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Ok, olá.
Obrigado por terem vindo.
Esta é uma honra especial e um grande privilégio. É a primeira vez que venho a Portugal.
Já viajei por todo o mundo muitas vezes, mas nunca tinha vindo a Portugal.
Por isso é altura de corrigir esse erro.
É muito bom estar aqui e tenho muito orgulho em falar para vocês e para o Partido pelos Animais.
Vim agora de Lisboa, onde também falei, e isto é uma coisa excelente, muito progressiva.
É parte da revolução que está a acontecer e que precisamos que aconteça,
pelo que é entusiasmante fazer parte deste tempo, um tempo revolucionário.
E a crise que hoje atravessamos pois estamos a atravessar uma crise muito grave.
Por isso esta noite vou falar-vos das revolucionárias alterações de consciência
que se desenrolaram em termos filosóficos ao longo dos últimos séculos
e as implicações disso relativamente à identidade humana.
Por isso vou falar da identidade humana esta noite.
Quem somos, quem pensamos que somos e as políticas da identidade humana.
De quem é chamado de humano e o que isso significa e por que razão a identidade humana é um erro.
É por isso que decidi provocatoriamente intitular a minha palestra
“Tudo o que sabe sobre a identidade humana ou a natureza humana é um erro".
Porque ainda não sabemos quem somos e eu vou agora explorar esse paradoxo.
Vou falar em inglês, e se falar devagar não há problema, certo?
Ok. Não queiram ouvir o meu português. Nem o meu italiano, nem o meu francês.
Se eu vos fizer a pergunta "quem és tu?", vocês vão pensar nisso na vossa cabeça. "Quem sou eu?"
Poderão dizer "sou mãe", "sou irmã", "sou irmão", "sou pai".
"Sou Cristão", "sou Muçulmano". Poderão dizer "sou funcionário", "sou gerente".
Poderão dizer "sou homem", "sou mulher". Poderão dizer "sou branco", "sou ***", "sou mulato".
Poderão dizer "sou heterossexual", "sou gay", "sou lésbica", "sou ***".
Poderão dizer uma série de coisas relacionadas com a vossa nacionalidade, etnia, género,
ocupação, profissão.
Temos tendência a identificar-nos em diversos papéis e a pensar em nós mesmos de várias formas diferentes.
Mas aposto que não responderiam à questão "quem és tu?" dizendo "sou um ser humano".
"Sou um membro da espécie *** sapiens". Porque temos isso como garantido.
Não pensamos sobre o facto de que somos um animal,
uma espécie que surgiu de um fluxo evolutivo da vida,
e que existe neste planeta há muito pouco tempo. Muito pouco.
Talvez 100 ou 200 mil anos no máximo, não há consenso quanto às datas.
Viemos de África, migrámos para todo o mundo e colonizámos este planeta.
Não existe o império brasileiro, não existe o império português, o império espanhol.
não existem os impérios americano ou inglês, não existem os impérios egípcio, romano, grego
ou otomano. Existe o império humano.
Uma espécie colonizou este planeta. E tudo foi um erro.
Toda a forma como pensámos em nós próprios e no mundo foi um erro.
E as pessoas ainda interiorizam este erro,
as pessoas ainda são educadas nesta ilusão, nesta falsidade, nesta falácia.
E este erro começou a ser corrigido. Por isso quero falar esta noite
da génese deste erro, da desmontagem deste erro
e de quão teimosas são duas formas de consciência hierárquicas
a que chamarei antropocentrismo e especismo.
Este segundo termo, claro, significa que... Pretende-se que seja análogo a racismo e sexismo.
Pretende-se sugerir que, tal como o racismo coloca uma raça acima de outra, hierarquicamente,
na forma de relações de poder e diz: "esta é a raça superior, esta é a raça inferior",
o especismo faz a mesma coisa: uma espécie, a espécie humana,
todas as outras são espécies não-humanas, animais não-humanos, especificamente,
e por isso somos superiores a eles.
Isso significa que temos o direito de usá-los para qualquer propósito que queiramos.
Isso significa que não têm valor moral, ou têm muito pouco valor moral, não são iguais.
Uma característica engraçada do comportamento humano é que não temos tendência a olhar para as diferenças
e respeitá-las por aquilo que são.
Pegamos sempre nas diferenças e organizamo-las numa hierarquia, não é?
Por isso, de todas as formas em que nos relacionamos entre nós, com a Terra ou com outras espécies,
organizamos a relação hierarquicamente de todas as formas.
Descriminamos com base na idade, na deficiência, não faltam exemplos.
E o especismo é a hierarquia do animal humano sobre todos os outros animais.
Na realidade, é uma forma de antropocentrismo, que significa exactamente aquilo que diz:
que estamos no centro da Terra, que a Terra existe para os nossos propósitos.
Por outras palavras, a Terra e os animais são meios para um fim, o nosso fim,
o seu propósito é satisfazer os nossos propósitos, e apenas isso.
Aristóteles disse... Aristóteles foi o primeiro filósofo da escravatura e da hierarquia.
De facto, a Filosofia ocidental começou muito bem, com Pitágoras.
Pitágoras era aquilo a que hoje chamaríamos vegano e activista pelos direitos dos animais.
Abstinha-se de comer carne por motivos éticos, não apenas por motivos nutricionais,
criticava a caça por motivos éticos.
E depois aparece Aristóteles a meio da antiguidade grega
e diz que as formas inferiores de racionalidade existem para servir os propósitos
das formas superiores de racionalidade.
Então, tal como as plantas existem para os animais, os animais existem para as pessoas.
Foi assim que começámos a pensar, e agora esse pensamento está profundamente interiorizado.
E qualquer pessoa que coma carne obviamente interiorizou essa forma de consciência,
porque aquilo que está no nosso prato, é um meio para o nosso fim.
Na verdade, não há justificação para isso.
E é por isso que quem defende os direitos dos animais tem mesmo de ser vegano,
para viver sem incoerência, porque caso contrário
estará a viver uma vida baseada na exploração, baseada no especismo e no antropocentrismo,
que são precisamente as ideologias construídas através da civilização ocidental.
Posso recuar muito mais, até ao início da própria civilização, há 10 000 anos,
aquilo a que chamamos sociedade agrícola. Foi aí que começámos a domesticar o selvagem,
e ao domesticar o selvagem através da agricultura, do pastoreio e confinamento dos animais
e da sua exploração para alimento, roupa, trabalho, transporte...
