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Avisou no escritório que
pode ser um trabalho longo?
- Podemo ligar para eles.
- Não, tudo bem.
Pode se estender até à noite, dependendo
de como as coisas andarem.
- É uma história estranha.
- Que história?
Bem, parece
que alguém está se passando
por Mohsen Makhmalbaf.
Você o conhece?
- Ele é empresário?
- Não.
- Viro à esquerda aqui?
- Isso.
Ele não é empresário,
é cineasta.
- Você o conhece?
- Não.
"O Ciclista" foi o seu
último trabalho.
Não tenho tempo para ir ao cinema.
Seu rosto não é muito conhecido.
Alguém disse a uma família
que é Mohsen Makhmalbaf.
Não está bem claro
o que ele está fazendo.
E disse a essa família
que poderiam ser atores
e que a casa deles
é o local ideal
para seu próximo filme.
Mas ninguém sabe ao certo
quais são suas intenções.
Eu sou jornalista e vou lá
para cobrir a prisão dele.
- Jornalista?
- Da revista "Soroush".
Pensei que fosse policial.
Não sou.
Um amigo me contou
essa história,
vai dar uma boa matéria.
Vou acompanhar até o fim.
Não é uma matéria comum.
Não é sempre que se consegue
um presente desses.
É uma matéria quente.
Sensacional,
do tipo que vende.
Uma história estilo Oriana.
Conhece Oriana Fallaci?
Não.
Bogdanovich? Edisson?
São colegas jornalistas.
Não são meus clientes.
Eles são jornalistas,
escrevem matérias
sensacionalistas.
Oriana Fallaci escreve
artigos bastante originais.
Ela tem faro para a reportagem.
Ela é mundialmente famosa.
Tenho certeza de que é
uma história estilo Oriana.
Ele deve ter planejado roubá-los.
Roubar as jóias da família.
Vou saber quando ele for preso.
Vou precisar de você o dia todo.
Tudo bem.
Ligue para o seu chefe quando chegar lá.
Eu não trabalho para ele
tempo integral.
Sou piloto de combate aposentado
e agora estou trabalhando em terra.
É engraçado ver um piloto
trabalhando em terra.
Por que alguém da Força Aérea
trabalharia em terra firme?
- Viro à esquerda?
- Sim.
- Para Lavizan?
- É. E depois para a Av. Hosseinabad.
Lavizan é uma área boa.
Morei lá antes da Revolução.
Fui embora quando começou
a agitação
com a ocupação de Lavizan.
Os soldados foram fuzilados,
Nunca mais voltei.
Depois queremos ir
à Av. Javanshir
e à Av. Golzar.
Vou perguntar a alguém.
Vamos ver se esse menino
pode ajudar.
- Onde fica a Av. Javanshir?
- Não sei.
- Ele não sabe.
- Pergunte a um adulto.
Pergunte a esse senhor.
Onde fica a Av. Golzar?
- Eu não sei.
- Fica próximo?
- Não sei. Quer peru?
- Não.
Estamos procurando um
sujeito tipo "camaleão".
Como soube dessa história?
Uma amigo compositor
me ligou e me contou
sobre os eventos
na casa do seu amigo.
É um lugar estranho
para escolher viver.
Onde fica a Av. Golzar?
Siga em frente, vire à esquerda
depois do supermercado.
- Em frente e depois à esquerda?
- Sim.
Obrigado.
Para um repórter, é a matéria perfeita.
É uma história única.
Mal posso esperar para ver
a minha matéria na
primeira página.
Será uma sensação.
Todos na TV e nos jornais
vão falar sobre isso.
Vejamos...
Onde fica a Rua Golzar?
É aqui. Primeira rua.
É essa.
Entro nessa rua?
Sim, é uma rua sem saída.
É estranho que uma história assim
tenha acontecido numa rua sem saída!
Realmente tive muita sorte.
12... 14... 16
É aqui. Que lugar estranho!
- Espere aqui.
- Tudo bem.
- Pois não?
- É o Sr. Farazmand.
Ele pode vê-lo da janela.
Fique no carro até eu chamar.
Diga ao querelante para trazer
a queixa e sua identidade.
- A queixa e a identidade.
- Exato.
A polícia não tem
veículos próprios?
Eles têm.
A conta desse jornalista
vai ficar enorme!
- Quer fumar?
- Não, obrigado.
- De onde você é?
- De lspahan.
Que estranho! Ser de lspahan
e servir em Teerão.
Eu sou de Teerão
e servi lá.
Temos que aceitar
o destino.
- Você também é de lspahan?
- Não, de Borujed.
Na verdade, não sou de lspahan,
mas de uma vila perto de Nain.
- Nain fica perto de Yazf, não é?
- Sim, a minha vila é Jandagh.
- Há quanto tempo saiu de lá?
- Fiquei uma no.
Ainda tenho mais dois anos,
porque não sou casado.
Eu vou para a frente logo.
- Onde?
- Curdistão.
- Perto de Baneh?
- Isso mesmo.
Não demora muito. Então você
poderá voltar para casa e se casar.
Com saúde, o tempo passa rápido.
- E você?
- Eu sou casado.
- Tem filhos?
- Um.
Que Alá o proteja.
- Sr. Abolfazl Ahankhah??
- Sim.
- Ele está armado?
- Acho que não.
Espere. Esqueci a minha maleta.
Ouça, amigo... Se você me
contar a verdade,
farei o possível para ajudá-lo.
Para você, sou apenas
um trapaceiro.
Arrumou algum?
Não tinha ninguém em casa.
Mas preciso de um gravador.
Vá pa a delegacia.
Nos vemos lá.
- Quem vai me pagar?
- Quanto é?
São 350 tomans.
Sr. Ahankhah, pode me
emprestar 200 tomans?
Desculpe por isso.
Nos vemos na delegacia.
Você precisa me arrumar um gravador.
- Não conheço mais ninguém.
- Quero um gravador.
- Pois não?
- Desculpe, foi um engano.
Não estão em casa.
- Sim?
- Aqui é o Sr. Farazmand.
Sou jornalista e amigo de seu
vizinho, o Sr. Ahankhah.
Preciso de um gravador.
Não temos gravador.
Obrigado.
- Sim?
- Aqui é o Sr. Farazmand.
