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eu queria começar essa reflexão pensando em algo que
nós não podemos esquecer
é exatamente a razão deste evento
a razão de nós nos encontramos
que a tua capacidade
a minha
de recusarmos aquilo que parece obvio
recusarmos o que parece
e falível
recusarmosos o que parece
sem alternativa
que é uma sociedade
que faz com que haja uma degradação
da condição de existência coletiva no cotidiano
por isso, uma noite como hoje como todo evento
é antes de mais nada um momento de recusa
recusa a aquilo que parece óbvio
e que antes demais
nos constrange
a ter de viver numa situação
em que nós precisamos de fato como foi lembrado
nós educarmos reciprocamente
afinal de contas essa questão ligada ao consumo não está obviamente
atreladas apenas as crianças, mas de fato é uma educação coletiva
se nós olhamos
é preciso observar o quanto que cada dia mais
faz sentido aquela frase clássica que você conhece
que é bastante evidente que diz
que o mundo
que nós vamos deixar pros nossos filhos depende muito dos filhos que nós vamos
deixar pra esse mundo
e que filhos que nos vamos deixar?
que filhos nós estamos deixando?
será que daqui a 30 anos, quando alguns de nós ainda cá estarão
será que os jovens de hoje que terão 40 anos
vão nos colocar
numa sala grande e nos fazerem a grande pergunta que é
porque é que vocês não fizeram o que podia ser feito
afinal de contas vocês sabiam
sabiam que nós estávamos degragando a vida convivência coletiva, que nós estávamos formando
personalidades egonarcísicas
e nada fizeram
sábiam, tinham consciencia
e não agiram
exatamente por isso sem tormar essa reflexão uma questão de tribunal
é preciso que quando a gente relaciona educação, consumo e infância que a gente
pensa especialmente no papel da mídia como corpo docente
a mídia como corpo docente
isto é
a capacidade de formação e ensino
que a media exerce
atenção
não estou falando a capacidade educação porque que ela é óbvia
afinal de contas
educação é um fenômeno mais amplo
ensino é algo que se dá em algumas distâncias entre elas a escola
desse ponto de vista
é necessário que a gente traga à tona proporia origem da palavra "ensinar "
ensinar significa deixar gravado algo em alguém
en-signar
é deixar uma marca
deixar um caractere
como diria um portugês luzitano
é deixar um sinal
ensignar significa gravar algo em alguém
de maneira
que ele seja capaz de levar aquilo adiante
por isso que a questão central é na articulação entre educação
consumo e infância nosso pensamento é que nós estamos ensignando
quais são as marcas que hoje se autoriza
que sejam deixadas
nas crianças, na infância
algo que é um pouco mais violento
como você sabe
a palavra infância na origem significa
aquele que não pode falar
aquele que não pode dizer
e de maneira geral
o infante fica emudecido
por uma série de circunstâncias
que o coloca como alguém que sofre
o processo de deformação no cotidiano
apoiada
essa deformação
talvez no mais violento
processo
de vida coletiva que se pode ter
que é aquele que acredita que a regra da vida é
cada um por si
e Deus por todos
este ditado popular que se entranha nas várias culturas "cada um por si e Deus
por todos" ele é a algo que é gravado também
como ensigno
aquilo que é deixado como sinal
aquilo que assinala
um dos modos nossos de conviência
afinal de contas
acho que cada um e cada uma
em um fórum como esse
o que deseja é que cada vez mais a gente construa uma vida coletiva na
na qual o que vá valer
não é o cada um por si e Deus por todos mas isso sim
um por todos e todos por um
a substituição gradativa
a construção paulatina
do um por todos e todos por um
traz pra nós uma obrigação como geração que somos
a destruição de alguns paradigmas de convivência
de sobrevivência de consumo
e à educação ter uma tarefa grande e dentro dela evidentemente
a mídia o tem
afinal de contas hoje
eu vivo lembrando essa perspectiva
em vários debates
hoje uma criança que entrou este ano na primeira série do ensino fundamental
aqui no Brasil antes de ser formalmente alfabetizado por nós
já tinha assistido 5, 6 mil horas
de televisão
uma criança que entra este ano, de 6 para 7 anos de idade eu repito
antes de colocar o pezinho na sala de aula
já terá assistido
de 5 a 6 mil horas de televisão
o que significa
que ela tem um pré escolar fortíssimo
