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ILHA DE RAASAY ESCÓCIA
Cheguei! É aqui.
O topo fica bem ali.
É fantástico! Que vista!
Estou de volta!
A última vez que estive aqui foi há 25 anos.
Deixei meu martelo em algum lugar.
Olha só! Aqui estamos!
Olha esta vista. É do que me lembro.
É a nossa antiga herança diante de nós.
A paisagem escocesa tem um passado épico e violento.
Escondida nestas montanhas e vales,
está a história do planeta.
Vou mostrar como esta paisagem foi usada por um grupo
de cientistas brilhantes, heterodoxos e excêntricos
para desvendar os maiores mistérios da Terra.
Vou seguir os passos desses pioneiros
que fizeram algo que ninguém fez antes.
Eles mostraram visão...
e determinação...
...para reunir provas surpreendentes
e desvendar as forças que moldam nosso mundo.
Nossa! Meu Deus, é muito quente!
Está tudo por aí, se souber o que procurar.
Escrita na paisagem escocesa
está a história de todo o planeta.
MUSKETEERS Apresentam
HOMENS DE PEDRA
MUSKETEERS Albattroz | Otoni | Kakko
TEMPO PROFUNDO
Torridon, nas Terras Altas do noroeste da Escócia.
A paisagem mais antiga da Grã-Bretanha.
Nossa! Isto é tão remoto.
Parece o fim do mundo.
Por séculos, as pessoas olharam esta paisagem e indagaram
há quanto tempo ela estava aqui e como se formou.
Mas foi somente na década de 1750,
que a resposta começou a surgir,
do mito e da superstição
rumo a uma nova visão da Terra baseada na ciência.
Um homem teve uma nova ideia revolucionária que mudou tudo.
Mudou a forma de pensarmos o planeta,
até a forma de pensarmos sobre nós.
O homem que iniciou essa revolução científica
cresceu na capital da Escócia, Edimburgo.
James Hutton se tornaria o pai da Geologia.
Quando jovem, as colinas ao redor de sua cidade natal
o deixavam curioso sobre como a Terra se formou.
Hutton costumava vir muito aqui.
Ele daria um incrível companheiro de viagem.
Era divertido, desbocado um pouco grosseiro.
Adorava um uísque,
gostava de suas mulheres
e adorava debater novas ideias.
Em 1747, Hutton era um jovem médico recém-formado
com um enorme e incomum interesse por toda a natureza.
Quando ele estudou a origem da paisagem,
descobriu que a autoridade aceita
não era a ciência, mas a teologia.
Quando Hutton começou a pensar sobre a Terra,
só havia um único livro de Geologia disponível:
a Bíblia.
O que eu gosto nesta edição da época de Hutton,
é que define a data de quando Deus criou a terra e os mares.
4.004 a.C.
Não só em 4.004 a.C.,
mas no sábado, 22 de outubro de 4.004 a.C.
Hutton acreditava em Deus.
Mas diferente dos homens de sua época,
ele não se prendia a uma interpretação literal da Bíblia.
Ele acreditava que Deus tinha criado um mundo
que possuía um sistema de leis naturais.
Mas ele particularmente não se estendia em tais ideias.
Pelo contrário, fazia o que muitos estudantes fazem.
Enchia a cara.
Ele também se distraía muito com as mulheres
e isso seria sua ruína.
Foi a relação de Hutton com uma certa mulher
que parece tê-lo magoado
e causado seu banimento de sua adorada Edimburgo.
Hutton engravidara sua jovem amante, a Srta. Edington.
Foi um escândalo.
Ela foi levada a Londres para ter o filho.
Para minimizar os danos à reputação da família,
Hutton deixou Edimburgo.
Aos 26 anos, ele foi obrigado a começar uma nova vida
numa fazenda abandonada da família, ao sul da Escócia.
Hutton escreveu que era
"uma terra amaldiçoada onde tudo conspira para me magoar".