Sou jornalista e amigo de seu
vizinho, o Sr. Ahankhah.
- Preciso de um gravador.
- Não temos gravador.
- Não?
- Não, não temos.
Aqui é o Sr. Farazmand.
- Sr. Farazmand.
- Sim?
Aqui está.
Depois eu devolvo.
CLOSE-UP
Um Filme de Abbas Kiarostami
Baseado em fatos reais
Fazendo os seus próprios papéis:
H Sabzian, H Farazmand
A Ahankhah, M Ahankhah
N M Zanoozi, A M Mohseni
and Mohsen Makhmalbaf
Fotografia:
A R Zarindast
Produção:
A R Zarin
Direção e edição:
Abbas Kiarostami
IMPOSTOR DE MAKHMALBAF
É PRESO
- Quem está no comando?
- O capitão Bashiri.
- Posso falar com ele?
- Vou chamá-lo.
Capitão? Ele quer falar com o senhor.
- Olá, senhor.
- Olá.
Li na Revista Sorush que
um tal Hossein Sabzian
foi preso pelos seus homens.
Sim, nós temos uma cópia da revista.
Gostaria de ver?
Barati, traga a revista.
Eu li o artigo,
mas poderia me dar mais
informações sobre o caso?
Eu não me lembro agora,
foi há duas semanas.
Estamos muito ocupados,
como pode ver.
Poderia me dar...
o endereço da casa onde aconteceu?
Tenho de ver na ficha.
Barati, traga a ficha, por favor.
- Aconteceu há 15 dias?
- É, uns 15 dias.
A reportagem foi publicada recentemente.
Uma semana depois do acontecido.
- Ele ficou preso aqui?
- Durante alguns dias.
Que tipo de homem ele é?
Ele disse que era bastante religioso.
Você participou da prisão dele?
Participei.
- Ele resistiu à prisão?
- Não. Ele se entregou sem resistir.
- Que tipo de homem ele é?
- Rendeu-se pacificamente.
- Como?
- Ele não se opôs.
- Que tipo de homem ele é?
- Não é do tipo que faz essas coisas.
Como assim?
Não parece o tipo de homem
que comete fraudes.
- Não parece?
- Não mesmo.
Gostaria que me desse
o endereço do Sr. Ahankhah.
Você parece saber muito sobre
o assunto. O endereço é...
Vou tomar nota.
Primeira Avenida, n. 16,
com a Avenida Golzar, em Lavizan.
Sr. Kiarostami, até agora,
os envolvidos neste caso
tentaram apresentá-lo sob
um prisma que os beneficiasse.
O Sr. Farazmand afirmou na revista
"Sorush" que a verdade não teria vindo
à tona se não fosse por ele.
Isso não é verdade.
Eu sabia exatamente o que estava
acontecendo, e a situação
estava sob controle.
Eu entrei no jogo. Foi uma lição
para os meus filhos.
Agora você veio com
uma versão diferente
e me confundiu.
A reportagem não conta
a história toda.
Em que sentido?
O artigo nos descreve como ingênuos,
o que não é verdade.
O que quer dizer?
Eu gosto de cinema,
mas isso não significa
que eu faria
o que está no artigo.
Fiquei feliz por minha mãe
conhecer o Sr. Makhmalbaf.
Isso é fato.
Achei que conhecê-lo
também poderia ser útil para mim.
Sou formado em Engenharia Civil,
mas não encontrei emprego
na minha área.
E o meu irmão.
engenheiro mecânico, vende pão.
Mehrdad!
Eu pude escolher entre
Artes e vender pão,
então escolhi Artes.
Manuchehr não vende pão,
ele é diretor da padaria,
Isso não é diferente
de vender pão.
Por favor, fale em persa,
eu não entendo.
É verdade, meu irmão
não estudou para vender pão.
Quando você se formou?
Há seis meses.
Tenho certeza de que logo
encontrará um emprego.
Amir, Hossein e Hushang
se formaram há mais de um ano.
Só Amir conseguiu um
emprego durante seis meses.
As fábricas não contratam,
não têm matéria-prima.
Eu vim falar sobre
o Sr. Sabzian.
Pode me falar
alguma coisa sobre ele?
- Onde ele está agora?
- Na prisão.
- Qual?
- De Ghasr.
- É o Sr. Sabzian?
- Sim.
- Detido por...
- Tentativa de Fraude.
Você tem visita.
- Como vai?
- Bem, obrigado.
- Você me conhece?
- Sim.
Li uma reportagem sobre você
e decidi vir visitá-lo.
- Em que revista?
- Sorush.
Aparentemente, você gosta muito
de cinema.
Como diretor de cinema,
queria conversar com você.
- E você é...
- Kiarostami.
Estou surpreso, Sr. Kiarostami.
Vi os seus filmes.
Há algo que eu possa fazer por você?
Poderia fazer um filme sobre
o meu sofrimento.
Não posso prometer nada,
mas gostaria de conversar com você.
O que eles escreveram a meu respeito?
Que sou trapaceiro?
Parece que confessou
a tentativa de fraude.
Sim, confessei.
- Mas não sou trapaceiro.
- Não é?
Por que confessou que era
um trapaceiro?
Porque o que eu fiz
parece uma fraude.
- E é?
- Tenho interesse por cinema.
Há quanto tempo está na prisão?
Não tenho certeza.
- Há umas três semanas.
- Quando é o julgamento?
Eu não sei direito.
Esse caso não interessa
o tribunal.
Vou tentar apressar o julgamento.
Eu agradeceria muito.
Não tenho mais perguntas,
capitão.
Tenho uma mensagem
para o Sr. Makhmalbaf.
Qual é?
Diga que "O Ciclista"
faz parte de mim.
Está bem.
Com licença.
Até logo.
Até logo. Avise se precisar
de alguma coisa.
- Em que cela você está?
- Na 5.
- Precisa de alguma coisa?
- Não.
Viemos na terça-feira
para o caso Sabzian.
Eu não me lembro.
O homem que fingia
ser o Sr. Makhmalbaf.
Tenho pilhas de arquivos.
Não me lembro de
todos os nomes.
Pode ser mais específico?
Eu vim na terça-feira. Você disse
que falaria com Haj Agha
e nos diria sua decisão.
Gostaríamos de filmar
o julgamento.
Isso mesmo.