Esta forma de vida tem apenas 10 000 anos.
Foi aí que a hierarquia emergiu na sociedade, foi aí que a escravatura emergiu na sociedade,
foi aí que o patriarcalismo emergiu na sociedade. Há apenas 10 000 anos.
Muitas destas coisas começaram há apenas 10 000 anos.
Por isso, assim que começámos a reflectir, a filosofar
sobre a base da nossa vida, a domesticação da natureza,
é claro que íamos pensar como exploradores, porque já éramos exploradores.
Temos a mentalidade de exploradores ainda hoje connosco, e é preciso extirpá-la.
É o último preconceito a desaparecer, a última forma de ignorância a desaparecer,
que já não pode ser tolerada,
porque as consequências destrutivas deste erro não podem ser subestimadas.
Eu disse que saímos de África há 100, 200 mil anos e migrámos pelo planeta.
Começámos a falar, começámos a criar linguagens, culturas simbólicas.
Há apenas 45 000 anos. A linguagem tem apenas 45 000 anos.
E é aí que encontramos as pinturas nas cavernas francesas, em Lascaux e em outros locais.
Por volta deste período da História as pessoas começaram a simbolizar os seus pensamentos.
E Nietzsche disse algo muito profundo.
Vamos falar bastante esta noite do filósofo Friedrich Nietzsche, do século XIX.
Nietzsche disse que assim que os humanos começaram a pensar, inventaram erros.
Porque pensamos de maneira muito crua, não é? Deuses, o deus Sol, a deusa Lua, panteísmo,
uma pluralidade de deuses, uma série de superstições, todos os tipos e formas de ignorância e erros,
muitos dos quais seriam corrigidos ao longo do tempo, mas alguns dos quais ficaram no nosso pensamento.
Alguns dos quais permanecem connosco ainda hoje. Erros, enganos, ilusões, falácias.
E Nietzsche diz que os erros que permanecem, aqueles que não são corrigidos,
são aqueles que têm utilidade para a vida.
Por outras palavras, contamos certas mentiras a nós próprios, como, se quiserem, Deus.
Sem pretender contestar a fé, mas Nietzsche usava este exemplo.
Gostamos de inventar um deus, a história de uma alma, de uma vida após a morte,
porque serve os nossos propósitos, lisonjeia-nos.
Somos criaturas vaidosas, e queremos acreditar que isto é tudo para nós.
Queremos acreditar que há vida após a morte, Queremos acreditar que isto durará para sempre.
É difícil não acreditar. Queremos acreditar numa ponte de arco-íris, não é?
Que depois dos nossos animais morrerem, encontrá-los-emos novamente.
A morte não é para sempre, isto é apenas temporário.
Uma série de coisas em que ainda acreditamos, e Nietzsche dizia que são erros.
Mas mantemo-los porque servem o propósito de nos lisonjearem o ego, a vaidade,
e como geralmente diziam os existencialistas, os humanos não conseguem aceitar o facto
de que nós existimos, como diria Heidegger, atirados ao mundo.
Apenas existimos, e é tudo o que sabemos. Existimos.
Não sabemos com que propósito, por que razão, ou o que está para lá da mente humana,
excepto o que podemos imaginar ou sonhar. É tudo o que sabemos, e se formos honestos...
Nietzsche enaltecia a virtude da honestidade intelectual.
Se formos honesto, temos de admitir que é tudo o que podemos saber, apenas que estamos aqui.
E que qualquer sentido que exista no mundo é humanamente construído. Ok?
Então deixem-me começar com um paradoxo. O paradoxo é que após 45 000 anos de pensamento,
de cultura, de expressão simbólica, de comunicação, de Filosofia,
após 45 000 anos, o *** sapiens... Não é um nome bonito, *** sapiens, homem sábio?
Tão sábios que estamos a destruir o planeta. Tão sábios que não conseguimos
conviver uns com os outros. Matamo-nos em guerras.
Tão sábios que estamos em guerra com tudo neste planeta?
Estamos em guerra com os animais, com a Terra e connosco próprios?
Tão sábio, o *** sapiens.
Ao longo de 45 000 anos o *** sapiens tem pensado sobre quem somos, tentado definir quem somos
e nunca conseguiu acertar. Ainda não sabemos quem somos.
Invetamos estas respostas fantásticas, simplistas, infantis, simplificando Aristóteles,
homem racional, bípede sem penas. Estas respostas não ajudam. E não são verdade.
Como vos vou mostrar, não são verdade.
Mas agarramo-nos a estas ilusões de quem somos, de quem é o *** sapiens,
porque lisonjeiam a nossa vaidade, servem os nossos propósitos.
Permitem-nos explorar o planeta e sentir que somos boas pessoas,
e que temos o direito a sermos exploradores. É um direito concedido por Deus, segundo a religião.
Vou ter a ousadia de sugerir que de facto a religião não tem lugar neste debate,
embora estejam a acontecer revoluções na religião, o esverdeamento da religião,
os direitos dos animais são hoje uma parte importante do Cristianismo,
e isso, é claro, recua até ao Islamismo antigo, Hinduísmo, Budismo,
o pensamento indiano antigo começa com o biocentrismo,
ou a ideia de que todos estamos igualmente interligados na vida.
Mas na minha opinião, para responder a esta questão "quem somos", quem é o ser humano,
temos de olhar para a Filosofia e as ciências.
Especificamente a ciência, é aquilo em que me vou focar esta noite.
O que diz a ciência, porque a ciência baseia-se em factos.
Por isso, sem pretender ofender quaisquer sensibilidades religiosas,
Vou sugerir que esta questão tem de ser respondida cientificamente,
e que na verdade não há outra forma de responder a esta questão.
Quem somos? Quem é o *** sapiens?
Vamos começar com aquilo a que chamo as revoluções da modernidade.
Vamos começar com este paradoxo de que ainda não sabemos quem somos
e estas revoluções viriam corrigir isso.
E, além de um paradoxo, há também uma ironia.
Precisamente quando estamos a começar a perceber quem somos através destas revoluções cognitivas,
tornámo-nos tão sofisticados que estamos a mudar quem somos.
Coloca-se aqui uma questão. Temos uma natureza?
Existe uma natureza humana, ou somos totalmente plásticos?
Somos maleáveis, somos tão flexíveis que podemos ser qualquer coisa em que a sociedade nos molde?