Mas foi esta remota fazenda que despertou
suas brilhantes ideias sobre o planeta.
Este é a Fazenda Slighhouses, mas...
que paisagem!
É desoladora, ventosa e está muito úmida hoje.
Não é o tipo de lugar onde imagina que seria criada
uma importante nova teoria sobre a Terra como sistema,
mas foi exatamente isso que Hutton fez.
Primeiro, deveria transformar este cenário encharcado
em uma lucrativa fazenda.
Um dos trabalhos pesados que ele encarava com frequência,
era cavar e limpar valas de drenagem.
Que trabalho duro!
Denise Daly Walton cultiva aqui perto
e sabe o que ele enfrentou.
A finalidade desta vala era retirar a água do campo,
mas o que acontecia com o tempo,
é que o sedimento, a cobertura do solo, escoava dos campos
e acabava obstruindo tudo.
Mas isto é algo precioso em termos de terra cultivada,
mas é desperdiçado nestas valas.
Todo ano, Hutton limpava estas valas de drenagem.
E todo ano, a chuva levava
a preciosa cobertura dos seus campos para dentro das valas
e a carregava riacho abaixo.
Esta dispersão de drenagem nas terras de Hutton
era o início de uma longa jornada
para todo aquele solo retirado de seus campos.
A água corre rumo a córregos e rios cada vez maiores e,
para onde ela corre, a areia, o silte e a lama acompanham,
acabando despejados no mar.
Esta erosão incessante da terra preocupava muito Hutton
pois ele percebeu que, se todo o solo fosse levado,
acabaria não havendo onde se cultivar
e, por fim, as pessoas morreriam de fome.
Hutton olhou esta erosão
e percebeu que ela devia ocorrer não só na Escócia,
mas por todo o planeta.
Parecia que Deus tinha feito um mundo
que privava as fazendas de um bom solo.
Com o tempo, se isto continuasse,
haveria uma paisagem totalmente estéril.
Mas, para ser sincero, Hutton não acreditava nisso.
Em seu coração, não fazia sentido
que Deus deixasse Seu povo morrer de fome.
E em sua mente, não fazia sentido
que a Terra fosse reduzida irreversivelmente a nada.
Ele estava certo de que havia um meio de criar terra nova.
Hutton, aos 34 anos, e ainda trabalhando isolado,
veio a rejeitar a visão convencional da Terra.
Ele não podia aceitar que o mundo fora criado por Deus
de um só golpe,
e permanecido imutável.
Seu pensamento radical era que Deus
devia ter planejado um planeta que pudesse reconstruir-se.
A questão era:
Como terra nova podia ser formada?
Hutton viu algo na paisagem ao redor de sua fazenda
que lhe deu sua primeira pista.
Hutton via penhascos como este por toda a parte.
Se olhar esta rocha, verá camadas distintas,
todas sutilmente diferentes. Centenas delas.
Hutton percebeu que estas faixas de sedimento
foram depositadas em épocas diferentes.
Trazidas dos rios e depositadas uma sobre a outra.
São apenas depósitos ao longo do tempo,
ano após ano,
aos poucos compactando-se em rocha.
A maior ideia de Hutton, que hoje parece tão óbvia,
é que a criação e a destruição da terra
não são eventos súbitos e dramáticos
do passado obscuro e bíblico, mas
ações lentas e imperceptíveis que acontecem o tempo todo.
Estão acontecendo neste instante.
A ideia de que a terra era criada
dos pedregulhos do passado
era uma forma surpreendentemente nova de ver a paisagem.
E esta rocha sedimentar,
formada por camadas de lama e areia
depositadas em rios e mares,
é encontrada em todo lugar.
Dos penhascos brancos da costa sul da Inglaterra...
ao Grand Canyon dos EUA.
Hutton havia feito sua primeira descoberta.
Ele agora tinha certeza que havia
um grande sistema conduzindo a Terra.