Agora eu me lembro.
Eu passei para Haj Agha.
Com licença, você estudou
o caso Sabzian?
- O julgamento que quer filmar?
- Isso mesmo.
Sim.
Precisamos de sua permissão
para filmar.
Gostaríamos que a data
do julgamento fosse adiantada.
Está marcado para
o dia 29 de janeiro.
Está marcado para o dia 25.
Por que quer antecipar?
Para que a pressa?
Por causa do cronograma
das filmagens.
Também precisamos
de permissão
para filmar no tribunal.
Não há nada nesse caso
que valha a pena filmar.
- Você estudou o caso?
- Estudei.
Esse caso nos interessa
por conta da relação que tem
com o cinema.
Você tem casos mais interessantes?
Temos casos com acusações
mais graves.
Esse é um caso de
fraude insignificante.
O que ele fez foi receber 1.900
tomans do Sr. Ahankhah,
aparentemente para
pegar um táxi.
E também se fez passar
pelo Sr. Makhmalbaf.
Vai nos dar permissão
para filmar no tribunal?
Só se as autoridades
permitirem.
- Para quem pedimos?
- O Ministério da Justiça.
Se eles concordarem,
eu concordo.
- Teremos seu consentimento?
- Sim.
Cena 1, tomada 1:
Tribunal de Justiça.
Sr. Sabzian, está lembrado de mim?
Lembra-se de onde nos conhecemos?
Nós nos conhecemos na
prisão de Ghasr.
Gostaríamos de filmar
o julgamento.
Está de acordo?
Estou.
Vocês são a minha platéia.
- Quem?
- Vocês.
Por que diz isso?
- Por causa de meu interesse.
- Em quê?
Na arte.
Na arte... O cinema.
Nós temos duas câmeras.
Temos uma câmera fazendo close-up.
- Sabe o que é?
- Sei.
- A outra com lente de zoom.
- Essa eu não conheço.
- Tem lente de zoom.
- Certo.
Esta, com abertura angular, filmará
o local durante o julgamento.
Esta é só para nós. Não tem
a ver com o julgamento.
Quando nos conhecemos na prisão,
você me disse que confessou.
Mas essas coisas são mais complicadas,
e nem todos entendem.
Esta câmera está aqui para que
você explique certas coisas
que as pessoas acham
difíceis de entender.
Eles vão começar com a
leitura das acusações.
Se algo lhe parecer inaceitável,
de um ponto de vista legal,
olhe para essa câmera se
quiser explicar alguma coisa.
OK.
- Está pronto?
- Sim, Excelência.
Em nome de Deus.
O acusado é o Sr.
Hossein Sabzian.
Quem são os querelantes?
Sr. Ahankhah, Sr. Mohseni
e Mehrdad Ahankhah.
- Três querelantes?
- Sim.
Antes de prosseguirmos,
convido as partes
para que resolvam suas
diferenças de forma amigável.
Se os querelantes não
quiserem
retirar a queixa,
começaremos o julgamento.
Como chefe de família,
não estou em posição
de retirar a queixa.
Pedi ao meu filho Mehrdad
para falar em nosso nome.
Muito bem.
Vamos começar.
Sr. Ahankhah, poderia nos contar
o seu lado da história?
O Sr. Hossein Sabzian
abordou nossa família,
fazendo-se passar pelo
Sr. Makhmalbaf,
com a clara intenção de,
na melhor das hipóteses,
cometer fraude,
e, na pior, de nos
aplicar um golpe.
Ele só não conseguiu ir adiante
e posteriormente foi preso
porque meu pai está sempre
em alerta.
O CICLISTA
Com licença, onde conseguiu
esse livro?
Onde comprou esse livro?
Em uma livraria.
Qual livraria?
Quero comprar um.
Pode ficar com ele.
Obrigada, mas eu quero comprá-lo.
É seu.
Fui eu que escrevi.
- O senhor é escritor?
- Sim.
- É o Sr. Makhmalbaf?
- Sim.
- Prazer em conhecê-lo.
Foi muita gentileza.
Quer que eu autografe?
- Obrigada.
- De nada.
Fico surpresa em ver que
usa transporte público.
Isso a surpreende?
Diretores famosos
geralmente têm carros.
Eles não andam de ônibus.
Eu geralmente pego ônibus
para procurar assuntos interessantes.
Assistiu a algum filme meu?
Sim, e todos gostamos muito.
- Assistiu só uma vez?
- É.
Mas deve assistir várias vezes
para entendê-lo realmente.
Os meus filhos
ficaram mais interessados.
Eles se interessaram?
Sim, meus dois filhos.
- Ambos são engenheiros.
- Qual ficou mais interessado?
O mais jovem ficou
mais entusiasmado.
- Ele viu o filme?
- Sim, assistimos juntos.
- O que ele achou?
- Ele gostou.
- Ele fez alguma pergunta?
- Não, nenhuma.
O que ele faz?
São engenheiros. O mais velho
é engenheiro mecânico.
Este trabalha em uma fábrica
de pão em Mazandaran.
O mais novo fez Engenharia
de Desenvolvimento.
Mas ainda não tem emprego.
Ele trabalha em uma empresa de
computação. Na área dele.
A minha filha acabou de fazer
o vestibular.
Ah, então é sua filha?
Acabou de fazer o ensino médio.
Quais os verdadeiros interesses
do seu filho caçula?
Ele se interessa por
arte e literatura.
Ele já escreveu algum roteiro?
Bem, ele escreveu um roteiro.
- Ele se interessa por cinema?
- Sim, se interessa.
- E design?
- É a especialidade dele.
Então se interessa por arte?
Sim, muito.
Eles ficarão felizes quando souberem
que nos conhecemos.
Eles podem entrar em contato
comigo, se quiserem.
Qual é o seu endereço?
Está no livro.
E o meu telefone também.
Obrigada. Vou dizer a eles.
Pode me dar seu telefone
para eu ligar para eles?
Tenho papel aqui.
Eu tenho uma caneta.
- Aqui está sua caneta.
- Obrigado.
Não escreveu o nome.
Qual é seu sobrenome?
Ahankhah.
Pare, por favor.
Eu quero descer.
- Vai descer?
- Com licença.
- Espero encontrá-lo novamente.
- Obrigado.
O que quer dizer exatamente
com "fraude"?