É como um pedaço de barro, o que a sociedade fizer de nós é aquilo que somos.
Ou temos uma natureza? Permitam-me sugerir que temos uma natureza.
Evoluímos há 5 a 7 milhões de anos no sudeste de África, como um ramo da árvore dos primatas.
Como um tipo de primata do Pacífico.
Jared Diamond, antropólogo e escritor contemporâneo, chama-nos o terceiro chimpanzé.
O bonobo, o chimpanzé comum, com que estamos mais familiarizados, e o ser humano.
Pertencemos à família dos primatas, somos parentes próximos dos grandes símios,
os 4 grandes símios. Juntamente com os orangotangos.
Somos primatas, ok?
Por isso, se ao responder à questão "quem sou eu?", disseram "um primata",
estão a começar a pensar pelo caminho certo.
Mas muito poucas pessoas responderiam à questão "quem sou eu?" - "sou um primata".
Experimentem. E vejam quantas pessoas dizem "sou um primata" ou "sou o terceiro chimpanzé"
ou "faço parte da família dos grandes símios", etc.
Então, precisamente quando estamos a começar a descobrir alguma coisa sobre a natureza humana,
e eu sugiro que existe uma natureza humana, porque temos 5 a 7 milhões de anos
de bagagem evolutiva. Como animais.
Precisamente quando estamos a começar a descobrir sobre isto, estamos a mudá-lo.
Pensem no animal interior. Esquecemo-nos que somos animais, não é?
Tiveram algum desejo por sexualidade ultimamente? Tiveram algum...
Quantas pessoas tiveram... Esqueçam a pergunta.
Quantas pessoas tiveram um pensamento *** recentemente? Provavelmente a maioria de vocês.
Isso é o animal interior. Quantas pessoas tiveram um pensamento violento recentemente?
Eu tive vários hoje. Há pessoas que me irritam.
Isso é o animal interior, é aquilo a que Freud chamava o id.
Sempre que se esquecerem que são animais, tudo o que têm que fazer é sentir o id,
os instintos dentro de nós, o animal dentro de nós,
e saber que na verdade não somos seres racionais, somos animais.
Ou tentem livrar-se de um vício, tentem romper com o namorado, a namorada, passar por um divórcio.
Vão aperceber-se de que este não é o capitão do navio.
Não controlamos as nossas vidas com racionalidade.
Somos animais, e é a nossa animalidade que nos leva à guerra, à agressão, ao territorialismo.
Não estou a dizer que não possamos mudar isso, mas nunca o mudaremos
se não reconhecermos o facto de que somos animais.
Somos xenófobos, somos territoriais, somos animais muito, muito violentos.
Então, à medida que começamos a descobrir quem somos, estamos a começar a mudar quem somos,
por isso é quase como se nunca fôssemos conseguir saber quem somos, por duas razões.
Primeiro, estamos a mudar quem somos, porque apesar de termos esta natureza biológica
há, até certo ponto, uma plasticidade do self humano.
Farmacologia, ok?
Há quem diga... Foram escritos livros sobre o impacto de Prozac na mente humana.
E há quem diga que estes medicamentos anti-depressivos
criam uma personalidade diferente, criam um self diferente.
Então temos a farmacologia, temos a sociedade terapêutica,
temos uma série de drogas psicotrópicas, que podem criar experiências diferentes,
percepções diferentes da realidade, naturezas diferentes, se quisermos.
Estamos a modificar geneticamente o mundo e estamos a começar a modificar-nos geneticamente a nós mesmos.
Já criámos espécies híbridas em caixas de Petri.
Pegamos no ADN de um ser humano, pegamos no ADN de um bezerro,
combinamo-los e criamos uma espécie híbrida.
Chegará o dia, garanto-vos, se vivermos até lá,
em que seremos geneticamente modificados, seremos geneticamente alterados.
Esta sociedade será como Gattaca, o filme Gattaca.
Em que a nova forma de discriminação que surge é a discriminação genética.
“Oh, és apenas normal? Não és geneticamente modificado?”
Porque isso será um privilégio dos ricos.
Portanto existe esse paradoxo de ainda não sabermos quem somos,
existe a ironia de estarmos a começar a mudar quem somos à medida que percebemos quem somos,
e existem as revoluções da modernidade de que quero falar agora,
para mostrar-vos como nos últimos 4 ou 5 séculos as nossas percepções de nós mesmos enquanto animais,
enquanto seres neste planeta, mudaram radicalmente.
Este é um mapa medieval do mundo. É cosmologia medieval.
Era o centro do mundo.
Deus criou o mundo e o meio do universo era a Terra.
E é claro que no meio da Terra, no centro de toda a vida
o sentido de toda a vida, o propósito de toda a vida, o Homem.
Literalmente o homem, porque esta é também uma visão patriarcal do mundo.
E as mulheres eram consideradas mais próximas dos animais ou da natureza
do que dos homens, da cultura e da razão.
E é claro, o centro do Homem era a razão, a nossa alma, as nossas capacidades.
Essência racional. *** sapiens, homem racional.
Era esta a imagem do mundo na era medieval.
Esta imagem foi destruída. Esta imagem desapareceu para sempre.
Esta imagem é uma mentira, uma ilusão, um erro, uma falácia.
E começamos... Talvez conheçam a progressão do pensamento,
talvez estejam de alguma forma familiarizados com este esquema.
Começamos no século XVI e XVII com Copérnico e Galileu.
E ambos, juntos, conseguiram estabelecer que
não é a Terra que está no... A visão geocêntrica do mundo,
de que a Terra está no centro do universo.
O Sol está no centro do nosso sistema solar, devemos dizer,
e a Terra orbita à sua volta, bem como outros planetas.
Isto não parece ser uma enorme revolução conceptual,
Mas, reparem, significa que a igreja estava enganada,
significa que o melhor conhecimento científico disponível na época estava errado,
e há aqui um impacto psicológico de não estarmos no centro do universo,
que as pessoas consideraram muito desconfortável.
E o que vou mostrar-vos é que de cada vez que este gráfico foi perturbado,
de cada vez que começámos a aproximar-nos da verdade de quem somos enquanto animais,
tivemos que rapidamente emendar as coisas, costurar e coser, reparar o rasgão no tecido,
porque não podíamos permitir que a verdade viesse ao de cima.
T. S. Elliot, poeta inglês do século XX, disse algo muito profundo:
os seres humanos não são capazes de aguentar muita realidade.
