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Eu tive muita sorte de poder mostrar o projeto desta apresentação no encontro de mulheres que aconteceu antes da conferência
por isso a maioria das mulheres aqui já assistiu e eu tive muita sorte de poder me beneficiar das
suas experiências e das suas opiniões depois de mostrar para elas primeiramente.
Meu nome é Rachel e eu era uma adolescente liberal [risos]
Um pouco mais sobre mim para as pessoas que ainda não me conhecem muito bem:
Eu tenho 23 anos. Eu me formei em estudos feministas
em uma faculdade bem típica de estudos feministas em uma
universidade tradicional na qual eu vou continuar dizendo que não importa muito,
mas se for importante pra você, eu tenho algum tipo de fundo legitimado.
Eu não era apenas uma adolescente liberal, eu era uma liberal de 20 anos nas questões de gênero.
E depois eu era uma liberal de 21 anos nas questões de gênero.
Aí meu liberalismo começou a desmoronar.
E não aconteceu tudo de uma vez só. Eu não acho que nossa cabeça mude da noite para o dia. Eu não acho que conhecimento acontece da noite para o dia.
Levei algum tempo para eliminar o liberalismo da minha prática ativista e
eu acho que minha visão liberal de gênero foi a última coisa que eu tive que exorcisar da minha cabeça em termos de liberalismo.
Ela adere muito, e é por esse motivo que eu sinto que essa apresentação e a maneira como nós moldamos ela,
e o que a Jessica e a Lexy disseram, é tão importante, porque
eu acho que a gente entende a ideia por trás dessa apresentação.
Porque a gente entende por que o liberalismo, principalmente em termos de gênero, é tão atraente.
Eu ainda consigo entender isso.
E esse é um dos motivos pelo qual eu estou tão animada que nós a fizemos dessa maneira.
Então, durante meu trabalho com a DGR, mas também antes disso...
– eu fui uma militante feminista antes de ser uma ativista ambiental –
DGR é na verdade o primeiro grupo ambientalista no qual eu já me afiliei. Antes disso era
só feminismo e direitos reprodutivos das mulheres.
Mas, eu digo isso para dizer que eu já tive muitas discussões sobre gênero.
E eu as tive através da perspectiva liberal,
como eu as tive através da perspectiva radical, já que
tenho passado tanto tempo dando palestras para a DGR.
Depois de tanto tempo tendo essas discussões sobre gênero, eu sinto que eu desenvolvi uma abordagem padrão para começar essas conversas.
Elas não vão sempre no mesmo sentido, cada uma é diferente.
Mas eu consigo iniciar elas da mesma maneira.
Então quando eu sinto que eu preciso trazer o tema de gênero,
ou se alguém parece estar pretendendo trazer o tema de gênero,
eu preciso pará-los ali e fazer apenas uma pergunta que precisa ser respondida, e essa pergunta é:
"Qual a sua definição para gênero?"
Porque se eu não entender qual a sua definição para gênero
e você não entender a minha definição para gênero,
você pode apostar que essa discussão não vai ser produtiva.
Porque se você está usando duas definições diferentes para gênero,
você não está nem falando a mesma língua quando se trata de feminismo. Esse é o principal.
Então, levei algum tempo para me dar conta disso.
E eu acho que eu ainda estou me dando conta disso porque eu ainda estou tendo essas discussões. Mas é aqui que eu cheguei até agora.
Então hoje eu vou mostrar isso a partir da perspectiva que eu experienciei sobre minha definição de gênero,
— que nem eu já disse, eu era uma adolescente liberal.
Mas eu também quero falar sobre as implicações maiores
para o nosso ativismo e para a nossa prática política, dessas duas
diferentes ideias de gênero. Porque ideias têm consequências materiais quando nós agimos sobre elas.
E desde o ano passado, talvez há um ano e meio, quando eu estava militando para a DGR,
você pensaria que um grupo que defende a destruição da civilização através da força, deveria,
não sei, talvez achar que esse fosse o assunto mais polêmico que você poderia trazer (da destruição da civilização).
Mas não. [risos] Não. É gênero. Todas as vezes.
É tão polêmico que é a única razão pela qual eu sei que nós tivemos seções da DGR excluídas da organização.
Nos foram negadas audiências em palestras e reuniões por causa da visão que nós temos sobre gênero.
E Lierre, que é uma voz determinada sobre o assunto,
recebeu ameaças de agressão e ameaças de morte
porque ela não segura a sua língua em relação à sua visão de gênero.
Eu estou muito agradecida de poder dar algumas explicações sobre um assunto
que tem sido imensamente incompreendido e descaracterizado tanto pela ampla comunidade ativista quanto dentro da própria DGR.
Se houverem dúvidas sobre o que vou dizer hoje,
ficarei muito feliz em responder perguntas, assim como as outras mulheres da convenção presentes.
Eu acho que isso é extremamente importante.
E eu quero ser direta, no entanto. Eu não estou apresentando esse tema para debate. Nem um pouco.
Essa não é apenas a minha opinião. Isso representa a política da DGR
e já aconteceu de pessoas se juntarem à DGR com a intenção específica de mudar a nossa visão sobre gênero
ou desafiando a convenção de mulheres e as mulheres da liderança nas suas visões radicais de gênero.