marcado pelo mundo da mídia como corpo docente
inclusive esse tempo dela
de maneira geral
no cotidiano ultrapassa boa parte da escolaridade formal que se terá depois
e é claro que a isso se agrega
o fato de que
a mídia
continua existindo e precisa existir
mas ela está no nosso cotidiano
é claro que nós não podemos demonizar a mídia
escola também faz mal nessa questão
não é só questão da mídia em si
aliás, o Mark Twain
grande escritor norte-americano
um dos meus prediletos, que criou
As Aventuras de Huckleberry Finn
Tom Sawyer
coisas deliciosas na história
o Mark Twain dizia
jamais admiti
que a escola atrapalhasse minha educação
é uma coisa séria
mas o que nós temos em jogo hoje quando se pensa na mídia como corpo docente
e o nosso papel como educadoras e educadores dentro das escolas
e fora delas
é o que é que nós estamos pensando como sociedade, como vida
certa vez o jornalista perguntou
ao grande mMahatma Gandhi lá na Índia
o que que ele achava da civilização ocidental
ele disse "é uma boa idéia
dá pra ser feito"
nós estamos ainda num processo de construcão
e uma das coisas que essa construção exige
é a nossa capacidade de recusar
refutar
não aceitar
que a gente tenha uma demonização
das instituições
apenas porque ela se colocam
como formadoras
por exemplo hoje há toda uma série de ataques e achaques em relação à
mídia
que e precisa ser feito quando de maneira crítica e séria
mas supondo que fora da mídia o mundo é saudável
que dentro da família as coisas não acontecem ou que a escola é um lugar
puro onde nós educamos as crianças
sem dificuldade
e portanto a mídia conspurca
(quero ver isso traduzir pro inglês)
e ela sabe
é preciso cuidado porque a suposição é que a mídia
ela torna
a vida um pouco e imunda
e que a escola e a família em várias situações seria um espaço mais puro
mais higienica
aliás vez ou outra muitos falando à mídia
como se tivessem que higienizar a mídia
esquecendo que a mídia, uma insituição social
que retém conectividade com as outras instituições sociais
com governos, com igrejas
com famílias
com escolas... por exemplo
muita gente fala desse papel pela lógica da mídia eu falo e acho que é
necessário pensar
mas
uma mídia que tem um contraponto crítico na família na escola
pode favorecer muito
o contrário também
uma mídia que oferece um contraponto a uma escola que trabalha meritocracia
que desenvolve a ideia de competitividade a qualquer custo em vez
de trabalhar com a noção de cooperação
substituindo
aquilo que garantiu a nossa existência como seres vivos
humanos que somos
que foi a capacidade de cooperar
e não de competir
por exemplo Paulo Freire foi secretário de educação da cidade de São Paulo
e eu era o secretário-adjunto
e havia na cidade de São Paulo naquela época uma coisa chamada
Concurso de Bandas e Fanfarras
Concurso de Bandas e Fanfarras, o que que era isso
na capital paulista
todos os anos
as escolas saiam
os seus lugares
e vinhgam para o Anhangabaú bem no centro da cidade
para mostrarem e disputarem o concurso
evidentemente
todos os anos
quem ganhava
as escolas de baixa classe média
todo ano a escola de Parelheiros, a escola de cidade Tiradentes, a escola
do Jardim Robru
a escola de Parada de Taipas perdia
aliás
antes que eles entrassem em Anhangabaú
já estava quase que o placar igual do Coliseu
leões 1 X cristão 0
porque a questão não era o evento em si
mas eram as circunstâncias que organizavam aquilo
e Paulo Freire, que aliás sexta-feira que passou dia 19, fariam 87 anos de idade
Paulo Freire
decidiu conjunto Ana Maria Saul, que é uma grande educadora da PUC-SP
substituir
o concurso de bandas e fanfarras pela MOSTRA
de bandas e fanfarras
e aí a escola pública municipal sumaré em são paulo
da vila madalena
a escola pública na vila mariana são bairros mais assentados mais estruturados
ela não competia
com aquelas bandas
lá do Jardim Robru que tinha só 8 meninos tocando flauta
ela não competia, ela se mostrava
há uma diferença significativa de percepção
entre você fazer uma competição e uma mostra
porque na competição o derrotado se envergonha
especialmente se ele já for prejudicado no dia-a-dia
e numa mostra
aquele que tem menos recurso se orgulha
de poder também
exibir
a sua arte, o seu dote
o desfile era o mesmo
a lógica que não era mais a mesma
quem se exibia, exibia como faria
se fosse um concurso uma mostra