Após 15 anos na fazenda,
Hutton estava prestes a iniciar um novo capítulo em sua vida,
que testaria suas ideias
e o levaria a descobertas ainda maiores.
Aos 41 anos,
seus anos de exílio chegaram ao fim.
Ele voltou à cidade de sua juventude.
Era época do Iluminismo escocês.
Edimburgo era a capital intelectual do mundo.
Hutton aproveitou ao máximo sua volta.
Por toda a cidade, ele debatia e bebia
com as maiores mentes de sua era.
Dá para ver por que as reuniões eram ideais para Hutton,
sua personalidade era uma combinação
de um profundo pensador e beberrão.
Este ambiente alegre era perfeito
para divulgar sua grande ideia.
Note que, mesmo toda esta boemia não era suficiente
para esconder as lacunas na teoria de Hutton.
Hutton sabia que nem todas as rochas que ele podia ver
haviam sido formadas por camadas de sedimentos.
Se o sistema da Terra reciclava continuamente toda a terra,
de que outras formas as rochas podiam ser formadas?
Hutton ainda não tinha uma grande peça do quebra-cabeça.
Ele obteve sua inspiração
de outra grande mente do Iluminismo escocês.
Seu amigo, um James indiscutivelmente mais famoso.
James Watt.
O colega escocês James Watt era um exímio inventor.
Famoso por fabricar motores a vapor mais eficientes.
Foi o aproveitamento do calor por James Watt
que impulsionaria a Revolução Industrial.
Hutton tinha fixação por máquinas
e era fascinado pelas engenhocas a vapor de Watt.
Hutton viu que o calor dava aos motores a vapor um enorme poder.
Ele começou a imaginar se o calor movimentava o planeta.
Talvez o calor do interior da Terra
fosse a força que pudesse mudar e renovar a paisagem.
Talvez o centro da Terra tivesse um poderoso motor térmico.
Os cientistas do século XVIII tinham visto vulcões ativos.
Mas achavam que fossem apenas explosões pequenas e isoladas.
Hutton foi o primeiro a imaginar
que o centro da Terra era uma bola fundida.
Ele via os vulcões como os condutos de uma fornalha gigante
nas profundezas da Terra.
Acreditava que essa fornalha
tinha o poder de criar terra nova...
...terra que nascia fundida.
Se pudesse provar que a maior parte da paisagem
tinha começado fundida,
então teria descoberto um outro meio
pelo qual a Terra pudesse renovar-se continuamente.
Mas se grande parte das rochas começou fundida,
por que elas eram tão diferentes?
Se tinham a mesma origem, teriam de ter mesma aparência.
Se estiver tentando definir "gênio", acho que seria
"fazer correlações incríveis nas quais ninguém jamais pensou".
Mas repetidamente ele tirava suas ideias
das valas da fazenda, dos penhascos e de motores a vapor.
E talvez sua ideia mais inteligente tenha sido
quando soube de um acidente em uma fábrica de garrafas.
Vamos tentar esta.
Mais uma.
A próxima.
Siobhan Healy, artista em vidro, vai me ajudar a recriar
o incidente que chamou a atenção de Hutton.
Há algo muito satisfatório nisto!
Em uma fábrica de vidro em Edimburgo,
os operários deixaram acidentalmente
uma fornada de vidro derretido no forno por tempo demais.
Temos duas pilhas de vidro quebrado.
Vamos tratar uma normalmente
e usar a outra para recriar o "acidente".
Esta está pronta.
Só vou fechá-la.
Agora depende da nossa maior temperatura.
Vai derreter totalmente a essa temperatura,
vai ficar líquido.
Esta aqui vai na outra, a mais lenta?
Sim, essa aí vai demorar bem mais, este programa,
pois tudo será idêntico menos a taxa de resfriamento.
A razão pela qual Hutton estava tão interessado nos resultados,
é porque ele sabia que vidro derretido
se comportaria da mesma forma que rocha fundida.
Nossa! Meu Deus, é muito quente!