O que ele fez exatamente?
Ele apresentou-se como sendo
o Sr. Makhmalbaf, o cineasta.
Ele olhou toda a nossa casa,
o que lhe permitiu coletar
as informações necessárias
para nos roubar.
Sr. Hossein Sabzian,
é acusado de fraude
e de ter planejado outros golpes.
Pode se defender em relação
a essas acusações.
Reconhece as acusações?
Se reconhece, explique como
pretendia cometer o crime.
Quanto ao roubo...
Não foi acusado de roubo.
É acusado de fraude
e tentativa de fraude.
Eu nunca tive a intenção
de fraudar ninguém.
Legalmente, pode ser
uma acusação apropriada,
mas, moralmente,
não é.
Tudo isso começou com
o meu amor pela arte.
Quando criança, eu sempre ia
ao cinema com os meus amigos.
E brincava de fazer filmes.
Porém, eu não tinha
recursos financeiros
e reprimi meu interesse pela arte.
Aquilo se tornou uma obsessão.
Entretanto, um trapaceiro normalmente
se prepara para aplicar seus golpes.
Cria um disfarce. Aparece com um
carro emprestado, carregando uma mala
para parecer convincente.
Eu nunca fiz isso.
Nunca foi minha intenção.
Qual foi o motivo para
se passar pelo Sr. Makhmalbaf?
Revele à corte.
Eu o admiro, porque ele...
retrata o sofrimento em seus filmes.
Seus filmes falam a pessoas como eu,
principalmente "Feridas de
um Casamento".
Assim como do Sr Kiarostami
fez em "O Viajante".
Eu sou como o menino do filme
que finge fotografar as pessoas,
a despeito de não ter filme na câmera,
para conseguir dinheiro para ir a
Teerã assistir a um jogo de futebol.
Mas ele dorme e perde o jogo.
E é como me sinto. Também tenho
a sensaçãp de ter perdido o jogo.
Sei que as minhas ações não podem
ser justificadas legalmente,
mas o meu amor pela arte deve
ser levado em consideração.
Não respondeu à minha pergunta.
Por que fingiu ser o Sr. Makhmalbaf
se não pretendia cometer fraude?
Não chama isso de fraude?
Queria ser como ele.
Gostei de interpretar o papel.
Um dos querelantes afirma
que o acusado
recebeu 1.900 tomans dele.
Fale sobre isso.
Quando ele saiu de nossa casa,
após a primeira visita,
ele viu minha moto.
Ele perguntou se a moto era minha.
Ele me pediu uma carona até
sua casa.
Eu concordei.
Quando saímos...
ele disse que se algo acontecesse a ele,
seus admiradores e a equipe
se vingariam vindo à nossa casa
e saqueando-nos.
Nós rimos e fomos embora.
No caminho...
ele me respondia como se
fose Makhmalbaf.
Ele falou sobre os filmes
e o trabalho de diretor.
Eu lhe fiz diversas perguntas,
as quais respondeu,
por vezes de maneira inteligente,
por outras de forma vaga e evasiva.
Eu achei que, por ser um cineasta,
não queria comentar sobre tudo.
Então ele disse ter uma idéia
interessante para um filme.
Ele disse que eram duas pessoas
em uma moto,
e uma perdia a certeira.
Perguntei se isso tinha
acontecido com ele.
Afirmou que realmente
havia perdido a carteira.
Quando saiu, ele disse
que precisava de dinheiro.
Eu pensei que, para chegar em casa,
ele precisaria de 50 ou 100 tomans.
Mas ele disse que precisava de algo
que custava 1500 tomans.
Quando eu lhe dei o dinheiro,
ele disse que precisava de mais 500,
que 2.000 seria perfeito.
Eu acabei ficando com apenas 50...
porque precisava de algum dinheiro.
E lhe dei o resto.
Pôs o dinheiro em seu bolso.
Então disse que o roteiro
que tinha em mente terminava
assim mesmo.
Dos dois sujeitos na moto,
o que tinha dinheiro
esprestava ao outro que tinha
perdido a carteira.
E isso seria o início de uma
grande amizade entre eles.
Eu fiquei realmente encantado
em conhecer um diretor
humilde o bastante para me
pedir dinheiro emprestado.
- Você recebeu 1.900 tomans?
- Recebi.
Precisava do dinheiro ou...
queria testar a generosidade dele?
Precisava de dinheiro.
Acha que a necessidade de
dinheiro justifica sua ação?
Não.
Com a permissão do tribunal, poderia
falar da sua atitude em relação a isso
e falar o porquê de se passar
pelo Sr. Makhmalbaf.
Ser o Sr. Makhmalbaf
era muito difícil.
Por quê?
A idéia foi sua.
Era difícil para eu
assumir sua identidade.
Não tinha certeza de que seria
aceito como essa pessoa.
- Que pessoa?
- Makhmalbaf.
Era difícil interpretar o papel
de um diretor.
Mas adquiri confiança
em mim mesmo.
E com essa interpretação
ganhei o respeito deles.
- Respeito de quem?
- Dos membros da família.
Eles faziam tudo o que eu dizia.
Por exemplo, se eu dissesse
para moverem um armário
de determinado lugar, eles faziam.
Eles faziam tudo o que eu pedia.
Antes disso, ninguém havia
aceitado minhas opiniões.
As pessoas não queriam me obedecer.
Mas naquela casa, agindo
como uma pessoa famosa,
fiz com que todos me obedecessem.
Quando saí daquela casa
e aceitei o dinheiro
para comprar algo para o meu filho
e comprar uma passagem para
voltar para casa, eu me dei conta
de que eu ainda era um pobre
que não tinha como sustentar a família.
Tinha de continuar aceitando meu
destino de ser uma pessoa sem recursos.
Por isso que, quando acordei
no dia seguinte,
ainda desempregado,
quis voltar lá e continuar
desempenhando o personagem.
Era difícil continuar agindo assim.
Era difícil fingir que era
uma outra pessoas.
Mas, mesmo assim, queria fazê-lo por
causa do amor que tenho pelo cinema.
E porque, como cineasta,
eles me respeitavam.
Além disso, me davam apoio moral.
E por isso me envolvi no personagem.
Eu o representei com a maior seriedade,
tanto foi que acreditei que era de fato
um diretor de cinema. Comecei a
acreditar nisso.
