais de capacete colocam-nos na fronteira de um estado militar.
"O gás lacrimogêneo nos deixa sem dinheiro para a educação gratuita."
As crises resolvem-se sempre através de medidas que atacam a sociedade e os pobres.
E podem ser particularmente duras.
É assim que o capitalismo controla a situação.
O problema do capitalismo é fazer com que estas medidas sejam aceitas.
E para isso recorrem à violência.
Em resposta ao alerta de "vendaval financeiro",
a democracia dá lugar à "debitocracia".
"Pobres, não se comam uns aos outros! Comam os ricos, que são mais carnudos!"
A crise do capitalismo gera uma vasta desvalorização.
O valor se perde, graças à especulação financeira.
Alguém tem de pagar esta desvalorização
Mas os capitalistas não têm qualquer intenção de serem eles os que paguem,
não são propriamente altruístas.
Mas se quem causou a crise faz questão de não a pagar,
por que é que temos de ser nós quem a paguemos?
No passado, vários países conseguiram repudiar as dívidas
não contraídas pelos seus cidadãos,
de acordo com as disposições da legislação internacional,
tal como o conceito de "dívida odiosa".
"A história da dívida odiosa"
A nossa história começa nos anos 20, com Alexander Sack.
Sack era ministro e especialista em assuntos legais na Rússia czarista.
Depois da Revolução de 1917, deu aulas em universidades na Europa e nos EUA.
Em 1927, inventou um conceito genial:
o conceito de "dívida odiosa".
Para definir uma dívida como odiosa, é necessário cumprir três pré-requisitos.
1. O governo de um país recebe um empréstimo
sem o conhecimento ou aprovação dos cidadãos.
2. O empréstimo é gasto em atividades que não beneficiam os cidadãos.
3. Os credores estão cientes desta situação,
mas fingem não o saber.
As propostas de Sack podem parecer progressistas e até revolucionárias.
Na verdade, na altura, serviram os interesses
de uma superpotência emergente: os Estados Unidos da América.
Os EUA tinham sentido falta do conceito de "dúvida odiosa" em 1898,
quando venceram a Guerra Hispano-Americana e anexaram Cuba.
O problema foi que, para além de Cuba,
também ficaram com as dívidas contraídas pelo regime colonial espanhol.
E como o colonialismo espanhol durou quatro séculos,
desde 1492, quando Colombo chegou à América, até 1898,
a dívida era imensa.
Como é óbvio, os EUA não tinham intenção de pagar pelos erros dos regimes anteriores.
Decidiram que a dívida cubana era odiosa.
E pura e simplesmente recusaram-se a pagá-la.
O mesmo se passou no México umas décadas antes.
Quando os republicanos derrubaram o imperador Maximiliano I,
decidiram que as dívidas que ele tinha contraído eram odiosas.
Maximiliano pediu muito dinheiro emprestado, a taxas de juro demasiado altas,
para enfrentar a revolta contra ele.
E como devia muito, sobretudo aos mexicanos,
foi condenado à morte, e enviado para o pelotão de fuzilamento.
Entre o final do séc. XIX e início do séc. XX,
a maior parte dos casos de dívida odiosa
estiverem relacionada com países subdesenvolvidos no continente americano.
Mas houve uma superpotência emergente envolvida em todos estes repúdios da dívida:
os Estados Unidos da América.
E esta mesma superpotência trouxe o conceito de dívida odiosa
até ao século XXI.
Dezembro de 2002: a Casa Branca está dando os retoques finais
nos planos de invasão e ocupação do Iraque.
Porém, antes do início dos ataques, os estadunidenses
já estão preparando o dia seguinte à derrubada de Saddam Hussein.
O Departamento de Estado sabe que vai ter de resolver o problema
da enorme dívida pública iraquiana. Por isso, estão tentando provar
que se trata de uma dívida odiosa.
Foi criada uma equipe, que propôs que
o primeiro governo provisório do Iraque declarasse a cessação dos pagamentos da dívida,
com o pretexto de que os iraquianos não tinham de pagar uma dívida contraída
pelo regime iraquiano. Agora, está tudo a postos para o ataque.