Não suportamos a verdade, não somos suficientemente fortes para a verdade.
Alimentamo-nos de e prosperamos com ilusões e erros.
Então Copérnico e Galileu viraram os mapas cosmológicos
de uma visão geocêntrica para uma visão heliocêntrica, certo?
Da Terra como centro para o Sol como centro.
Agora sabemos que o universo não tem centro, que o universo é apenas espaço infinito,
que podem existir buracos de minhoca, que podem existir universos paralelos.
Toda a noção de um centro do universo é absurda.
Mas lembremo-nos que nos séculos XVI e XVII esta era uma ideia revolucionária.
E agora, como poderíamos reparar os danos das revoluções Copernico-Galileanas?
Bem, não foi muito difícil, porque houve quem dissesse:
"Ok, não estamos no centro do universo, isso só significa que temos espaço infinito para comandar,
só significa que tudo está sujeito ao controlo humano",
e as pessoas conseguiram lidar, com a excepção da igreja, as pessoas conseguiram absorver,
por assim dizer, o impacto forte da revolução Copernico-Galileana com relativa facilidade.
Algo mais desafiante aconteceu séculos depois,
a revolução seguinte da modernidade na ciência, com Darwin. 1859.
Darwin escreveu a Origem das Espécies. Guardou o manuscrito durante um par de décadas.
Sabiam disto, desta história? O manuscrito ficou na gaveta.
Só porque um outro pensador lhe escreveu uma carta: "Caro Charles, submeto-lhe o meu trabalho
para a sua estimada revisão profissional, poderia por favor examiná-lo
e dar-me a sua considerada opinião sobre o meu trabalho?"
Bem, Darwin começou a olhar para isto e disse: "Meu Deus, isto é exactamente o que tenho pensado.
Exactamente. É a teoria da selecção natural. Este tipo... estamos a pensar em caminhos paralelos.”
Honra lhe seja feita, a verdade é que Darwin co-creditou a teoria da evolução a este homem,
cujo nome me escapa pois trabalho de memória e estou a ficar velho.
Darwin guardou o manuscrito. Porquê? Porque as implicações disto
eram tão revolucionárias que ele teve medo de o publicar.
A Origem das Espécies foi publicada em 1859. Que impacto é que isso teve?
Bem, mostrou-nos que não estamos no centro da Terra, ok?
Há uma imagem chamada a grande cadeia dos seres. É parecida com isto. Vão encontrar...
Já mencionei que Aristóteles a antecipou.
Temos Deus, os anjos, os homens, os animais, as plantas, as pedras e os minerais. Ok?
Era chamada a grande cadeia dos seres. Que há uma ordem de perfeição no universo,
e que quanto mais alto subirmos, mais razão, mais racionalidade, mais perfeição.
Deus é perfeito, claro, depois os anjos, e logo abaixo dos anjos está o Homem ou a Humanidade,
E abaixo de nós os animais. A isto chama-se a grande cadeia dos seres.
Era uma cosmologia dominante, era parte desta imagem,
é outra forma de representar esta imagem.
Na era medieval. Até à era medieval.
O que Darwin fez foi o seguinte. Disse: Reparem, há condições primordiais para a vida.
Para a evolução. A evolução faz uma coisa a que se chama especiação. Cria espécies.
Qual é o propósito da vida? Apenas criar espécies, nada mais. Especiação.
Por isso, em vez desta imagem de racionalidade ascendente em que estamos apenas
um passo abaixo dos anjos e de Deus, Darwin deu-nos esta imagem.
Se quiserem, uma roda ou uma árvore ou um arbusto. Os raios da vida.
E cá estamos nós, *** sapiens, uma entre milhões de outras espécies.
Pensem nas implicações cognitivas destas duas metáforas.
Isto é muito lisonjeiro, isto não.
Não sabemos quantas espécies existem no planeta neste momento,
há muitas espécies que ainda nem sequer descobrimos. Que continuemos assim.
Pode haver até 10 milhões de espécies no planeta, nós somos apenas uma.
E ainda assim pensamos que tudo isto existe para os nossos propósitos.
Então Darwin mostrou-nos que somos uma entre milhões de outras espécies,
que não fomos criados por Deus, fomos criados pelos mesmos processos naturais,
selecção natural, que enformou todas as outras espécies.
Somos animais, ele enfatizou isso,
e disse que somos diferentes dos animais em grau e não em tipo.
E isso é muito importante. Somos diferentes dos animais em grau e não em tipo.
Ele antecipou a última revolução que vou discutir, a Etologia Cognitiva,
no seu livro A Origem do Homem e em alguns dos livros que escreveu
após A Origem das Espécies, que estão entre os seus trabalhos mais importantes para os meus propósitos.
Portanto, ele disse que tudo aquilo que temos veio dos animais.
As nossas emoções, prazeres, alegrias, a capacidade de sentir tristeza, a capacidade de pensar.
Tudo isto vem dos animais. Porque nós somos animais,
e com o tempo desenvolvemos um prosencéfalo avançado.
Sabia-se muito pouco sobre evolução naquela época.
Nem sequer se tinha a certeza se tínhamos vindo de África.
Ainda se dizia que a chamada raça negra era uma raça sub-humana,
nem sequer eram humanos.
Ainda mal tínhamos começado a ver gorilas ou grandes símios pela primeira vez.
É para vermos o quão primitivo era o nosso conhecimento nesta época.
Portanto, somos diferentes em grau e não em tipo, isso quer dizer que somos animais
e tudo o que temos é o facto de sermos ligeiramente mais racionais.
Podemos ter alguns sentimentos ou experiências diferentes dos outros animais,
mas diferentes em grau e não em tipo. Isso quer dizer que pertencemos a uma família.
E não estamos separados na natureza, não estamos à parte da natureza, fazemos parte da natureza.
E foi muito importante que Darwin estabelecesse isso,
e isso queria dizer que não estávamos no centro da Terra.
Não há centro nesta imagem.
Agora, como seria isto reparado? Lembram-se de eu ter dito que sempre que há um rasgão
no tecido da supremacia humana, temos que o emendar.
Ups, há um rasgão na imagem cosmológica, vão lá acima emendá-lo.
Como se emenda Darwin?
Bem, não foi assim tão difícil.
Em primeiro lugar, ignora-se o que ele disse sobre sermos diferentes em grau e não em tipo.
Em segundo lugar, usa-se as ciências biológicas para promover o avanço da vivissecção.
