Tip:
Highlight text to annotate it
X
O privilégio de abrir o primeiro julgamento...
Em 20 de novembro de 1945,
o mundo acompanhou o julgamento de 21 dos nazistas mais influentes.
Demonstraremos que esses prisioneiros
são símbolos vivos de terrorismo e violência
e da arrogância e crueldade do poder.
Acusados dos crimes e horrores do Terceiro Reich,
todos ficaram diante da pena de morte.
Ele foi responsável pelo plano de escravização em ***...
Um deles se destacou dos demais.
o réu Speer...
O mais enigmático dos acusados,
arquiteto de Hitler e ministro do armamento,
Albert Speer.
...e pelo uso em condições violentas, desumanas e degradantes.
Que todo o sistema nazista
e todos os que dele participaram, inclusive eu mesmo,
entrem para a história com a ignomínia e a desgraça que merecem.
Seus atos foram os de maior alcance e os mais significativos do julgamento.
Os mortos serão os acusadores do responsável por continuar a guerra:
Adolf Hitler.
O que está pretendendo? Você não me contou que ia dizer isso!
Por que tenho de lhe contar o que eu vou dizer?
Porco!
lsso provavelmente lhe custará a vida.
Que assim seja.
Passados 60 anos,
''o nazista que pediu perdão'' ainda divide opiniões.
E quanto à culpa?
Teria sido uma alma perturbada, buscando o perdão do povo alemão?
Ou o autor de uma estratégia cínica que enganou o mundo?
NUREMBERG Nazistas no banco dos réus
Quinze dias após a rendição,
Hitler, Himmler e Göbbels haviam se suicidado.
Os Aliados estavam à procura dos líderes nazistas ainda vivos.
Turner e Evans, para a direita! Fiquem aqui comigo!
Speer. Albert Speer.
-Quem é Speer? -Não sei.
Entre no corredor, sargento.
Albert Speer? Senhor?
Sim, sou eu.
Devo informar-lhe de que o senhor é meu prisioneiro.
Vou lhe dar um instante.
Obrigado.
Não acho que ele se considerava um criminoso de guerra na época.
Ele pensava que podia ser uma das pessoas
que os Aliados usariam para reconstruir a Alemanha.
Sim, acho que ele ficou surpreso.
Alemães de altas patentes,
os últimos chefões que restaram após a rendição,
perfilam-se como prisioneiros comuns.
Parecia pouco provável que Speer se tornasse nazista.
Tendo tido uma formação privilegiada, iniciou a carreira como arquiteto.
Foi isso que o levou diretamente para o círculo mais íntimo de Hitler.
Hitler sempre foi fascinado por arquitetura.
E Albert Speer, jovem e muito bem-sucedido,
logo chamou sua atenção.
O relacionamento deles tornou-se muito estreito,
alguns diziam que eram quase como pai e filho.
Acredito que Hitler viu em Speer o homem que ele mesmo poderia ter sido,
se não tivesse tomado outro rumo.
Nos três últimos anos da guerra,
Albert Speer foi ministro do armamento de Hitler,
responsável por manter em funcionamento a imensa máquina de guerra alemã.
Apesar da violenta campanha de bombardeamento aliada,
ele conseguiu até aumentar a produção.
Muita gente acha que a guerra se estendeu por mais dois anos
graças aos esforços de Speer.
Estou inclinado a partilhar dessa opinião.
Foi esse feito que atraiu a atenção dos Aliados para ele.
Quatro meses depois de sua prisão,
Speer foi transferido para a prisão de Nuremberg,
acusado de ser um importante criminoso de guerra.
Lá, foi reaproximado a outros líderes nazistas ainda vivos,
entre eles Hermann Göring,
braço direito de Hitler e sucessor nomeado.
Ele era diferente dos outros réus.
Uma pessoa distinta e de alto nível que se deixou levar
pelo movimento nazista, pelo significado que tinha para ele.
Ele não parecia ser um nazista como a gente conhecia.
Sempre fui da opinião de que aquele não era o lugar dele.
Em Nuremberg, Speer foi, pela primeira vez,
confrontado com a totalidade dos crimes do regime nazista.
Sua reação a essa acusação
teria um efeito decisivo no resultado do julgamento.
Doutor Hans Flaschner.
Fui nomeado seu advogado, se o senhor concordar.
Lamento ter sido imposto ao senhor.
Espero que o senhor não tenha intenção de fazer nome,
defendendo um famigerado criminoso de guerra.
Na verdade, o senhor era o único que eu estava preparado para defender.
Nesse caso, devo avisar-lhe desde já
que pretendo admitir uma responsabilidade comum.
O quê?