Caros concidadãos, a esta hora as forças americanas e dos seus aliados
estão executando as primeiras operações militares para desarmar o Iraque
para libertar o seu povo e defender o mundo de um grande perigo.
Em Março de 2003, os EUA e os seus aliados invadiram o Iraque.
Três semanas mais tarde, o Secretário de Estado do Tesouro estadunidense
convocou uma reunião de cúpula dos ministros das finanças do G8, em Washington,
e anunciou que a dívida de Saddam Hussein era odiosa.
Ele disse: "o regime de Saddam Hussein é ditatorial e a dívida deve ser repudiada".
"O novo governo do Iraque deve ser liberado das dívidas de Saddam".
As grandes operações militares no Iraque terminaram.
Na guerra do Iraque, os EUA e os nossos aliados prevaleceram.
George W. Bush deu instruções ao antigo Secretário de Estado James Baker
para convencer a comunidade internacional de que a dívida iraquiana era odiosa.
Baker alegou que Saddam Hussein desperdiçava o dinheiro do seu povo
construindo palácios e comprando armas.
Entre outras coisas, os diplomatas estadunidenses provaram que o Iraque devia
milhares de milhões de dólares à França e à Rússia, pela compra de mísseis Exocet
e aviões de guerra como Mirage F1 e MiG.
Na verdade, o comportamento de Saddam Hussein não era diferente
daquilo que muitos líderes ocidentais fazem. Para os árabes, os palácios
são o que os Jogos Olímpicos são para o Ocidente: uma ostentação de poder
econômico e geopolítico.
A diplomacia estadunidense conseguiu provar que a dívida do Iraque era odiosa
e que o povo iraquiano não era obrigado a pagá-la.
Mas Washington percebeu logo em seguida que tinha aberto uma caixa de Pandora.
Pela primeira vez no Século XXI, a maior superpotência tinha legitimado
o conceito da dívida odiosa. Por isso, optaram por
varrer o assunto para debaixo do tapete.
Os outros países disseram "ok, vamos cortar 80% da dívida através do Clube de Paris".
"Mas o conceito da dívida odiosa não pode ser usado oficialmente,"
"porque outros países podem também alegar esse direito".
"Por exemplo, a República Democrática do Congo vai repudiar as dívidas de Mobutu."
"As Filipinas vão recusar-se a pagar as dívidas do ditador Marcos."
"E a África do Sul vai recusar as dívidas do regime do apartheid.".
Para evitar que o conceito da dívida odiosa se propagasse no Século XXI,
tomaram uma decisão ad hoc para o Iraque.
Mas não deixa de ser óbvio para nós que a doutrina da dívida odiosa foi usada.
Eu julgo que seria um erro se o Iraque tivesse de pagar
pelos pecados de um ditador deposto.
Os EUA continuaram ajudando o Iraque a cancelar dívidas antigas,
mas ninguém em Washington quis voltar a ouvir falar
na expressão "dívida odiosa".
O Iraque conseguiu cancelar grande parte da sua dívida
com o apoio de um império. Mas outro país decidiu
aguentar-se sozinho e enfrentar o FMI
e os outros grandes credores. Conseguiram provar que a sua dívida
não era apenas odiosa, mas também ilegítima e inconstitucional.
Bem-vindos ao Equador.
Temos compromissos nacionais, mais urgentes do que os internacionais.
Cumpriremos com as nossas obrigações internacionais assim que pudermos.
Mas as nossas prioridades são claras. A vida primeiro, pagar as dívidas depois.
O Equador podia ser um dos países mais ricos da América do Sul.
Mas, a partir do momento em que foi descoberto petróleo,
tudo o que o país conheceu foram ditadores, pobreza, dívidas e mercenários econômicos.
O meu verdadeiro trabalho era fechar negócios. Era dar empréstimos a outros países,
grandes empréstimos, muito maiores do que eles alguma vez pudessem pagar.
Uma das condições para o empréstimo de, por exemplo, um bilhão de dólares
a um país como a Indonésia ou o Equador...
Este país tinha de devolver 90% deste empréstimo
a uma empresa ou empresas estadunidenses para construir infraestruturas.
A Halliburton e a Bechtel eram duas destas grandes empresas.
