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A LUA NA SARJETA
"Nascemos na sarjeta. As estrelas refletem-se na água."
Num porto, igual a tantos outros
perdido entre as docas
no fundo de um beco
um homem vem todas as noites para fugir de seu passado.
Passaram sete meses
e muitas luas nasceram no céu escuro.
Eles nunca encontraram o estuprador.
É um caso arquivado e ninguém mais se lembra.
Ainda...
Ele lembra da noite em que sua irmã havia morrido ali.
Ele lembrou da inocência.
Ela foi estuprada e então suicidou-se.
E, noite após noite,
nada era invencível o suficiente para impedi-lo de continuar
voltando aquele lugar.
Ele só pensava em uma coisa: encontrar o estuprador
para acabar com o pesadelo que havia acabado com sua liberdade.
Essa mancha nunca vai sair.
Nunca!
Oi Frank.
Você tem um cigarro?
Me dê um cigarro/ dinheiro?
Quanto quer?
500.
10.
Dez dá.
Você bebe demais.
Não vai pegá-la?
Ela era boa demais para esse lugar.
Você também sabe?
- Você parece nervoso. - Fique calmo.
Estou sempre nervoso.
Tem alguém seguindo você?
Por que alguém me seguiria?
Não sei.
Você talvez tenha feito alguma coisa.
Alguma coisa?
Não é da minha conta.
Não estou vigiando você.
Tem certeza?
Por que o vigiaria?
Você já é adulto
Não é minha culpa.
Então, é minha?
Sim, sabemos que você fala demais.
Seria fácil demais.
Posso?
Posso?
Por que não?
Frog, consegue me ouvir?
Consigo, puta.
Ponha 100 para mim! Esqueci minha carteira.
Você ganhou!
Hei, você! Não gosto de voyeurs.
Cadela!
O que está fazendo?
- Estou indo ao banheiro. - Está ocupado.
- Eu sei. - Está me vigiando?
- Algum problema, Frank? - Que tipo de problema?
- Tem algo chateando você? - Chega de perguntas.
Você vive me vigiando, como se esperasse por sei lá o quê.
Sempre que olho, você está lá, me observando.
Me deixe em paz!
Estou avisando.
Seu irmão é um porco, ele é nojento.
Quem é aquele cara?
Tudo que sei é que não gosto do jeito que ele olha para mim.
Está com medo agora?
Ele me cansa. Nunca parece satisfeito.
É um cliente?
Ele não gosta de putas.
- O que eles está fazendo por aqui?
Aqui ele pode fazer coisas que não seriam permitidas entre os ricos.
- Que tipo de coisas? - Nesse bairro? Muitos tipos.
Faz tempo que ele vem aqui?
Ele é estranho.
Não gosta de si mesmo.
Hei...
O quê?
- Vamos, levante!
Me deixe em paz.
Me deixe em paz.
Não reconhece seu velho amigo Gérard?
Não conheço nenhum Gérard.
Não tenho velhos amigos.
Gérard. Gérard Delmas, não lembra.
Não.
Não lembro de ninguém,
Prefiro esquecer as pessoas.
Isso não é bom.
Não, não é bom. É maravilhoso
O que é maravilhoso?
- O calendário. - Qual calendário?
O calendário com fotos da garota.
Ela usava um mink e o deixou aberto.
Ela não vestia nada por baixo.
Esse era meu sonho.
Qual era o nome dela?
Elas nunca têm nomes, apenas números de telefones.
Ela nem mesmo tinha um telefone.
Eu as prefiro sem telefone algum.
As únicas que amei estão mortas.
Elas nunca o incomodam.
Talvez eu deva fazer algo?
Para que?
Para acabar com esse sonho.
Você quer que compre um sonho para você?
Você precisa de uma mulher.
Quem é você?
Desculpe-me senhor. Não nos conhecemos.
Eu sabia que nunca havia lhe visto.
Mas precisava conversar com alguém.
Meu nome é Gérard Delmas.
Sou Newton Channing.
Lembrarei disso.
Onde mora?
- Na cidade. - Na Cidade Alta?
Sim, na Alta.
Em uma casa branca,
com persianas pudicas,
gramados e chafarizes.
Partidas de tênis invisíveis entre arvores de essências raras.
Crianças loiras gritando.
Tudo limpo.
Limpo demais.
Puramente burguês.
Moro com minha irmã.
Nós nos damos bem.
Uma noite, semana passada, ela me nocauteou.
Minha irmã é muito legal.
Eu estava tentando incendiar a casa.
Ela pegou seu sapato de salto fino...
e paf!