Nesse momento, o que eu fazia
não era mais representação.
Eu me transformei naquela pessoa.
Mas quando eu saía de lá
e voltava para casa todos os dias,
eu tinha de esconder
aquele personagem.
O dinheiro facilitaria
na interpretação de seu papel?
Um diretor de cinema não pode ser pobre.
Ele tem de ter dinheiro.
Não pode ser tão pobre
a ponto de não poder
dar à família
as condições de viver com dignidade.
É por isso que foi difícil para mim
continuar com o meu papel
de diretor nos dias seguintes.
Por outro lado,
eles confiavam em mim,
e isso me deu confiança.
O dinheiro que lhe emprestaram
também lhe deu confiança?
Sim. Quando ele me emprestou
o dinheiro,
eu me dei conta
de que ele estava convencido de que
eu realmente era um diretor.
Você não pretendia devolver?
Pretendia, mas...
Eu não via como poderia fazer isso.
Além disso...
eu tinha gostado de interpretar, e ele
queria tanto participar de um filme,
que eu gostaria muito de ter
condições de conseguir isso.
Começamos a ter dúvidas
na quinta-feira seguinte.
Ele insistiu que todos assistíssemos
ao filme "O Ciclista".
Ele disse que o filme serviria
de ponto de partida
para o nosso filme
"A Casa da Aranha".
"O Ciclista" estava passando em dois
cinemas. Um era perto de nossa casa.
Mas ele queria que fôssemos
ao cinema que ficava longe.
Ele disse que aquela
era uma versão menos censurada.
E que tínhamos de ver essa versão.
E foi isso uma das coisas
que nos deixou intrigados.
Quando dissemos
que não tínhamos carro,
ele disse que não importava.
Disse que chamaria um taxi.
Depois pediu a um conhecido nosso
o carro emprestado
para nos levar ao cinema.
Ele disse que não viria conosco
porque seus fãs nos
incomodariam no cinema.
Sr. Sabzian, escutou o que ele disse?
O rancor é um véu que oculta a arte.
O quê?
O rancor é um véu que oculta a arte.
Eu gostaria de perguntar
ao Sr. Ahankhah,
que me acusa de querer
roubar sua casa...
Não está sendo acusado disso.
Ele mencionou isso de passagem.
Não está na sua ficha.
Então, esqueça.
Eles disseram que você
fazia parte de uma quadrilha
que estava planejando
um assalto a casa deles.
Isso não é verdade!
Eu nego veementemente.
Acreditam que só queria
que eles saíssem da casa
para que seus cúmplices
roubassem os bens deles.
- Foi essa a sua intenção?
- Não. Eu nego.
Mesmo assim, admite que queria
se apropriar do nome de Makhmalbaf?
Admito.
Como ele explicou,
e você confirmou,
ele não pretendia roubar nada.
Mas não está claro
por que ele queria
que a família inteira fosse ao cinema.
Eu gostaria que ele explicasse
quais os motivos para isso.
Eu queria que eles
assistissem ao filme
para adquirirem
maior interesse pelo cinema
e me respeitarem mais
como diretor.
Eu queria que eles me vissem
como um diretor que conhece
o sofrimento e dificuldades das pessoas.
Um diretor humilde o bastante
para se misturar ao povo.
Eu queria que eles se esquecessem
da idéia de que um diretor de cinema
é diferente das outras pessoas.
Um diretor deve ter humildade.
Eu queria que eles vissem
que um verdadeiro artista
se aproxima do povo
e está preparado para
ir ao cinema com eles.
Mas, como não aceitaram
a minha proposta,
eu sugeri que fossem sozinhos.
Eu fui de ônibus.
Quando cheguei ao cinema,
vi que já estavam lá.
Eles não me viram.
Eu fui falar com eles e disse.
que esperei muito tempo por eles.
Eles me perguntaram como
cheguei lá,
e eu disse que tive cuidado
para não ser reconhecido,
pois as pessoas viriam me cercar,
para pedir autógrafos
ou simplesmente conversar comigo.
O que você teria feito se outra
pessoa pensasse que era Makhmalbaf?
Fora do cinema
eu tentei não chamar atenção.
Não iria com as pessoas e tentaria
ser Makhmalbaf por alguns dias?
Acho que sim.
Quanto tempo depois de ter
visitado sua casa ele foi preso?
Quando ele nos deixou
na terça-feira,
ele disse que gostava de mim
e queria que eu interpretasse
o papel principal
no seu próximo filme.
Ele disse que voltaria para
conversar conosco.
Ele disse que viria almoçar
conosco na quinta-feira.
Ele disse que gostava muito de sopa.
Quanto tempo depois de ter
conhecido vocês e foi preso?
E quais foram as circunstâncias?
Ele nos ligou 3 vezes em 4 dias.
Na terça, na quinta
e no sábado.
Descreva as circunstâncias
que levaram à prisão.
Para dizer a verdade, o meu pai
suspeitou dele desde o início.
Ele conversou com o Sr. Mohseni,
e as características
conferiam com as do Sr. Sabzian.
Sr. Mohseni, estava acompanhando
tudo desde o início.
Tudo o que aconteceu,
ocorreu de forma como eu previ.
Mas Mehrdad disse
que não havia motivos
para suspeitar dele.
Felizmente, algo aconteceu
que o convenceu de que ele
não era Makhmalbaf.
Ontem o tal Makhmalbaf
veio ensaiar as crianças.
Mehrdad chegou com o jornal.
Ele disse: "Parabéns,
Sr. Makhmalbaf!"
Ele ficou confuso, sem saber
o que dizer.
O jornal dizia que "O Ciclista"
havia sido premiado
no Festival de Rimini.
Parecia que ele
não sabia nada a respeito.
Ele se saiu dessa
dizendo que a premiação
foi para a música do filme.
- Referia-se ao prêmio dado em Fajr.
- Provalvemente.
Eles continuaram o ensaio,
mas Mehrdad estava convencido
de que não era Makhmalbaf.
Às vezes,
os diretores não sabem
imediatamente que são premiados.
O jornal dizia que o Sr. Makhmalbaf
havia enviado um telegrama
ao festival,
então, ele tinha que saber do prêmio.
Depois do ensaio,
nós fomos ao cinema.