E estas empresas iam lá construir uma rede elétrica, portos ou auto-estradas.
E isto só servia aos interesses de algumas das famílias mais ricas nestes países.
Em última análise, os pobres desses países ficavam presos
com esta dívida incrível, que eles nunca conseguiriam pagar.
Em 1982, o FMI visitou o Equador com um comitê de especialistas,
em representação dos maiores credores do país.
O Equador foi forçado a pedir emprestado,
mais e mais, para poder cumprir obrigações antigas.
O Equador foi continuamente saqueado pelos países do Norte.
Por exemplo, de 1980-90, até 2005,
quase 50% do Orçamento de Estado serviu para pagar dívidas.
Nomeadamente, cerca de 3 a 4 bilhões de dólares por ano.
Apenas 4% foi empregado em cuidados de saúde.
Quatro bilhões para pagar os serviços da dívida, 400 milhões para a saúde.
Quatro bilhões para pagar os serviços da dívida, 800 milhões para a educação.
Estávamos matando o nosso próprio povo.
Os equatorianos protestaram. Por um momento, tudo parecia estar sob controle,
quando Lucio Gutiérres tomou o poder, prometendo benefícios sociais.
Falava como um socialista
mas, mal tomou posse, fez um novo acordo com o FMI
e implementou medidas de extrema austeridade.
As pessoas decidiram que ele tinha de sair pelo meio de transporte
preferido dos presidentes argentinos: o helicóptero.
O poder passou para o vice-presidente Palacio.
Tinha boas intenções, mas não tardou a ceder a Washington.
Por isso, as pessoas viraram-se para o único político
que resistiu à pressão internacional.
Rafael Correa.
Uma única rodada
Correa, uma única rodada
Uma única rodada, Equador
Triunfo é esperança
Somos um povo unido
Avança a Aliança do Equador
Luta pela justiça
Luta pelos teus direitos
Luta, Correa, pelo Equador
Uma única rodada
Correa, uma única rodada.
Uma única rodada, Equador
Correa estudou Economia na Europa e nos EUA,
e sabe muito bem como lidar com o Banco Mundial e o FMI,
desde que haja vontade política.
Em 2005, como ministro das Finanças, Correa declarou que não era normal
utilizar os recursos petrolíferos de forma a pagar a dívida.
Era injusto para o povo. Disse ainda que 80% das receitas petrolíferas
deviam ser usados em benefícios na saúde, na educação e para criar emprego,
e apenas 20% canalizados para o pagamento da dívida.
O Banco Mundial disse que não emprestaria dinheiro ao Equador
se uma lei destas fosse aprovada.
Isto foi uma interferência clara do Banco Mundial na política interna do Equador.
Correa declarou que jamais seguiria instruções deste tipo do Banco Mundial.
Ele preferiu demitir-se a ceder, o que o tornou extremamente popular.
As pessoas disseram: "Esse homem optou por se demitir de ministro"
"para defender a dignidade e os interesses do povo."
Correa foi finalmente eleito em 2006. Uma das suas primeiras ações
foi expulsar o representante do Banco Mundial
e pedir à delegação do FMI para abandonar as instalações do Banco Central.
Representantes do FMI, como Bob Traa, que mais tarde viria para a Grécia,
já tinham sido classificados de "indesejáveis" pelos equatorianos.
Estes burocratas insensíveis e desonestos têm de respeitar o nosso país.
Foi por isso que expulsamos o delegado do Banco Mundial.
E nos reservamos o direito de iniciar as ações legais pertinentes
pelos danos e prejuízos causados ao país.
Assim como a declarar ilegítima a dívida que temos com o Banco Mundial.
Seis meses mais tarde, Correa deu mais um passo.
Satisfez a reivindicação das organizações sociais
de uma comissão de auditoria.
Fui uma das pessoas que Correa escolheu para a comissão
Participaram 18 indivíduos e 4 organizações nacionais.
A nossa missão foi examinar todos os contratos de dívida, entre 1976 e 2006.
Trabalhamos durante 14 meses. Examinamos as dívidas obrigacionistas,
as dívidas ao FMI, ao Banco Mundial e a outras organizações internacionais.
e examinamos a dívida a países como a França, o ***ão e a Alemanha.