Fiquei desmaiado por pelo menos dez minutos.
Nada como um lar feliz.
As vezes, ela fica estranha.
Não gosto que ela venha aqui.
Tem razão.
Não é um bom bairro para sua irmã.
- Ela nem liga. - É um bairro de brutamontes.
Pode ser perigoso para uma mulher.
Aonde quer chegar?
Em lugar algum.
Talvez você seja um ladrão.
Neste bairro, nunca se sabe com quem se está falando.
Amigo, deixe-me lhe dizer uma coisa, somente uma coisa.
Não tenho medo do que possa me acontecer.
Ande, Newton.
Termine de beber, estamos indo para casa.
O último trem.
- Meu anjo-da-guarda. - Vamos.
- Vamos para casa. - Não estou pronto.
Preciso beber mais um pouco.
Quer que chame uma ambulância?
Ainda não fez efeito.
Preciso ficar até que faça efeito.
Um dia, você vai sentir algo.
Você será levado em uma maca.
É isso que quer?
O que eu quero
é que me deixe em paz.
- Você pode? - Não, não posso.
Gosto demais de você.
Gosta demais...
É muito gentil.
Tenho sorte.
A sorte não existe.
Você não tem educação, Newton
Não me apresentou seu amigo.
Estou esperando, Newton.
Aqui, não apresentamos as pessoas.
Sinto muito, senhor. Ele não é assim.
É porque ele bebeu demais.
Não faz mal.
Não leve a mal.
- Eu disse que não faz mal. - Claro que não faz mal.
Meu nome é Loretta.
É muito importante que ele saiba seu nome
e endereço.
Convide-a para jantar,
diga-lhe que será bem-vinda.
Segure a mão dela,
beba em seu copo.
Vou te dar um tapa.
Não será preciso.
Me chamo Gérard Delmas.
Seu irmão tem razão, senhorita.
Pode vir jantar sempre que quiser.
Moro no 7 do Chemin de l'Ócean. Número 7.
Dá sorte.
É a casa mais pobre da vizinhança. Não tem como errar.
- Já voltou? - Sim.
Não estava com sono.
Maldito sofá!
Você tem um quarto.
Lola me expulsou.
Outra vez?
Essa noite.
Não sei o que ela tem,
deve ser a fase da lua.
Maldição!
Se não tivesse me abaixado, teria levado a mesa na cara.
Um demônio.
Ela não é fácil.
Por que ela jogou a mesa em você?
Por causa dos aluguéis.
Tome.
Não posso aceitar dinheiro de quem não tem.
Na última vez que subi, a polaca...
me contou tantos infortúnios...
que fiquei bêbado por três dias seguidos.
É para você.
O que é isso?
É pelo seu aniversário.
Toque!
Toque!
Nunca soube tocar, hein?
Não faz mal.
Toca violino agora?
Então, você subiu?
Você subiu?
Pegue, coração.
Viu a outra? Viu aquela vaca?
Não, vi a polaca.
Ah...
Você viu a polaca?
'Tá gozando com minha cara? É dinheiro dele!
- Ouça coração. - Coração, uma ova!
Você... suba!
- Sabe que horas são? - Você deveria ter subido mais cedo!
Se não tivéssemos o dinheiro dele...
Não se envergonha de viver às custas de seu filho?
Há sete meses que não faz nada com aquela droga de ambulância.
Não fale de ambulâncias. Eu proíbo você!
Me proíbe? O que?
Você me proíbe! Você me proíbe!
E essas garrafas? O que é isso? Me diga o que é!
- O médico disse que seria bom. - Que médico?
Do que está falando?
Quando foi ao médico?
- Não é nada sério. Não se preocupe. - Eu? Me preocupar?
Você está tão saudável que me deixa doente.
Tudo que faz é beber e dormir.
Trabalhar que é bom, nada. É essa a sua doença.
Ela está morta.
Isso não vai trazê-la de volta.
E nós estamos vivos.
Vivos!
Entendeu?
Oi, Bella.
Morra.
- Vá se foder! - O que foi agora?
Ontem eu falei para você: acabou.
Ainda pensando na tal ruiva?
São tantas que nem lembra do nome delas!
Não comece, não comece!
Vera! Ela se chama Vera.
- É uma garçonete. - Garçonete.
- Se eu quiser comer, preciso falar com uma garçonete.
Ela entrega em domicílio, sua garçonete?
Eu vi você entrar em uma casa com ela.
Uma casa?
Num armazém! Ela é casada e tem 5 filhos.
E daí?
Eu comprei um abajur para você. Não viu ali?
O quê?
- Por que não me disse? - Eu disse.