Depois, ele disse que gostaria
de passar a noite na nossa casa.
Então ele dormiu lá em casa.
Na manhã seguinte,
por volta das 6h,
eu o ouvi conversando
com Mehrdad.
Ele disse que gostaria
de ir para as montanhas.
Mehrdad tinha certeza
de que ele não voltaria,
e mesmo assim emprestou a ele seu
casaco, para que não se resfriasse.
Não esperávamos vê-lo de novo,
mas, felizmente...
ou infelizmente,
ele ligou há meia hora
e pediu a Mehrdad que o buscasse
na Praça Hosseinabad.
Eles vão prendê-lo
a qualquer momento.
Como eu disse,
o meu amigo Farazmand
conhece muitos artistas.
Espero que esse homem
seja Makhmalbaf.
Com licença. Parece que chegaram.
- Olá, tudo bem?
- Bem, obrigado.
- Meu amigo, Sr. Mohseni.
- Prazer em conhecê-lo.
Sente-se.
- Como vai?
- Bem, obrigado.
Espero que tenha dormido bem.
Eu não dormi.
- Não.
- Não consegui dormir.
Sinto muito se nossa casa
é desconfortável.
As pessoas normalmente
não dormem bem fora de casa.
Mas um sábio se sente
em casa em qualquer lugar.
Eu não sou um sábio.
Parece um sábio, todavia.
As aparência enganam.
Sr. Makhmalbaf, já comeu?
Eu tomei um bom
café da manhã,
mas posso acompanhá-los.
Nos fins de semana,
as crianças dormem até tarde,
e nós só almoçamos.
Posso lhe fazer uma omelete.
Na verdade, estou sem fome.
Sábio ou não, podemos
lhe oferecer uma omelete.
Tudo bem.
Prepare uma omelete.
Vai muito às montanhas,
Sr. Makhmalbaf?
Às vezes.
Mas esta manhã,
quando vi as montanhas,
senti a necessidade de me
aproximar da natureza.
A proximidade com a natureza
separa o nosso coração
da ansiedade que nos cerca.
As pessoas precisam conviver
com a natureza...
"Perguntei à musa
por que ela estava escondida.
Ela disse: 'É você
quem está escondido'."
Somos escravos da máscara
que esconde nosso verdadeiro rosto.
Se nos libertarmos dela,
a beleza da verdade será nossa.
Esta manhã eu queria ir às
montanhas para me estudar.
A natureza é um espelho
que reflete a nós mesmos.
Se gosta tanto da natureza,
deveria levar uma vida natural.
Mehrdad, você não parece
estar pronto para o ensaio.
Estou esperando os outros.
Está me fazendo perder tempo.
Como a sua refeição.
Você não me acha natural?
Não foi o que eu quis dizer.
Eu quis dizer que a maioria das
pessoas descansa às sextas-feiras.
Quando há trabalho,
não importa o dia.
Temos pouco tempo.
É por isso que dou prioridade
ao meu trabalho.
Nunca sabemos o que está por vir.
Não sabemos o que nos espera.
Não podemos prever
nem o futuro imediato.
É por isso que temos que
aproveitar as oportunidades.
É o que estou fazendo.
Raramente temos oportunidade
de trabalhar.
Não podemos descansar
quando queremos.
É por isso que não paro
nem sendo sexta ou feriado.
Eu adoro o meu trabalho e, por isso,
tenho de terminá-lo antes de descansar.
Existem vários dias
que não podemos trabalhar.
Estou preparado para
trabalhar dia e noite,
desde que os rapazes mantenham
o entusiasmo.
Acho que o interesse deles
está diminuindo,
mas não sei o porquê.
Mehrdad estava indo muito bem,
mas parece desmotivado agora.
Quem sabe?
Realmente eu não sei.
Se ele tivesse continuado
como estava no início,
eu teria trabalhado dia e noite.
Isso eu garanto.
Não seria problema.
Pois não, entre.
- É o Sr. Farazmand.
- Com licença.
- Como vai?
- Bem, obrigado.
Espero não estar atrapalhando.
De jeito nenhum.
- Esse é o Sr. Mohseni.
- Tudo bem?
- Sr. Makhmalbaf.
- Prazer.
Sente-se.
Como vai, Sr. Ahankhah?
Espero não estar atrapalhando.
- Podemos conversar?
- Claro.
Podemos começar os ensaios?
Só um minuto.
Preciso de um gravador.
O Sr. Farazmand
precisa de um gravador.
- Esse não. Preciso de um portátil.
- Portátil nós não temos.
- E os vizinhos?
- Vou perguntar a eles.
Espere ele terminar a refeição.
- Não deixe que o levem daqui.
- Ele volta, não se preocupe.
É o seu primeiro delito
ou já cometeu outros antes?
Sim, é o primeiro.
Dou minha palavra.
- Mas eles disseram...
- Que me pareço com Makhmalbaf.
- Então houve outras vezes.
- As pessoas achavam que eu era ele,
e nunca fiz nada para
que pensassem o contrário.
Você se arrepende do que fez?
Sim. Eu sei que a justiça
tem de ser feita,
mas eu me arrependo de brincar
com os sentimentos deles.
E é só disso que tenho
de me envergonhar.
Nunca tive a menor intenção
de roubar nada deles.
Estou arrependido pelo que fiz, mas
não pelo tempo que passei na prisão.
A prisão não funciona para a gente de
bem, mas é péssima para os do mau.
Ela poderá corrigir os do bem,
mas os do mau pioram. Arrependo-me.
- Já esteve preso antes?
- Nunca.
- O que você faz?
- Trabalhava com estamparia.
Explique por que examinou
todos os quartos da casa.
O que tinha em mente?
Eu estava interpretando
o papel de diretor.
Eu disse que ia filmar desse
ou daquele ângulo.
Você já trabalhou em filmes?
Não.
Mas já li livros sobre o assunto.
Roteiros e livros sobre como
dirigir filmes.
Eu simulei como se ensaiam as cenas.
E também lhes pedi
que cortassem as árvores.
Eu disse que, para
as cenas do jardim,
as árvores fariam sombra na casa,
e a fachada não ficaria muito bem.
Aí o Sr. Ahankhah concordou
em cortá-las.
Eu disse que seria uma pena cortar as
árvores e que usaríamos outros ângulos.