Por fim, examinamos a dívida pública interna do Equador.
A batalha pelo acesso à documentação foi tremenda.
No ministério das Finanças, o nosso parceiro Alejandro Olmos Jr.
e eu mesmo fomos declarados "personae non gratae",
e todos os funcionários do ministério das Finanças escreveram ao ministro
a queixar-se e a denunciar a nossas ações,
alegando que estávamos prejudicando os funcionários do Ministério.
Nós nos rimos disto, mas dá para perceber as dificuldades que enfrentamos
depois de termos sido acusados de ser "os maus da história"
nesse processo de auditoria.
Apesar dos contratempos, a comissão conseguiu concluir os trabalhos,
e chegou à conclusão de que uma grande parte da dívida era ilegítima.
Deram conhecimento dos fatos ao Estado, que informou o povo.
Foi muito importante que os trabalhos da comissão tenham sido tornados públicos.
A população do Equador ficou sabendo
porque é que os contratos de dívida a ssinados pelos governos anteriores,
especialmente os de 2000, foram considerados ilegítimos.
Dá-lhe, Correa Rafael!
A nossa pátria luta contra
o congresso decadente
e a ditadura burocrática
dos políticos de sempre.
O poder é cidadão, diz-te o teu irmão.
O povo do Equador quer uma nova Constituição.
Dá-lhe, Correa!
Correa, dá cabo dos "patrões" que destruíram a nossa terra
Dá-lhe, Correa!
Com base nas conclusões da comissão, o governo comprovou que
a dívida era ilegítima e decretou a suspensão do pagamento
de 70% das dívidas obrigacionistas do Equador.
Quem tinha em sua posse títulos de dívida vendeu-os a 20% do seu valor.
O governo começou a comprá-los em segredo.
Por 800 milhões de dólares, compraram 3 bilhões em dívidas.
Esta redução significativa permitiu melhorar as condições de vida da população.
Para além disso, viram-se livres dos juros que teriam de pagar até 2012 ou 2030.
Pouparam pelo menos 7 bilhões de dólares, o que foi ótimo para o país.
Isto permitiu ao governo aumentar os gastos na saúde e na educação,
na criação de emprego, e na melhoria das infraestruturas.
O Equador já não está à venda, percebe?
Todos os dias na Grécia, historiadores, economistas e analistas políticos
fazem correr rios de tinta para nos dizer como controlar a nossa dívida pública.
Porém, há uma questão que muito poucos levantam.
Será que os gregos devem assim tanto, como reivindicam os credores?
A dívida contraída pela Grécia nos últimos tempos tem indícios de ser ilegítima.
Por exemplo, as autoridades receberam 'dádivas' de companhias como a Siemens,
que, juntamente com a Siemens Hellas, subornou ministros e funcionários
durante pelo menos uma década para ganhar contratos.
Neste caso, temos indícios de ilegalidade e ilegitimidade.
Por isso, esta dívida deveria ser investigada pelos tribunais. Para mim, isso é evidente.
A justiça grega não se mostrou eficaz no caso da Siemens.
E foi demasiado lenta noutros casos
de acordos feitos às escondidas que aumentaram a dívida.
Com os swaps infames de 2001, o governo hipotecou o futuro
para apresentar um falso e próspero presente.
Fizeram com que a dívida grega parecesse menor,
alterando um empréstimo de ienes para euros, a uma taxa de câmbio desatualizada.
Recorreram aos serviços da Goldman Sachs,
que ganhou milhões com o negócio.
Estou preocupado com o papel das instituições financeiras estadunidenses,
particularmente a Goldman-Sachs.
Porque quando a Grécia ficou viciada na heroína do dinheiro emprestado,
a Goldman foi a traficante de crack.
A artimanha funcionou durante muitos anos. E a elite política grega
provou que podia recompensar generosamente os seus aliados.
Voltaram a contratar a Goldman Sachs para consultoria,
e pagaram com o dinheiro dos contribuintes.
A Goldman Sachs fez consultoria e atacou o governo grego ao mesmo tempo.
O escândalo foi revelado em 2010.