Essa é a sensação de 900 graus? É fantástico.
É muito quente. Dá vontade de tocar...
Sei que é a última coisa que meus dedos fariam...
- Ardente. - Ardente.
Resfriamos as duas amostras a taxas diferentes.
Os resultados são dramáticos.
O que é este aqui?
Este é o pedaço de vidro vitrificado.
Este é o que resfriou rápido, arrefeceu bem rápido.
Dá para ver através dele, é bem transparente. Olha só.
Mas este é totalmente diferente.
É uma rocha fundida que se solidificou bem devagar.
Podemos ver cristais aqui,
pequenos cristais angulares,
e a textura é completamente diferente.
Cristais são formados dentro do vidro ou da rocha
quando os átomos se agrupam.
Leva muito tempo para que as aglomerações de átomos
cresçam o bastante para serem vistas.
Quando o vidro resfria rapidamente,
os cristais são muito pequenos e o vidro é transparente.
Mas quando deixaram o vidro resfriar por muito tempo,
enormes cristais foram criados.
Hutton tinha uma explicação
para os diferentes tipos de rocha na superfície da Terra.
Resfriamento muito lento cria cristais grandes.
Resfriamento mais rápido cria cristais menores,
como neste granito.
E resfriamento ultra rápido, cria cristais minúsculos,
como no basalto vulcânico.
Só alteramos a velocidade de resfriamento do vidro derretido,
e criamos dois materiais totalmente diferentes.
Hutton entendeu que toda uma variedade de rochas
podia ter se originado como rocha fundida
e conforme solidificaram-se sob diferentes condições,
seu aspecto e aparência mudaram.
Significava que o calor podia ter formado
bem mais da superfície da Terra do que se pensava.
Isso convenceu Hutton de que de fato havia
um imenso motor térmico interno em ação.
Hutton criou duas formas fundamentais
pelas quais a terra podia ser criada.
A rocha sedimentar podia formar-se
quando as condições climáticas, chuva, geada e vento,
erodiam o solo.
Os rios carregavam o sedimento para os oceanos.
Ele era comprimido para formar uma nova rocha.
E a sua segunda ideia?
De que um núcleo quente no centro da Terra
podia criar rocha fundida que se resfriava para tornar-se terra.
Ele tinha uma clara visão de uma Terra
que se destruía e reparava-se sozinha
em um ciclo infinito.
A ideia de Hutton é tão bela.
E surpreendente para algo que foi concebido
há quase 250 anos, ela está quase correta.
É uma ideia grandiosa, coerente e impressionante.
E esse conceito da Terra como um sistema,
renovando-se continuamente, parece tão moderno.
Mas a grande pergunta, à época, foi:
O mundo estaria pronto para ela?
Hutton foi convencido por amigos a divulgar suas ideias.
Ele estava preocupado sobre como elas seriam recebidas.
Mas, em 1785,
ele apresentou sua teoria da Terra como um sistema
na Sociedade Real de Edimburgo.
Imagine a cena.
Diante dos maiores cientistas da época,
o deslocado Hutton prepara-se para apresentar
sua teoria radical da Terra.
Ele é um péssimo orador,
fala com um forte sotaque escocês.
E está muito nervoso.
Além disso, ele tinha a incômoda sensação
de que não tinha provas de campo suficientes
para apoiar sua teoria.
E sabia que o que ia falar era polêmico.
Suas ideias iam contra toda a ortodoxia religiosa da época.
No evento, seus maiores temores se concretizam.
A apresentação é um fracasso.
Os cavalheiros da Sociedade Real
rejeitaram a teoria de Hutton de imediato.
E ainda pior, Hutton, um temente a Deus,
foi acusado de ser ateu.
Um dos maiores transtornos foi por causa disto. Granito.
É difícil crer que isto podia causar desentendimentos.
Mas isto causou grande polêmica.
O conhecimento aceito era de que o granito
fora a primeira parte da terra a ser criada por Deus.
