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Eu gostaria de falar com vocês
sobre sexo e doenças,
mas talvez não o que estão pensando.
Então agora que chamei a atenção de vocês
quero contar uma coisa que é
realmente fundamental.
Quero falar sobre uma ligação entre sexo
e doenças que é bastante séria,
mas uma ligação entre sexo e doenças
que foi, por muito tempo,
despercebida e inexplorada
mesmo dentro da comunidade científica.
Então, para começar,
deixe-me abrir com três observações
que eu acho que podem parecer
surpreendentes e espantosas.
Em primeiro lugar: genoma humano,
nós temos um problema.
Em segundo:
homens e mulheres não são iguais.
Melhor fazer uma pausa aqui --
E terceiro: o estudo das doenças tem falhas.
Então vamos explorar um de cada vez.
Através dos tempos
os cientistas, não importando o
quanto fossem brilhantes,
cometeram erros, e bem grandes.
Por muito tempo, pensamos que a Terra era plana,
e que o Sol girava em torno da Terra.
Bem, nesse momento da revolução
do genoma humano
tem algo que está faltando
que é de importância crucial.
E para entender do que se trata
eu preciso pedir para vocês
voltarem comigo ao início
onde cada um de nós começou.
Portanto, aqui está, o momento da
concepção, óvulo encontra o esperma!
Todas as células do seu corpo --
suas células do pulmão, do fígado, da pele,
basicamente todas as células do seu corpo
são derivadas dessa primeira célula fundadora,
o óvulo fertilizado.
Então o óvulo fertilizado se divide
e se transforma em duas células,
essas duas se dividem e viram quatro,
e oito, e assim por diante --
até que seu corpo todo, que consiste em --
na ordem de 10 trilhões de células
seja formado
e o que é mais impressionante
é que dentro do núcleo
de cada uma daquelas 10 trilhões de células que constituem o seu corpo,
dentro de cada uma dessas células,
você carrega os mesmos 23 pares de cromossomos.
E esses 23 pares de cromossomos
carregam todo o DNA,
todo o material hereditário,
todas as informações hereditárias
que as células, tecidos e órgãos em seu
corpo utilizam para executar suas funções.
Então vamos observar esses 23 pares
de cromossomos mais detalhadamente.
O que acontece é que, dos 23 pares,
22 pares são totalmente idênticos
e compartilhados entre homens e mulheres.
E aqui podemos ver --
As diferenças aparecem no 23o. par
que em fêmeas são dois cromossomos X,
formando um lindo par de iguais,
mas em machos, esse 23o. par
é substituído por um par XY, de dois
cromossomos diferentes.
E vamos ver em mais detalhes
esse par de diferentes, XY
Aqui estão --
à esquerda, o grande e imponente
cromossomo X.
(Risos) Por que vocês estão rindo?
E à direita, o pequeno e modesto
cromossomo Y, de cabeça baixa.
Agora, verdade seja dita,
eu passei toda a minha carreira no
Instituto Whitehead
defendendo a honra do cromossomo Y --
(Risos)
Apesar de incontáveis insultos à sua
natureza e sua perspectiva de futuro.
Até hoje médicos e boa parte dos
cientistas no mundo inteiro consideram
que a função do cromossomo Y
está restrita às células do sistema reprodutivo
E, na verdade, essa ideia de que as células
do sistema reprodutivo
são o único lugar onde o Y tem utilidade
levou, por sua vez, à noção
de que os genomas do homem e da mulher são,
se não consideramos o sistema reprodutivo,
equivalentes em termos de função,
e talvez até moralmente.
E portanto, na verdade, foi dito muitas vezes
que fora o sistema reprodutivo e até
deixando isso de lado por um momento,
foi dito muitas vezes
que nossos genomas são todos
99,9% idênticos
em cada uma das pessoas.
Essa ideia de que somos 99,9% iguais
teve uma adesão enorme
e por uma série de razões --
É muito interessante afirmar que somos
todos 99,9% idênticos --
Tão interessante que essa ideia
foi adotada pelo presidente
[dos EUA] Bill Clinton
em seu discurso sobre o Estado da União, em 2000
em que afirmou "Nesse outono, na Casa Branca...
tivemos a visita de um cientista renomado,
um especialista em seu estudo sobre o genoma humano,
que disse que somos todos,
independentemente da raça,
geneticamente 99,9% iguais."
Nossa -- acontece que essa ideia é até correta --
contanto que os dois indivíduos
comparados sejam dois homens.
Também está correta se os dois indivíduos
comparados forem duas mulheres.
No entanto, se compararmos
o genoma de um homem
com o genoma de uma mulher
descobriremos que, na realidade,
eles são apenas 98,5% idênticos.