Fui burro e ingênuo de supor que seria acusado separadamente.
O fato é que fomos todos acusados
de cada um dos crimes monstruosos daquele documento.
Mais uma razão para contestá-lo.
Não. Pensei muito sobre isso.
Dada a magnitude dos crimes, a história exige um julgamento.
Eu sei disso.
Não tenho ilusões sobre meu destino.
Reuni-me com Hans Flaschner, o advogado de Speer.
Ele me contou que brigou muito com Speer
sobre o reconhecimento de responsabilidade que ele propôs.
Ele disse a Speer:
''Você não lhes deixará alternativa senão enforcá-lo''.
Devo encarar minha vida como terminada.
Minha postura aqui deve ser de ministro do Reich,
não de indivíduo.
Ele iniciou um plano de admitir responsabilidade,
de demonstrar remorso.
Creio que você entenderá,
porque você e as crianças ficariam envergonhadas,
se eu me esquecesse que milhões de alemães
acreditaram num ideal enganoso.
Os historiadores ainda estão divididos entre os que dizem:
''Claro, ele estava tentando salvar sua pele''
e os que dizem:
''Não, ele provou que era o único decente do grupo''.
O capitão Gustave Gilbert, psicólogo do serviço secreto americano,
era o oficial de ligação do prisioneiro.
-Capitão. -Como vai, sargento?
Muito bem, obrigado.
Ele teve um papel fundamental nos bastidores do julgamento.
Quero que seja nossos olhos e ouvidos, capitão.
Familiarize-se com os prisioneiros,
informe-me regularmente sobre seu estado psicológico.
Nossa tarefa, capitão,
é garantir que esses homens estejam saudáveis
para irem a julgamento perante o mundo.
Com acesso irrestrito aos prisioneiros,
Gilbert conseguiu informações preciosas sobre as razões de Speer.
Quero que assine esta cópia do indiciamento,
e que escreva brevemente sua opinião sobre ele,
se não se incomodar.
Achei que os guardas diriam alguma coisa a respeito disso.
Simplesmente observei
que o regulamento da prisão não menciona nada
sobre desenhar nas paredes.
O julgamento é necessário.
Há uma responsabilidade comum por crimes horríveis como esses,
mesmo em um Estado autoritário.
Sinto que devo assumir a responsabilidade comum
em nome da liderança.
Não é para salvar minha pele.
AAlemanha precisa saber que Hitler traiu seu próprio povo.
Não entendo. Se é assim que pensa,
como pôde cooperar com um monstro como Hitler durante tanto tempo?
Eu devia... Eu devia ter percebido antes,
mas continuei jogando esse jogo hipócrita
até ser tarde demais.
Porque era mais fácil.
Eu não imaginava que existisse um nazista como Speer.
Aquele era um homem que pensava com a própria cabeça.
Falava livremente. Ninguém mais faria aquilo.
Ele não estava negando.
Speer disse: ''Fui eu!''.
''Sou responsável, junto com Hitler, pelo que aconteceu
desde 9 de fevereiro de 1942''.
Aquilo foi um choque.
O fato de Speer admitir responsabilidade
imediatamente o diferenciou dos demais réus nazistas.
Gõring liderava a outra legião de nazistas,
no que se refere à negação.
Estou pronto para lutar.
E, se não conseguir convencer o tribunal,
convencerei o povo alemão
de que tudo o que fiz foi pelo grande Reich.
Não havia dúvida de que Göring e Speer eram polos opostos.
Göring era o homem que se sentiu no dever
de justificar Hitler e o Terceiro Reich.
Ao passo que Speer foi aquele que disse:
''Temos responsabilidade coletiva,
fizemos tudo aquilo e foi um erro''.
Certamente, aquilo acabaria causando algum confronto.
CÁRCERE PARA OS CULPADOS
O tribunal de Nuremberg, local onde serão julgados
os maiores criminosos de guerra nazistas.
Prisioneiros alemães estão trabalhando na ampliação da sala de audiências,
instalando cabines de radiotransmissão e para as câmeras de cinejornal
que levarão a história do julgamento para o mundo todo.
O responsável pela promotoria era o juiz RobertJackson.
Ele e sua equipe estavam cientes
dos riscos de se fazer um julgamento público.
Os réus tinham o direito de contestar nossas acusações.
Bom dia, pessoal!
Em qualquer ação judicial existe esse risco,
pode-se vencer ou não.
São riscos que precisam ser aceitos.
Mas as contestações não eram a maior preocupação dos Aliados.
Não é o que esperávamos, mas não posso dizer que estou surpreso.
O que houve?
O coronel Amen está preocupado com alguns de nossos réus,
especialmente Göring.