Uns dias antes, um antigo funcionário da Goldman Sachs
foi nomeado chefe da Agência para a Gestão da Dívida Pública Grega.
Contratar um empregado da Goldman Sachs é como contratar um criminoso.
É o mesmo que contratar um assaltante de bancos para lhe guardar a casa,
Pensa que ele sabe como funciona a cabeça dos ladrões, e por isso será um melhor guarda.
Mas há sempre o perigo de um dia ele roubá-lo e desaparecer.
Quem é que me garante que esse antigo homem da Goldman Sachs
vai gerir os assuntos gregos da melhor maneira possível?
Muitos países acusam a Grécia por causa dos negócios com a Goldman Sachs.
Só que são os mesmos países que exploram a ligação que têm
com os governos gregos para vender armas à Grécia a um bom preço.
Quando, há um ano, a Alemanha estava negociando a ajuda à Grécia,
uma das principais condições foi que a Grécia continuasse a importar armamento alemão.
A Grécia devia cortar nas pensões e nos apoios sociais, não na importação de armas.
É um bom indicador dos interesses envolvidos.
A Alemanha protege os interesses dos fabricantes de equipamento militar e da sua indústria exportadora.
Essa gente quer continuar a fazer negócio apesar da crise.
Somos uns hipócritas!
No mês passado, a França vendeu à Grécia 6 fragatas por 2,5 bilhões de Euros.
Mais helicópteros de 400 milhões e aviões Rafale, de 100 milhões cada.
Não sei se vendemos 10, 20 ou 30 Rafale. Os custos totais chegam quase aos 3 bilhões.
A Alemanha vendeu 5 submarinos à Grécia, no valor de um bilhão.
Somos tão hipócritas! Damos-lhes dinheiro, para poderem comprar as nossas armas.
Antes da hipocrisia da Europa, houve concessões criminosas,
de mãos dadas com decisões criminosas, sempre "para o bem da Grécia"
ou para apoiar um novo 'expansionismo' grego, que levou à destruição da economia.
Nós gastamos muito dinheiro.
Nós gastamos o dobro do dinheiro que se gastou em Sidney: .
Eu não sei... Nós saberemos o custo final, obviamente depois do fim dos jogos. .
Você falou 1,2 bilhões de dólares gastos em segurança. De onde veio esse dinheiro?
Nós temos o dinheiro.
É dinheiro grego, é do Comitê Olímpico,
ou há uma parte que vem dos Estados Unidos?
Não, é dinheiro grego. Estamos falando de quantias maiores
do que podemos pagar, talvez, mas importantes para a segurança.
Houve despesas suntuosas, cujo fardo recai sobre as pessoas.
Os empréstimos para os Jogos Olímpicos foram pagos com o dinheiro dos contribuintes.
É normal que as pessoas exijam saber porque o orçamento explodiu
e para que foi usado o dinheiro.
Os Jogos Olímpicos e as transações corruptas com a Siemens e a Goldman Sachs
não passam de uma pequena fração dos negócios obscuros feitos à custa da população.
No entanto, há assuntos mais importantes, que não dizem respeito apenas à Grécia
mas a todos os países europeus periféricos...
Foram seguidas todas as regras que regem a emissão de obrigações?
E ainda há a questão da legitimidade em relação aos bancos
que foram os principais responsáveis pela emissão de obrigações,
tanto no mercado primário como no secundário.
Que bancos estiveram envolvidos? Como é que foram reembolsados?
Sob que termos e condições aceitaram participar?
Uma parte das dívidas contraídas na Zona do Euro é ilegítima,
porque é fruto de políticas contrárias aos interesses das populações.
Por isso, essas dívidas não devem ser pagas pelos cidadãos.
O Equador demonstrou como todos esses contratos ilegítimos ou odiosos
podem passar a ser do conhecimento público através de uma comissão de auditoria.
Porque é que não nos dizem de que tipo de dívida se trata?
Quanto é? Como é que foi contraída?
A quem é que devemos dinheiro?
É por isto que a auditoria é necessária. Uma auditoria permitiria identificar
quais são os contornos exatos desta dívida. Temos de conhecer e denunciar
todas as mentiras do governo e das grandes empresas que estão
se aproveitando do dinheiro dos gregos, e todos os que estão sendo muito bem pagos
para papaguear elogios ao governo.