Em outras palavras, a diferença genética entre
um homem e uma mulher
é quinze vezes a diferença genética
entre dois homens ou entre duas mulheres.
Vamos considerar, por exemplo, o caso
de Bill e Hillary -- (Risos)
Então quer dizer que o Bill é tão
similar à Hillary geneticamente
quanto ele é a um chimpanzé macho.
(Risos)
Mas, genoma humano, nós temos um problema --
Na era do genoma humano em que estamos vivendo
essa diferença fundamental
entre machos e fêmeas
foi ignorada.
Ao contrário, nós temos operado
com uma visão unissex do genoma humano.
E portanto -- na verdade, homens e mulheres não são iguais em seus genomas --
como acabei de explicar
e como quero continuar a explicar agora --
homens e mulheres também não são
iguais em termos de doenças.
Bom, o que eu quero dizer com isso?
Quais são as consequências disso
e o que isso implica para a assistência médica?
Vou citar uma série de exemplos
para ilustrar o meu ponto.
Vamos pegar o caso da Artrite reumatoide --
Para cada homem com Artrite reumatoide
existem 2 a 3 mulheres afetadas
por essa doença.
Agora, a Artrite reumatoide é uma
doença do sistema reprodutivo?
Não.
Existe alguma diferença anatômica óbvia entre homens e mulheres
que explique essa dramática diferença
na incidência de Artrite reumatoide,
em sua maior incidência em mulheres?
Não há uma explicação simples, anatômica, que se aplique.
Vamos virar o jogo agora e falar de
Distúrbios do Espectro Autista.
Para cada menina com um Distúrbio do Espectro Autista
os números mais recentes indicam
que existem 5 meninos com tal distúrbio.
Por que isso acontece?
Virando a mesa mais uma vez --
Lúpus - um distúrbio autoimune, a longo prazo
com consequências devastadoras
que podem levar à morte.
Para cada homem diagnosticado com Lúpus,
existem 6 mulheres afetadas por essa doença.
Então, para uma série de doenças
que ocorrem fora do sistema reprodutivo
podemos ver que a incidência ou predominância
em homens e mulheres pode ser
consideravelmente diferente.
E mesmo em casos onde a doença ocorre
tanto em homens quanto em mulheres,
aquele distúrbio pode ser muito mais severo
ou apresentar consequências mais severas
em um sexo do que no outro.
Vamos considerar então o caso
da Miocardiopatia dilatada.
A Miocardiopatia dilatada é uma condição
em que as paredes do coração afinam
e o coração infla de forma perigosa --
e, algumas vezes, com consequências arrasadoras.
O que eu vou mostrar a seguir é a curva de sobrevivência,
ou a curva da morte, como preferirem,
para mulheres que sofrem de
Miocardiopatia dilatada
devido a uma má-formação genética
bem específica --
os homens também podem ter
Miocardiopatia dilatada
como resultado da mesma
má-formação genética específica
mas, se isso acontece, os homens tendem
a morrer muito mais cedo.
Por que isso ocorre?
Bem, resolvi perguntar a meus colegas --
Quando faço viagens, pergunto a meus colegas pesquisadores biomédicos
Por que é que, para tantos distúrbios,
a incidência da doença ou a sua severidade
apresentam uma diferença tão dramática
entre homens e mulheres?
Por que isso ocorre?
E a resposta que recebo, quase que
invariavelmente, é --
"Não faço a mínima ideia."
Veja bem, essa é uma grande questão --
uma grande, enorme questão --
Sempre que pressiono um pouco
mais os meus colegas dizendo:
O que você acha que pode estar acontecendo?
A resposta que recebo com mais frequência é
"Bom, talvez sejam os hormônios sexuais."
Como é possível que estejamos tão
avançados no mundo da pesquisa,
nessa era da genética humana,
se as respostas são tão superficiais?
Bem, acontece que essa
revolução da genética humana
nos entregou, nos forneceu um
conjunto de ferramentas
com o qual podemos fazer a pergunta --
Por que um homem tem mais ou menos
risco que outro homem
de desenvolver determinada doença?
Da mesma forma, possuímos as ferramentas
para poder fazer a pergunta --
Por que uma mulher tem mais ou menos
risco que outra mulher
de desenvolver determinada doença?
Mas, por incrível que pareça,
não temos um conjunto de ferramentas genéticas
que permita perguntar:
Por que os homens, como um grupo,
têm maior ou menor risco
de desenvolver uma determinada doença
do que as mulheres como um grupo?
Essa é uma grande, grande questão
e, até agora, não tivemos respostas,
nenhuma forma sistemática de procedimento.
Mas talvez, pode ser que
a resposta estava bem na frente
do nosso nariz esse tempo todo.
Porque, é claro, os indivíduos com
maior tendência ao Autismo,
que podem sofrer de forma mais severa, mais precocemente
de Miocardiopatia Dilatada,
esses indivíduos são homens e são XY.