Eu disse, mas você pulou em mim como uma pantera.
Minha pantera.
Minha linda tigresa.
Não precisava me bater.
Se não batesse em você, você arrancaria meus olhos.
- Minha pantera. - Tentarei da próxima vez.
Não tente isso quando a Gorda estiver aqui.
Que Gorda? Não é ela que vai me impedir.
Algo lhe aborrece?
A gente vai se casar ou não?
Eu não sei.
A gente se ama não?
Não basta. Você é muito ciumenta.
Tenho todo o direito de ser ciumenta.
Talvez você tenha outros planos?
Não me passe para trás, Gérard.
Quer que eu viva trancado em um armário?
Sim, gostaria muito.
O que há comigo?
Eu tenho essa cara na minha pele. Só penso nisso,
só penso naquilo.
As vezes, não consigo dormir.
Eu quero entender. Só vejo mulheres,
milhares delas.
Todas querem você. E eu corro atrás de você.
Que inferno!
Aquela filha-da-puta!
Não há outras.
É mais forte que eu. Sou ciumenta.
- Ciumenta, está entendendo? - Nunca mais olhei uma bunda.
- Mas não é você! - Não é você!
É o jeito como elas olham para você.
Já viu sua cara no espelho?
Viu sua cara?
Olhe bem, olhe bem!
Mais.
Assim.
Vê sua cara?
É a cara que tem quando está em cima de uma mulher.
Sua cara quando faz sexo.
Quando faz sexo comigo.
Venha!
Vamos entrar.
Venha!
Onde roubou isso?
Não roubei. Eu ganhei.
- Você vem? - Estou tomando um ar.
Vai demorar?
Não sei.
Não estou a fim de esperar.
O murmúrio...
dos chafarizes...
Tem alguém doente na sua casa?
Sim.
A ambulância.
Tem certeza que não errou de endereço?
Sim...
Não podia deixar de ver a casa mais podre do bairro.
Aceito seu convite.
É um pouco tarde para jantar.
Não, é apenas uma visita. Queria ver você.
É muito gentil.
É muito gentil.
São duas da manhã. Já me viu.
Sim, esperava que ainda não estivesse na cama.
Você me acordaria.
Você teria arrombado a porta do meu quarto.
Não.
Não, nunca cheguei a tanto.
Nunca.
Não tenho tanta certeza.
É um bom couro.
Vou sujá-lo.
A noite está ideal para um passeio.
Vamos ao porto?
Estamos indo ao porto. Não gosta?
A motorista é você.
Ele sabia que, em poucas horas, o frenesi recomeçaria.
Centenas de caminhões invadiriam o porto.
O ventre dos navios se abriria.
Os braços de metal acordariam.
Os cabos estalariam e um calor intenso...
desceria sobre o porto quando os estivadores voltassem ao trabalho.
Por que sempre fecha os punhos?
Sou um estivador. Vejo as coisas diferentes de você.
Nós dois estamos vendo a mesma coisa.
Olhe mais de perto.
Você queria ver a sujeira? Ali está.
Por que fala em sujeira?
Acho isso magnífico.
Um sonho.
Uma cidade limpa, branca, com chafarizes,
árvores...
Era com isso que eu sonhava...
quando me acordou para me trazer onde trabalho.
Nunca pensou em navegar?
- Sim. - E então?
Talvez tenha visto partir navios demais.
Quando éramos crianças, minha irmã e eu, íamos ao píer...
para acompanhá-los.
Conhecíamos todos eles.
Nunca eram os mesmos.
Você tem uma irmã?
Ficávamos no píer olhando...
até eles sumirem no horizonte...
até chorar.
Qual o nome dela?
Eles tinham nome de mulher... Marie,
Catherine...
Está chorando?
Senhorita Channing...
você é muito curiosa.
Está passeando.
Mas cuidado,
está num mundo de brutos.
Mas você não é um bruto. Lembrou-se do meu nome.
Você gosta de mim?
Leve-me com você.
Para longe!
- Não, esqueça.
Não posso.
Não.
Estive esperando...
por tanto tempo.
- É uma pena. - Uma pena para nós dois.
- Não para mim. - Mentira.
- É mentira. Olhe para mim, por favor.
Olhe para mim.
Olhe para mim!
- Dê o fora! - Está com medo?
Um dia, você falará.
Você abrirá seu coração.
Haverá um pouco de azul em seu céu.
Uma estrada infinita até o sol.
Barcos como pássaros.
Uma doçura...
E você não sentirá mais medo.
Tudo será belo.
Não há fatalidade na desgraça.
