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A DAMA OCULTA
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Certo, certo.
Senhoras e senhores, sinto muito.
O trem não vai chegar hoje.
Uma forte tempestade de neve soterrou os trilhos.
Se quiserem um quarto, é bom se registrarem.
- O que ele disse, Charters? - Sei lá.
Senhoras senhores, sinto muito. O trem só chegará amanhã.
Se quiserem ficar no hotel, devem se registrar agora.
Por que não disse logo?
Como vai, Srta. Henderson? Como vão as senhoras?
- É uma honra recebê-las de novo. - É um prazer vê-Io, Boris.
Não mudou nada desde a úItima sexta-feira.
Não fez a barba.
- Está tudo pronto? - Está. Nada foi mudado.
Nem mesmo os lençóis? Vamos, Boris.
Não esperava que viessem tão rápido.
Nós cansamos. Fizemos a úItima parte da viagem de carroça.
Vejo que temos companhia. Este pessoal vai ficar aqui?
- O que houve, Boris? - Foi a 'avelancho'.
- Avalanche, Boris. - É época de muitas avalanches.
A neve cai e tudo desaparece.
Até o trem desapareceu.
Vou para casa amanhã. Quando os trilhos ficarão livres?
Pela manhã. Com sorte, irá para casa.
Como disseram? Há um vento ruim soprando lá fora.
- Não comemos o dia inteiro. - Sirva nosso jantar no quarto.
- Eu poderia comer um boi. - Não dê idéias a ele.
Galinha, Boris. Uma garrafa de champanhe.
Vamos beber bastante esta noite.
Vamos ficar plantados aqui? Que descaramento!
É um país grande. O que esperava?
- Quem eram aquelas mulheres? - Devem ser americanas.
- O todo poderoso dólar! - Vamos ter de esperar aqui.
- Sem o atraso em Budapeste... - Não quero parecer implicante.
Se não tivéssemos esperado o fim do Hino Nacional...
Precisamos demonstrar respeito, Caldicott.
Não sabia que ia demorar vinte minutos.
Nunca achei que a Rapsódia Húngara fosse o hino deles.
- Éramos os únicos de pé. - É verdade.
- Acho que vamos chegar a tempo. - Duvido. O relatório foi péssimo.
Lembra-se? A Inglaterra por um triz.
Isso é sensacionalismo de jornal.
- Já enfrentamos dificuldades. - Parece-me bem complicado.
Mesmo se sairmos bem cedo.
Ainda temos a conexão na Basiléia.
- Vai demorar horas. - É verdade.
Precisamos de ajuda.
Senhor, a que horas sai o trem da Basiléia para Inglaterra?
É mesmo? Ele não fala inglês.
Alex.
Mande refeiçöes e champanhe para a Srta. Henderson.
Exatamente, exatamente. Certo.
Há um trem que sai da Basiléia às 21:20.
21:20... 21:20 em Basiléia são...
Lamento, mas só temos dois quartos de solteiro na frente...
ou um pequeno, de casal, nos fundos.
Ficaremos com o de solteiro.
- Certo, senhor. Aqui está. - Obrigado.
Podia ter perguntado qual eu preferia.
Minha cara, quarto pequeno, num lugar como este?
Não foi tão exigente em Paris, no outono passado.
Foi diferente. Era o auge da temporada.
Eu compreendo isso agora.
Não precisa me lembrar.
Queremos uma suíte com banheira.
- Com chuveiro. - Água quente e fria.
Uma lareira, se tiver.
Lamento, só temos um quarto de empregada.
- De empregada? - O quê?
Sinto, mas o hotel está completamente Iotado.
Impossível! Ainda não nos registramos.
Espera que fiquemos num quarto de empregada?
Não se preocupem. Vou mandar a empregada sair.
Acho bom. O quê? Do que está falando?
Prefiro dormir no trem.
- Lá não tem 'esquecimento'. - Esquecimento?
Quero dizer... esquecimento.
Aquecimento. Não tem aquecimento no trem.
- Vamos ficar com ele. - Um momento. Há uma condição.
Precisam deixar a empregada entrar para trocar de roupa.
Anna!
É uma boa moça e não quero perdê-la.
Estes senhores ficarão no seu quarto. Certo?
É melhor subirmos logo.
Eles têm um humor primitivo, não é?
Pensando bem, situação delicada a da moça.
Pena não haver um para cada um.
- Hein? - Um quarto para cada um.
Eu, Iris Mathilda Henderson...
uma mulher solteira...
renuncio solenemente a meu nome de solteira.
Declaro que na próxima quinta-feira, dia 26...
gozando de plena saúde mental...
aceitarei a grinalda e a flor de laranjeira...
e mudarei meu nome para Sra. Charles Fatheringale.
Será que não dá para ele mudar de nome?
A única coisa que gosto nele é o bigode.
Vocês são duas cínicas. Eu gosto muito dele.
Gosto de coelhos, mas eles têm de ficar do lado de fora.
Ridolph, ajude-me aqui.
- Já leu algo sobre o amor? - É algo que já esteve em moda.
O tapete está estendido na igreja de São Jorge...
na praça de Hanover...
e papai quer ter um brasão no rótulo da geléia.
A Iris e aos dias felizes que ela está deixando para trás.
Ao interesseiro de sangue azul com quem se casará em Londres.
Ao interesseiro de sangue azul!
Não lamento nada. Estive em todos os lugares, fiz de tudo.
Comi caviar em Cannes, pão de lingüiça com rapazes...
joguei bacará com nobres e dardos com camponeses.
O que me resta senão o casamento?
Eu gostaria de saber o que se passa na Inglaterra.
Tente se acalmar, Charters.
Entre!
- Entendeu o que ela disse? - Diga-lhe que isso já é demais.
Não, não mude de roupa aqui.
Lá fora.
- Ela não entende. - Não. Vamos.
- Notícias do mês passado. - Eles não têm telégrafo aqui.
Ficar sem notícias, sem meio de comunicação, em hora de crise.
Londres? Quer falar com o Sr. Celsur?
Um momento. Vou chamá-Io.
Londres!
Vamos, atenda.
Alô? Alô, você em Londres.
Não, não sou o Sr. Celsur.
Meu nome é Charters. Não creio que me conheça.
O quê? Não se preocupe. Foram chamá-Io.
Diga-me, o que está acontecendo na Inglaterra?
Um vendaval? Não está entendendo, senhor.
Refiro-me ao jogo amistoso em Manchester.
De críquete! Críquete! Não sabe?
Está na Inglaterra e não sabe o resultado?
- Ele disse que não sabe. - Não pode ser.
Pode descobrir? Bobagem. Não vai demorar nada.
Está bem, se não quer ajudar, não ajude!
Perder tempo com tal tipo...
Obrigado, garçom.
- Que tal um bife grelhado? - Ótimo.
- Para mim, bem passado. - O meu, mal passado.
Ele gosta de repetir as coisas.