como a diferença
criava-se outra lógica
para essa percepção
por isso
esta ideia da sujidade, vou pegar uma palavra que o paulo freire gostava
da "sujidade da mídia"
e a boniteza da escola precisa cautela
por exemplo
eu fui alfabetizado numa cartilha, eu nasci no paraná
eu sou que se chama de VIP, que é vindo do interior do paraná
eu nasci no paraná, mas moro em são paulo há 40 anos
e eu fui alfabetizado uma cartilha que algumas pessoas aqui foram também
brasileiros que é a Caminho Suave
na caminho suave e lá pelas tantas tinha a figura da família, o desenho da
família
como é que era o desenho da família? O pai sentado numa poltrona lendo jornal
a mãe em pé atrás com uma bandeja, um avental e um café em cima
homens lêem, mulheres servem
mas isso você diz: "mas isso, a Branca Alves de Lima, autora da cartilha
fez em 1952
a questão é que ela continua circulando
e continua circulando
não que ela seja uma má cartilha
mas é porque ela hoje não responde a consciência necessária
pra essa formação
aliás
o menino que vê a mulher servindo
e os homens lendo
não se preocupa por exemplo que publicidade de cerveja
seja capaz de coisificar as mulheres
e transformá-las em "One Way"
em descartáveis
"a boa"
"as coisas"
é a situação de você coisificar
e a criança vai vendo
é interessante
curioso
você diz assim: tá vendo como a escola faz mal, mas a mídia também
por exemplo no início do século 20 ou na datação cristã em que nós estamos
alguns jornais pelo mundo afora
inclusive no brasil em são paulo
alguns jornais que é uma coisa no final de semana inacreditável chamada
suplemento feminino
e aí o jornal no sábado, no domingo vem desse tamanho
o marido entra, tira o suplemento feminino quase com uma pinça
e põe de lado e sai com política, economia, literatura, esportes
e para ela fica coisa de mulher
não é como tirar mancha de ferrugem
não é, como cuidar da criança rebelde
como agarrar teu homem pelo estômago
tá na mídia
é a formação: mulheres, de vez em quando podem ler, inclusive
mas coisa de mulher
interessante
a mídia separa também muita questão de que são homens de um lado, mulheres
do outro
a escola faz isso se a gente bobear
por exemplo
alunos voltando de educação infantil, logo depois do intervalo, voltando pra
sala de aula
a professora ou professor quer que entra em fila
ele fala uma coisa ótima
formem duas filas
para ajudar
até aí ótimo, a função de uma fila é organizar
na sequência
ele muda a lógica ou ela quando ele diz
meninos de um lado,
meninas do outro
a função de uma fila não é separar por gênero
a função de uma fila é organizar
você não cresce e vai ao banco e tem caixa pra homem e caixa pra mulher
não vai ao supermercado e tem caixa pra homem e caixa pra mulher
onde tem isso
filas separadas por gênero
escola, penitenciária e hospício
que são três instituições de normatização social
pra se entender quais são os papéis a serem desempenhados
não tem muita dificuldade do menino entender uma publicidade em que a mulher
é vendida como garrafa de cerveja
mesmo que ele seja criança
porque ele tá habituado com isso em casa já
também às vezes o pai dele trata a mãe como se ela fosse objeto a ser
colocado lateralmente
também a escola da essa dimensão
por isso que a questão é um pouco mais séria
do que simplesmente se supor
que aja uma temática ligada ao consumo que está
unicamente (você sabe que não)
enfincada dentro da mídia
é óbvio que ela tem responsabilidade
mas também a família,
também a educação, também as religiões
uma parte das religiões trabalha seu cotidiano de uma forma que é consumista
que trabalha com o que a gente chama de "economia da salvação"
dentro do mercado religioso
que faz com que haja por exemplo uma infantilização
das crianças, dos jovens
no próprio serviço religioso
e é claro que a escola carrega essa marca
uma coisa que se faz também, é a competitividade até na organização de
fila
por que em sã consciência um prefessor ou uma professora, a organizar uma fila
ou faz por altura
qual que é a lógica?
pra criar o baixinho?
porque a ideia de baixo ou alto é uma questão de referência
eu sou filho de italianos, na minha família sou chamado de baixinho
e eu tenho 1m82
claro, porque todos os outros, por incrível que pareça são maiores que eu
feita a fila na minha família eu fico por último
porque organizar uma fila
por altura?