E falharam miseravelmente. E vão falhar de novo se tentarem porque
isso é o principal da DGR. Essa é a razão pela qual eu me juntei à DGR. Essa é a razão pela qual as mulheres que eu admiro estão na DGR.
E se isso mudasse, nós iríamos todas sair. E aí onde vocês estariam? [risos]
Eu queria tirar isso do nosso caminho primeiro.
Caracterizar essas duas definições de gênero é muito simples superficialmente, mas eu não quero me manter na superfície.
Eu poderia dizer que uma é liberal e a outra é radical, mas o que isso significa?
Então, hoje eu queria desconstruir essas duas definições de gênero
conforme o que essas implicações de liberalismo e radicalismo de fato significam
em termos do efeito material normalmente observado na vida das mulheres.
Mas eu também quero falar sobre alguns dos momentos de epifania,
as experiências pessoais que eu tive que mudaram minha visão sobre gênero.
Não foi apenas lendo um livro. Acontecem coisas que moldam a sua opinião
e eu acho que descrever essas coisas é a melhor maneira que eu conheço de explicar porque eu me sinto da maneira como eu me sinto.
Então, nós temos essa palavra "gênero" e existem duas definições dela lá atrás. Eu meio que absorvi isso de conversas que eu tive.
Na verdade não existem muitas variações.
Ou me dizem uma delas ou me dizem a outra.
E elas não misturam elementos, e isso é muito interessante para mim,
é realmente uma ou a outra. É muito polarizador.
Na primeira definição, gênero, frequentemente chamado de "identidade de gênero",
é uma qualidade pessoal e individual pertencente a cada pessoa.
Identidade de gênero é uma percepção subjetiva do próprio indivíduo,
da sua posição dentro de um espectro entre masculino e feminino,
que são ambos atributos neutros, politicamente.
O gênero é uma performance externa através da escolha de indicadores ou símbolos
como comportamento, liguagem corporal, escolhas estéticas como cabelo, roupas, presença ou ausência de de maquiagem, pronomes.
Esses indicadores externos são os que decidem se um indivíduo
percebe você como homem ou mulher ao te conhecer ou interagir com você.
Cada pessoa tem uma identidade de gênero inata, caracterizada com as palavras
"masculino" ou "feminino" ou algo entre os dois que independe do seu sexo biológico.
Cada pessoa nasce com um sexo biológico (macho, fêmea, intersexual)
que também é apolítico nessa definição.
Sexo e gênero não estão necessariamente conectados.
O que é opressivo sobre isso, de acordo com as pessoas que aderem a essa definição?
O fato de que há uma sistema binário na cultura dominante.
O fato de que desde o nascimento você é socializado como masculino ou feminino.
Geralmente, isso é visto como a opressão de gênero primária nessa definição de gênero.
Esse sistema pune qualquer um que não se conforma com uma das duas opções binárias.
Logo, isso oprimiria tanto mulheres quanto homens.
Ele oprime qualquer um que é colocado em qualquer uma dessas caixas,
não importa porque eles estão colocados ali ou o que acontece com eles.
Então como poderíamos resistir?
"***" mulheres e homens rejeitam o sistema binário,
se identificam como "foras da lei do gênero" e exigem reconhecimento
para um leque de identidades de gênero, com o masculino em uma ponta e o feminino em outra.
Então, nessa definição, virou de um binarismo para um espectro.
As duas pontas do binarismo são apenas esticadas
e então nós podemos ver algumas opções a mais entre os dois.
Essa é a primeira definição.
A segunda definição: gênero é um sistema hierárquico que mantém a
subordinação das fêmeas como categoria aos machos através da força.
Gênero é um sistema material de poder que usa da violência
e da coação psicológica para explorar o trabalho feminino, o sexo,
o sistema reprodutivo, o suporte emocional, etc, para o benefício dos machos.
Gênero não é natural ou voluntário, já que uma pessoa não é naturalmente
subordinada e ninguém escolhe ser subordinado.
O sexo biológico é um aspecto físico de cada pessoa,
e aquelas consideradas fêmeas ao nascerem são socializadas à feminilidade pela cultura.
Nessa definição, feminilidade é definida como demonstrações ritualizadas de submissão aos machos.
Então por que isso é opressivo?
Porque oprime uma categoria de pessoas. E porque há opressores.
O poder é empunhado por grupos de pessoas. É experienciado por indivíduos, sim.
Mas é empunhado por grupos de pessoas contra outros grupos de pessoas.
E com gênero não é diferente.
E como poderíamos resistir? Mulheres se organizam para derrubar o poder masculino e consequentemente todo o sistema de gênero.
Então, ao invés de esticar o binarismo para que haja um espectro entre eles,
essa definição defende a abolição desse sistema de dominação e opressão.
Então, ao invés de haverem mais do que duas identificações de gênero,
nessa definição não haveria nenhuma.
Porque sem patriarcado não haveria necessidade de gênero.