E que os indivíduos que desproporcionalmente
sofrem de Lúpus e de Artrite reumatoide,
e uma série de outras doenças
são mulheres e são XX.
Claro que ser XY ou XX é a
diferença mais fundamental
entre machos e fêmeas.
Mas toda a indústria de pesquisa biomédica
vem trabalhando por décadas a
partir da hipótese
que a atuação do cromossomo Y
resume-se às células do sistema reprodutivo
ou, em outras palavras,
que o cromossomo Y só importa em
nossas partes baixas.
E, consequentemente,
a ideia foi firmemente mantida
por toda a indústria de pesquisa
biomédica, por décadas,
que todas as diferenças entre os sexos
fora o sistema reprodutivo,
incluindo diferenças em susceptibilidade a doenças
fora do sistema reprodutivo,
a ideia foi que todas essas diferenças
devem ser provenientes dos
hormônios sexuais
que são produzidos pelos
órgãos reprodutivos.
Acontece que recentemente
o meu laboratório no Instituto Whitehead descobriu
que o cromossomo Y está atuando
não só nos órgãos reprodutivos
mas, na verdade, por todo o corpo.
O que significa que todas as células
do seu corpo --
as células da pele, as células do seu fígado,
do seu coração, e até do seu ouvido
essas células sabem, num nível
molecular fundamental,
se elas são XX ou XY.
E a questão que divido com vocês é:
"Isso é importante?"
Isso importa fora do sistema reprodutivo?
E eu gostaria de propor que isso importa, sim.
E que representa um caminho a ser seguido
para uma melhor assistência médica.
Mas qual a seriedade desse problema?
Será que estou inventando coisas?
A indústria da pesquisa realmente
desconhece esse fato?
Bem, quando vou visitar meus colegas
pesquisadores pelo mundo
que trabalham em universidades, em centros médicos, em empresas farmacêuticas --
Se pergunto a colegas, no mundo todo,
que estão estudando células humanas,
como mostrado aqui --
Se pergunto: "Você está estudando células XX
ou células XY?"
A resposta é, quase sempre -- "Não sei"
Bem, se você não sabe se está
estudando células XX ou XY --
Como você pode estar levando em conta
essa diferença de caráter fundamental
entre células, tecidos, órgãos e corpos
masculinos e femininos?
E então -- é fato que um grande número
de pesquisas em andamento hoje em dia
com objetivo de entender a causa de doenças,
e de identificar possíveis curas e
tratamentos para doenças,
não está levando em conta essa
diferença fundamental
entre homens e mulheres.
E é por esse motivo que eu disse,
de forma provocadora,
para vocês no começo dessa palestra
que o estudo das doenças tem falhas.
Bem -- o que fazer? O que pode ser feito?
Como podemos pensar sobre isso de outra forma?
Como podemos pensar sobre
reconectar e reconsiderar
essa ligação entre sexo e doenças?
Bom, eu penso o seguinte --
Em primeiro lugar, células XX e XY realizam
suas tarefas de formas diferentes,
no nível celular e nos níveis superiores
de organização seguintes.
Então precisamos levar em consideração,
como pesquisadores no mundo todo,
que existem, de fato, diferenças fundamentais,
não somente no sistema reprodutivo,
mas por todo o corpo
entre células XX e XY.
Nós precisamos descobrir quais
são essas diferenças.
Nós já estamos, em meu laboratório
no Instituto Whitehead,
explorando essa questão
e nós já descobrimos
que células XX e XY realizam suas tarefas
por exemplo, de produzir proteínas,
de formas ligeiramente diferentes.
Em segundo lugar, precisamos desenvolver
um conjunto de ferramentas melhores
para os cientistas e clínicos
que estão buscando a cura e
tratamentos para doenças.
Precisamos desenvolver um conjunto de ferramentas
com informações para XX e para XY
no lugar do conjunto unissex atual.
Precisamos de um conjunto de ferramentas
que reconheça todas
as diferenças fundamentais
entre células, tecidos, órgãos e corpos XX e XY.
E eu acredito que se fizermos isso,
e eu acho que conseguiremos,
chegaremos a um paradigma
fundamentalmente novo
para o entendimento e tratamento
de doenças humanas
para que, no futuro, se você procurar
a ajuda de um profissional da área de saúde,
será realmente importante
se você é do sexo masculino ou feminino --
o tratamento que você receberá
e não apenas se você deve procurar
um ginecologista ou um urologista.
Então, no futuro, isso vai transformar
a forma como encaramos a assistência médica,
e acredito que isso vai -- para vocês, para mim,
para nossos filhos e nossos netos,
transformar nossa experiência
com a assistência médica.
Muito obrigado. (Aplausos)