Com licença, ele está tentando explicar que...
por causa do grande número de pessoas, a comida acabou.
Acabou a comida? Que tipo de lugar é esse?
Pöem-nos no cubículo da empregada de estômago vazio?
Isso é hospitalidade? Isso é organização?
Obrigado.
- Estou com fome, sabia? - Que país! Por isso há revoluçöes.
Podem comer o queijo que sobrou.
Não é um bife grelhado, mas tem muitas vitaminas.
Muito obrigado.
Eles não estão acostumados a servir tantas pessoas.
Bandrika é um dos raros lugares da Europa ainda não descoberto.
Deve ser por não haver nada de bom para ser descoberto.
Talvez não conheçam o lugar tão bem quanto eu.
Estou triste por ter de sair daqui.
- Quero um pouco de queijo. - Por que não, meu jovem?
- Está indo para casa? - Amanhã. Charles já está crescido.
Sou preceptora e professora de música.
Nos seis anos que vivi aqui, aprendi a amar este país...
sobretudo as montanhas.
Às vezes, penso nelas como vizinhas muito simpáticas.
As grandes são pai e mãe, com chapéus brancos de neve.
Seus sobrinhos e sobrinhas, menores, com chapéus pequenos.
Até os menores morros, que não têm chapéu.
É apenas minha imaginação.
É mesmo?
Gosto de admirá-las do meu quarto, em noites de lua.
Que bom que tem lua esta noite.
Estão ouvindo a música?
Todo mundo aqui canta. São como crianças alegres.
Com riso nos lábios e música no coração.
Isso não se reflete na política.
Acho que não se deve julgar um país por sua política.
Afinal, nós, ingleses, somos honestos por natureza, não é?
Com licença, já vou indo.
- Boa noite. - Boa noite.
Esquisita.
- É excêntrica, só isso. - Após seis anos neste lugar...
eu também seria.
Acho que não. Ela foi gentil em nos dar o queijo.
Mas acabou com os picles.
Boa noite, Iris.
Ouçam! Uma serenata.
Deixe estar. Nada vai me tirar o sono esta noite.
Boa noite, minhas crianças.
O que está havendo? Um terremoto?
Não pode ser por causa da música, não é?
Que barulho horrível!
- O que estarão fazendo? - Não sei, mas vou descobrir.
É um país musical, não é?
É. Estou com pena daquele cantor lá fora.
Ter de competir com isso.
Boris? É a Srta. Henderson.
Estão dançando com um elefante no quarto de cima.
Mande um deles embora, preciso dormir. Está bem.
- Acho que isso resolve. - Obrigada.
Algumas pessoas não têm consideração.
O que torna a vida mais difícil que o necessário.
Não concorda? Boa noite. Muito obrigada.
- Vai pegar o trem amanhã? - Sim.
Espero que nos vejamos de novo, com menos barulho.
- Boa noite. - Boa noite.
Senhorita, por favor, eu vou resolver tudo.
Acho bom.
Parem. Não se mexam, não se mexam.
- Por favor, senhor. - Saia daqui.
Um, dois!
Por favor, podem fazer a gentileza de parar?
Todos estão reclamando.
Está fazendo muito barulho.
- Muito o quê? - Barulho.
Atreve-se a chamar de barulho?
É a música com que seus ancestrais celebravam casamentos.
Eles a dançaram quando seu pai casou com sua mãe.
Se for fruto de um casamento, o que duvido.
Olhe para eles.
- Deve ser o gerente do hotel. - Claro que sou.
Já estou acostumado. Quem está reclamando?
A jovem inglesa aqui embaixo.
Diga que estou registrando...
para o bem da humanidade...
uma das danças folclóricas perdidas da Europa Central.
- Ela não é dona do hotel! - Mas senhor, não entende.
Um, dois.
Sabe o que ele disse?
Quem ela pensa que é? A rainha de Sheeba?
Acha que é a dona do hotel.
- Não pode se livrar dele? - Impossível.
- Tem certeza? - Estou pensando.
Já sei. Conhece a senhora alemã?
Ela vai telefonar e dizer...
Meu jovem, esse quarto é meu. Paguei por ele. Saia já.
- O que acha? - Boa idéia.
Vou jogá-Io lá fora com um chute tão forte...
que vai se lembrar para o resto da vida.
Só falam de beisebol.
O jogo que chamávamos de rouders.
As crianças jogam com uma bola de borracha e um bastão.
Mas nada sobre críquete.
Os americanos não têm senso de proporção.
Entre.
Não agüento esta situação ridícula. Vou trancar a porta.
Quem é você? O que quer?
- Reconhece a melodia? - Saia, por favor.
Este quarto é muito melhor. Excepcional, sem dúvida.
O que está fazendo? Não se aproxime!
Pode segurar isto um instante?
Guarde isso agora!
- Em que lado gosta de dormir? - Quer que o expulse?
Então vou dormir no meio.
Foi esperta em subornar o gerente.
Olho por olho, dente por uma escova de dente.
Suponho que saiba que está agindo como um cafajeste.
Pelo contrário. Pode dormir no corredor, se quiser.
Eu não faria isso.
Eu diria a todos que me convidou a ficar aqui.
Quando digo todos, falo sério.
Tenho uma voz poderosa.
- Saia já daí! - Só se subornar o gerente...
- e ele me devolver o quarto. - Saia deste banheiro!
Alô, Boris? Estive pensando.
Talvez eu mude de idéia sobre o quarto de cima se...
A propósito, peça que subam minhas coisas, sim?
Você é o ser mais desprezível que já conheci na vida.
Cá entre nós, você também é muito irritante.
Se chegarmos a Basiléia na hora, veremos o úItimo jogo.
Espero que o tempo esteja assim em Manchester.
Está perfeito para críquete.
- Está por aqui. - Se não se apressar...
não pegaremos aquela cabine.
Isso importa?
- Ainda pode mudar de idéia. - Mande a ele um telegrama...
- diga que está tudo acabado. - É tarde demais.
Em uma semana estarei casando na igreja da praça de Hanover.
Não vou me importar.
Bom dia. Não consigo achar minha mala.
É marrom. Você viu? Olá. Claro que não. Obrigada.
Ela deixou cair os óculos.
- Seus óculos caíram. - Obrigada, querida.
- Minha nossa! Minha nossa! - Iris, você se machucou?
Eu não sei. O que foi?
- Temos de levar as malas. - Deixe isso para lá.
- Ela quase quebrou a cabeça. - É isso mesmo!
- O que vai fazer? - Esfregue a cabeça.
Ele disse que não pode retardar o trem.
- Rápido, ele está partindo! - Eu vou ficar bem.
Tenha cuidado.
Não se preocupem. Tomarei conta dela.
Tem certeza de que está bem?
- Mande notícias. - Escreva-nos contando tudo.
Boa sorte. Cuide-se.
Pronto. Vai ficar boa num instante.
É só ir com calma.
Ponha um pouco disso na cabeça.
- Está melhor? - Estou bem agora. Obrigada.