Alguém quer adivinhar qual dessas definições eu vou caracterizar como liberal? [risos]
Eu estou fazendo uma pergunta sincera, porque quando eu leio elas,
se eu der um passo atrás e me desapegar do fato de que eu tenho uma convicção nítida em relação a isso,
a primeira coisa que pula para cima de mim sobre a primeira definição é que ela enfatiza o individualismo.
Então, essa é a primeira coisa sobre a qual eu vou falar, e vou passar um tempo nisso
porque eu acho que esse é o principal do liberalismo sobre o ambientalismo, e é o principal do liberalismo sobre o gênero também.
Então, de novo, nós temos a palavra "gênero", e você pode perceber que isso se parece com um diagrama de Venn, mas os círculos não se sobrepõem de nenhuma maneira.
E isso é porque eu não acho que essas duas definições de gênero tenham alguma coisa a ver uma com a outra.
Eu acho que eles usam a mesma palavra para descrever duas definições contraditórias e vou explicar por quê.
Então, vou começar com a visão liberal.
Eu escolhi uma citação para cada uma dessas definições que eu acredito que as resumem muito bem.
Então, com essa, a citação é: [Rachel para de falar para deixar a plateia ler] "Gênero é uma escolha, ou gênero é um papel, ou uma construção que alguém usa como alguém veste roupas de manhã, na qual existe um 'alguém' que é prioritário em relação a esse gênero, um alguém que vai até o armário de gêneros e decide deliberadamente que gênero será hoje."
E essa é a Judith Butler, cuja obra passei muito tempo lendo na escola.
Ela é uma proeminente teórica ***, e ela é bastante citada.
Eu acho que as ideias dela resumem muito bem a definição liberal de gênero, por isso vou me referir a ela com alguma frequência.
Então, essa citação incorpora de fato esse individualismo para mim.
Então, comecemos com o individualismo: [silêncio] "Se o gênero não é nada mais do que uma característica da personalidade individual, então opressão de gênero ocorre quando uma pessoa é limitada por normas sociais de expressar plenamente seus verdadeiros atributos de gênero."
Na perspectiva liberal, o gênero é visto como uma característica pessoal e individual, e portanto politicamente neutra.
O indivíduo é tão sagrado na nossa cultura dominante egocêntrica
que não é politicamente correto criticar ou investigar o gênero de ninguém.
Isso nos leva a muitas discussões, porque se você tentar analisar isso politicamente,
as pessoas ficam ofendidas em uma base individual. Isso não é o que eu estou tentando fazer.
Eu estou tentando desenhar conexões entre como nós enxergamos o gênero individualmente
e os problemas de classes que afetam a realidade material.
Com o ambientalismo liberal, nós enxergamos esse individualismo como
a suposta capacidade dos indivíduos em acarretar mudanças apenas mudando a eles mesmos.
"Eu vou comprar algo diferente, eu vou vestir roupas sustentáveis, eu vou reduzir a minha emissão de carbono
e isso vai nos ajudar a nos livrar do sistema, ou mudar o sistema,
que é o que está causando a destruição ambiental em primeiro lugar."
A lógica conclusão para isso é o isolacionismo –
"Se nós apenas nos mudarmos para fora do sistema, então nós não vamos estar em nada contribuindo com ele."
O problema nisso, como vocês todos da DGR sabem, é que
só porque você supostamente não está contribuindo com isso, não quer dizer que você está contribuindo para destruir isso.
E a mesma coisa parece estar acontecendo com o gênero.
Onde, um termo que a Judith Butler criou é o "fora da lei do gênero",
que é uma ideia muito atraente quando você é uma adolescente liberal, [risos]
porque coloca esse poder supostamente em suas próprias mãos.
"Se eu apenas parar de me conformar, particularmente, com esses sistemas ou com essas atribuições que estão conectadas ao sistema,
então o sistema vai murchar e morrer sem mim, certo?"
Ou "pelo menos eu posso escapar individualmente dos efeitos dele se eu apenas não representá-los na minha própria vida."
Então, de novo, um "fora da lei do gênero" é alguém que abandona os estereótipos de gênero
e os símbolos de gênero que são tradicionais pelo sexo biológico,
e adota aqueles que estão ligados ao outro sexo.
Eu quero ser bem direta em dizer que eu não me importo em como alguma pessoa se veste.
Eu não me importo como elas cortam seu cabelo ou como elas utilizam maquiagem.
Particularmente, isso não me afeta. Eu realmente não acho que seja político.
Mas eu tenho um problema com pessoas que exigem que isso é um ato político e de resistência em si.
Se vestir como, aparecer como, o estereótipo tradicional de gênero do sexo oposto
não é nada mais efetivo do que morar em uma cabana na floresta, em algum lugar, esperando que a civilização continue sozinha.
Não faz nenhuma diferença política em si.
Mas, eu não me importo, eu não tenho nenhuma crítica sobre pessoas individualmente.
Na perspectiva liberal, opressão de gênero é definida como restrições sociais sobre a capacidade individual de expressar seu verdadeiro gênero.
Então não é uma categoria oprimindo a outra, são indivíduos que não conseguem se expressar.
Eles estão impedidos de fazer isso, e isso é visto como a opressão de gênero primária.
E, de novo, quando eu era uma liberal, isso era muito atraente porque colocou tudo nas minhas mãos.