A idéia de filmar na casa
foi sua ou deles?
Quem sugeriu que fosse
filmado assim?
Fui eu, mas eles gostaram.
Você ia pedir dinheiro
para a produção?
- Para produzir o filme?
- Sim.
Eu apresentei a eles um projeto
para fazer o filme.
Se tivesse dinheiro,
eu teria feito.
Achei que eles queriam se envolver
no projeto de um filme.
Nunca achei que terminaria
da forma como terminou.
Ele se arrepende sos seus erros.
Gostaria de perguntar aos querelantes
se eles concordam em perdoá-lo.
É claro que o crime tem
que ser punido pela lei,
mas o perdão deles pode
ser levado em consideração.
Eu o teria perdoado
se ele tivesse sido honesto.
Mas tenho a impressão de que
ainda está representando.
Ele ainda está
interpretando um papel,
ainda que um pouco diferente.
Em vez de Makhmalbaf,
ele está representando
para que tenham pena dele.
Gostaria que o Sr. Farazmand
nos falasse
sobre as pessoas que ele contactou
conectadas a esse homem.
Vocês têm novas evidências?
Sim, eu acompanhei o caso.
Qual foi o título de seu artigo?
"Impostor de Makhmalbaf é Preso".
Impostor de Makhmalbaf?
Depois da publicação, diversas
pessoas me ligaram.
Uma delas foi uma mulher
que não consegui mais localizar.
Ela disse que um homem
que dizia ser Makhmalbaf
prometeu a ela que lhe daria
um papel num filme.
Ele prometeu até se casar com ela.
Ela queria dar queixa e processá-lo.
Eu disse a ela que fosse até a revista,
ou que viesse ao tribunal,
mas ela se recusou.
Recebi também o telefonema
de uma estamparia.
Disseram que o réu foi acusado
de má administração.
Não detalharam, mas era algo como
receber carregamentos e não pagar.
Fale, Sr. Sabzian.
Em relação ao telefonema
da mulher...
Como está solteiro, poderia ter
prometido casar-se com ela.
Eu nego e estou pronto
para confrontá-la.
Eu trabalhei de vendedor
em uma empresa.
Pegava amostras de produtos
da empresa
e as levava comigo em visitas
a possíveis clientes.
Normalmente, tinha pouco
dinheiro comigo.
E, freqüentemente,
passava o dia sem almoçar.
No dia em que conheci a Sra.
Ahankhah, também estava com fome.
Quando ela me confundiu com
o Sr. Makhmalbaf,
pensei que talvez pudesse
ir comer na sua casa.
Só foi por causa da refeição.
E gostaria de incluir
um fato importante.
Naquele dia em que fui preso,
tinha escrito o endereço
do Sr. Ahankhah
no meu caderno, e ao lado escrevi
"A Última Tragédia".
- Você sabia...
- Eu senti.
Senti que o fim estava
próximo e escrevi
sobre o meu trágico fim.
Li minhas anotações na delegacia
sabendo que seria prese
por causa do dinheiro
e porque tinha passado
a noite lá.
Mas não conseguia deixar
de voltar àquela casa.
- Por quê?
- Adorava ficar naquela casa
e gostava de interpretar Makhmalbaf.
Gostava de despertar o respeito
e a admiração deles.
Levantava a minha moral.
Eu precisava daquilo.
E também achei que eles
me dariam suporte financeiro.
Me sentia deprimido toda vez
que ia embora da casa deles.
Eu me senti mal.
Mas mesmo assim resolvi ir.
Quando cheguei lá naquele dia fatídico,
sabia que seria preso.
Quando liguei para Mehrdad
e pedi que me apanhasse
na Praça Hosseinabad,
eu sabia que iam me pegar.
Quando Mehrdad chegou,
ficou surpreso
de me ver esperando,
o que confirmou as minhas suspeitas.
Eu fiz diversas anotações em minha
caderneta e tenho certeza de que
eles leram na delegacia de polícia.
- Onde está o caderno?
- Eu rasguei a página.
Também rasguei o endereço
do Sr. Ahankhah. Era o fim.
Quando se deu conta
de que tinha sido descoberto?
Na noite anterior, quando eu estava lá.
Mas me dei conta disso aos poucos.
Naquela noite com eles, percebi que
haviam comprado uma revista de cinema.
Dentro dela havia uma foto
de Makhmalbaf.
Ele estava dirigindo uma
atriz, Roya Nonahali,
em uma cena de um filme dele chamado
"Feridas de um Casamento".
Eu senti que tinham
comprado a revista
por causa da foto.
Eles queriam ver
a minha reação.
Eles me mostraram a foto
e disseram: "você era bem
mais bonito
"quando era jovem, Sr. Makhmalbaf".
Olhei para as fotos e respondi
que era bem mais jovem naquela época.
Naquele instante, senti
que estavam desconfiados.
Mas achei que não soubessem
que eu não era Makhmalbaf.
Até onde ia levar isso?
Até onde eles
estivessem dispostos a ir.
Quando ele veio à nossa casa
na quinta-feira,
tinha cabelo branco.
Na foto, o cabelo
de Makhmalbaf era preto.
Eu não lhe perguntei sobre isso,
mas ele disse que seu cabelo era preto,
mas estava ficando branco.
Quando voltou no sábado,
tinha pintado o cabelo.
Como ele explica isso?
A minha mãe, que está aqui,
pode confirmar que eu pintei o cabelo
muito antes desse episódio.
Foi na noite em que meu cunhado
nos visitou. Eu queria
parecer mais jovem.
Mais jovem?
Eu pinto o cabelo
há já bastante tempo,
mas não pelos motivos
sugeridos aqui.
- Você é casado?
- Sim, sou.
- Tem família?
- Na verdade, me divorciei.
Por quê?
Eu era pobre e não tinha trabalho.
- Tem filhos?
- Sim. Dois
- Onde estão?
- Um com a mãe e um comigo.
- Quem cuida dele?
- A minha mãe.
- Onde está sua mãe?
- Mora perto de Mamazan.
- Me refiro aqui no tribunal.
- Está sentada atrás, com véu preto.
- É a mãe do Sr. Sabzian?
- Sim, sou.
Sabe por que ele se divorciou?
- Por quê?
- Ele trabalhava em uma estamparia.