"Ah mais qual é o outro critério?" Vários. Organize por ordem alfabética
hoje começa com o A, B, C
a manhã B, C, D até que termina no A
depois da manhã C, etc
alternativas para impedir
a discriminação
a idéia de que tem alguns que valem por causa da altura que tem
da calça que usam
do tênis que importam
não é só o consumo em si
mas é todo um conjunto de perspectivas na qual a lógica por trás é
a criação de diferenciações
para exclusão
e nessa hora
é preciso pensar em algo
quero aproveitar esse tempo esses dez minutos antes dos meus 30
é isso
pra pensar em algo especial
você e eu, e essa é a oportunidade do forum
precisamos ter muita clareza
de o que é que nós estamos construindo, cada dia mais
quando nós admitimos algumas coisas. Por exemplo:
o Yves de La Taille, e acho que vai voltar nesse assunto, vale a pena, gosto demais, senão
der, se puder
nas respostas ao menos
o Yves diz uma coisa especial naquele livro "Nos Labirintos da Moral"
ele diz
o jovem hoje substituiu a noção de direitos por desejos
e portanto ele transformou desejo em direito, isto é
se eu quero você tem que me dar
e se você não der é porque não gosta de mim
e se você fizer isso eu vou me matar
e aí a família com um menino de 14, 15 anos de idade, morre de medo
de ele morrer, sabe porque?
porque não convive com a criança no cotidiano
aliás têm pais e filhos que não conhecem os filhos
nós somos a primeira geração de adultos
nas grandes cidades
que sai de casa mais tarde que os filhos
durante séculos na história da humanidade, os pais acordaram os filhos pra eles
irem a escola
hoje a criança acorda e vai sozinho, na Kombi, na van, no ônibus
as 6h30 da manhã, 6h40
e o pai e a mãe sai 7h40, 8h pra trabalhar
isso é: não tem contato com eles
não os conhecem. Quer ver um exemplo:
na hora de se juntar não sabem cada um que quer
se o teu filho fosse ouvir uma música que tipo de CD que compraria pra ele?
que música ele ouve?
se você fosse comprar um CD de música pra ele, qual música ele ouve?
não estou falando do menino genérico, a criança abstrata, do consumo
o teu filho, a tua filha
o teu neto, que música que ele ouve? Qual CD você compraria pra ele?
ou, o contrário:
qual o CD que que ele compraria pra você?
no dia dos pais ele vai dar um CD. O que que ele te dá? O que que você ouve?
A gente não houve mais junto
cada um usa o seu modo de ouvir
e aí gente fica ensurdeçamente
todo mundo o surdo falando ao mesmo tempo
aí acontece uma coisa que a mídia faz
e o consumo faz e que nós admitimos
que é uma coisa execrável
chamada vale-presente
ou vale cd
que é o ápice do anonimato: eu não te conheço, você não me conheça apesar de nós
sermos íntimos
eu trabalho com você todo dia mas eu não te conheço
você é filho mas eu não te conheço, na hora de te dar um presente eu te dou um vale-cd
olha eu vou avisar, se você me der um vale cd eu devolvo
me dê dinheiro então
aí eu decido o que eu quero, se você é tão anônimo comigo
por isso que cada vez mais nós inventamos uma coisa execrável que tá se aproximando
pro meu desespero
que é amigo secreto
aliás, qual amigo não é secreto?
ha 20, 30 anos uma família trocava presentes no natal e era uma lembrancinha
o negócio é que em função do consumo nos começamos a achar
que era muito caro comprar lembrancinhas para todos, mas se é uma lembrancinha,
é só uma lembrancinha
e aí a gente faz um amigo secreto
que é uma coisa em que cada vez mais o outro de fato é secreto pra você
você não sabe que ele faz, do que ele gosta
aí fica aquela coisa chata na antevéspera de natal ou na noite
um monte de gente dizendo: o meu amigo é
esse vai ter que descobrir que características ele tem naquela hora
curioso
engraçado e triste
é o anonimato
que música ele ouve?
aí não sabe
resultado:
como é que eles foram formados desse jeito
eles não nasceram prontos
o menino ou menina não nasceu pronto
e aí é óbvio, nós formamos isso em casa, na educação pai e a mãe não
encontram
quando encontram, brigam
não se juntam mais pra comer
hoje uma refeição é feito várias vezes num fast-food
em que ela demora 15 minutos
aliás, quando ela termina o pai e a mãe dizem assim: aquilo é bom, tão bom quando
agente sai junto, a gente precisa sair mais
quer um sinal de doença nossa
nós saímos todos juntos no final de semana
a família inteira sai junta pra comer comida caseira
se isso não é doença coletiva oque que é?