Precisa de uma xícara de chá forte.
- Vou chamar o cabineiro. - Não se incomode.
- Vou com você, importa-se? - Claro que não.
Desculpe-me. Lamento muito.
Devem estar em lua-de-mel. Eles são tão tímidos.
- Por que fez isso? - Não quero que nos vejam.
Parece que todo o Judiciário o está perseguindo.
- Não me surpreenderia. - Até achou que o mendigo...
- era um advogado disfarçado. - Só disse que tinha cara de juiz.
- Até mudou de direção. - Não é verdade.
Procurava a Rua Straighton.
- Antes, era menos cuidadoso. - Eu sei.
Tem medo de encontrar um conhecido. E eu?
Robert pensa que estou em um cruzeiro com minha mãe.
Vai sacolejar um pouco.
Por isso prefiro o meio do ***ão.
De preferência, perto da janela.
- Chá para dois, por favor. - Pois não.
Só um instante.
Peça que usem este chá. É o único que tomo.
Certifique-se de que a água esteja fervendo. Entendeu?
É uma mania minha.
Meu pai e minha mãe...
que felizmente estão vivos e com boa saúde...
só tomam este chá. Sigo o exemplo deles.
Um milhão de mexicanos o tomam, diz a embalagem.
É muita gentileza sua ajudar-me.
Não nos apresentamos.
Sou Iris Henderson. Vou me casar.
É mesmo? Que emocionante!
- Espero que seja feliz. - Obrigada.
Vai ter filhos, não é? Eles são tão importantes.
Acho que a convivência com crianças me tornou...
jovem na minha idade. Sou preceptora. Meu nome é Froy.
Disse Froy?
Desculpe, mas...
Froy, que rima com herói.
Reserve dois lugares para o almoço.
- Se quiser me acompanhar. - Claro.
Sem discussão. Ele não estava fora.
Não fosse o erro do árbitro, ele continuaria rebatendo.
- Não estou entendendo. - Vou mostrar.
Eu vi a coisa toda.
Bem, aqui está Hammon.
Aqui, o lançador e...
aqui o árbitro.
- Açúcar? - Sim, por favor.
Ora, não tem açúcar.
Agora, preste atenção.
Quando o lançador...
Pode passar o açúcar?
O açúcar, por favor.
Muito obrigada.
Se eu fosse você, dormiria um pouco.
Vai se sentir bem de novo.
Tem um acróstico na revista.
Vou tentar resolvê-Io antes de você acordar.
Reservas para o almoço.
- Fez reserva? - Acho que minha amiga já fez.
- Viu minha amiga? - Não.
Minha amiga, onde está?
A senhora inglesa. Onde ela está?
- Não há senhora inglesa. - O quê?
Não há nenhuma senhora inglesa.
Há, sim. Estava sentada ali.
Você a viu. Ela sentou do seu lado.
Isso é ridículo.
Fomos ao ***ão-restaurante e ela voltou comigo.
Não. Você voltou sozinha.
Não estão entendendo.
Refiro-me à senhora que me ajudou.
O desmaio pode tê-la feito esquecer.
Talvez eu esteja nervosa...
mas se é uma brincadeira, não estou achando graça.
- Você me serviu chá? - Sim, madame.
Viu uma senhora comigo, uma inglesa?
Madame estava sozinha.
- Desculpe, ele se enganou. - É claro. Deve se lembrar.
- Ela pediu e pagou. - Não. A senhora pagou.
Mandou olhar a conta. Farei isso.
Ela deu uma caixa de chá. Deve lembrar disso.
O chá era nosso. Não recebi nenhuma caixa.
Recebeu. Sei o que aconteceu.
Perdão, madame. A conta diz chá para um.
- Não está certo. - Quer examinar pessoalmente?
Não quero. Esta situação é absurda.
Por favor, viu uma senhora passar...
Ora, ora, se não é a nervosinha.
Se soubesse que viria no trem, teria ficado no hotel.
- Senhora? Não, por quê? - Não importa.
Não conseguiria reconhecer uma senhora.
O que houve?
É o cachimbo. Jogue a fumaça para outro lado.
Grato pela ajuda, assim mesmo.
Sente-se. Descanse um pouco. O que aconteceu?
- Levei uma pancada na cabeça. - Quando, na infância?
- Na estação. - Que azar! Posso ajudar?
Só se for embora.
Meu pai disse para nunca abandonar uma moça com problema.
Por isso ele se casou com minha mãe.
Viu uma senhora ontem, no hotel? Ela usava tweed.
Só vi uma, e ela usava pouca roupa.
Ela estava na minha cabine e não consigo encontrá-la.
Deve estar no trem. Ainda não paramos.
Claro que está. Isso eu já sei.
Ninguém disse que não.
- É o que estão dizendo. - Quem?
O pessoal da cabine, o cabineiro. Dizem que nunca a viram.
- Todos eles? - Todos.
Levou uma pancada na cabeça?
- O que quer dizer? - Esqueça.
- Falou na língua deles? - Não.
Então pensaram que queria dinheiro.
Vamos tirar essa idéia de sua cabeça estúpida.
Isso pegou mal. Desculpe.
Aquele é um deles. O homem baixo e moreno.
Desculpe, acho que houve um mal-entendido.
- A jovem se perdeu da amiga. - Sim, eu soube.
Este cavalheiro estava me contando. Muito interessante.
Nestas circunstâncias, é melhor nos apresentarmos.
Sou cidadão italiano.
- Minha mulher e filho. - Prazer.
- Que garotão. Quantos anos? - Cinco.
Neste canto, a baronesa Sacorna.
Conheci seu marido. Entregou os prêmios no festival de dança.
- Ministro da Propaganda. - Sou o Dr. Heggan Hartz.
- Talvez já tenha ouvido. - O especialista em cérebro?
Esteve na Inglaterra. Operou um de nossos ministros.
- Sim. - Encontrou alguma coisa?
Uma pequena concussão.
Bem, é melhor do que nada.
Vou pegar um caso parecido na próxima estação.
Mas muito complicado.
Vou operar no Hospital Nacional esta noite.
Uma fratura de crânio com compressão.
- Entende? - Sim, uma pancada na cabeça.
- Não viu minha amiga? - Infelizmente, não.
Vou trocar umas palavras com a baronesa.
- O que dizem? - Que nunca a viram.
Não é verdade. Ela estava sentada aí...
- Pode descrevê-la? - Bem, ela era de meia-idade.
O que ela vestia?
Tweed. A cor era marrom claro.
Casaco comprido com bolsos na frente.
Echarpe, chapéu de feltro, sapatos marrons, blusa branca...
e um lenço azul no bolso da frente.
Não lembro de mais nada.
Não pode prestar atenção. Escute aqui.
- Foram tomar chá? - Sim.
Devem ter encontrado alguém.
Acho que sim, mas...
Um instante, deixe-me ver...
Um senhor inglês nos passou o açúcar.