A propósito, Darwin apoiava a vivissecção, não era anti-vivissecção.
E talvez não tivesse uma visão ética muito coerente.
Mas tratou-se de focar as ciências biológicas como ciências e usar isso para a vivissecção.
Ora, Darwin enfatizou a cooperação no mundo natural.
Quando pensamos em Darwin pensamos em competição, a selecção natural é uma competição,
a sobrevivência do mais apto. Ele nunca usou essa frase, sequer.
É uma frase de Herbert Spencer, a sobrevivência do mais apto.
Darwin enfatizou a importância da cooperação.
Que todas as espécies que sobreviveram aprenderam a cooperar entre si.
Não era só competição.
E então, como se emenda o rasgão no tecido cosmológico,
para que possamos ser novamente senhores do universo após Darwin?
Bem, transforma-se o Darwinismo no Darwinismo social.
Transforma-se o Darwinismo na ideologia do capitalismo por excelência.
Porque pegamos na sua ideia de competição, esquecemo-nos da cooperação,
dizemos que somos animais competitivos,
que subimos a pulso até ao topo da escada evolutiva,
e por isso é esse o nosso lugar.
Começou a surgir a ideia de que quem tem a força tem o direito.
E vou voltar a este conceito, quem tem a força tem o direito.
E enfatizamos a importância da competição na sociedade, ok?
Quer dizer, reparem, isto é a natureza, onde a competição de facto desempenha um papel
na selecção natural, na governação da vida.
Isto é a sociedade.
A competição desempenha algum papel aqui? Bem, no capitalismo sim, não é?
Porque a sociedade capitalista baseia-se numa suposta competição.
Bem, Marx deu cabo desse mito quando disse que não existe competição nesta sociedade,
esta sociedade baseia-se no monopólio.
Controlo monopolístico, fixação de preços, dominação de mercados.
A competição é precisamente aquilo que esta sociedade tenta erradicar.
Mas reparem, a ideologia capitalista privilegia a ideia de competição
como uma ideologia para beneficiar empresas enormes,
para ignorar ou obscurecer o controlo monopolístico
e porque significava que as pessoas que eram ricas
e que estavam no topo da escada social, estavam lá quase que por desígnio natural.
Quase que seleccionadas para serem elites, não é?
Por outras palavras, a sociedade de classes foi naturalizada.
É assim que se emenda o rasgão no tecido após Darwin,
transformando Darwin num ideólogo do capitalismo.
Então, verifica-se que o Homem não está no centro da Terra;
bem, redefine-se o Darwinismo numa ideologia capitalista,
numa ideologia especista, e está emendado o rasgão no tecido.
Depois surgem Nietzsche e Freud nos séculos XIX e XX.
Freud escreveu a Interpretação dos Sonhos, publicada em 1900.
Nietzsche morreu em 1889 e viveu mais 11 anos, quase que em coma.
Uma das mais brilhantes mentes de sempre simplesmente fundiu.
Mas o que Nietzsche e Freud fizeram foi dizer que a razão não está no centro do Homem.
Na verdade, Darwin deixou isso implícito, e eles tornaram-no explícito.
Pensamos em nós mesmos como seres racionais, como já disse,
que temos uma essência e que essa essência é ser racional.
Bem, eles enfatizaram com Darwin, embora não se referissem a Darwin com frequência,
Nietzsche garantidamente não o fazia, que somos animais governados por instintos
governados pela vontade, governados por impulsos que não são racionais, são sub-racionais.
Uma forma frequentemente usada para representar esta ideia é, por exemplo, a metáfora do icebergue.
Dizemos, está aqui a razão, mas em vez de ser todo o self, é apenas uma parte do self,
e tudo isto, o inconsciente, as forças sub-racionais, são muito mais fortes na vida.
E é isso que efectivamente nos molda, é isso que nos controla.
Ora, Nietzsche e Freud disseram que o Homem não está no centro da Terra,
que a razão não está no centro do Homem, da Humanidade, da espécie humana.
Nós somos animais, não somos governados pela racionalidade.
Nietzsche disse, em resposta a Descartes, "Penso, logo existo",
Nietzsche disse, "não, ele pensa, logo eu existo". Ele, o inconsciente, o id pensa, logo eu existo.
A racionalidade é como que um subproduto de forças sub-racionais na nossa vida.
Não é o capitão do navio, é apenas um marinheiro, apenas um membro da tripulação, nada mais.
Não é, de forma alguma, quem controla.
E então, como emendamos o rasgão no tecido depois disto?
Isto parece ter causado grande dano, não? Um grande dano na...
De que é que estamos a falar, lembram-se?
Da identidade humana, da imagem dos seres humanos que construímos
ao longo de milhares de anos de pensamento ocidental.
Como emendamos isto? Porque já estamos no século XX
e foi estabelecido que somos totalmente... somos animais na plena acepção da palavra,
e Aristóteles estava errado, a igreja medieval estava errada,
a teologia católica e a ciência estavam ambas erradas,
não somos seres racionais.
Como emendamos isso?
Bem, transformamos Nietzsche num Nazi.
A sua ideia da vontade do poder, que somos animais, temos um desejo de poder,
de controlar, de dominar ou superar-nos a nós próprios, às nossas limitações,
é em parte o que ele quis dizer com a vontade de poder, a vontade de superar-nos a nós próprios,
às nossas limitações, através da vontade, da força de vontade.
Bem, transformamos a vontade de poder numa força social,
e transformamos Nietzsche, que era [contra o anti-semitismo] num filósofo
preconceituoso para com os Judeus.
A sua irmã ajudou os Nazis a editar as suas obras para dar a entender que ele era Nazi
e que era um nacionalista alemão, quando ele escreveu explicitamente que a cultura
mais lenta e enfadonha que existe na modernidade ocidental, na Europa Ocidental, era a cultura alemã.
Ele detestava os alemães. Detestava os filósofos alemães, acima de tudo.
Por isso, reescrevemos Nietzsche e transformamo-lo num Nazi.
Ora, Freud era muito interessante, porque Freud tinha visões conflituantes sobre a racionalidade.
Ele disse que não somos animais racionais, mas podemos ganhar controlo sobre os nossos corpos,
sobre nós próprios, podemos libertar-nos, através da psicanálise.
Psicanálise é uma ciência, é um novo tipo de ciência.