Se eu quisesse escapar do gênero, eu poderia fazer.
Mas não estava tudo nas minhas mãos. E a ideia de que está tudo nas minhas mãos é tão insultante quanto é ilógico.
Porque ninguém, incluindo eu, escolheria um papel que envolve constante abuso ***,
a ameaça onipresente e, no meu caso, situações ocasionais de violência masculina.
E a convicção com que você foi criada de que você foi feita para
exploração, submissão, silenciamentos, mas nunca humanidade.
E eu não acho – eu não acho que ninguém entre nós acha – que alguém iria escolher isso.
Eu não tenho certeza porque, para a maioria da esquerda, isso é diferente quando falamos de gênero.
Mas parece ser. [aplausos e comemorações]
Eu quero enfatizar aqui: eu posso dizer isso, mas eu estou muito longe de ser espancada, vendida ou morta pelos homens.
Então, no que tange à situação das mulheres, eu tenho muita sorte. E o fato de que eu ainda posso identificar essa opressão de classe na minha própria vida
realmente te diz alguma coisa, já que eu fui tão sortuda.
Então, eu entrei na faculdade e li coisas como a Judith Butler.
A ideia de que eu poderia mudar a minha perspectiva sobre a vida, mudar minhas próprias percepções,
para escapar do que a socialização feminina estava fazendo comigo, era muito tentadora para resistir.
Eu entendo porque mulheres jovens, homens jovens – jovens no geral – estão realmente atraídos por isso.
Mas eu estava errada. E eu estava errada porque gênero não é uma escolha individual e não tinha nada de errado comigo.
Gênero é uma opressão de classe sobre as fêmeas.
Ok, eu quero parar aqui e falar sobre isso. Porque é um individualismo também – eu vou falar sobre isso –,
mas eu queria começar falando sobre isso particularmente.
Então, eu vou repetir algo que falei anteriormente: para ser um fora da lei, precisa haver uma lei.
No caso do "fora da lei do gênero", essa lei é o patriarcado, esse sistema de valores e essa lei é opressão de classe sobre as fêmeas.
Para fazer sentido existir um "fora da lei do gênero" e pessoas que se descrevem como trans,
precisa haver uma maioria para que essa minoria exista.
E essa maioria são as mulheres "cis", na qual eu me incluo.
Ou, mais precisamente, não, porque eu acho esse termo opressivo para fêmeas em níveis múltiplos
porque ele descreve as pessoas fêmeas que se renderam, nesse ponto de vista,
ao "ser feminino". Nós estamos escolhendo o caminho mais fácil, meninas! [ironia]
Nós estamos aceitando aquele papel que nós deveríamos aceitar, e nós somos privilegiadas por causa disso. [ironia]
Porque ser socializada dentro de um papel feminino que engloba subordinação profunda na tua identidade - tanto que tu não o chama assim (de identidade),
você pode chamar da sua natureza, você pode chamar da sua religião, você pode chamar da sua cultura...
Eu não acho que isso seja um privilégio. E eu acho tão ridículo muitas vezes
que eu tenha que explicar porque isso não é um privilégio.
Então, nós vamos continuar no gênero conforme as feministas radicais, e eu irei falar
sobre os problemas de classe em oposição ao individualismo já, mas antes eu tenho esta citação:
"Virou popular dentro de alguns círculos ativistas abraçar as noções do pós-modernismo,
e isso inclui a ideia de que gênero é de alguma forma um binarismo.
Gênero não é um binarismo. É uma hierarquia.
É global no seu alcance, é sádica em sua prática, e é assassina em sua conclusão.
Assim como raça, e assim como classe.
Gênero demarca os limites geopolíticos do patriarcado –
o que significa dizer, nos divide ao meio. E esse meio não é horizontal, é vertical.
E em caso você tenha perdido essa parte, os homens estão sempre no topo."
Eu posso imaginar a resposta anti-DGR, anti-feminismo radical
como sendo "bom, é claro que você citaria a Lierre Keith. É claro que você citaria."
E, sabe, eu citaria. E parte disso se dá porque ela é minha amiga
e porque eu admiro ela. Mas também se dá porque ela foi a primeira pessoa da qual eu ouvi algo como isso,
e é por isso que teve tanto efeito em mim.
Isso pra mim resume as questões de classe que o feminismo radical engloba.
Grupo/ classe: para as radicais, gênero por si só é a opressão. Eu vou repetir isso:
Sem a opressão, não há como existir gênero. Eles são um só e o mesmo quando se fala sobre opressão de gênero sobre as fêmeas.
Para feministas radicais, gênero é a corrente, e o patriarcado é a bola,
e ela se algema ao tornozelo de cada pessoa fêmea que nasce.
Essa socialização não é escapável, mesmo que você mude para aquela cabana na floresta.
Se você tem uma televisão, está lá. Se você conhece algum homem que foi socializado nessa cultura, está lá.
Se você conhece uma mãe que foi socializada como feminina, está lá.
E é isso que o faz um problema de classe.
Eu não consigo escapar do gênero mudando a mim mesma porque mudar a minha aparência
não muda o fato de que eu fui socializada dentro da classa chamada "mulher" contra a minha vontade.