- Vamos encontrá-Io. - Se permitirem, vou junto.
É muito interessante.
Não gostamos de curiosos, mas aceitamos sua companhia.
Espere, teve outra pessoa.
A Sra. Froy perdeu o equilíbrio aqui.
Tinha um cavalheiro e uma senhora.
Agora estamos chegando a algum lugar.
- Posso ajudar? - Este é o cavalheiro.
Lembra-se de tê-la visto passar com uma...
senhora inglesa de baixa estatura?
Eu... receio que não.
Deve lembrar. Ela quase caiu dentro da cabine.
Não pode ter esquecido. É importante.
Todos dizem que ela não estava no trem, mas ela está.
Vou encontrá-la mesmo que tenha de parar o trem.
Caldcott, sou eu. Posso entrar?
Lembra daquela moça do hotel?
Está armando uma confusão.
- Disse que a amiga sumiu. - Ela não esteve aqui.
Mas está ameaçando parar o trem.
Se perdermos a conexão em Basiléia chegaremos tarde a Manchester.
- Isso é sério. - Vamos nos esconder.
Lamento, não me lembro de nada disso.
Devem estar enganados.
É óbvio que não se lembra.
Vamos procurar o outro homem.
- Com quem estava falando? - Com ninguém.
Eram umas pessoas discutindo no corredor.
Este é o homem.
Ah, sim. Desculpe incomodá-Io.
- Pode nos ajudar? - Como?
Há uma hora, tomei chá com uma senhora inglesa.
O senhor a viu, não?
Não sei. Eu estava conversando com meu amigo.
Sua mesa era ao lado da nossa.
Ela pediu o açúcar. Devem lembrar.
- Lembro do açúcar. - Então a viu.
Já disse que estávamos conversando sobre críquete.
Como algo como críquete o faz esquecer de alguém?
Se é assim, não há mais o que conversar.
Vamos, Caldicott. Algo como críquete!
Devíamos ter perguntado por uma bola de críquete perdida.
Ele falou com ela. Deve haver uma explicação.
Há. Desculpe-me. Posso estar enganado...
mas já vi casos em que um choque ou golpe...
produziu imagens realistas.
Entendo. Não acredita.
Não é questão de acreditar.
Uma simples concussão pode ter estranhos efeitos...
sobre uma pessoa imaginativa.
Sim, mas me lembro dos menores detalhes.
Do nome, Sra. Froy. De tudo.
Muito interessante.
Com o devido tempo...
descobriremos a causa das alucinaçöes.
- Alucinaçöes? - Exato.
Não há nenhuma Sra. Froy. Nunca houve.
Só uma imagem subjetiva.
- Eu a conheci no hotel. - Pensou que conheceu.
- Mas... e o nome? - Alguma associação do passado...
um anúncio, personagem de livro gravado no subconsciente...
Não há razão para ter medo, se ficar calma e relaxada.
Muito obrigada.
Está parando. Se me derem licença...
é aqui que meu paciente entra no trem.
Com licença.
Interessantíssimo!
Está parando.
Ele disse parando, não é?
A Sra. Froy ainda deve estar no trem.
Fique nesta janela e veja se ela sai por aí.
Eu fico do outro lado.
Interessantíssimo!
O que ela vestia? Tweed bege, não é?
Marrom claro.
Sabia que era algo parecido.
Quanto tempo leva para conseguir um divórcio?
- Eric? - Desculpe, não ouvi.
Quanto tempo leva para conseguir um divórcio?
Depende, por quê?
Poderíamos ter nossa lua-de-mel na primavera.
A lua-de-mel oficial.
As dificuldades são muitas.
O tribunal está com muito movimento.
Embora nós, advogados, não devêssemos reclamar.
Na verdade, as chances de eu me tornar juiz...
são muito boas. Se nada desfavorável acontecer.
Como envolver-se em um caso de divórcio.
Sim.
Antes, dizia não se importar com o que acontecesse.
Veja as coisas do meu ponto de vista.
Como a esposa de César, a lei deve estar acima de toda suspeita.
Mesmo quando a lei passa seis meses traindo a esposa?
Escute aqui...
Agora sei por que você corria como um coelho assustado.
Por que mentiu?
Eu menti?
Para aquelas pessoas.
Ouvi tudo que disse.
Não queria me envolver numa investigação.
Investigação?
- A senhora sumiu? - A moça está armando confusão.
Se a mulher sumiu, e eu admitir que a vi, seremos testemunhas.
Meu nome apareceria nos jornais, ligado ao seu.
Um escândalo seria desastroso.
Desastroso.
Eu suponho que sim.
- Ninguém? - Ninguém.
Do meu lado só saíram cascas de laranja e um saco de papel.
Sei que a Sra. Froy existe. Ela é tão real quanto você.
Sei que acredita nisso mas ninguém mais a viu.
Eu a vi, eu acho.
- Você viu? - Uma senhora baixa, de tweed.
- Sim. - Com um casaco comprido.
- Com uma echarpe? - Exato.
Vi quando passaram por minha cabine.
Eu tinha razão.
Mas seu marido disse que não.
Ele não notou. Lembrei assim que ele tocou no assunto.
Você ganhou. Poderia fazer uma declaração?
Claro, se ajudar.
Meu paciente acaba de chegar.
- Complicaçöes fascinantes. - Boas notícias.
- Esta moça viu a Sra. Froy. - Viu?
Podemos mandar vasculhar o trem.
- Deve pensar em outra teoria. - Não será preciso.
Ela era muito boa. Os fatos eram enganadores.
Espero que ache sua amiga. Com licença.
- Estarei aqui, se precisarem. - Certo. Vamos indo.
Eric...
Eu disse àquela moça que vi a amiga dela.
Como? Está ficando maluca?
Pelo contrário. Estou muito lúcida.
Como assim?
Um escândalo levaria a um divórcio.
Não poderia me decepcionar, não é?
A coisa certa feita de modo relutante.
Esquece algo importante, Margaret.
Seu marido se divorciaria não tenha dúvida.
Mas minha mulher, jamais.
Parece loucura, mas devemos vasculhar o trem.
Senhorita! Eu a estava procurando.
- Sua amiga voltou. - Voltou?
- Mas o que aconteceu? - Venha ver, ela lhe dirá.
Muito bem, não se preocupe. A crise acabou. Vamos.
Sra. Froy!
Ela não é a Sra. Froy!
- Não é? - Não.
Sei que parece bobagem, mas é a Sra. Froy?
Não. Sou Madame ***.
Disse que a ajudou a entrar na cabine e depois...
foi ver uns amigos.
A baronesa diz que, como falou em uma inglesa, ela não pensou...
em Madame ***.
Mas não foi ela quem vi. Foi a Sra. Froy!
- Tweed, blusa, lenço azul... - Tudo combina, mas não é ela.
Com licença. Quando conheceu a Sra. Froy?
- A noite passada, no hotel! - Ela usava roupas assim?
Sim, acho que sim.