Nada podia ser mais sólido que a pedra fundamental do Senhor.
Parece bastante sólida.
Mas Hutton alegava que esta coisa dura,
que parece tão antiga e imutável,
era o melhor exemplo de uma rocha jovem
que outrora foi quase líquida.
Ele estava dizendo que isto surgira fundido.
Alegar que o granito surgiu fundido
desafiava toda a visão bíblica da Criação.
Há 220 anos, isto era heresia.
Hutton precisava achar alguma prova de campo.
Aos 60 anos,
quando deveria estar em casa com cachimbo e chinelos,
Hutton caiu na estrada.
Ele partiu de Edimburgo, rumo a nordeste,
para a selvagem região montanhosa
de Blair Atholl, em Perthshire.
Viajar na década de 1780 era um pouco diferente de hoje.
Levarei duas horas para ir de Edimburgo a Blair Atholl,
nas Terras Altas do Sudeste,
mas, para Hutton, a viagem teria levado 3 dias a cavalo.
Sua busca por rochas provocava assaduras causadas pela sela.
Certa vez, escreveu: "Senhor, tende piedade do traseiro
"que está grudado à cabeça que procura rochas".
Mas, apesar da dor no traseiro, ele não desistiu.
Em 16 de setembro de 1785,
Hutton viajava ao longo deste caminho em Glen Tilt.
Hamish Cruickshank é fiscal de caça no Estado de Atholl.
Você tem um escritório incrível.
- É um dos melhores do mundo. - É fantástico.
595 km2 de escritório.
Se eu estivesse aqui em 1785,
- não seria muito diferente? - Não muito.
Estaria usando o mesmo tipo de equipamento que eu.
O tecido, só o modelo mudou com os anos.
Acho que está mais camuflado na paisagem do que eu!
- É o que parece! - Eu não poderia caçar assim.
Hutton escolheu explorar Glen Tilt
porque dois dos maiores rios escoceses encontram-se aqui.
O rio Dee corre sobre um leito de granito rosado.
O rio Tay tem um leito de arenito cinza.
No encontro dos rios, Hutton esperava
que o granito e o arenito também se encontrassem.
O contato, o encontro, fica descendo o rio.
Era dele que Hutton estava atrás.
Se pudesse achar onde as rochas se encontravam,
talvez encontrasse prova de que o granito escorrera
como líquido derretido para dentro do arenito.
Conforme Hutton avançava pelo rio,
podia ver o arenito cinza bem próximo,
mas nunca tocando o granito rosa.
Então, Hutton chegou a estas corredeiras.
Este é o trecho.
Veja só!
Maravilhoso.
Hutton deve ter ficado muito contente ao ver isto.
Dá para ver a rocha cinza ali, a rocha estratificada.
E aqui, à nossa frente, esta rocha rosa, é o granito.
E ali, sobretudo ao longo da outra margem,
vemos tudo misturado. Se der uma olhada,
olhe ali embaixo,
verá que a rocha rosa e a cinza estão misturadas.
E aquela era a ponte. Havia uma ponte até aqui.
Hoje, não há um jeito fácil de atravessar.
Hutton tinha assaduras da sela.
Acho que terei queimaduras de corda.
Esta é a rocha que Hutton procurava.
Tem uma falha bem aqui. Veja só.
Este é o belo granito vermelho
e esta é a rocha cinza estratificada, o arenito.
Dá para ver como o granito está projetando-se com força
para dentro do arenito.
É um trecho brilhante. Veja só. É o máximo.
Tem umas porções aqui. É muito irregular.
Lembra um sorvete italiano.
Lindo.
Aqui está claro que o granito veio da rocha fundida.
Ele está sendo projetado em todas as direções.
Neste sentido, naquele.
Ali ele está subindo, na transversal.
Como se fosse uma área de batalha geológica.
Estas rochas mostraram que a paisagem tinha mudado.