Baseado nos interrogatórios, acredito que ele será um problema.
Ele é inteligente.
Está ciente de que o julgamento deverá ser seu ''canto do cisne'',
a última oportunidade para ele fazer sua propaganda nazista pessoal.
É por isso que os britânicos não queriam esses julgamentos.
O julgamento não diz respeito apenas à culpa desses réus,
mas ao movimento nazista como um todo.
Obrigado. Ele precisa acontecer.
É preciso que se saiba o que aconteceu aqui.
Já há descrença nos EUA.
Precisamos expor tudo: o extermínio, a agressão, a atrocidade.
Se tivéssemos um único réu disposto a admitir a culpa,
suas acusações seriam de longe nossa melhor arma.
E então?
Speer parece o mais realista de todos.
Ele alega que não tinha ideia de todos os crimes relacionados no processo,
mas que entende que a história exige um julgamento,
coisa que considera boa, de modo geral.
Ainda que, em sua consciência, haja dúvida sobre sua culpa.
Mas não havia muita dúvida a respeito da culpa de Speer,
pois ele foi incriminado por outro réu.
Fritz Sauckel fora responsável pelo fornecimento
de mão-de-obra estrangeira para a indústria alemã,
a maior parte recrutada à força.
-Pois não? -O prisioneiro, senhor.
Faça-o entrar.
Sauckel era um zero à esquerda, era um maricas.
Não estou querendo dizer que ele era homossexual,
mas acho que ele nunca entraria numa briga sozinho.
Ele não saberia agir como um homem.
Lembra-se de que continua sob juramento desde ontem?
Sim.
Muito bem.
Vamos retomar do momento em que recebeu a responsabilidade
de recrutar mão-de-obra.
Speer chamou-me ao QG e fui apresentado ao Führer.
Ele me falou pessoalmente de como essa tarefa era importante
e que eu deveria cumprir as ordens de Speer sem questionar.
Outro aspecto é que ele parecia
muito satisfeito e honrado em ser um dos criminosos de guerra.
Era como se dissesse:
''Olhe só, eu, o reles Sauckel, sou um deles''.
Então, as requisições de mão-de-obra de Speer eram questão prioritária,
acima das demais atividades?
Primeiro, Speer, depois os outros?
lsso.
As requisições para a indústria de armamentos de Speer eram enormes
e Sauckel foi designado para fornecer esses trabalhadores.
Foi ficando cada vez mais difícil conseguir trabalhadores.
Hitler e Speer faziam requisições cada vez maiores.
Era necessário usar todas as formas de...
persuasão...
para cumprir minha missão.
Mas quero dizer que a desempenhei da melhor forma que pude,
e da maneira mais humana possível.
Eu mesmo fui trabalhador a vida toda.
Particularmente, eu não tinha interesse
em trazer trabalhadores estrangeiros à Alemanha.
Eu só os trouxe para cumprir exigências de mão-de-obra de terceiros.
O milagre do aumento de produção de Speer teve um custo.
Ele só foi possível por meio do sofrimento de milhões de trabalhadores forçados.
Aoperação de escravização
recrutou 5 milhões de pessoas de outros países,
das quais só 200 mil foram de vontade própria.
O recrutamento era o mais cruel possível
e Sauckel foi associado a mortes de trabalhadores,
ferimentos de trabalhadores...
A maior operação de trabalho escravo da história.
Houve alguma consideração a respeito da legalidade
da importação de trabalhadores para a Alemanha?
Diante da situação, não dei muita importância a isso.
Speer estava num nível mais alto.
Era encarregado dos armamentos e da produção de guerra.
Sauckel não tinha poder de decisão,
ele só atendia às requisições de Speer de mão-de-obra escrava.
Pode propor algum argumento que justifique
obrigar mão-de-obra civil de territórios ocupados a vir para o Reich?
-O senhor diz com bases legais? -Ou morais.
O senhor protestou a alguém contra essa medida
de trazer trabalhadores à Alemanha contra sua vontade?
Sim.
O arrebanhamento forçado de mão-de-obra criou problemas
em minhas fábricas nas áreas ocupadas.
Ela trazia os trabalhadores para a resistência.
Mas estou falando de bases morais ou legais.
Sempre que eu ressaltava o fato de que os métodos eram problemáticos,
Hitler me perguntava
se eu aceitaria os métodos ou uma redução da mão-de-obra.
Do ponto de vista da manutenção da produção,
como ministro do armamento, eu não tinha escolha.
Com Speer pessoalmente implicado, suas perspectivas pareciam sombrias.
Ainda mais, tendo os soviéticos deixado bem claras suas expectativas.