Então desculpe-me. Realmente a conheceu.
- Não... - Mas não neste trem.
No subconsciente, você trocou o rosto de Madame ***...
pelo da Sra. Froy.
Nada disso, tenho certeza. Falei com ela aqui!
Isso é fácil. Há uma moça que diz que a viu.
A senhora se incomodaria...
A senhora, primeiro.
Foi essa mulher que viu?
Não parece com ela, não é?
Sim, é ela.
Não é, estou dizendo. Não é!
- Tem certeza? - Absoluta.
Não é ela. Não é ela!
Bem, vamos indo. Desculpem o incômodo.
Bem, não vai dizer nada?
Poderia ao menos se vangloriar.
O que espera? Só fez isso para salvar sua pele.
Estava mentindo. Vi pelo rosto dela.
Todos mentem. Mas por quê?
Sente-se e relaxe.
Acha que troquei o rosto da Sra. Froy pelo de Mme. ***?
Qualquer mudança seria positiva.
A Sra. Froy estava neste trem.
Nada vai me convencer do contrário.
Vai me seguir feito um cão de estimação?
Feito um cão de guarda. Tenho bons instintos.
Até logo.
O doutor tinha razão. Todos vocês tinham.
Nunca vi a Sra. Froy no trem. Nunca aconteceu.
- Sei disso agora. - Que bom que aceitou.
Precisa esquecer tudo isso.
Apague tudo da mente.
Observe-me. Não tem como errar.
- Que tal comer? - Faço qualquer coisa.
Isso, vamos lá.
- Quer um pouco de ar? - Obrigada.
- Consegue comer? - Posso tentar.
É assim que se fala. Ficará nova em folha.
Espero que sim.
Não quero ver meu noivo neste estado de nervos.
- Seu o quê? - Vou me casar na quinta.
Não é imaginação?
Não mesmo.
Temia que dissesse isso.
- Ah, a comida. - Não posso nem olhar.
Como quiser. Posso falar enquanto como?
Se quiser.
- Quer saber como comecei a vida? - Acho que não.
Se é assim, começarei por meu pai.
Muitos homens importantes começaram por seus pais.
- Quer beber alguma coisa? - Não. Sim, um chá.
Meu pai era um sujeito pitoresco.
Entre outras coisas, era louco por... nunca vai adivinhar.
Chá de ervas Hariman.
- Não é bem isso. - Muitos mexicanos o tomam.
- É questão de gosto. - A Sra. Froy deu uma caixa a ele.
- Do quê? - Chá de ervas Hariman.
Era o chá que tomava.
Não combinamos que tiraria isso da cabeça?
Mas é tão real. Sei que aconteceu.
- Combinamos ou não? - Combinamos. Desculpe.
Continue a falar de seu pai.
Meu pai era formidável.
Ele tocava clarinete?
O tempo todo, para falar a verdade.
Herdei seu amor pela música.
- Por que não? - Foi o que ele me deixou.
Sabe, você é muito atraente.
Já disseram isso?
Estávamos falando de você.
- Sim. Você gosta de mim? - Não muito.
Após pagar as dívidas de meu pai...
comecei a viajar, a gastar dinheiro.
Estou escrevendo um livro sobre danças folclóricas.
- Quer comprar um exemplar? - Adoraria.
- Quando ele fica pronto? - Daqui a uns quatro anos.
- É um longo tempo. - É um longo livro.
Sabe por que você me fascina? Vou dizer.
Tem duas qualidades de meu pai.
Não tem a menor educação e sempre vê coisas.
Qual o problema?
Olhe!
- Sumiu! - Sumiu o quê?
O nome da Sra. Froy, na janela.
Você viu! Deve ter visto! Ela está no trem!
Calma, calma.
Com licença, obrigado.
Precisamos achá-la. Algo se passa com ela!
Pare o trem!
Ouçam. Há uma mulher neste trem, a Sra. Froy.
Alguém a viu! Estão escondendo-a em algum lugar.
Apelo a todos vocês para que parem o trem.
Por favor, me ajude. Façam o trem parar.
Está ouvindo? Aja antes que seja tarde.
- Por favor. - Não estou maluca!
Não estou! Por Deus, parem o trem!
Deixem-me em paz! Deixem-me em paz!
Dez minutos de atraso, graças àquela tola.
Se ela continuar, perderemos o úItimo jogo.
Podem tê-la colocado em algum lugar.
- Por quê? - Pessoas não desaparecem assim.
- Ela, sim. - O quê?
- Ela desapareceu. - Quem?
A senhora idosa.
- Como é que pode? - O quê?
Ter desaparecido.
Eu não sei.
É o que eu digo. Pessoas não desaparecem por mágica.
Na Índia, isso acontece.
- O quê? - O truque da corda.
Ah, isso? Nunca deixaram que fosse fotografado.
Em meia hora paramos em Morsekin, quase na fronteira.
Salto lá com o paciente, para ir ao Hospital Nacional.
Se vier, passará a noite numa enfermaria particular.
Você precisa de paz e descanso.
- Sinto, mas não quero. - Não há nada a fazer?
Sim, encontrar a Sra. Froy.
Se não descansar, não sei o que poderá acontecer a ela.
Seria melhor se a convencesse. Ela gosta de você.
Sou tão popular com ela quanto estricnina.
Se pusesse açúcar, ela beberia.
CHÁ HERRIMAN
O trem está cheio de pessoas de vários países.
Acabei de ver um milhão de mexicanos no corredor.
Vim pedir para pensar no que o Dr. Hartz disse.
Se mudar de idéia, estarei por perto.
- Por que tanto mistério? - A Sra. Froy está no trem.
Vi o pacote de chá.
Jogaram fora com o lixo.
Custou a acreditar. Ela pode estar morta agora.
Falando no verão inglês, passei as férias em Brighton.
Vamos vasculhar o trem. Há algo muito estranho aqui.
- Não está cheirando bem. - É mesmo.
Olhe aquilo!
- Certo, só um instante. - Rápido!
Talvez a Sra. Froy seja bruxa. Quem sabe?
Recuso perder as esperanças. Vamos encontrá-la.
- Sabe algo sobre ela? - Não.
Era uma preceptora voltando para casa.
- O que é isso? - Não faço idéia.
Pode haver alguma coisa aqui.
- O que é isso?! - Nosso amigo italiano.
Já entendi. Espere.
Aqui está: O Grande Doppo.
- Está escrito, olhe. - O que diz?
O Grande Doppo: Mágico, ilusionista, leitor de mentes.
Veja o fascinante número da mulher que desaparece.
Mulher que desaparece?
- Talvez seja a explicação. - Qual?
Ele está praticando com a Sra. Froy.
- Ele pode ter... - Acho que não.
A baronesa ou Mme. ***?
- Qual é sua teoria? - Não sei. Minha teoria?
Vou lhe contar.
Nossa.
- Onde você está? - Aqui, onde ele faz o truque.
- Não consigo vê-Io. - Estou aqui, em algum lugar.