Vá embora.
Vá embora.
Quando vai parar com esse jogo?
Acabou. Eu...
Eu parei.
É o que você diz.
Ela pegou minha navalha e...
cortou a garganta...
ela se deitou ali...
para morrer.
O mais importante é...
que ela fez isso sozinha.
Não...
Não...
Não quero ir mais longe.
Você sabe que não precisa ir mais longe.
Ela fez isso porque estava desesperada.
Porque um cara a violentou.
Ela não conseguia suportar aquela dor,
aquele sofrimento.
Ela não podia mais agüentar.
Todos nós procuramos aquele cara.
Catherine... todos a amavam.
Você a amava?
Sim.
Não me olhe assim.
O que há de errado?
Não gosto do jeito que me olha.
Nunca o vi com ela.
Conversávamos bastante.
Alguém contou para ela que antes eu pintava.
Ela queria vê-los. Queria saber que tipo de quadros eram.
- Levou-a para sua casa? - Sim.
Não. Ela nunca foi a casa de um homem.
Mas ela confiava em mim.
Eu gostaria... gostaria que fizéssemos um passeio. Nós dois.
Confio em você.
Ok? Para sua casa.
- Para quê? - Para ver.
Para ver se há algum quadro.
Pode não haver nenhum.
Deve haver uma cama lá.
- Você pode precisar. - Sim.
Tentei avisá-lo.
Catherine.
Você queria vir.
Catherine.
Não queria que a visse.
Você a ama?
- Ela nunca soube. - Seu idiota!
Deveria ter dito a ela que a amava.
Se eu soubesse que ela me amava...
teria partido com ela.
Teria pedido ela em casamento.
Você deveria ter contado a ela.
Não, ela sentiria pena de mim.
Eu era miserável.
Você deveria ter dito a ela.
Muitos lugares miseráveis, muitas mulheres miseráveis.
Muito tarde.
Deveria ter dito a ela.
O quê?
Está cansado?
Pode dormir aqui. Eu o acordo.
Catherine?
Que vestido é esse?
Dói?
Estou bem.
Você se veste como uma puta agora?
Eu emprestei. Era para você.
Não... Catherine...
- Me mostre. - Não é nada.
- Você se vacinou? - Sim.
Mesmo assim, vá limpar isso, ok?
Me dê isso.
Me dê!
Quer de presente?
Me dê o filme.
Para quê?
O que vai fazer com ele?
Enfiá-lo na sua garganta. Me dê!
Hei você! Acabou?
E daí?
Está louco?
Me dê isso!
Vá com calma, cara.
Devagar, solte isso!
Bote esse cara para fora!
- Ele está demitido. - É isso.
Bom!
É isso. Venha comigo.
Entendeu? Já chega?
Não.
- Tome! - O que quer que faça com isso?
Você quer me fazer engolir isso.
- Eu disso isso? - Ah sim, sim.
Não queria bater em você, mas na hora...
Não se desculpe.
Não se desculpe.
Não deveria ter vindo ao porto.
Não tinha o direito de fotografá-lo.
- Mas você o fez! - Sim.
Não tenho justificativas. Só isso.
- Me perdoe. - Esqueça.
Não posso. Sinto muito.
Pronto, já se desculpou.
Perdeu seu emprego?
Sim, a vida não é um piquenique.
É minha culpa. Deixe-me ajudá-lo.
Ajudar-me?
Conheço o armador.
Irei vê-lo.
Vai dar certo.
Preciso trabalhar, é importante.
Sim, para mim também. Fui a responsável.
Você não me deve nada.
Foi minha culpa.
Adeus.
Creio que não nos veremos mais.
Hein?
Não. Não.
- Deixe-o em paz! - Ele vai ver só!
Você que vai ver!
Ele não perde por esperar.
Nesta casa, nada vai acontecer. Nada. Entendeu?
Quem é você para me impedir?
Tente para ver sua desgraçada.
Quando se quer um homem, é preciso lutar por ele.
Um marido tem que merecê-la, Bella
- Boa noite. - Boa noite, Gérard.
Acaba quebrando, Bella...
Você está cheiroso.
Isso fede!
Vai comer Gérard?
Tem algo pronto pra mim?
Sempre tem algo pronto para você.
Sempre tem algo pronto para você...
Sempre tem algo pronto para você.
Está sonhando?
Perguntei se queria café?
Por que não veste o sobretudo?
Chega.
- Não comece. - Está errado.
Por que não tira o paletó?
Por que...
- Incomoda você? - Nem um pouco.
Só quero que sinta-se bem, que fique à vontade.
Estou à vontade.