qual que é a nossa ideia de casa?
mas aí ta vendo, a mídia faz isso
o consumo
a minha filha Carol, que tem 28 anos
ela quando tinha 15, 16 como todo mundo nessa idade
vivia me ameaçando
como pai
dizia "eu vou me matar"
"se você não deixar eu viajar eu vou pular da janela do prédio" eu falava "filha pelo
amor de Deus
não pule lá embaixo que eu vou tomar uma multa do ***ínio
eles proíbem de jogar lixo pela janela
qual era a garantia que eu tinha que ela não ia se matar
porque eu a conhecia, eu convivia com ela
eu tava com ela almoçando, eu procurava encontrar todo final de semana por um
tempo mais elástico, eu partilhava as compras que ela fazia
em casa eu usava como referência para compra, liquidificador
nada que custasse mais do que dois liquidificadores podia ser comprado
como calça, como calçado
certo
aí dizia "pai, preciso de um negócio, mas custa 3 liquidificadores"
porque o liquidificador custava por hora de quarenta reais naquele tempo
como que é possível dizer pra Carol, pro André ou pro Pedro, que são meus filhos
já adultos e casados, como que era possível
que eu não assustasse com eles assistindo à mídia
e graças aos céus
ou boa parte dos momentos eles escaparam num consumo insano desvairado
porque eu tava com eles
estava com eles no dia a dia
ai dizia, mas nem toda criança tem essa oportunidade, mas é claro, é por isso
que nós estamos aqui
mas o que eu quero chamar atenção é que nós temos que inventar
modos que não fiquem fixados
só na temática da mídia e do consumo
ela é um corpo docente poderoso
mas ela abre porta
onde agente deixou a porta destrancada
é por isso que ela entra convidada
aliás, cada vez mais a gente compra aparelhos maiores pra que ela entre
20 polegadas era pouco agora, 30, 40, 50
eu ponho na sala, você põe
pra que ela entre, "venha"
é você que sai e compra pro teu filho um tênis que custa o preço de dois pneus de
um carro
eu não tenho dinheiro pra isso
ou compra, uma calça que custa o preço de uma tv
de 25 polegadas
sem ver a diferença de produto, de valor, de trabalho
é você, ele não compra isso
ah, mas se eu não fizer ele vai ficar bravo comigo. E?
"Ah, mas se eu não sei ele vai brigar comigo" E?
milhares de crianças brigara, nos brigamos "Não pode, não pode."
uma coisa que o Yves chamo de "disciplina", uma coisa boa
meus filhos cresceram com uma coisa muito interessante
claro que eles ficaram traumatizados
mas mesmo que não fizesse isso eles ficariam traumatizados, porque ficam sempre
mas cada um deles cresceu tendo no quarto sempre duas frases pra eles lerem
e isso durante anos
uma frase ficava numa parede
é uma frase inspirada no pensamento do filósofo Kant, do Immanuel Kant
que diz o seguinte:
"Tudo que não puder contar como fez,
não faça."
que aliás, vale pra muita gente
especialmente nesta época política
"Tudo que não puder contar como fez, não faça."
a segunda é uma frase do apóstolo Paulo, dos cristãos
que tá lá na segunda carta aos coríntios
em que Paulo diz:
"Tudo me é lícito
mas nem tudo me convém."
"Tudo me é lícito, mas nem tudo me convém." isto é
eu posso fazer qualquer coisa
mas eu não devo fazer qualquer coisa
"Tudo me é lícito, mas nem tudo me convém."