E agora, senhoras e senhores,
é uma honra e um privilégio apresentar o senhor Andrei Vishinski,
do Ministério das Relações Exteriores soviético,
que, tenho certeza, nos dirá algumas palavras. Senhor Vishinski.
Avodca é inimiga do povo. Por isso, deve ser consumida.
Temos a felicidade
de ser advogados com um propósito comum.
E, talvez por sermos advogados, e não diplomatas,
é que consigamos nos dar tão bem uns com os outros.
Quero, agora, propor um brinde.
Aos réus.
Que seus caminhos os levem direto do tribunal à sepultura.
Bravo!
Para réus perspicazes como Speer,
ficou claro que havia pouca esperança com os russos.
Ele reconheceu claramente que sua única chance
de evitar a condenação ou a execução
seria estabelecer alguma forma de relacionamento
com as potências ocidentais, Grã-Bretanha e EUA.
Palácio da Justiça de Nuremberg, na Alemanha.
Aquela que já foi a cidade sagrada do nazismo, tornou-se...
Após seis meses de preparação,
o Tribunal de Crimes de Guerra começou os trabalhos.
Os 20 integrantes mais importantes do bando de Hitler que sobreviveram
vão a julgamento.
A atenção do mundo está concentrada nesta cidade e neste acontecimento.
Com esse julgamento,
os Aliados esperavam derrotar de uma vez o nazismo.
Foi um teatro minuciosamente coreografado,
e nada foi deixado por conta do acaso.
Veja onde eles o puseram.
Você está sentado junto com os únicos considerados casos duvidosos.
Não pense que alguma coisa aqui é mero acaso, tudo foi pensado.
Mantenha-se firme naquela sua linha masoquista,
assim, quem sabe, iremos bem.
Todos de pé!
Estas imagens revelam a arrogância com que os comandantes alemães
recebem acusações de crimes contra povos civilizados.
O promotor Robert Jackson, dos EUA,
abre o julgamento com fortes acusações aos réus.
O privilégio de abrir o primeiro julgamento da história
por crimes contra a paz mundial
traz consigo uma séria responsabilidade.
Os crimes que buscamos condenar e punir
foram de tal forma calculados, tão perversos e tão devastadores,
que a sociedade não pode tolerar que sejam ignorados,
pois ela não sobreviveria a sua repetição.
Pretendemos provar que cada um desses réus
sabia da existência dos campos de concentração.
E que o medo, o terror
e o horror inominável desses campos eram instrumentos
pelos quais os réus mantinham seu poder
e suprimiam a oposição a suas condutas.
É muito fácil racionalizar durante a guerra.
Patriotismo, e tudo o mais.
Minha maior culpa é ter ignorado tudo isso.
Eu disse a Hitler, em janeiro de 1945, que tudo acabara.
Mas ele insistiu
que a Alemanha devia vencer, ou ser destruída.
AAlemanha não merecia sobreviver.
Mesmo assim, o senhor continuou cooperando.
Não. Não.
Foi aí que percebi que ele era um maníaco,
determinado a destruir a nação alemã.
Göring e os demais faziam discursos heroicos
sobre lutar e morrer pela pátria, sem jamais arriscarem o pescoço.
Acho que isso facilitou para eles.
Não precisam responder a perguntas sobre moralidade.
Esse era o tipo de herói que tínhamos, conduzindo o país à destruição.
Göring... Hitler...
Nenhum deles deve ficar na história como digno do mínimo respeito.
Que todo o sistema nazista
e todos os que dele participaram, inclusive eu mesmo,
entrem para a história com a ignomínia e a desgraça que merecem.
Em 11 de dezembro de 1945,
a promotoria abriu o processo contra Speer e Sauckel.
A política nazista de mão-de-obra estrangeira
era uma política de deportação e escravização em ***.
Uma política de alimentar pouco
e fazer trabalhar em excesso os trabalhadores estrangeiros,
de sujeitá-los a todo tipo de degradação,
brutalidade e desumanidade.
O réu Sauckel
dirigiu o recrutamento, deportação e distribuição
de mão-de-obra civil estrangeira.
Ele era responsável pelo tratamento aos milhões de pessoas escravizadas.
O réu Speer
é responsável pela determinação da quantidade de escravos estrangeiros
necessários para a máquina de guerra alemã.
Foi Speer o responsável pela decisão de recrutá-los à força
e por seu uso, em condições violentas, desumanas e degradantes,
na fabricação de armamentos e munições.
Sua esposa pediu-me que lhe entregasse um pacote dela e das crianças
mas, infelizmente, os guardas confiscaram-no.
Agora, precisamos pensar em sua defesa
das acusações específicas contra você:
os trabalhadores forçados.