Satisfeita?
Por que está todo bem vestido?
Eu a conheço?
É aquela do carro? Vi pela janela.
- Não se debruçou demais?
- Naquele momento, não foi preciso.
Só quero que você me conte...
quais são os seus planos.
Vocês dois...
Será possível!
Aquela mulher não significa nada pra mim.
Entendeu?
Eu mal a conheço.
Esperei por você a noite toda.
A noite toda!
Mas ela, é só assobiar!
Você é louca, sabia?
Está escrito na sua cara.
Você nem pode me encarar.
Vou lhe dizer uma coisa pela última vez.
Não vai acontecer nada.
Nada.
Entendeu?
É uma rica que gosta de ver os pobres.
Isso a excita...lhe dá sensações... Entendeu?
Não tenho nada com ela. Ouviu? Não tenho nada com ela.
Pobre coitado!
Ela o enfeitiçou tanto que acredita no que diz.
Ela excita você, não é?
- Engraçado. - O quê?
Você!
Você!
Olhe para você!
Todo fantasiado.
- Você fede. - Pare com isso.
Cadela, pare com isso!
Não consigo.
Olhe-se no espelho!
Olhe bem!
É da sua irmã.
- Onde achou isso? - Ela deixou para mim.
Deixou para você?
Não deve abusar da sorte. Um dia ela para de sorrir.
Desculpe-me, não estou entendendo.
É só um conselho.
Acho que você é que precisa de conselhos.
Não tenha medo dela.
Eu procuro alguém.
Sim, eu admiro você.
Gostaria muito de conhecê-lo, saber mais de você.
Por quê? Algum motivo em particular?
Você deve saber.
Não tenho certeza, mas você deve saber o motivo.
Você me deixou intrigado.
Deveria estar preocupado.
Nunca me preocupo.
Sofro muito, mas nunca me preocupo.
Então?
Não, ainda não! Ainda não.
É excitante!
Eu adoro quando é excitante!
Algum tempo atrás, fiquei entusiasmado...
De repente, senti vontade de conhecer o Alaska.
Peguei o avião e, à noite, estava em Anchorage.
Transei com uma esquimó de 60 anos de idade.
Anchorage... uma cidade desconhecida!
Alaska... Imensidões geladas, brancas ....
e, a perder de vista,
os dois seios quentes de uma esquimó.
Excitação!
Excitação!
É difícil lembrar de todas.
Com certeza,
você também deve ter muitas.
Ai!
Tem razão, é Gérard.
Não lhe disse?
Ele está vestindo sua roupa de domingo. Foi por isso que...
pensamos que fosse um policial.
Por que está vestido desse jeito?
Caiam fora.
Podemos nos sentar, não podemos?
Veja isso! Um concurso de elegância masculina!
Essa é uma mesa especial.
Especial, talvez, mas não está reservada. Vamos sentar.
Se eles podem sentar, nós podemos também.
Tem razão!
Você está cheiroso, querido.
Nos paga uma bebida?
Certamente senhoras. O que vão querer?
Uma "Ave do Paraíso".
Uma "Odalisca".
Muito bem.
Eu fiz a barba.
Vamos festejar isso. Vai tomar algo?
- Vai se ferrar! - Vai você!
Nós é que não queremos você, seu nojento!
Não fale assim, senhora. É falta de caridade.
- Vai querer algo? - Não, não quero nada. Vou embora.
Eu me afeiçôo fácil. Quer que eu sofra?
Quem é essa piranha?
É minha irmã.
Bonita, ela.
Veio procurar homem?
Um freguês a espera no bar, querida.
Pare de olhar pra ele.
Estamos juntos. Se quiser ele, tem que falar comigo primeiro.
Cuidado, Sra. Dora. Minha irmã é faixa preta.
Não tenho medo dela.
Acho até que vou arranhar o rostinho dela.
Ouviu? Eu disse pra parar!
Não grite na minha cara.
Tente me impedir. Quando estou com um cara, é bom nem chegar perto.
Com licença.
Com licença? Quem ela pensa que é?
Essa puta pensa que vai ficar assim?
Vamos!
Beijem-se.
Um uísque, por favor.
Precisa de uma mulher. Não pode continuar assim.
Uma mulher igual a você, Frieda.
Viver a dois é bom. É bom para o equilíbrio.
Equilíbrio é importante.
Quantos anos você tem, Frieda?
Estou quase nova.
- Quanto pesa? - 40 quilos.
Vestida.
Sabe cozinhar?
Não é o meu forte.
- Deveria aprender. - Acha?
- Sim, gostaria que você aprendesse. - Não vê que está zombando?