vale para a mídia
vale pra a família
vale com a igreja, vale pra nós
quero ir amarrando um pouco essa idéia pra pensar nesses 5 minutos antes dos 30
exatamente essa percepção
claro
que quando você estabelece a relação entre
educação
infância e consumo
é evidente que existe uma responsabilização coletiva
mas alguns polos de atenção que são mais marcantes
eu não tenho dificuldade
que as pessoas tenham contato com a mídia, e inclusive com a publicidade desde que
ela seja formada pra ver aquilo
eu, por exemplo
não sou consumista no meu cotidiano
isso tem a ver com o meu desejo, com a minha formação, com as minhas coisas
tem a ver também com o jeito de viver
alguém vai fazer filosofia, obviamente
né, nem podia na vida ser consumista
nem teria recurso pra fazer isso
então não é nenhuma questão de condição
mas mesmo assim: eu não sou
não tenho atração por exemplo, eu não gosto, eu não dirijo não tenho nem carteira
de motorista
carros não me atraem, às vezes as pessoas mostram, "Olha, não tenho, nunca sonhei em
ter um carro X ou Y"
eu não dirijo
tem gente que diz assim "Você não dirige?" "Eu não dirijo, não boto ovo, não fabrico rádio"
tem um monte de coisa que eu não faço
uma delas é não dirigir
isso não significa que eu não goste por exemplo de consumir
livros
eu entro nas livrarias
e aí a gente vai né, todo todo mundo aqui é professor, você pega aquilo e isso pesa
olha
às vezes gasta um recurso
mas aquilo tem a ver com o momento de prazer que não é obsessivo ele tem
a ver com a escolha,
com a capacidade de sedução que aquilo exerce
quero ir fechando depois a gente vai debater depois das várias falas com uma
idéia
acho que nessa relação a educação,
consumo e infância
nós temos que pensar
que nós não estamos num lugar onde há o crime perfeito
crime perfeito é aquele que só tem vítima, não têm autor
nós não estamos vivendo um crime perfeito
existe uma autoria dessa degradação da nossa capacidade de resistência
e nós temos um desafio pela frente
esse desafio é nós sermos capazes também de educar não só
nós no ocidente e as nossas crianças
mas educar -atenção-
chineses e indianos
vou contar uma coisa pra você que você sabe
em 20 anos a China tem a hegemonia econômica do planeta
a menos que aconteça um desvio de rota muito sério
se cada chinês decidir daqui a 20 anos
que ele tem direito a um carro só pra ele
um computador só pra ele, um iPhone só pra ele, uma televisão só pra ele. precisa
quatro planetas Terra
aí quando chegar a essa hora daqui a 20 anos você chega pros chineses e diga assim
"Agora que é a vez de vocês, lamento, nós vamos ter que preservar o planeta"
nós vamos falar em sustentabilidade
nada de consumo desvairado
aí eles vão falar: "Mas em 2008,
vocês vendiam em São Paulo, no Brasil
um carro em 80 prestações
em 2008, nos EUA
vocês emprestaram o dinheiro pra quem não podia pagar na área imobiliária
em 2008, em nome do "fazemos qualquer negócio" se fez qualquer negócio
e agora vocês vão dizer que nós não
Que direito você tem?
aí vocês expliquem
sabe o que que é, que agora tá complicado
mas o que faz transbordar um copo, a primeira gota ou a última?
parece que são todas né?
inclusive porque se eu tirar qualquer uma delas, ele não transborda, nossa tarefa é tirar
uma das gotas
nossa tarefa é impedir que as nossas gerações, que conosco partilham a vida
elas sejam
destrutivas
que elas sejam consumistas, que elas sejam ególatras
que elas sejam capazes de esquecer que a regra básica não é
não é e não pode ser
cada um por si e Deus por todos
mas a regra é outra é um por todos
e todos por um
termino de vez com a frase que termina um livro até que passei pro Yves que é
um livro chamado "Qual é a tua obra?"
é um livro publicado pela editora Voz que eu gosto muito "Qual é a tua obra?
quando você se for que é que vai ficar
que você vai deixar?
dado que caixão não tem gaveta
dado que a gente nada leva, o que nós vamos deixar?
oque que você e eu vamos deixar que não apodrece, não estraga e não será
objeto de disputa odiosa
porque muitas vezes a gente deixa a coisa que é objeto de disputa odiosa
o que que você e eu deixaremos, qual é o nosso legado
qual é a tua obra?
e esse livro termina com essa frase que eu vou dizer agora e vou dizê-la duas
vezes é uma força que ela carrega e que uma vez conversando com Yves sobre
isso eu trouxe a frase a tona e ela se incorporou
um pouco no nosso material
é uma frase do grande François Rabelais
Rabelais foi um grande monge beneditino do século 16
escreveu "Gargantua e Pantagruel" como você lembra grande nome da
renascença francesa
e Pantagruel tem uma frase, diria, desculpa
Rabelais tem uma frase de que eu direi duas vezes
e acho que vale para nós pensarmos hoje nessa relação: educação
consumoe infancia, na qual não há o crime perfeito
disse o Rabelais
conheço muitos
que não puderam
quando deviam
porque não quiseram
quando podiam
digo de novo
conheço muitos que não poderam
quando deviam
porque não quiseram
quando podiam
a gente pode, deve, tem de querer
do contrário
a gente desiste
e aí apodrece
o que falta. Obrigado.