Quero que reconsidere alegar responsabilidade coletiva.
Tudo bem assumir a responsabilidade por coisas que você podia controlar.
Mas dizer que foi responsável pelos campos de concentração
sem ter tido absolutamente nenhuma influência sobre eles...
lsso é...
É uma completa loucura.
Provavelmente lhe custará a vida.
Que assim seja.
O culto a Hitler não deve nunca mais se repetir
e farei tudo o que puder para impedir.
A menos que conseguisse encontrar um meio
de estabelecer uma relação com a acusação,
ele, assim como os demais, sofreria as consequências.
Bem no início do ano, Speer iniciou sua defesa.
Gostaria de fazer algumas perguntas à testemunha em nome do réu Speer,
uma vez que o advogado do réu Speer está ausente.
Com o chefe de inteligência doméstica da SS no banco das testemunhas,
Speer surpreendeu o tribunal com uma revelação bombástica.
Testemunha,
é de seu conhecimento que o réu Speer,
contrariando ordens de Hitler, tomou medidas para impedir
a destruição de instalações industriais e outras?
É.
Uma última pergunta:
o senhor sabe que o réu Speer preparou um atentado à vida de Hitler
em meados de fevereiro daquele ano?
Não.
Obrigado. Sem mais perguntas.
Deus!
Considero a hora oportuna para suspender a sessão.
Assassinato? Ficou louco?
É degradante vender sua alma ao inimigo
com essa conversa de traição em pleno tribunal.
O que está pretendendo? Você não me contou que ia dizer isso!
Por que tenho de lhe contar o que eu vou dizer?
Porco!
Aquilo certamente não caiu bem para os réus.
Era uma tentativa grosseira de ganhar a simpatia do tribunal.
Para Gilbert, aquela revelação era um claro sinal
de que Speer poderia ser usado pela acusação.
-Bem, a bomba explodiu hoje. -Explodiu, mesmo.
Que bom que você veio.
As coisas vão ficar complicadas para mim agora.
Foi uma decisão difícil enfrentar Göring.
Quer dizer, eu já tinha decidido fazer aquilo há algum tempo,
mas ainda é uma coisa difícil para mim.
Então, como pretendia matar Hitler?
-Gás. -Gás?
É.
Como arquiteto de Hitler, eu conhecia a estrutura de seu bunker.
Eu ia fazer o gás entrar pelo duto de ventilação
mas, ao inspecioná-lo,
descobri que o duto já não estava no nível do solo,
mas quatro metros acima.
lsso acabou com o plano.
Göring atacou-me hoje porque estraguei a união do grupo.
Mostrei que nem todos seguem aquele maníaco destrutivo até o fim.
Agora estou nervoso.
Estou preocupado que tentem fazer algo a minha família.
Acho que se Speer quisesse matar Hitler,
havia outras maneiras de fazê-lo, porque os dois eram muito próximos.
Para mim, aquilo pareceu meio teatral.
Algo bonito de se falar, mas que não se realizou.
Por outro lado, Speer, de fato, se arriscou,
contatando gente em seu ministério para conseguir o gás venenoso.
Então, ele estava se arriscando.
Maldição!
Não me importa o que o inimigo queira fazer conosco,
mas tenho nojo
de ver alemães traírem uns aos outros.
Vá falar com ele.
Não percebe o que está fazendo?
Você está desgraçando a si e a seu nome na Alemanha.
Sua honra não conta?
Göring está furioso.
Göring está furioso?
Von Schirach,
ele devia ter ficado furioso quando Hitler conduzia a nação para a destruição.
Como marechal do Reich, segundo no comando, depois do Führer,
era responsabilidade dele tomar uma providência a respeito.
Em vez disso, o que ele fez?
Dopou-se com morfina e pilhou tesouros artísticos de toda a Europa.
Que direito ele tem de me julgar?
O homem é uma desgraça e um covarde.
Como sucessor escolhido por Hitler,
Göring exercia forte influência sobre os demais réus.
Eles o veneravam.
Quase se desfaziam em mesuras diante dele.
Carcereiro!
Ele se considerava superior a todos ali.
Carcereiro!
Eu não gostava dele.
Abotoe a farda, balofo.
Para os Aliados,
qualquer coisa que pudesse enfraquecer Göring seria bem-vinda.
Ele marca sua presença.
Você precisava ver Göring antigamente.
Era motivo de chacota. Chamavam-no ''o gordo''.
Preguiçoso, corrupto, viciado irresponsável.
Ele ainda acha que é o chefão, mesmo sendo criminoso de guerra.
Já avisou aos outros que, se eu sair vivo deste julgamento,
serei linchado por traição.