Portanto, Freud elevou a ciência à posição mais alta na sociedade,
e disse que embora não sejamos livres, sejamos dominados pela nossa vontade,
pelo nosso inconsciente, por forças que não entendemos e não conseguimos controlar,
através da psicanálise podemos entendê-las, podemos ganhar controlo delas racionalmente.
E Freud ajudou também a criar a sociedade terapêutica, que normalizava as pessoas
para se ajustarem até corresponderem aos padrões sociais de comportamento,
aos padrões sociais de comportamento esperados.
Todas estas revoluções foram incrivelmente radicais.
Destruíram totalmente esta imagem.
Mas sendo o tipo de animais que somos, sendo muito vaidosos,
não sendo capazes de suportar muita verdade ou muita realidade,
pegamos em todas as revoluções da modernidade e alteramo-las para que não fossem
tão destabilizadoras, para que pudéssemos continuar a agir como senhores do universo.
Para que pudéssemos continuar a agir como Deus na Terra.
Outras coisas aconteceram. Após a 2ª Guerra Mundial, nos anos 40 e 50.
Inteligência artificial e computadores, certo? Vou falar rapidamente a respeito disto.
Começámos a criar máquinas que eram mais inteligentes do que nós de muitas formas.
Agora temos... Vemos aqueles filmes antigos da 2ª Guerra Mundial,
com aqueles computadores enormes que encheriam esta sala,
e hoje em dia um portátil é mais potente do que esses computadores.
E os computadores conseguem pensar mais depressa do que nós,
conseguem pensar de forma mais eficiente do que nós,
são aquilo a que poderemos chamar os filhos da nossa mente.
Criámos os computadores mas existe uma ansiedade na cultura humana
de que esses computadores voltarão para nos controlar, para nos criar.
E essa ansiedade do domínio das máquinas está representada na ficção científica.
Pensem, por exemplo, no filme 2001.
HAL, o computador, desobedece aos engenheiros da nave e recusa ordens.
Pensem no Exterminador.
Há máquinas a virem de outro planeta para destruir a Humanidade.
São máquinas, são robots, em última análise foram criados por seres humanos.
Pensem na Matrix, em que estamos a ser atacados por máquinas.
Isto mostra uma ansiedade por termos criado estas coisas mais inteligentes do que nós
que podem fugir ao nosso controlo tipo Frankenstein e destruir-nos.
Podem destruir-nos, por isso o que fazemos? Temos que domesticar essa ameaça, não é?
Porque é só na ficção científica que isto acontece.
Então, 2001, a sequela foi 2010,
A rebelião de HAL era apenas um programa informático mal escrito.
Era só isso, afinal a máquina não se rebelou.
No Exterminador 2, pegamos no Arnold Schwarzenegger, essa ameaça,
e ele torna-se um animal de estimação.
Está completamente domesticado no Exterminador 2, era uma vez uma ameaça.
Na Matrix, é claro, nós ganhamos, destruímos finalmente as máquinas na matriz.
Seria eu a única pessoa na sala a torcer pelas máquinas?
Viram o filme 2012, em que os humanos estão prestes a serem destruídos por um tsunami?
Seria eu o único a torcer pelo tsunami?
Acho que sim, porque estou cansado destes finais falsos.
A ansiedade é perfeitamente visível nos filmes de ficção científica,
estamos a ser sobrecarregados por forças que nós próprios criámos
e estamos finalmente a ter o que merecemos neste planeta.
Yeah, força tsunamis, força robots, força máquinas. Yeah!
Mas sabem, estou a torcer pela equipa errada.
E é claro que Hollywood não nos vai mandar para casa tristes, por isso ganhamos sempre.
Os extraterrestres são outra preocupação que ameaça a nossa supremacia.
E tudo isto é exibido na ficção científica.
Não vou falar sobre isto, embora tenha escrito extensivamente sobre este tema,
a ameaça de extraterrestres e como isso desafia a ideia da supremacia humana.
E vou passar à última revolução, que são os direitos dos animais e a Etologia Cognitiva.
Agora já não podemos andar a brincar. A ciência... Há algo de particular na ciência.
A ciência é uma das ideologias do mundo que nos mentiram.
A religião mentiu-nos sobre quem fomos e quem somos.
Os filósofos mentiram-nos sobre quem fomos e quem somos.
A ciência mentiu-nos sobre quem fomos e quem somos.
Mas aquilo que a ciência tem é o facto de ser uma entidade que se auto-corrige.
Se permitirmos que a ciência avance, exceptuando talvez as influências corruptivas do dinheiro,
mais cedo ou mais tarde ela vai começar a dizer-nos a verdade.
Ora, desde os anos 70 e 80 um tipo chamado Donald Griffin
foi um dos primeiros autores, e trabalhava directamente a partir de Darwin no início,
e inventou uma nova ciência chamada Etologia Cognitiva.
Etologia Cognitiva é o estudo científico da complexidade do comportamento animal,
da vida social dos animais, das emoções e da inteligência dos animais.
A Etologia Cognitiva diz-nos que os animais não são simples máquinas,
como disse Descartes, que os animais são máquinas, que são simples nas suas funções.
E são meras funções para nós.
A Etologia Cognitiva diz-nos que todas as experiências que nós temos, os animais têm.
Que eles se sentem sós, que sentem dor, sentem tristeza, sentem alegria.
Diz-nos que a vida social deles se baseia num sistema complexo de regras.
Uma sociedade de chimpanzés não é governada pelo instinto, é uma sociedade governada por regras.
Há regras para cumprir e regras para quebrar, e há que seguir as regras
senão o macho alfa aparece e restaura a ordem na sociedade
até que surja um novo macho alfa.
É uma sociedade governada por regras e os animais sabem quais são as regras,
há expectativas para segui-las, tal como na nossa sociedade.
E a Etologia Cognitiva mostrou-nos uma série de experiências interessantes,
as únicas experiências que eu poderia apoiar.
Por exemplo, sobre a inteligência dos animais, para dar-vos apenas dois exemplos rápidos.
Põe-se dois chimpanzés num campo e pendura-se uma banana num arame,
demasiado alto para a alcançarem. Depois põe-se 2 ou 3 caixas por lá.
Vamos ver o que acontece. Ok, comecem a filmar. Força, chimpanzés.
E os chimpazés olham para a banana, "quem me dera ter a banana, estou cheio de fome.
Ei, espera aí, estão aqui umas caixas.