Está fazendo piada de você. Sua estúpida.
Ele quer que o dinheiro valha a pena.
É isso que ele está fazendo?
Está apenas fazendo piada de mim?
Você é bonita, Frieda! Bonita!
Não faz mal. Não era sério. Era só uma brincadeira.
Não era sério. Não faz mal.
Está enganada.
Acredite em mim.
Você esqueceu isto.
Por favor, não vá embora!
Tenho um encontro.
Por isso está tão elegante?
Sim, tem um encontro...
comigo!
- Não é? - Desde quando?
Desde que tomou um banho,
fez a barba e se vestiu bem.
Não fiz isso por você.
- Não foi por minha causa? - Não.
Não foi por mim...
É uma pena.
Pena!
- Obrigada. - Rápido!
Rápido!
Estou pronta.
Você é bela! Você é pura!
Eu deveria ter falado logo.
- Falado o que? - Que é você que eu quero.
Eu senti logo uma coisa...
forte.
Uma sensação... um sentimento que não conhecia.
É tudo que sei.
Só isso...
estar... perto de você.
Para sempre.
Loretta...
Nunca vá embora... nunca!
Algum problema?
Você ama seu irmão.
É um bêbado, um preguiçoso, um excêntrico, mas...
às vezes é muito meigo.
Sim, eu o amo.
Eu o amo.
O que ele veio fazer aqui?
Aqui, ele procura se esconder. Se esconder.
Do quê?
Dele mesmo.
Não estou entendendo.
Não costumo falar sobre isso.
Por quê?
Um pesadelo.
Afinal, você tem o direito de saber.
Uma noite, meu irmão foi buscar meus pais no cassino.
Minha mãe estava bêbada... como sempre.
E meu irmão corria muito... como sempre.
E meu pai estava calado... como sempre.
Esse é meu irmão.
Ele não é o homem que você procura.
Tudo podre! Droga de carro!
Ralé! Tudo podre!
Porcaria de carro! Vou mostrar pra vocês!
Bastardos!
Ainda bem que escapei daquilo.
Assine.
Assine você primeiro!
Quem é o senhor?
Sou o vigia da catedral, Senhorita.
Quero que seja tudo legal.
Nada mais legal que este documento.
Amanhã será colocado nos arquivos,
e o nome de vocês...
constará no registro de matrimônios.
Foi você que quis.
Talvez ele mude de idéia.
Assine...
Ali.
Ao lado do meu nome.
O casamento é uma coisa muito séria.
Se ele quiser desistir é agora ou nunca.
Pronto, está feito!
Trouxeram as alianças?
Não.
Não se preocupem. Daremos um jeito.
São 60 francos a mais.
Dez pela grande, cinqüenta pela pequena.
A fé não se mede pelo tamanho.
O tamanho exato. Bom sinal.
Agora, o noivo pode beijar a noiva.
Eu te amo. Na vida e...
na morte.
Agora, eu os declaro unidos pelo matrimônio.
Te amo na vida... na morte... na vida...
Agora a noiva chega perto do noivo.
Ao nosso amor!
Agora o noivo beija a noiva.
Pela morte...
Beije-a.
Eu os declaro marido e mulher.
Pela morte.
Beije-a.
Beije-a.
Beije-a.
Pelo nosso...
Beije-a.
Amor.
Pelo nosso amor.
Vem...
Vem, querido...
Quero você.
Me pegue.
Eu disse para vir.
O que é isso? Você está vestido!
Nossa mãe!
Que palhaçada é essa?
Oh... Errei de quarto.
Você errou de quarto?
Errou de quarto!
Afinal, que esculhambação é essa?
A fé não se mede pelo tamanho.
Onde está seu pai?
Quantos litros você bebeu?
Poucos. Eu não agüento.
Não agüenta!
Mas que brincadeira é essa?
- Onde está ele? - Está calor!
Não mude de assunto.
Foi tomar uma cerveja para se refrescar.
Espere só ele voltar!
Vai ver como eu vou refrescá-lo.
O que está fazendo aí?
Meu coração! Minha jóia!
Está ferido?
Meu violino!
Eu poderia ter tocado novamente.
Quebrou meu violino!
Vá!
O pássaro voou!
Que filho-da-puta, esse pássaro!
- Aonde você vai? - Vou dormir.
- Vai dormir?
Escute aqui, seu safado!
- Não fale comigo desse jeito. - Vai me contar tudo, agora!
- Eu preciso dormir. - Estou de ressaca e...
- O que você fez ontem à noite? - Você nunca bebe.
- Nada! - Nada?