Aqui estou.
- Onde está? - Eu não sei!
É no que dá não dizer abracadabra.
Você se machucou?
Não.
- Sente aqui. - O que é isso?
Chamam de cabine do desaparecimento.
- Você entra e desaparece. - Eu percebi.
- La me dizer sua teoria. - Minha teoria.
Bem, minha teoria, meu caro Watson...
é que estamos numa situação difícil.
Muito obrigado.
Examinemos os fatos enquanto eu fumo.
Primeiro, uma senhora some.
Todos que a viram afirmam que ela nunca esteve aqui.
- Certo? - Certo.
Nós sabemos que esteve.
Eles a viram. Então, estão mentindo deliberadamente.
- Por quê? - Não sei. Sou só o Watson.
Não exagere no papel. Vou dizer por quê.
Por causa do inquérito. A Sra. Froy ainda está no trem.
- Eu disse isso há horas. - Disse.
Por isso, meu caro Watson, vai ganhar um charuto.
- Obrigada. - Só resta uma coisa.
- Vasculhar o trem sob disfarce. - Qual?
Bem...
- De senhor inglês. - Vão reconhecê-Io.
Talvez tenha razão.
Disfarce de professor.
Garotos? Quem roubou a Sra. Froy?
Levante a mão.
Dê-me estes óculos!
Por quê?
São da Sra. Froy.
- Tem certeza? - Sim, são idênticos...
- Onde achou? - No chão. A lente quebrou.
- Deve ter havido luta. - Pegue os pedaços.
É nossa primeira prova concreta.
Pode me dar os óculos? São meus.
- Meus óculos, por favor! - Seus? Tem certeza?
É um nariz muito grande para óculos tão pequenos.
Esse é o jogo? Vamos ver no que dá.
São da Sra. Froy e sabe disso.
Ela esteve aqui, e sabe disso também.
Não fique pulando como juiz de boxe. Ajude-me!
Dê-lhe um chute. Ele é muito forte.
Assim não ajuda.
Rápido, puxe as orelhas. Puxe-as!
Ele tem uma faca.
Pegue-a antes que me tire uma fatia.
Não alcanço!
Muito bem.
Sabemos como isso funciona. Saia daí.
Ele quer os óculos. Temos de escondê-Ios.
- Pode ser aqui. - Rápido, enquanto está zonzo.
Está vazio. Pode trazê-Io.
- Qual o problema? - Alho. Logo ficarei bem.
Aqui, segure. Vou amarrá-Io.
Chegamos a algum lugar.
Sabemos que a Sra. Froy esteve no trem.
Que nosso amigo está envolvido.
Espero que fique quieto até a encontrarmos.
Deu trabalho, mas valeu.
- Vamos ver a prova. - Prova?
- Sim, os óculos. - Estão com você.
Não, não estão comigo.
Estão com ele!
Ele sumiu.
Droga, tem fundo falso.
- Ele é contorcionista. - Ele se mandou.
Pior, foi procurar os outros.
Que situação! Não podemos enfrentar todos.
- Precisamos de aliados. - Em quem confiar?
Esse é o problema.
Que tal o Dr. Hartz?
- Talvez ele possa ajudar. - Certo. Só um instante.
É esta aqui.
Ele não está.
- Tive uma idéia idiota. - Eu acredito.
Se o paciente for a Sra. Froy?
Mas ele chegou no trem depois que ela sumiu.
Por isso era idiota. Vamos procurar o doutor.
Não, espere.
- O que foi? - Notou algo errado na freira?
Acho que não é freira. Elas não usam salto alto.
Tem razão.
- Viu Mme. *** entrar? - Não.
E se levaram a Sra. Froy para o ***ão de carga?
Na primeira parada, entra um paciente cheio de ataduras.
Ele é a Sra. ***.
Madame *** vira a Sra. Froy e a Sra. Froy vira... aquilo.
Mas tanto trabalho só por uma preceptora?
Talvez não seja preceptora. Pode ser algo político.
Vamos investigar.
Vou tentar em inglês. Podemos ver o paciente?
Obrigado. Fique de olho na freira.
O que estão fazendo aqui?
Por que estão aqui?
É um caso sério. Não têm nada a fazer aqui.
Tire as ataduras. Queremos ver o rosto.
Perderam o juízo?
Não tem rosto, apenas pedaços de carne viva.
Perdeu tanto sangue que só uma transfusão pôde salvá-Io.
Querem que eu mate o paciente?
Este realmente é o seu paciente?
Acreditamos que seja a Sra. Froy.
A Sra. Froy?!
Não estão falando sério. De onde tiraram essa idéia?
- Disseram que é surda-muda. - Talvez leia lábios.
É possível.
Então é melhor irmos para o ***ão-restaurante.
Irei logo. Quero ter certeza de que o paciente está bem.
Como vou saber como descobriram?
Alguém deve ter contado.
Não disse que a velha era inglesa.
Que diferença faz?
Daqui a pouco, vou pedir três drinques.
O meu será um Château. Um dos cabineiros está conosco.
Ouça com atenção.
É aquela moça de novo.
Ela sempre aparece. Não dá para esquecê-la.
Agora podem falar...
O senhor chegou a ver seu paciente?
Não. Pediram para assumir o caso e operar.
Não é a Sra. Froy?
Acreditamos numa troca, doutor.
Estão querendo dizer que alguém...
Quero um Château. Acompanha-me?
Sim, um conhaque.
- E você? - Não quero nada.
- Fará bem. - Não quero mesmo.
Está muito cansada. Vai lhe fazer bem.
Está bem. Só um drinquezinho.
Dois conhaques e um Château.
Sabe algo sobre a freira que cuida de seu paciente?
Freira? Não.
É de um convento próximo ao local do acidente.
Não acha estranho que ela use salto alto?
Ela usa, é?
Isso é mesmo peculiar, não é?
Só pode ser conspiração.
As pessoas afirmam que não viram a Sra. Froy...
mas viram. É certeza. Há pouco, no ***ão de bagagens...
Lá vai ela de novo.
Espero que não faça escândalo.
Nunca chegaríamos a tempo.
Então o homem na cabine, um tal de Doppo...
- entrou e pegou os óculos. - Lutamos com ele.
- Lutaram? - Nós o derrubamos.
- Ele se recuperou logo. - É, estava fingindo.
Tome.
Como ele estaria envolvido numa conspiração?
Coitado. É só um viajante inofensivo.
Ele é um artista em turnê em Bandrika.
O marido da baronesa é ministro da propaganda.
Uma palavra dela, e a turnê seria cancelada.
Entendo.
Os cabineiros não querem se meter em problemas.
Os dois viajantes ingleses também negaram tê-la visto.
Diplomacia britânica. Antes ser imparcial do que se arriscar.
- Um conceito bem conhecido. - Não entendo...
por que alguém queria livrar-se da senhora.
É o que nos intriga. Só sabemos que estava no trem...
e que ela... desapareceu.