O medo e o desespero que parte daí não é algo que alguém iria escolher, e isso não é minha culpa.
Mas mesmo depois que eu percebi isso, levei algum tempo para levantar a minha cabeça enquanto eu caminhava,
e na maioria dos dias eu ainda tenho que fazer um esforço psicológico para isso.
Então quando pessoas exigem que gênero é individual, que minha identidade individual inclui
andar como se tu fosse ser chutada a qualquer momento, ou manter sua cabeça para baixo enquanto você fala,
é ofensivo. E não tem como classificar de nenhuma outra maneira.
Porque ninguém escolhe essa identidade, ninguém é inerentemente subordinado.
Não é uma coincidência que 91% das pessoas que são estupradas sejam fêmeas, e que 99% dos estupradores são machos.
Não é uma coincidência que os nossos sapatos dificultam a nossa fuga.
É tão tabu reconhecer que fêmeas são socializadas desde o seu nascimento em uma
classe de sexo subordinada que é explorada por machos, isso está tão arraigado nas nossas normas sociais,
que nós nem reconhecemos mais isso. Isso virou uma "escolha", que se tornou a nossa "identidade".
É tabu entre o feminismo liberal tradicional que a gente reconheça o fato que
homens são socializados desde o seu nascimento dentro de uma classe de sexo privilegiada que
se alimenta de violência e de subordinação não apenas em relação às mulheres,
mas como vocês podem ver, também em relação aos oceanos, à terra, e à vida em geral.
Pessoas que são críticas em relação à posição feminista da DGR parecem estar frequentemente desligadas
para o fato que a Lierre não é a única feminista radical na organização – longe disso.
Porque ela é uma mulher que não controla as suas palavras, não controla sua língua,
e de fato não aceita as merdas liberais, ela se tornou o centro das atenções
para o tipo de perseguição que o feminismo radical tende a sofrer.
E, eu acho isso injusto, primeiramente. E boa parte dessa perseguição parte de um e-mail privado
que ela enviou e que se espalhou por toda a internet, e quando as pessoas criticam a DGR se baseando no texto daquele e-mail,
elas esperam que nos sintamos tão envergonhados disso ou tão ofendidos com nós mesmos,
que nós não vamos nem nos referir a isso. Então eu gostaria de fato de ler ele aqui em voz alta.
"Então, eu particularmente venho lutando contra isso desde 1982.
Eu acho "transfobia" uma palavra ridícula. Eu não tenho nenhum sentimento estranho em relação a pessoas que se identificam como "trans".
Eu discordo com elas profundamente, assim como a maioria das feministas radicais.
Imagine só. 'Eu sou uma pessoa rica presa em um corpo humano pobre.
Eu sempre gostei mais de champanhe do que de cerveja, e sempre soube que pertencia à primeira classe, e não à econômica,
e parece tão correto quando as pessoas esperam por mim.
Meu convênio deveria me pagar um milhão de dólares para curar minha disforia econômica.'
Ou, quem sabe isso: 'Eu realmente sou uma indígena. Como eu sei?
Eu sempre senti uma conexão especial com os animais, e eu comecei a construir tendas nos fundos da minha casa assim que tive idade para isso.
Eu insisto em usar mocassins na escola mesmo quando as outras crianças fazem piada disso ou quando meus pais me punem por isso.
Eu li tudo o que pude sobre indígenas, comecei a ir em rituais pow-wow e rituais de purificação assim que tive idade para isso,
e eu sabia que essa era a verdadeira eu. E se vocês, indígenas biológicos não nos aceitarem como trans-indígenas,
então você é tão opressor e genocida quanto os europeus.'
Com gênero não é diferente. É uma condição de uma classe criada por um sistema brutal de poder."
[aplausos]
Eu gostaria de ir um pouco além nessas analogias para, talvez, torná-las um pouco mais compreensíveis.
Eu perguntei, primeiramente longe por ser uma curiosidade genuína,
por que, se gênero é algo em que a socialização não importa, é voluntário,
você pode ser transgênero ou no caso mais específico, uma mulher trans...
Por que isso é aceitável e ser trans-*** não é?
Eu quero continuar um pouco nisso. O que significaria se eu fosse trans-negra, se eu decidisse que isso fosse verdade?
Isso significaria que eu deva usar roupas que são aceitas tradicionalmente e estereotipadamente como roupas de afroamericanos?
Isso significaria que eu me identifique mais firmemente com a cultura africana do que com a cultura branca?
Não. E eu não acho que eu precise explicar por qual motivo. Porque isso é ofensivo.
Eu não estou inserida no contexto histórico que faz disso uma realidade. Eu não sofri a opressão e o abuso
do que é ser de uma classe racial marginalizada.
Então, para mim, reivindicar que eu me identifique mais com essa cultura é reforçar esses estereótipos.
E eu, honestamente, não vejo porque é diferente com gênero.
Se nós aceitarmos que gênero é uma condição de classe, não uma condição individual, essa analogia faz sentido.
Então, as pessoas me falaram sobre elas (as analogias) antes de eu ler sobre elas, e quando eu li sobre elas,
eu fiquei meio decepcionada [risos] porque eu não via de fato por que não era tão óbvio chamar gênero
uma posição de classe. Isso foi um pouco depois de eu deixar o liberalismo.