Eu o encontrei em coma, beijando uma estátua da Virgem Maria e não fez nada?
- E daí? - Sou ciumenta...
e estou ficando curiosa.
Você é pesado, sabe? Arrastei você até aqui.
- Obrigado. - Não fiz aquilo para que me agradeça.
Quero que me diga o que aconteceu!
Não pedi que me chamasse para a sua cama.
Como se fosse a primeira vez!
Nunca se fez de rogado!
Está bem...
Não vai dormir, não! Não vou deixar.
Você vai me contar.
Agora.
Seria fácil demais.
Vista alguma coisa.
Está excitado, não é?
Não quer ficar assim, não?
Escute, Bella.
Escute.
Vou ajudá-lo. Ela ficou esperando por você no carro.
Ela chorou, chorou... mas ela se mandou, viu?
Sou mais paciente que ela.
Eu vim buscar minhas coisas, Bella.
Entendeu? Entre nós acabou tudo!
O quê?
Eu me casei ontem à noite.
Não é verdade.
É verdade.
Ela assinou... eu também.
Não é verdade. Não pode ser.
Não pode ser.
Estou ficando louca.
Com aquela puta rica!
Está mentindo.
Onde está sua aliança?
Na minha camisa.
Mas é de plástico.
Estava bêbado.
Estava bêbado. Não sabia o que estava fazendo. O casamento não vale.
Bebemos depois.
Num quarto de hotel? Conte-me.
Os detalhes. Quero saber tudo. Fale...
Não aconteceu nada, se é isso que quer saber. Nada!
Bella...
Vim apanhar minhas coisas.
Ela estava me esperando.
Não sei o que aconteceu. Estava bêbado. Desmaiei.
Entrei no quarto errado.
Não, errar é humano.
Agora você está no quarto certo.
Aqui estou. Beije-me!
Beije-me!
Não estou mais a fim, Bella.
Não estou mais com vontade.
Espere!
Espere!
Quer um? Quer um cigarro?
Tem que entender, Bella.
Estou casado.
Onde ela está?
Onde está sua mulher?
Onde ela está? Cadê a noiva?
Não sabe?
Vou lhe dizer.
Na caminha dela, bem limpinha...
dormindo um sono limpo.
Ela nunca dormiria neste pulgueiro.
Sua noiva se mandou.
Ninguém pode censurá-la. É duro viver aqui.
Tem que ter nascido aqui.
Brigas! Garrafas vazias!
É nojento. Fede!
Sabe o que ela vai fazer? Amanhã ela vai ao salão,
lavar os cabelos, borrifar-se com DDT.
- Vai se lavar, se desinfetar. - Pare!
Cale essa boca!
Cale essa boca...
ou quebro sua cara!
Lá em cima, ela respira. Nos bairros chiques.
Não entendeu nada, Bella. Nada!
Ela foi, mas não me abandonou.
Você é que não entendeu nada.
Talvez ela goste de você...
mas nunca vai deixar a Cidade Alta. Nunca!
E você... você é daqui...
e sempre será daqui.
É só pegar o bonde, Bella.
Não...
claro que não. Não gaste seu dinheiro à toa.
Não gaste seu dinheiro à toa.
Ela está me esperando.
Diga à Gorda que não venho jantar.
Cretino!
O que está fazendo?
Durma.
O que está fazendo?
Estou indo embora.
Eu me casei.
Com quem?
Você não a conhece.
Como ela se chama?
Loretta.
Aquela do carro?
Eu a conheço.
O que quer dizer?
Bom... eu a vi no café.
Várias vezes.
Um dia ela me pagou uma cerveja.
- Bebemos, conversamos. - Sobre o quê?
Não me lembro.
- Só sei que ela...me lembrava alguém. - Quem?
Não era o rosto dela... nem o corpo, nem os olhos.
Uma impressão...
Aquela impressão quando se chega em algum lugar...
e pensa que já esteve lá, mas não reconhece nada.
Uma impressão esquisita.
É difícil dizer por quê é tão estranho.
Tão estranho que senti um friozinho nas costas.
Gosto de sentir isso.
Estávamos no balcão... eu tremia...
era gostoso.
Aí ela saiu.
Fui atrás dela.
Ela estava andando.
- E eu atrás dela! - O que aconteceu depois?
Estávamos andando.
Eu atrás dela. Estava sozinha?
Eu ouvia os passos dela.
Ela foi até o carro.
Eu tremia...era gostoso...
sentir frio...
Ela parecia tão esbelta...
tão brilhante sob a lua... limpa...
como uma aparição... um sonho.
E eu já havia visto aquilo.