Não ficou, como dizia a Bíblia,
"imutável desde a Criação."
O granito fundido era a prova
de um gigante motor térmico em ação.
Esta descoberta em Glen Tilt
foi um grande momento para Hutton.
É o tipo de emoção que todo geólogo busca.
Por isso, também sou fascinado pelas rochas que nos cercam.
No cerne de ser um geólogo
está a habilidade de interpretar a paisagem
mas é muito difícil explicar para os outros.
A gente se habitua a ela. É meio intuitivo.
E também é uma maldição, pois de repente
não podemos curtir a paisagem sem pensar:
"O que é aquilo?
"Como se formou? Será arenito?"
Sempre sou...
repreendido quando estou de férias por trabalhar.
Quando estou olhando uma paisagem, minha esposa diz:
"Pare com a Geologia, pare de trabalhar!"
Respondo que só estou olhando. Mas é verdade.
Acho que um geólogo não consegue olhar ao redor sem pensar:
"Como isso se formou?"
A partir de suas observações na Escócia,
James Hutton provou muito de sua teoria da Terra como um sistema.
As rochas eram fundidas e resfriadas.
Eram erodidas e reconstruídas.
Hutton ainda não estava satisfeito,
e partiu mais uma vez.
Desta vez, estava à procura de pistas de há quanto tempo
esse ciclo de renovação do planeta vinha ocorrendo.
Será que a Terra tinha milhares de anos, como dizia a Bíblia,
ou ela era muito mais antiga?
Em 1788, Hutton foi para Siccar Point,
na costa de Berwickshire,
a apenas alguns km de sua antiga fazenda.
Nesta época, em abril, normalmente o mar é traiçoeiro,
mas hoje temos um belo e calmo dia de sol,
bem parecido ao clima de quando Hutton veio com dois amigos
para tentar convencê-los sobre suas teorias da Terra.
O que Hutton estava à procura acabou virando
a mais celebrada descoberta geológica da História.
Hutton conhecia bem esta costa.
O que o intrigava eram os diferentes ângulos
das rochas ao longo dos penhascos.
Ele tinha visto camadas verticais
ao longo de parte da costa...
...mas sabia que, mais ao norte, o ângulo mudava totalmente,
as camadas eram horizontais.
A curiosidade de Hutton o fez dar uma olhada mais de perto.
Ótimo!
É muito bom estar aqui.
Acho que isto parece um depósito rochoso de antepraia,
bem comum para a maioria das pessoas, mas...
mas este lugar é "ouro geológico".
Quero dizer, simplesmente,
este é o sítio geológico mais importante do planeta.
Jamais saberíamos só de olhar,
mas há uma imensa história a ser contada aqui,
um conto épico de violência geológica.
Demora um pouco para ver,
mas Hutton soube na hora o que vira.
Nada mais que o nascimento e morte de mundos inteiros.
O incrível é que Hutton viu tudo isto
não em um penhasco gigante,
mas em uma seção de rocha com 1,5 m de altura.
Nestas camadas horizontais e verticais de rocha,
ele viu um longo ciclo geológico empilhado sobre outro.
Estas camadas verticais de rocha cinzenta
começaram como fluxos pastosos de areia e lama
que escorriam de antiga *** de terra
e depositavam-se no oceano.
Elas se depositavam no fundo do mar como camadas horizontais
centímetro por centímetro durante milhões de anos.
Mas, apesar de terem se formado horizontalmente,
tudo estava prestes a mudar. O oceano começou a se fechar.
O que Hutton não sabia, mas que depois descobrimos,
é que os continentes se movem lentamente pelo globo,
por isso as camadas de rocha estão verticais, e não deitadas.
Ao longo de milhões de anos,
um continente lenta e implacavelmente
flutuou em direção à Escócia.
O fundo do mar enrugou,
empurrando as camadas de rocha para cima,
cada vez mais alto,
até elas se tornarem colinas e montanhas.
Então, a erosão recomeçou,
os rios e a chuva desgastaram a terra.