Bem, se estiver certo, o trem todo está contra nós.
O que vamos fazer?
Bem... pelo que contaram, vou examinar o paciente.
- Então vamos! - Um momento.
Não devemos chamar a atenção.
Ajam como se nada tivesse acontecido.
Beba, vai acalmar seus nervos.
A nossa saúde.
E, se nossos inimigos forem reais...
que desconheçam nossos propósitos.
Vamos, temos de nos apressar.
Vamos, beba tudo.
Esperem aqui.
- Algum problema? - Nenhum.
A não ser por terem notado o seu salto alto.
Entretanto, não faz diferença.
Chegaremos a Morsekin em três minutos.
Uma viagem bem movimentada.
Bem?
A paciente é a Sra. Froy.
Será tirada do trem em Morsekin, em três minutos.
Será levada ao hospital e operada.
Infelizmente, a operação não será bem-sucedida.
Talvez devesse explicar.
Eu farei a operação.
Estou nessa 'conspiração', como dizem.
São um casal muito perspicaz.
Mas é inútil ficar pensando num modo de escapar.
Os drinques, lamento informar, tinham hidrocianureto.
É uma droga pouco conhecida...
que, em pequena quantidade, paralisa o cérebro...
e deixa a vítima inconsciente por um tempo considerável.
Em quantidade um pouco maior pode levar à loucura.
Mas dou minha palavra de que a dose foi pequena.
Daqui a poucos instantes, vai se juntar à sua amiga.
Eu disse o quanto lamento ter de ser tão...
como posso dizer, melodramático?
Mas a sua persistência me obrigou a isso.
Você está bem? Deve ter desmaiado.
- O quê? - Uma mulher será assassinada.
Temos de agir antes que a droga surta efeito.
Dizem que se ficar se mexendo...
- consegue ficar acordado. - Certo. Vamos indo.
Está trancada.
Não podemos ir por aqui. Seremos vistos.
- Não pode fazer isso! - Tudo bem, é aqui ao lado.
Precisa ficar acordada.
Fique na ponta do pé, plante bananeira, mas não durma.
Continue. Não precisa ter medo. É a Sra. Froy.
Tudo bem, não foi drogado.
Ele me mandou pôr algo no drinque, mas não pus.
Quem é você, afinal? Disse que era surda-muda.
Não importa. Se quer salvá-la, precisa se apressar.
Hartz volta logo. Não quero que nada aconteça.
Precisa segurá-Io até chegarmos a Morsekin.
A estação não pode estar longe.
Vamos, ainda temos tempo.
Aqui está seu dinheiro.
Mas só isso?
Depois de tudo que fiz?
Depois de aquela mulher quase arrancar minhas orelhas?
Pague-lhe mais.
Chegamos. Terminou?
Vamos, Sra. Froy.
Pode parar. Não foi drogada. Explico depois.
- Abracadabra. - Sra. Froy! Não acredito!
- Obrigada, querida. - Cuidado.
- Está pronta? - Sim.
- Está bem, Sra. Froy? - Sim, obrigada.
Parece o metrô na hora do rush.
Cuidado, estamos parando.
Para trás.
Lamento que tenha feito uma viagem tão desconfortável.
Volte para o trem.
Espero que nada dê errado.
Não estamos parados há muito tempo?
A ambulância está indo. Já vamos partir.
Em minutos, estaremos na fronteira.
Sei que fui bem paga. Fiz muito trabalho sujo por isso.
- Mas iam matar uma inglesa. - Você é banduíque.
Meu marido era, mas eu sou inglesa.
Lam matá-la a sangue frio.
Agora somos obrigados a remover não só a tal senhora...
- mas outras duas pessoas. - Não podem fazer isso.
Também não é aconselhável deixar uma traidora viver.
Não se atreveria. Sei de muitas coisas.
Precisamente.
Acho que já passamos pela fronteira.
Pode sair.
- Que viagem desagradável! - Não se preocupe.
Pode ficar aqui até o fim da viagem.
Pronto. Agora que tudo acabou...
conte o que aconteceu.
Que grito foi esse?
- Foi só o trem, não? - Não. Foi uma mulher.
Tenha cuidado.
Problemas. Estamos numa linha auxiliar.
- Soltaram parte do trem. - Minha nossa!
Não importa quem seja. Por que tanto...
trabalho para pegar você?
Não faço idéia. Sou só uma preceptora.
- Cometeram um engano. - Por que está mentindo?
Diga a verdade. Envolveu-nos nessa trama.
- Deve confiar em nós. - Eu realmente não sei. Eu...
- Se tiver mais alguém no trem? - Só sobrou o ***ão-restaurante.
Se sobrou alguém, deve estar lá.
É hora do chá. Os ingleses devem estar lá.
Vou olhar. É melhor ficarmos juntos.
A senhora apareceu.
Falei que era muito barulho por nada.
A porta deve ter emperrado.
Tenho algo a dizer. Podem prestar atenção?
Tentaram levar essa senhora à força.
Creio que os responsáveis tentarão de novo.
- De que está falando? - Se duvida, olhe pela janela.
Estamos numa linha auxiliar.
O que diz? Rapto? Desvio de trem?
- Estamos falando a verdade. - Não estou interessado.
Já incomodou muito com sua história.
- Deve ter um parafuso solto. - Coisas assim não acontecem.
Não estamos na Inglaterra.
- Que diferença faz? - Estamos parando.
Vêem os carros? Vieram buscar a Sra. Froy.
Besteira.
Olhem, lá vão duas pessoas.
É óbvio que vieram buscá-la.
Por que desengataram o trem e o desviaram?
- Desengataram? - Sobraram umas cabines.
Não. Nossa bagagem está na primeira classe.
Não mais. Quer olhar?
Se for uma brincadeira, não estou achando graça.
Meu Deus!
Pegue o conhaque.
Não acredita na história deste sujeito, não é?
- Parece meio estranha. - Não se amarram freiras.
Alguém está vindo.
Nada podem nos fazer. Somos cidadãos britânicos.
Vim oferecer as mais sinceras desculpas.
Um incidente muito sério ocorreu.
Tentaram interferir com os passageiros deste trem.
Felizmente, as autoridades foram informadas.
Se me acompanharem até a cidade, informarei...
a Embaixada Britânica imediatamente.
Senhoras e senhores, os carros estão à sua disposição.
Somos muito gratos.
Que bom que alguns falam inglês.
- Estudei em Oxford. - É? Eu também. Em que ano?
Esperem. Ela quer dizer alguma coisa.
Não sei o idioma. Pode ser importante. Será que poderia...
Isso cuida dele.
- Por que fez isso? - Estudei em Cambridge.
O que tem a ver? Ouviu o que ele disse.
Ouvi o que ela disse.
Um truque para sairmos.
Não acredito. A explicação dele era satisfatória.
Algo assim causaria uma guerra.
Vou lá fora dizer o que aconteceu.
Tentarei me desculpar e consertar a situação.