A mesma lua, a mesma rua... tudo igual.
Menos uma coisa.
Não era Loretta.
Costuma fazer isso?
Brincar?
Brincar de seguir mulheres sozinhas?
Fale!
Falar o quê?
Algo que você já sabe?
Venha aqui meu chapa! Não fique aí...
Chegue mais perto.
Vem, cara, vem!
Isso... assim está bom.
Vem cá!
Mais perto!
Vem pra cá!
Vem pra cá!
E aí?
Conseguiu?
O que foi?
Onde você estava?
Quem pagou você?
Quem pagou você?
- Uma mulher. - O nome dela.
Be... Bella.
O dinheiro!
O dinheiro!
Só isso?
Pra matar você, seria mais mil.
Estou na condicional.
Fui franco com você.
Pode me dar uma chance?
Uma chance...
Você...me assustou.
Ainda está aí?
Por que não foi embora?
Quer que eu fique?
Você fica?
Foi jogar?
Sim.
- E perdeu? - Perdi.
- Andou bebendo? - Sim!
No bolso do meu paletó.
- Não tem fósforos. - Não.
A vida de um cara não vale muito.
Aqui está o dinheiro da sua aposta.
Não! Não...
Não...
Não faça drama, por favor.
Não vai me bater?
- Não vai me bater? Não.
Não
Você é infeliz demais!
Da próxima vez, não pague adiantado.
- Não fui eu. -O quê?
A idéia não foi minha.
Do que está falando?
Não posso, não posso!
- Mas juro que não fui eu. - Sim, pode. Você pode, sim.
Você consegue. O cara que eu procuro sabe que vou encontrá-lo.
Ele vai pagar pelo que fez com Catherine.
Com esse seu ciúme doentio... sua sede de vingança...
foi mole pra ele. Você é ingênua.
Ele usou você, idiota!
Quem foi?
Frank.
Como se eu não soubesse.
Lógico
Só lhe faltava o dinheiro. Ele enganou você.
Eu estava louca! Eu queria ver você sofrer.
Ele sabia, não?
Ele sabia?
- Ele até pediu mais, certo? - Pediu, mas eu não tinha.
Não disse o que faria por mais mil pratas?
Onde ele está? Onde ele está?
Pode deixar, eu encontro.
Não faça isso! Fique aqui. Vai estragar tudo.
Vá pegar seu bonde. Ela espera você.
Ela está esperando você. Ela ama você. Você tem razão. Ela ama você.
Tem que sair daqui e nunca mais voltar.
Gérard...
Não mereço ser tão amado.
Nada, esqueça! Vá pegar seu bonde. Você me esquecerá!
Eu imploro.
Por favor, Gérard. Vá procurá-la. Seu ticket.
Ela ama você. Você tem razão. Ela ama você.
Pare, Gérard! Você vai estragar tudo. Está louco!
Gérard!
Gerard!
Gérard!
Vem comemorar?
Olhe! Viu a aliança?
Ela não consegue superar.
Alguém viu meu irmão?
Ele que vá pro inferno.
Fale pra ele quanto custa o anel. Ele paga uma cerveja.
Dê a notícia. Anuncie!
Fiquei noivo.
A noiva!
À noiva...
Ao amor...
Ao casamento...
Ao casamento... Vá se ferrar...
Você viu o Frank?
Cadela!
Eu amo você.
Venha ver! Venha ver!
Olhe o que você fez!
Olhe!
Seu lixo!
Olhe!
Olhe!
Olhe!
Está louco, Gérard! Você sabe que não foi ele.
Gostaria que...
fosse eu, não?
Não agüentava mais a sua desconfiança.
Você quase me convenceu
que fui eu.
Você suspeita de todos.
- Está louco! - Vamos!
Pode ser qualquer um.
Está louco!
É a rua!
Como se não soubesse!
Como se não soubesse!
Eu o encontrarei.
Um dia eu o encontrarei.
Eu o encontrarei.
Um dia eu o encontrarei.
Um dia eu o encontrarei.
Estou com frio.
Não deveria.
Gérard sonhava com uma cidade branca,
com persianas pudicas,
com ruas cheias de sombras
de partidas de tênis entre as árvores, suaves gramados.
Ele podia ouvir o murmúrio de chafarizes e o canto de pássaros...
mas, ele tinha medo daquela cidade...
medo de não ficar à vontade...
daquela porta que se abriria...
e daquela mulher que o esperava.
Bella.
Estou com fome.
Experimente outro mundo.
Tradução e Revisão: Angela B. B. Resende e Giovana Zaltron
MCL/ MKO