Se as empilharmos, conseguimos chegar lá acima e pegar naquilo."
"Boa ideia, Henry, vamos fazer isso."
E eles perceberam isso, treparam para cima das caixas e conseguiram a banana.
Num outro exemplo, pode ver-se em vídeo. É um corvo.
É uma espécie de exemplo inverso. Os corvos num arame, a comida pendurada para baixo.
Como poderá o corvo chegar à comida? O corvo quer a comida.
Então o corvo começa a pensar. Sabe-se agora que as aves são seres muito inteligentes.
Têm uma memória espacial e uma capacidade de mapeamento incríveis.
Eles pegam num pedaço da corda, agarram com a pata,
pegam noutro pedaço e agarram nele assim, e vão puxando para cima assim.
Estão a resolver problemas. Estão a resolver um problema.
Isso significa que estão a usar a sua mente, significa que estão a pensar de formas lógicas.
E se houver alguma dúvida sobre isto, e vou falar de modo muito simplista,
dá-se aos chimpanzés uma... uma língua que possamos partilhar.
Sabem qual é? Chama-se Língua Gestual Americana.
Se lhes dermos a língua gestual, uma língua comum que eles possam aprender,
eles conseguem dizer-nos "sinto-me só". Conseguem dizer-nos "tenho fome".
Conseguem dizer-nos "aquele é um homem mau, aquele é um homem mau".
Talvez porque um dos seus treinadores os tenha tratado de forma abusiva.
Começam a contar-nos histórias.
Subitamente, por trás destes olhos e sobrancelhas peludas surge outra mente viva,
que fala connosco porque agora temos uma língua comum, uma língua gestual.
Ou um lexigrama, que é um computador com símbolos, e eles podem carregar nos símbolos,
e conseguem criar frases e transmitir pensamentos complexos através de um lexigrama,
através de uma máquina de fazer símbolos.
Portanto, aprendemos que os animais conseguem falar, que conseguem raciocinar,
que conseguem pensar como nós.
E não podemos senão imaginar o que pensam as baleias, os golfinhos,
porque têm mentes e cérebros incríveis, o cérebro da baleia é certamente maior que o nosso.
Os golfinhos têm assobios específicos como nomes, as baleias cantam aquelas canções,
ainda estamos a tentar perceber o que significam, sabemos que têm um significado,
que há algum significado simbólico associado.
Há certos cães da pradaria no Colorado que foram estudados em detalhe e descobriu-se
que têm uma palavra para cada predador, ou um som, e um som para humano.
Não é uma palavra bonita. É, estão a ver, mau. Animal mau. Tenham cuidado.
O que estou a tentar dizer é que a ciência começou agora a estudar a inteligência dos animais
de forma séria, e o que descobrimos foi espantoso.
O que descobrimos foi que os animais burros somos nós, porque na nossa arrogância,
na nossa discriminação, na nossa mentalidade preconceituosa, recusámo-nos a considerar
o que era óbvio para qualquer pessoa que tenha um cão ou gato: que os animais têm sentimentos,
que eles são como nós, que nós somos como eles, que eles têm pensamentos e emoções,
que são seres complexos, não são simples máquinas.
E podemos olhar para Donald Griffin, que fundou este trabalho,
alguns de vocês devem conhecer o trabalho de Marc Bekoff,
que é um etólogo cognitivo contemporâneo muito produtivo.
Esta revolução está a acontecer na ciência,
a ciência está a começar a corrigir os erros que a própria ciência ajudou...
para os quais contribuiu na nossa cultura. Porque a ciência sempre nos disse
que nós éramos seres racionais e os animais eram simples máquinas
às quais poderíamos fazer o que quiséssemos.
Agora existe quase um consenso emergente,
a Etologia Cognitiva já nem sequer é controversa.
E um número cada vez maior de cientistas já aceita
as descobertas da Etologia Cognitiva.
O que é que isto significa? Que os cientistas estão a abandonar o especismo.
Há um consenso emergente na ciência de que os animais têm vidas sociais complexas,
pensamentos complexos e emoções complexas, que eles são como nós,
que somos diferentes em grau e não em tipo.
Agora estamos à espera que os cientistas retirem as conclusões correctas das suas teorias.
Porque, por exemplo, os grandes símios. Isto significa absolutamente
que não podemos fazer experiências em grandes símios.
Eles são tão idênticos a nós. Foi apenas com o projecto do genoma humano nos anos 90
que concluímos isso. Que percebemos que temos 98,6, os números variam,
mas em torno de 98,5 graus de semelhança genética com os chimpanzés.
Os chimpanzés são mais próximos de nós, em termos genéticos, do que dos orangotangos.
Por isso somos primos, e não fazemos experiências nos nossos primos, nos nossos primos biológicos.
E se não fazemos experiências em grandes símios, também não devemos fazê-las em gatos,
não devemos fazê-las em cães, não devemos fazê-las em ratinhos.
A vivissecção é uma ideologia morta.
É uma ciência morta, é uma má ciência, é uma pseudociência.
E agora começamos a traçar as implicações daquilo que os filósofos e cientistas
têm tentado dizer-nos.
Eliminamos esta falácia, esta visão do mundo que tem governado o nosso pensamento há tanto tempo,
que nos coloca no topo de uma hierarquia, porque percebemos que não temos lugar
no topo dessa hierarquia.
Nunca tivemos a inteligência e a compaixão necessárias para governar o planeta.
E o que agora reconhecemos é que somos uma parte do planeta, não estamos à parte do planeta,
que vivemos uma grande comunidade, muito maior do que a comunidade humana.
Ouve-se frequentemente este cliché: "pertencemos a uma só raça, a raça humana".
Pertecemos a uma só comunidade, a biocomunidade. Gaia, na palavra grega, que significa Terra.
Pertencemos à Terra, e pertencemos-lhe enquanto membros de uma comunidade.
E se somos membros de uma comunidade, isso significa que temos de viver nela com respeito.
Respeitar os outros membros da comunidade como nossos iguais.
Se temos direitos, também temos responsabilidades e deveres para com os outros membros da comunidade
e temos de começar a exercê-los.
Porque não temos vivido muito bem neste planeta, o *** sapiens.
Temos vivido neste planeta como animais destrutivos e predadores,
como o animal mais perigoso do planeta, como uma espécie que colonizou o planeta
para os seus próprios propósitos, e vejam o que causámos.
Olhem para os resultados de 10 000 anos de civilização. É um desastre.