Agora vamos falar sobre o idealismo.
Então, sob a perspectiva liberal, gênero é idealista. Esta é uma citação da Jennifer Baumgardner,
que eu costumava idolatrar – eu fui assistir ela discursar. Ela é uma mulher muito bacana. Ela produz muitos trabalhos bons. Mas ela diz que:
"Consciência é tudo. Inclusive hoje, reconhecer a desigualdade requer que alguém faça algo a respeito –
e isso é uma responsabilidade assustadora, embora justa."
A ideia de que a consciência é tudo, assim como com o ambientalismo,
nos leva a uma militância que foca em mudar a mente das pessoas,
como se a opressão fosse um erro que seria corrigido se nós apenas explicássemos para os homens que eles deveriam parar de explorar a gente.
Isso requer que nós façamos algo a respeito porque nós somos as afetadas por isso.
Mas reconhecer que nós estamos nos privilegiando de uma opressão de outra pessoa
leva a classe opressora a se omitir, não a fazer algo a respeito.
Até mesmo as feministas liberais... – eu gosto de usar o exemplo da cultura do estupro, para fugir do idealismo, porque estupro não é uma ideia.
De novo, existe uma razão pela qual 91% das vítimas de estupros são fêmeas, e 99% dos estupradores são machos.
Se ela for sortuda, a sobrevivente do estupro vai estar entre 2% dos casos em que isso vai a julgamento
e 97% dos estupradores nunca enxergam uma cadeia. Isso não são ideias. Isso é a realidade.
Quando nós estamos falando sobre cultura do estupro e idealismo, nós temos que falar sobre a Marcha das Vadias.
Eu dou uma chance para vocês adivinharem quem é essa brava jovem feminista. [risos] Os cachos dão uma pista?
Então, eu não me arrependo de ter participado disso – eu inclusive organizei a marcha da minha escola –
porque eu acho que, assim como eu, as mulheres que participam disso estão realmente interessadas em acabar com a cultura do estupro,
porque, qual mulher não estaria? A ilusão na qual eu caí (eu tinha 21 anos nessa foto) foi
acreditar que mudando as ideias das pessoas sobre o estupro iria de fato acabar com a cultura do estupro. Está escrito "ACABE CULTURA DO ESTUPRO" em marca texto.
A ilusão aqui não é querer que a cultura do estupro acabe. A ilusão aqui é
acreditar que marchar por aí com um "ACABE CULTURA DO ESTUPRO" nas minhas costas vai de fato acabar com a cultura do estupro.
De novo, é baseado na ideia que nós podemos mudar as ideias das pessoas sobre o que gênero significa:
"se nós apenas redefinirmos o termo 'vadia' então não irá mais ser um termo opressivo."
Mas nós esquecemos que as linhas da opressão não são demarcadas pelos oprimidos,
são uma escolha do opressor, e elas só podem mudar através da força,
não através de slogans. O que é uma pena, porque eu sou muito boa em slogans. [risos]
Para as radicais, gênero é mantido através da força. Gênero é um sistema material de poder
que utiliza da violência e da coerção psicológica para explorar o trabalho feminino, o sexo, a reprodução,
o suporte emocional, para o benefício dos homens.
Então, cultura do estupro, assim como a pobreza feminina, falha na educação, o tráfico sobre nossos corpos –
é mantido através de estruturas materiais. Não apenas pelas ideias das pessoas.
Gênero é um sistema de poder que usa da violência e da coerção psicológica para manter a opressão sobre as fêmeas.
Não só para controlar nossas ideias, mas para controlar a realidade física de fato.
Do lado liberal nós temos o voluntarismo, e isso volta para o centro das questões polêmicas da DGR sobre o feminismo...
E essa é a nossa política quando se fala sobre espaços femininos, e como isso se relaciona com as pessoas que se descrevem como "trans".
Eu novamente fico triste que eu tenha que colocar isso como uma retratação, mas durante o tempo em que palestrei publicamente para a DGR,
nós fomos apontadas como uma organização "transfóbica". Nós odiamos pessoas trans?
Eu posso falar por mim mesma que eu não odeio pessoas trans como um grupo de pessoas.
E não odeio as pessoas trans que conheço como indivíduos.
Meu sentimento pessoal em relação aos indivíduos não tem nada a ver com a minha análise política
do que a definição de gênero significa para todos nós, e para as pessoas como uma classe.
Na visão liberal, expressão de gênero... – eu tirei isso do site da HRC –
Expressão de gênero é visto como uma escolha voluntária de um conjunto de comportamentos e características externas
que são socialmente definidos ou como masculino, ou como feminino, como
se vestir, higiene pessoal, modos e gestos, padrões de discurso ou interações sociais.
O que podemos entender daí é que se gênero é voluntário, então pessoas que são oprimidas pelo gênero estão escolhendo ser oprimidas.
Eu vou repetir aqui que ninguém escolhe ser oprimido. Se nós formos aceitar essa definição de gênero,
nós estamos aceitando que as pessoas que são oprimidas por terem nascido fêmeas estão escolhendo estar nessa posição
e se elas quisessem, elas poderiam rejeitar isso e mudar isso através de suas próprias escolhas pessoais e fazer algo diferente.