Notei que ele usa sua influência para manter os réus sob controle.
É mesmo.
Averdade não lhe interessa.
Ele prefere ser aclamado como herói.
Ele disse aos outros: já que suas vidas estavam perdidas,
era melhor ficarem a seu lado e terem uma morte de mártir.
Disse que o povo alemão iria se reerguer e reconhecê-los como heróis.
Alguns deles concordam com minha postura.
Só que estão intimidados demais para fazer alguma coisa.
Sempre estranhei vocês permitirem que os réus andem e comam juntos.
É assim que Göring os mantém sob controle.
Acho muito interessante imaginar esses dois rondando um ao outro,
Gilbert imaginando se está obtendo o que quer de Speer
e Speer dosando o tempo todo o que preparou para passar a ele.
Após a sugestão de Speer,
Gilbert passou a isolar Göring durante as refeições.
A ordem do capitão Gilbert era trocá-los de lugar,
procurando impedir a camaradagem entre eles.
Ao obrigar Göring a comer sozinho,
Gilbert fez diminuir imediatamente seu controle sobre os demais réus.
O povo alemão está começando a perceber
que uma das acusações mais nocivas contra Göring
é a de roubar objetos de arte.
É, nem falaram da pior parte: ele até vendeu as coisas que roubou.
Percebe?
Como ele pode ficar falando que os réus têm de formar
uma frente de lealdade e honra?
Ele mesmo mostrou que não passa de um criminoso comum.
Mas Göring estava longe de ser derrotado.
lnterrogado por Jackson, o promotor-chefe,
ele mostrou o perigo que ainda representava.
Aqueles preparativos eram para a ocupação da Renânia, não?
Eram preparativos gerais de mobilização,
como os de qualquer outro país.
Mas tinham um caráter
que devia ser mantido em total sigilo das potências estrangeiras.
Não me lembro de ter lido com antecedência
a publicação dos preparativos de mobilização dos EUA.
Respeitosamente submeto a este tribunal
que a testemunha não está cooperando
e que não esteve presente a seu interrogatório.
Com licença.
Parece-me que esta testemunha adotou e está adotando,
no banco das testemunhas e no dos réus,
uma postura arrogante e desdenhosa em relação a este tribunal,
tribunal que está lhe dando um julgamento
que ele nunca deu a uma alma, viva ou morta.
Se vocês se forem duas vezes menos bem-sucedidos do que eu,
terão ido bem.
A vitória de Göring sobre o promotor-chefe
rendeu-lhe novamente aprovação.
Aquilo foi bem mais a cara do Göring de antigamente.
É, ele deu uma lição ali.
Sabe, muita coisa que Göring diz é verdade.
Então, o que acharam da atuação dele?
Magistral.
Seria insanidade política condená-lo.
Ele é tão popular! Até nos EUA.
A posição de Speer enfraquecera-se.
Para Speer, a influência de Göring era muito perigosa.
Ele não conseguiria manter sua defesa.
Não conseguiria, talvez,
defender sua tese com suficiente convicção,
sentindo-se totalmente isolado ou intimidado pelo resto do grupo.
Obrigado, senhor.
-Por favor, sente-se, doutor. -Obrigado.
Estou muito preocupado com o rumo que o julgamento está tomando
e com Göring, Hess e os outros, suas posturas de lealdade.
Não entendi. O que quer dizer?
Já pensou em como, no fim das contas,
regimes inteiros e indivíduos são julgados pelos seus últimos momentos?
Em vez de o nazismo terminar em desgraça e colapso,
este julgamento está acrescentando um capítulo.
Göring e os demais
estão tendo a chance de sair elegantemente
como nacionalistas leais.
As pessoas vão pensar que havia algo de bom no nazismo.
Desse jeito, meu depoimento será...
perdido.
Minha defesa será inútil e não produzirá nenhum efeito.
Só espero que, quando chegar a hora,
eu esteja no estado de espírito justo.
Para a acusação,
perder a admissão de culpa coletiva de Speer seria desastroso.
Ah, doutor Gilbert! Como estão nossos réus hoje?
Na verdade, é por isso que vim conversar.
Continue.
Conversei ontem com Speer e acho que ele está hesitante.
Hesitante?
Tenho certeza de que ele não seguirá a linha de Göring.
Ele acha que seu depoimento não é considerado importante
e é provável que reduza sua defesa a um breve resumo.
Por que ele pensaria assim?
Quando conversamos ontem,
contei-lhe que seria eu a interrogá-lo, e não você.
E?
Fiquei com a impressão de que ele achou que isso era reflexo de sua importância,
ou da falta dela.
Que enquanto o promotor-chefe interrogou Göring,
ele seria tratado como um réu secundário.