- Tinha razão. Empreste o lenço. - É claro.
Não estão brincando.
- Sim. - Nada podem fazer.
- Seria incidente internacional. - Já aconteceu antes.
- Estão vindo. - Se reagirem, vão nos matar!
Não vão nos deixar partir.
- Ordeno que se rendam. - Nada disso.
Se chegarem mais perto, eu atiro.
Eu avisei.
É bom se protegerem. Não deve demorar.
Que situação! Não gosto nem um pouco.
- Quanta munição temos? - Um cinturão.
Ótimo.
- Ei, você! Abaixe-se! - Não participo desta loucura.
É mais seguro reclamar daqui de baixo.
Querem entrar pelo outro lado.
Estão agindo como tolos.
Que chance temos contra homens armados?
Ouviu o que a madre disse.
Se nos rendermos, será nosso fim.
Nunca chegaremos ao jogo.
- Me dá, me dá! - Não.
- O que há? - Ele tem uma arma e não a usa.
- O que pretende? - Não participo desta loucura.
- Não acredito em lutas. - Um pacifista, é?
Os cristãos foram jogados aos leöes. Vamos lá.
- Não tenho medo de usá-la. - Acho que não sabe atirar.
Uma vez ganhei uma caixa de charutos.
Qual nada, ele é um excelente atirador.
Eu não perdi o jeito.
Quero acreditar que há uma explicação racional para isso.
Acertei.
Posso falar com você um instante?
- Agora? - Sim, é muito importante.
- Fique com isso. - Protegerei o forte.
- Aqui é mais seguro. - Fique abaixada.
Só queria dizer que tenho de partir agora.
Não pode. Não vai conseguir. Vai levar um tiro.
Terei de arriscar. Ouçam com atenção.
Caso não consiga e vocês escapem, quero que levem...
uma mensagem ao Sr. Calladam, Min. Das Relaçöes Exteriores.
- Então é espiã? - Que palavra forte!
Qual é a mensagem?
- É uma melodia. - Melodia?
Ela contém uma cláusula muito importante...
de um pacto secreto entre dois países europeus.
- Quero que a decore. - Certo, vá em frente.
A primeira parte é assim...
É melhor escrever. Tem um papel?
- Cresci com música, posso decorar. - Certo.
Acho que a velha endoidou.
Não é de admirar. Por que não aceitam?
Se continuarmos a resistir, seremos mortos.
Pelo amor de Deus, cale a boca!
- Agora temos duas chances. - Pode apostar.
- Vai se lembrar? - Não vou parar de assobiar.
- Acho que é a melhor saída. - Sim. Vou descer.
Pode ser baleada. Se conseguir...
vão pará-la na fronteira.
Não podemos deixá-la ir.
- Está se arriscando muito. - O risco é parte do trabalho.
Sou-lhes muito grata por tudo que fizeram.
Rezo para que nada de mal lhes aconteça...
- para nos vermos de novo. - Também torço por isso.
- Boa sorte. - Boa sorte.
- Você me ajuda? - Claro.
Cuidado, cuidado. Assim. Assim.
Adeus.
- Ela foi atingida? - Não sei ao certo.
- Fiquei sem munição. - Não sobrou muito aqui.
Só temos uma chance: Pôr o trem em movimento.
Voltar à linha principal e cruzar a fronteira.
É um plano grandioso.
Os maquinistas não vão obedecer, sabia?
- Usarei isto. Quem vem? - Conte comigo.
- Também vou. - Fique aqui e continue a atirar.
Com sorte pararemos o trem no desvio.
Você salta e move a alavanca.
Idiotas. Estão querendo se matar?
Só porque quero ficar vivo, acusam-me de pacifista.
Antes ser chamado de rato do que morrer como um.
Pensem. Se nos entregarmos, não nos matarão a sangue frio.
- Haverá um julgamento. - Chega, Eric. Ninguém o ouvirá.
Está bem.
Sigam o seu caminho e eu sigo o meu.
- O que tem em mente? - A única coisa sensata.
Deixe-o ir se ele quiser.
Não estão entendendo...
Por favor, não! Por que estamos parados?
Por quê?!
Eles disseram! Por que não partimos?
Ele vai nos pôr a caminho. Ele vai.
Só sobrou uma. Vou guardar, por segurança.
Estão se afastando dos carros e vindo para cá.
Se tivéssemos mais balas...
É engraçado.
Ao partir, disse a meu marido que não o veria de novo.
Gilbert! Gilbert!
Estamos nos movendo!
Vamos, continue.
- Sabe controlar essa coisa? - Observei e aprendi um pouco.
- O entroncamento está perto. - Vou ficar olhando.
Estão nos perseguindo. Olhem.
Não deve faltar muito.
Devemos estar chegando ao entroncamento.
Graças a Deus estaremos em território neutro.
Não será necessário.
Lamento, mas não haverá mudança de curso.
Por favor, sentem-se.
Está bem à nossa frente.
- Acha que consegue pará-Io? - Espero que sim.
Imóveis até meus amigos chegarem.
Receio que se alguém se mexer, terei de atirar.
Há uma coisa que não sabe, capitão.
Só há uma bala na arma.
Se atirar em mim, dará chance aos outros.
Está numa situação difícil, não é?
Sente-se, por favor.
Está bem.
Onde o Charters se meteu?
Vá em frente, ela conseguiu!
Tudo bem, foi só na perna.
Ou, como dizem os ingleses: Muito boa sorte para eles.
Estou feliz porque tudo acabou, e você?
Só Deus sabe o que o governo vai fazer.
Nada. Vão abafar o caso.
O quê?
Tire a mão. Estou tentando lembrar de uma melodia.
Lembrar?
- Carregador? - Não, obrigado.
Estamos em casa, Gilbert.
Pare de cantarolar. Já sabe a melodia de cor.
Não quero arriscar.
- Charles vem buscá-la? - Acho que sim.
- Estará muito ocupada. - Podemos almoçar junto.
- Se você quiser. - Não foi o que eu quis dizer.
Tenho de entregar a mensagem da Sra. Froy.
Depois volto a Yorkshire e termino meu livro.
Pronta?
Poder pegar o trem para Manchester, afinal.
JOGO AMISTOSO CANCELADO
- Algum sinal do Charles? - Não consigo encontrá-Io.
Bem, é aqui que dizemos adeus.
Que foi?
- Charles? - Seu egoísta, metido...
- Vão a algum lugar? - Min. Das Relaçöes Exteriores.
- Aonde vamos na lua-de-mel? - Não sei, um lugar tranqüilo.
Onde não haja trens.
O Sr. Calladam vai recebê-Ios.
- Espere. Sumiu! - Sumiu o quê?
- A melodia, eu esqueci! - Não, não.
Deixe eu me concentrar.
Não, essa é a Marcha Nupcial.
É terrível! Estou cantando a melodia desde anteontem.
Eu a esqueci completamente.
- Senhora Froy! - Ora, vejam só!
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