Mas quem é que vai instaurar a comissão de auditoria?
E, sobretudo, como é que podemos estar certos de que não vai ser
mais uma comissão parlamentar com as mesmas pessoas de sempre,
as que nos trouxeram até aqui?
Os membros da Comissão de Auditoria não devem ser especialistas. Não é necessário.
Porque se o governo formar uma comissão de especialistas,
mesmo que venham do exterior, mesmo que estejam incluídos cidadãos comuns,
a comissão pode acabar por ser porta-voz do governo.
Só o povo tem a autoridade moral e o direito de pedir uma auditoria,
porque é ele quem sofre as conseqüências. Todos os gregos devem envolver-se nisto.
Todas as organizações sociais devem protestar e exigir uma auditoria.
Os partidos políticos gregos ND e PASOK, que se beneficiaram com a criação da divida,
têm uma posição muito negativa em relação à auditoria,
pois as suas responsabilidades virão a público.
A opinião pública tem de se mobilizar.
As organizações têm de se mobilizar, assim como sindicados, juízes, intelectuais, artistas.
Têm de expressar os seus pontos de vista e exercer pressão sobre o poder político.
Em Março de 2011, um grupo de pessoas de origens diversas
tomou a iniciativa de exigir a formação
de uma Comissão de Auditoria na Grécia.
Acadêmicos, escritores, artistas e representantes de sindicatos de todo o mundo
apoiaram entusiasticamente a iniciativa.
A comissão de auditoria irá identificar as partes da dívida
que são odiosas ou ilegítimas
e provará que, de acordo com a lei grega e internacional,
os gregos não são obrigados a pagar essas dívidas.
No entanto, trata-se de uma decisão política e não financeira.
Mesmo que a dívida fosse legítima, nenhum governo tem o direito
de matar os seus cidadãos para satisfazer os desejos dos credores.
Mesmo que se prove que a dívida pública grega de 350 bilhões de euros é legítima,
o que claramente não vai acontecer, a Grécia pode recusar-se a pagar.
E a dívida terá de ser cancelada.
Se honrar a dívida, torná-la sustentável significa
desmantelar os serviços de saúde, desmantelar o sistema de educação,
desmantelar os transportes públicos, então a dívida é socialmente insustentável.
O que o Governo está de fato dizendo é que vão ficar em dívida com o povo grego.
E eu não compreendo como é que governos sociais-democratas,
socialistas e populares eleitos
podem chegar junto dos seus eleitores e dizer-lhes que vão ficar em dívida com eles.
em vez de pedir o dinheiro às instituições financeiras.
Só existe uma única opção na próxima década,
e essa opção é NÃO pagar a dívida.
Porque foi baseada no neoliberalismo,
e a aventura neoliberal foi um crime contra a humanidade.
Ninguém é obrigado a pagar essa dívida,
uma vez que foi contraída em nome da corrupção e dos mercados financeiros.
É imoral pagar uma dívida imoral.
A formação de uma comissão de auditoria é, em última instância,
apenas uma arma poderosa numa batalha mais vasta.
Esta batalha vai travar-se de acordo com as regras tradicionais
com que se travam batalhas há séculos.
Sem esta batalha, mesmo se passarmos a vida a repudiar a dívida,
ela vai sempre renascer das próprias cinzas.
Isto significa que se formará um campo para a luta ideológica, política e de classe.
A dívida é um resultado da luta de classes,
Não hesitem em defender os seus direitos perante a União Europeia e o governo grego.
O respeito conquista-se através da luta, e não obedecendo aos credores.
Olhem para a Tunísia e para o Egito.
Só quando as pessoas agem é que as coisas mudam.
Já é hora de nos vermos livres da submissão
e de nos livrarmos da Troika: o FMI, o Banco Central Europeu e a Comissão Europeia.
porque os três significam a escravidão econômica da Grécia.
Estamos num momento crucial.
Georgios Papandreou
Vamos!
Tradução do inglês: Mariana Avelãs e Hugo Evangelista Adaptação para Pt-Br: Jair de Souza Revisão geral: Youtube.com/AMHIRO2