E se ele se sentir importante?
Nesse caso, acho que dará uma declaração completa e aberta.
A atitude dele está condicionada à vaidade.
Não há dúvida, essa é a atitude psicológica dele.
Speer é o único réu
disposto a enfrentar Göring e testemunhar contra o regime nazista.
O destino de Speer dependia de sua atuação como testemunha.
Como ele abordaria sua responsabilidade pessoal
pelo programa de trabalhos forçados?
O réu Sauckel afirmou em testemunho que as atividades dele
eram determinadas primariamente pelas necessidades do senhor.
Quais são suas observações sobre isso?
Eu contava que Sauckel atenderia às exigências da produção de guerra,
mas não posso ser acusado de ser o único responsável
pela exigência de mão-de-obra estrangeira.
Sauckel também declarou
que eu incentivei a remessa de trabalhadores para a Alemanha.
Porém, isso não é verdade.
Não precisei usar de autoridade com Sauckel para isso.
O senhor afirmou anteriormente
que sabia que parte dos trabalhadores estrangeiros,
estava trabalhando na Alemanha contra vontade.
Aquela declaração voluntária foi correta:
durante a guerra, fui grato a Sauckel
por cada trabalhador que ele me forneceu.
Speer está tentando me culpar pelo trabalho escravo.
Mas não sou eu o responsável.
Ele e o Führer não paravam de me mandar conseguir,
nos territórios ocupados, o máximo de trabalhadores que eu pudesse.
Afase seguinte do depoimento de Speer era decisiva para a acusação.
A credibilidade de todo o julgamento de Nuremberg
repousava sobre o que ele disse a seguir.
Era possível para o senhor ter discussões políticas com Hitler?
Não. Ele me considerava um ministro puramente técnico.
Então, sendo um ministro técnico,
o senhor limita sua responsabilidade a sua esfera de trabalho?
Não.
Gostaria de acrescentar algo de fundamental importância.
Essa guerra causou uma tragédia inconcebível
ao povo alemão
e, realmente, iniciou uma catástrofe mundial.
Assim, é meu dever inquestionável
assumir minha parcela de responsabilidade
por esse desastre perante o povo alemão.
Os sacrifícios feitos dos dois lados,
desde janeiro de 1945, não tiveram sentido.
Os mortos desse período serão os acusadores
do responsável por continuar a guerra:
Adolf Hitler.
O povo alemão foi leal a Hitler até o fim.
Ele traiu essa lealdade intencionalmente.
Tentou atirar o povo no abismo.
Speer foi o único réu que se opôs a Hitler.
Quando Hitler finalmente percebeu que a guerra estava perdida,
ordenou que tudo fosse destruído antes da chegada dos Aliados,
que nada deveria ficar intacto,
condenando o povo alemão a um sofrimento ainda maior.
Speer fez tudo o que pôde para impedir aquilo,
contrariando as ordens de ''terra arrasada'' de Hitler.
No fim da guerra,
ele se arriscou a ser fuzilado ao admitir isso ao Führer.
Acredito que havia um risco enorme em fazer aquilo
e depois ainda ir ao bunker
e contar a Hitler que havia contrariado as ordens dele.
Ninguém nunca fez isso, é o que posso dizer.
O senhor conseguiu conciliar seus atos
com o juramento e a noção de lealdade a Adolf Hitler?
Só existe uma lealdade que todos devem sempre ter.
É a lealdade ao próprio povo.
Esse dever está acima de tudo.
Hitler traiu a confiança da nação, o que deve ter ficado claro
para qualquer membro inteligente de seu círculo.
Speer respondeu as perguntas diretamente.
Reconheceu livremente sua responsabilidade individual.
Ele disse que aquele regime era ruim,
que aquilo era uma coisa horrível, Hitler era mau de fato.
Era evidente que Speer estava fazendo exatamente
o que o promotor-chefe Robert Jackson esperava.
Pelo que eu entendi,
o senhor estava empenhado em conseguir mão-de-obra suficiente
para produzir armas e dar a vitória à Alemanha.
Sim.
E essa campanha antissemita era tão forte,
que tirou do senhor técnicos treinados
e impossibilitou-o de exercer suas funções.
É esse o fato?
Não entendi sua pergunta.
O interrogatório de Speer foi bem diferente dos demais.
Não havia a intenção de pegá-lo desprevenido.
Pode-se até argumentar que Jackson estava ajudando-o
a fortalecer seu argumento.
Então, seu problema para produzir os armamentos e dar a vitória à Alemanha
foi muito agravado por essa campanha antissemita,
promovida por alguns dos outros réus?
Sem dúvida.