Não era fixo. Está sempre sem trabalho.
Nossa casa é pequena. Depois que casou,
tinham um quarto para eles.
Viveram juntos por 7 anos. Depois disso,
sua esposa começou a reclamar
que não havia futuro
para ela na nossa casa.
Ele disse que,
se ela não estava feliz,
o melhor seria se divorciar.
Eles concordaram que ela ficaria com
um filho e eu com o outro.
Quando ele tem trabalho,
sustenta a família como pode.
Ele nunca havia se metido em problemas.
Por que não tenta arranjar
uma fiança para ele/
Eu falei com o delegado.
Também pedi para ver o Sr. Ahankhah.
Mas disseram que iam cuidar de tudo.
Sempre que fico triste na prisão,
eu penso no verso do Alcorão que diz:
"Lembrar-se de Deus é o melhor
consolo para um coração sofrido."
Eu sinto a necessidade, quando estou
deprimido ou cheio de preocupações,
de expressar a angústia da minha alma,
todas as minhas aflições,
que ninguém quer ouvir.
Então, quando encontro
um homem bom,
que mostra todos os meus sofrimentos
nos seus filmes, me dá vontade
de assistí-los repetidamente.
Um homem com a coragem
de retratar pessoas
que brincam com a vida dos outros,
os ricos indiferentes às
necessidades básicas dos pobres.
Que são, basicamente,
necessidades econômicas.
Foi por isso que esse livro
me trouxe consolo.
Ele fala de coisas que eu
teria gostado de expressar.
Depois de interpretar esse papel,
você acha que é melhor
ator do que diretor?
Não cabe a mim responder isso.
Acredito que prefira ser ator.
Acho que poderia expressar
todas as experiências ruins que tive
e todo sofrimento que
senti dentro de mim.
Eu gosto de pensar que poderia
espressar esses sentimentos
através da representação.
E não está representado
para a câmera agora?
O que está fazendo agora?
Eu estou falando do meu sofrimento.
Isso não é representação.
Estou falando do fundo do meu coração.
Para mim, a arte
é a extensão do que
você realmente sente.
Essa também era a visão de Tolstoy.
Segundo ele, a arte é uma experiência
sentimental do artista que ele
compartilha com os outros.
Acho que a minha experiência de miséria
e sofrimento pode me dar a base
de que preciso
para ser um bom ator.
Assim, eu interpreto bem e expresso
a minha realidade interior.
Por que fingir ser um diretor
em vez de se tornar ator?
Interpretar o papel de diretor
é uma representação.
Para mim, isso é atuar.
- Que papel você gostaria de interpretar?
- O meu mesmo.
Está interpretando o seu próprio papel.
Sr. Sabzian, já ouviu
as acusações que lhe foram feitas.
Diga o que acha
que pode ajudar no seu caso.
Peço à respeitável família
do Sr. Ahankhah que me perdoe.
Não peço que me isentem
de uma sentença merecida.
Preciso que me perdoem
para aliviar a minha consciência.
Peço ao tribunal que me perdoe,
se for possível.
Promete que nunca mais fará isso?
Sim, prometo.
- O acusado...
Por favor, perdoem-no.
Sente-se.
Meu filho é um descendente do Profeta.
Em nome dele...
por favor, perdoem ao meu filho.
Em consideração a sua jovem idade,
ao fato de que tem uma família
para sustentar,
como não há antecedentes
criminais
e prometeu nunca mais fazer isso,
peço aos querelantes
que o perdoem, se possível.
Mas, como eu disse antes,
o perdão só pode ser considerado
em circunstâncias extenuantes.
É esse o caso?
Estou disposto
a retirar a queixa na
esperança de que o Sr. Sabzian
possa se tornar um membro
útil à sociedade.
Agora sei que ele está arrependido.
Se o meu filho Mehrdad concordar,
eu retiro a queixa.
Suas ações são resultantes
do mal social e do desemprego.
Este não é o lugar
para discutirmos isso.
Então, a culpa não é dele.
O desemprego pode levar
à delinqüência.
Tenho certeza de que,
quando for solto,
ele terá uma vida honesta se encontrar
um emprego adequado.
É por isso que eu também
retiro a minha queixa.
Saiu de visão!
Não esperamos no lugar certo.
Não dá para vê-lo.
Não podemos refilmar isso.
- Agora dá para vê-lo.
- Ele está atrás daquele táxi.
- Estou vendo.
- Eu também.
Perdemos o som!
Mas o que houve?
O microfone de lapela
do Sr. Makhmalbaf
está com problemas.
Já está velho e gasto.
Deve estar com o fio solto.
Voltou o som.
Será que vai continuar assim?
Não há o que fazer agora.
É o Sr. Sabzian?
Como vai?
Não chore.
Não há por que chorar.
Quando foi solto?
Olhe para mim.
Quando foi solto?
Olhe para mim.
Vamos.
Por aqui.
Está bem?
- Aonde você quer ir?
- À casa dos Ahankhahs.
Eu o levo.
Você já me viu antes?
- Em um filme.
- Que filme?
Em "Feridas de um Casamento".
Você prefere ser Makhmalbaf
pu Sabzian?
Estou cansado de ser eu mesmo.
Vou buscar a moto.
Segure isso para mim.
Quanto tempo ficou na prisão?
Quando conheceu aquela
mulher no ônibus...
Na sua opinião...
É verdade.
Entendo o que quer dizer.
Gostaria de comprar umas flores?
Veja quanto pode gastar.
Tem o bastante?
Eu lhe empresto.
Não leve flores amarelas.
Escolha outra cor.
É melhor dar vermelhas.
- Quem é?
- É o Sr. Sabzian.
- Quem?
- Sabzian.
Makhmalbaf.
- Pois não?
- Aqui é o Makhmalbaf.
- Olá, Sr. Makhmalbaf.
- Tudo bem?
Que dia é hoje, Hossein?
Dia 3.
Quando veio aqui pela primeira vez?
Há 40 dias.
- Olá, como vai?
- Olá! Prazer em conhecê-lo.
- Conhece o Sr. Sabzian.
- Sim, claro.
Por favor, me perdoe.
O Sr. Sabzian realmente mudou.
Considere-o agora uma outra pessoa.
Estou certo de que deixará
a todos nós orgulhosos.