Relembrando sobre algumas pessoas que eu conheci que se identificaram como mulheres trans:
de novo, essas pessoas foram muito queridas. Eu fiquei muito grata em conhecer elas. Eu não digo isso como um ataque pessoal.
Mas algo que elas me disseram ficou realmente preso na minha garganta, quando elas disseram:
"Eu não carrego mais o privilégio masculino com o qual eu cresci."
Eu tive que parar um pouco para pensar o que eu achava daquilo, e se era realmente verdade.
E eu percebi que não era. Porque crescer com o privilégio masculino É o privilégio.
Crescer com a noção de que você é um ser humano e que você merece direitos
e que seu corpo não é de todo mundo e que o sistema de governo te considera humano
é o privilégio. E isso não desaparece simplesmente.
Então, um título alternativo para essa apresentação seria
"Eu não tenho medo do seu pênis, mas sou aterrorizada pela sua socialização." [risos]
Porque eu acho que as pessoas pensam que quando eu digo coisas assim, eu considero os machos naturalmente aterrorizantes,
que você nunca escapará disso. Eu já vi homens se livrarem do sistema de comportamento.
Mas se livrar de ser socializado na masculinidade, que é baseada na violação e na dominação,
não te faz fêmea. Te faz um revolucionário, porque é isso que vai mudar a cultura de fato,
pessoas atuando fora... [pausa para aplausos]
Essa é uma citação do Kourtney Mitchell – talvez ele esteja assistindo ao vivo agora, não tenho certeza, espero que ele esteja –,
ele escreveu um ensaio sobre privilégios brancos e backlash. Ele escreveu que
"É importante entender o que significa ver a opressão racial no contexto de análise de classe.
Ser branco é uma experiência de classe, e não baseada em uma realidade biológica. Mas isso não significa
que alguém possa decidir parar de ser branco, assim como eu não posso decidir parar de ser homem
enquanto a cultura dominante me classificar como homem. Enquanto você for classificado como branco,
você vai continuar se beneficiando do privilégio branco. É disso que aliados precisam lembrar."
Se você colocar isso no contexto da opressão de gênero, é tão verdade quanto.
É disso que aliados precisam lembrar, que quaisquer sejam as suas intenções,
qualquer que seja a sua apresentação externa, você vai ter aquela socialização e portanto aquele privilégio
e aquela identificação pela cultura dominante ao longo da sua vida.
Assim como enquanto eu viver eu vou ter que vigiar minha postura para ter certeza de que não estou me escondendo.
Eu vou ter que falar super alto na maioria das vezes para compensar as forças sociais que me ensinam a falar absolutamente nada.
Nada disso irá mudar apenas porque eu quero que mude.
Nada disso é voluntário como é no lado liberal.
Então, agora eu gostaria de falar sobre um conflito que eu tenho observado dentro do feminismo liberal.
Eu não acho que a opressão seja natural ou voluntária. Mas sob a perspectiva liberal, opressão é tanto natural quanto voluntária.
E isso se dá porque gênero é visto tanto como natural, algo inato, com o qual nós nascemos,
e algo que nós escolhemos no guarda-roupa de gênero todos os dias, como roupas.
É difícil discutir sob a perspectiva radical porque liberais têm sua argumentação limitada ao naturalismo e voluntarismo.
Eles podem argumentar dos dois lados, e mudar isso num piscar de olhos,
e eu estou tendo muita dificuldade tentando descobrir como apontar que isso é um conflito básico de lógica.
Se algo é inerente, então não pode ser voluntário.
Meu cabelo castanho é inerente, portanto não é voluntário. O mesmo acontece com o gênero. Ele não pode ser ambos, e na minha visão não é nenhum.
O próximo assunto é construtivismo. Ao invés de ser natural, sob a ótica radical, o gênero é construído.
É artificial. É imposto em humanos que poderiam declarar humanidade se fosse possível.
Mas ao invés disso, essa identidade construída de subordinação e dominação é impressa em nós.
Essa citação é da Andrea Dworkin: "Mulher não nasce, ela é produzida.
Nessa produção, a humanidade dela é destruída. Ela se torna símbolo disso, símbolo daquilo.
Mãe da terra, vadia do universo.
Mas ela nunca se torna ela mesma porque ela é proibida de fazer isso."
Então, para as fêmeas, essa é a realidade da construção do gênero, e isso não é escapável.
Só porque é construído, não significa que isso possa ser desconstruído por vontade.
Isso não significa que podemos desconstruir individualmente.
Para desconstruir isso, é necessário organização, que é algo que ainda não aconteceu em escala de *** ainda
e é por isso que o patriarcado ainda existe.
O que me fez perceber isso foi um relacionamento com uma estudante que eu tive.
Nós passamos por educação ***, auto-estima, cultura midiática. Durante muito tempo, nós conversamos apenas sobre essas coisas.
Falamos sobre nossas experiências sobre gênero e sobre ser uma adolescente nessa cultura.
Eu conheci uma menina que foi sujeita a incesto, tráfico, estupro,
mais incidentes horríveis do que eu poderia compreender.