Se os judeus que foram evacuados tivessem podido ficar
e trabalhar nas fábricas,
teria sido uma vantagem considerável para mim.
Enquanto facilitava a vida de Speer,
Jackson usou-o para desferir um golpe de misericórdia em Göring.
O senhor estava presente, junto a Hitler,
quando ele recebeu um telegrama de Göring?
Em 23 de abril, fui a Berlim
para me despedir de vários colaboradores.
Foi nesse dia que chegou o telegrama de Göring para Hitler.
É esse o telegrama em que Göring pede para assumir o poder?
É.
E o que Hitler disse na ocasião?
Ele expressou com muita clareza o que achava de Göring.
Disse que já sabia que Göring havia fracassado.
Disse que ele era corrupto e viciado.
Fiquei muito abalado,
porque aquilo demonstrou a falta de responsabilidade por parte do Führer
de manter alguém assim no poder,
quando a vida de inúmeros alemães dependia dele.
Acho que isso encerra o interrogatório.
Só queria dizer que seu cliente é um réu que me impressionou.
Acho possível argumentar que, de todos os prisioneiros,
Speer era o mais inteligente, socialmente competente
e alguém com quem Jackson se identificava.
É possível que Jackson acreditasse
que Speer havia sido de grande ajuda na sustentação do julgamento
após um período longo e difícil, para começar.
Você certamente causou um belo rebuliço entre os réus.
Muitos estão bravos
porque agora são os pescoços deles que estão em risco.
O maior choque foi eu ter admitido minha parcela da responsabilidade comum.
Mas pode ter certeza de que, se tivéssemos vencido a guerra,
eles estariam aos gritos, exigindo sua parcela da vitória.
E quanto à culpa?
Sua culpa pessoal?
Minha culpa pessoal consiste
em ter aceitado um cargo no governo
e aceitar que o antissemitismo e os campos de concentração
estavam naturalmente sendo usados como instrumentos daquele governo.
Preciso estar preparado para qualquer coisa.
Termina a carreira
que me arrebatou a alturas inimagináveis.
Foi uma vida que acabou tornando um homem esforçado e responsável
num traidor do senhor a quem serviu fielmente durante dez anos.
Ao final, a única decisão que lhe restou foi entre servir ao povo ou ao Führer.
Não escrevo tudo isso com a intenção de me justificar.
Apenas sinto a necessidade de dar a minha esposa e a meus filhos,
para o futuro, um entendimento claro dos acontecimentos.
Réu Albert Speer,
pelas alegações do indiciamento por que foi declarado culpado,
este tribunal o sentencia a 20 anos de prisão.
Ele era um dos líderes do fortalecimento do ataque alemão
ao mundo civilizado.
Se ele tivesse manifestado qualquer outra atitude,
sua sentença, sem dúvida, teria sido de morte.
Essa foi a atenuante da pena, a disposição de aceitar,
de reconhecer a perversidade do regime
e de admitir o papel importante que teve nele.
Acho que muitos integrantes da acusação,
muitos dos que interrogaram Speer e tiveram contato com ele,
saíram com a sensação de ele ser alguém muito parecido com a gente.
Ele poderia ser o burocrata do escritório.
Ele poderia ser o servidor judiciário, com quem vou almoçar.
E era muito difícil imaginar isso de muitos outros réus.
Sentido!
Fritz Sauckel.
Sauckel foi julgado pelos mesmos crimes que Speer
mas, para ele, a sentença foi a morte.
Lembro-me de que a maior preocupação de Sauckel era ele ter 12 filhos
que ficariam sem pai, caso ele fosse executado.
Ele pegou 20 anos e acho que devia ter sido prisão perpétua, ou a forca,
porque ele era tão culpado quanto os outros.
Realmente, muito tempo após o julgamento,
outras provas viriam implicar mais Speer nos crimes do regime nazista.
Speer cumpriu a pena completa.
Após sua soltura, em 1966,
ele escreveu um livro de sucesso, expondo em detalhe o regime nazista.
Tornou-se uma ''celebridade nazista'',
tendo sido até entrevistado pela Playboy.
Ficou conhecido como ''o nazista que pediu perdão''.
Uma vez, fui visitar Albert Speer, a quem disse:
''Sou jovem, tenho a vida pela frente.
Que conselho me daria
para usar em prol do desenvolvimento da minha carreira?''
Ele pensou um tempo e respondeu:
''Eu diria para trabalhar seu carisma''.
Acho que Speer usou seu carisma com muita eficiência.
Ele convenceu muita gente.
Ele os enganou, tinha razão quanto ao carisma.
Legendas ripadas e sincronizadas por: zecarlos, Grupo Barbanegra - CPTurbo.org