É um desastre absoluto e constante, digno de um filme de ficção científica,
o que fizemos ao planeta. Por isso eu digo, ou aprendemos a viver responsavelmente
e a viver correctamente neste planeta, ou não vivemos nele de todo.
Não temos sequer direito a viver, se não conseguimos viver em harmonia com as outras formas de vida.
E por isso precisamos de uma série de revoluções.
Foi preciso atravessarmos este processo revolucionário para ultrapassarmos o antropocentrismo
e ultrapassarmos o especismo.
Era preciso destruir e desmontar completamente este mapa cosmológico,
que é uma absoluta falácia, e criar uma visão descentrada do mundo.
E precisamos de revoluções sociais.
Precisamos não só de revoluções cognitivas, morais, mas também de revoluções institucionais.
Vivemos numa economia capitalista que, sinceramente, é crescer ou morrer.
É uma economia viciada em crescimento. Continuamos a aumentar a população
e os nossos níveis de consumo e a quantidade de animais que matamos e comemos.
Continuamos a aumentar e aumentar e aumentar, é insustentável.
E novamente, a Terra está a dizer-nos agora, a Terra está a dizer-nos na sua própria linguagem,
que estamos a viver em dissonância com aquilo que é preciso para viver neste planeta.
E a ética ambiental diz-nos como viver neste planeta.
Basta olhar para a forma como outros seres vivem no planeta.
Olhar para a forma como o planeta funciona, e viver em harmonia com isso.
Se aproveitássemos a ecosabedoria que fez parte
da cultura dos povos indígenas, sobre a qual os animais nos podem falar,
sobre a qual as florestas nos podem falar, se aceitássemos essa sabedoria,
essa sabedoria antiga, em vez de pensarmos que os nossos conhecimentos modernos são superiores.
Embora, ironicamente, estas novas ciências... é como se estivéssemos a fechar um círculo,
estamos a começar a aprender aquilo que sempre soubemos.
Temos de viver em harmonia com o resto do planeta.
E é isso que a ciência nos está a dizer hoje em dia.
Parte disso são os direitos dos animais, sem dúvida. Isso que significa que todos os seres
têm direitos iguais, porque têm interesses semelhantes aos nossos, iguais aos nossos.
O interesse que um gato ou um cão ou um rato ou um chimpanzé tem em não sentir dor
é exactamente igual ao nosso interesse.
Eles querem estar livres de dor e tortura, querem ser livres para viver a sua vida naturalmente,
em paz, em harmonia com as suas famílias, com as suas comunidades,
nos seus ambientes naturais, com os seus instintos naturais e os seus impulsos naturais
e os seus processos de vida naturais, exactamente como nós.
Os direitos dos animais são uma parte imensamente importante desta revolução.
A ética ambiental também faz parte desta revolução.
E o veganismo também faz parte desta revolução.
Porque o veganismo é a colocação destas ideologias em prática nas nossas vidas.
Quando somos veganos por motivos éticos, estamos a mostrar às outras pessoas
que não consideramos que um animal seja um recurso para nosso consumo.
E que só o facto de saber bem não é justificação para matar. Tal como o facto de caçar ser divertido.
Os caçadores dizem: "é divertido, é entretenimento, eu gosto de o fazer".
É a mesma desculpa que usamos para comer animais. Estas desculpas já não funcionam.
Então temos de alinhar o nosso próprio ser, temos de trazer harmonia
para a nossa ética e as nossas práticas e alinhar-nos neste planeta.
E temos todas estas revoluções a acontecer agora e é quase tarde demais.
Quase tarde demais, não é? Mas antes tarde do que nunca.
Mas é quase tarde demais porque o dano que causámos ao planeta é quase irreparável.
Temos agora 7 mil milhões de pessoas a viver neste planeta.
Estamos a consumir anualmente 50 a 60 mil milhões de animais terrestres.
7 mil milhões de pessoas a consumirem 50 mil milhões de animais terrestres.
Se acrescentarmos animais marinhos, baleias, golfinhos, atuns, etc.,
estamos a falar de muitos mil milhões mais, bem acima dos 100, 150 mil milhões.
É essa a quantidade de animais que 7 mil milhões de pessoas estão a comer. É insustentável.
Estamos a destruir a floresta tropical, estamos a transformar os oceanos em cinzas.
O principal responsável pelas alterações climáticas é o agronegócio, a agricultura.
A principal fonte de poluição dos oceanos, da estrutura dos oceanos,
é o consumo de carne.
Um dos principais motivos para a destruição das florestas tropicais,
para além da utilização de papel, é para criar pasto para gado.
Portanto, vivemos numa cultura insustentável, o capitalismo não ajuda,
porque para o capitalismo todas as coisas são apenas recursos a serem explorados,
e a menos que os mercados continuem a expandir, todo este império vai cair,
é isso que vai acontecer, este império vai cair,
a ordem industrial está a cair aos bocados e as coisas estão cada vez piores.
Sinceramente, as coisas estão cada vez piores.
No ano 2050, haverá 10 a 15 mil milhões de pessoas neste planeta.
Pensem nos problemas que temos agora com 7. Agora, avancem para 2050, 10 a 15 mil milhões.
Sabemos que vamos estar a comer mais carne, o consumo de carne duplicará até 2050.
E temos de olhar para o que se passa nos países em vias de desenvolvimento.
Já ouviram a frase "o planeta não tem condições para suportar outros Estados Unidos"?
Porque os Estados Unidos tem 5% da população mundial, mas consome 25% dos recursos.
A China tem 1,3 mil milhões de pessoas. A classe média chinesa tem 300 milhões de pessoas,
os Estados Unidos têm 300 milhões de pessoas.
Por isso temos dois Estados Unidos no planeta, e sabemos que não podemos suportar nem um.
Agora temos dois.
A Índia está a crescer rapidamente, a tornar-se rapidamente uma sociedade carnívora.
Prevê-se que a Indonésia multiplique por 10 o seu consumo de carne nos próximos 5 anos.
Por isso temos aqui um problema. Temos um problema.
E, como já disse, precisamos de mudanças institucionais, mas precisamos também de ouvir
a sabedoria, a sabedoria colectiva de culturas antigas e culturas modernas,
de povos tribais, da ciência contemporânea,
e precisamos de revolucionar radicalmente todas as facetas da nossa presença neste planeta,
ou não restará planeta para vivermos.
Muito obrigado.