Ela pode ter sido a pessoa mais horrorosamente abusada que eu já conheci nesse contexto.
Enquanto eu conhecia ela... [vídeo corta]
Ela já tinha cabelo curto, ela cortou um pouco mais, e pediu pra eu usar o pronome "ele", o que eu também fiz.
Eu realmente não pensei profundamente sobre aquilo na época. Na época, se você me perguntasse "por que ela fez isso?"
Eu teria dito que era a identidade de gênero nata dela. Ela nasceu querendo fazer isso.
Agora que ela está longe de seus pais, e nessa instituição, ela sente como se ela pudesse, sem repercussão,
e isso é uma coisa boa, porque ela pode expresssar quem de fato ela é.
Mas eu não acredito nisso mais.
E uma das razões pela qual eu não acredito é porque um dia durante a aula, eu propus que elas
fizessem um desenho, todas as minhas alunas. Eu sabia o que eu achava que elas mereciam,
mas eu queria saber o que eles achavam que mereciam. Como elas queriam que suas vidas fossem quando elas saíssem.
Como as vidas delas seriam se elas alcançassem o que elas queriam e precisaram durante suas vidas.
Elas desenharam muitas coisas diferentes, mas eu as deixei desenhando durante muito tempo.
Em um canto ela desenhou o que era visivelmente um rosto de uma menina. Ela usava
batom rosa, um laço rosa no cabelo, e lágrimas correndo pela sua face, e tinha um grande X através dela.
E embaixo ela escreveu palavras que ela pensava que descreviam o que é ser menina. Ela escreveu
"dor", ela escreveu "medo", ela escreveu "estupro", ela escreveu palavras nessa linha.
No canto ela desenhou um rosto humano – na verdade, parecia muito com ela.
Tinha cabelo curto e marrom, sem maquiagem ou acessórios, e o rosto estava sorrindo.
E embaixo ela escreveu "confiante", ela escreveu "feliz", ela escreveu "segura".
E embaixo disso ela me escreveu um parágrafo, e começava com "se eu não tivesse sido uma menina..."
"Se eu não fosse menina, eu não teria sido estuprada. Se eu não fosse menina, eu não estaria assustada.
Se eu não fosse menina, eu não estaria aqui, nessa instituição."
Eu guardei isso por um tempo porque eu não entendi imediatamente. Levou algum tempo para engolir isso.
E eu não trago esse exemplo para tentar convencer que todas as pessoas que se descrevem como trans
fazem isso por causa do tipo de abuso horroroso pelo qual ela passou.
Eu trago isso para afirmar que ser socializada à feminilidade é o abuso,
e ela experenciou isso mais brutalmente que a maioria de nós.
E ela fez o que ela pôde para fugir disso na época.
Mas, por mais que eu queira isso pra ela, isso não significa que ela poderia de fato fugir.
Ela saiu dessa instutuição, mas ela não saiu da feminilidade. Não importa o quão curto ela corte o cabelo, e não importa qual nome ela use.
Então, gênero é qualquer coisa menos natural. Ela não nasceu com um cérebro feminino ou um cérebro masculino, mas ela nasceu com um corpo feminino
e nessa cultura, isso significa que ela é considerada menos humana do que os membros da classe *** "homem".
Não é estranho pra mim que ela queria escapar dessa opressão da socialização feminina rejeitando sua feminilidade,
mas como Kourtney disse, assim como os homens não conseguem apagar seus privilégios masculinos,
mulheres não podem escolher apagar a opressão de serem socializadas na feminilidade.
O que me traz à distinção final entre a concepção liberal e radical sobre gênero que eu vou falar agora.
Que é a diferença entre reformismo e revolução.
Essa é uma citação longa, não vou ler ela toda porque não é necessário.
"Essa é uma daquelas coisas às quais a palavra '***' pode se referir: a ampla gama de possibilidades, lacunas, sobreposições,
dissonâncias e ressonâncias, lapsos e excessos de sentido quando os elementos constituintes
do gênero de qualquer um, da sexualidade de qualquer um, não são feitos (ou não podem ser feitos) para significar monoliticamente."
Essa é uma citação da Eve Sedgwick, que é outra teórica *** muito proeminente.
Ela segue dizendo que pessoas podem se identificar como "fadas radicais, mulheres insistentes, mulheres trans, lésbicas que transam com homens,
homens lésbicos". Ela continua nisso por algum tempo, é um parágrafo longo.
O ponto no qual eu estou querendo chegar, lendo toda essa linguadem acadêmica,
é que todas essas identidades ainda estão baseadas na dominação e na subordinação.
E só porque estamos botando algumas categorias entre as duas (homem e mulher), não significa que estamos nos livrando do sistema,
nos baseando em animosidade entre as duas.
No lado radical, nós temos revolução. Essa é Catherine Mackinnon:
"Em uma sociedade onde a equidade é um fato, não apenas uma palavra,
palavras de ataque racial ou ***, ou de humilhação, vão ser sílabas sem sentido."
E do lado feminista radical, é isso que vai acontecer com as palavras "homem" e "mulher",
assim como o sistema de classe *** baseado na subordinação e dominação que essas palavras significam.
E é isso. Obrigada.