No topo das camadas cinzas verticais,
o sedimento novo gradualmente depositou-se e solidificou-se
em novas camadas horizontais de rocha.
Hutton não sabia o que causou a formação em Siccar Point.
Sua brilhante ideia foi perceber
que isso envolve processos graduais
que ocorreram não no tempo bíblico,
mas em um tempo profundo,
estendendo-se ao passado imensuravelmente.
Hutton estava certo
e hoje sabemos o quão antigas são estas camadas de rocha.
Esta rocha cinza tem por volta de 425 milhões de anos.
E esta vermelha tem cerca de 345 milhões de anos.
O intervalo entre as duas é de 80 milhões de anos.
E este acabou sendo o mais importante legado de Hutton...
uma avaliação do tempo profundo...
...a linha do tempo de um planeta.
Hutton tinha uma frase assim:
"Sem vestígio de um começo, sem perspectiva de um fim".
Ou seja, uma atemporalidade na qual
pequenas mudanças graduais podem alcançar quase tudo.
Aqui, em Siccar Point,
James Hutton percebeu que se uma formação de rocha antiga
podia depositar-se sobre outra,
este processo devia ter levado
um período inconcebível de tempo.
Ele não fazia ideia de quanto.
Em verdade, ele nunca forneceu uma escala de tempo exata.
Ele só podia imaginar que o ciclo da Terra
continuara infinitamente.
O reconhecimento do Tempo Profundo de Hutton
foi um avanço extraordinário,
tão importante, ao seu modo,
como a teoria da evolução de Darwin
ou a teoria da relatividade de Einstein.
Como todos esses grandes avanços científicos,
foi difícil para as pessoas acreditarem.
As ideias na Geologia, bem, na ciência,
assemelham-se a uma corrida de revezamento,
onde o bastão é passado de mão em mão.
Espera-se que toda vez que o bastão é passado adiante,
as ideias tornem-se mais sólidas e aceitas.
Mas, no caso de Hutton,
esse bastão caiu ao longo do trajeto.
60 anos após a morte de Hutton,
o mais respeitado físico da Grã-Bretanha
tentou calcular a idade da Terra.
Um cientista escocês tão bem sucedido
que podia bancar um iate luxuoso como este.
É hora de apresentar-lhe um tipo bem diferente de cientista.
William Thomson, mais conhecido como Barão Kelvin de Largs.
Ele foi um colosso da ciência mundial.
É mais conhecido pela escala de temperatura.
O "grau Kelvin", é ele.
Ele era tudo o que Hutton não foi.
Ele era totalmente inserido no ambiente acadêmico.
Era poderoso, articulado, um verdadeiro showman.
Kelvin era um cientista brilhante,
extremamente confiante em sua própria capacidade.
Ele rejeitou a teoria de Hutton da Terra
como sistema em mudança perpétua.
A Terra deveria ter uma idade,
mesmo que fosse bem mais velha do que a Bíblia dizia.
Kelvin achava que Hutton e seus seguidores
eram pouco científicos.
Seu principal problema era a alegação
de que a Terra não mostrava vestígio de um começo,
nem perspectiva de um fim,
de que estava em uma espécie de movimento perpétuo.
Em outras palavras, ele achava que os geólogos
estavam tentando quebrar as leis da física.
Era hora de esmagar essa ideia.
Kelvin era um showman.
E ele tinha uma forma dramática de mostrar
que a Terra estaria perdendo energia o tempo todo.
Podia ter sido minha cabeça.
Eis uma bala de canhão de 15kg.
15kg. Mal posso segurar.
É bem mais pesada do que parece.
- Então, o que faremos? - Quero que fique em posição
e ergueremos a bala de canhão.
O Dr. Stuart Reid, da Universidade de Glasgow,
mostra por que Kelvin estava convencido
que a teoria de Hutton de mudança infinita na Terra
estava errada.
Segure-a com as mãos.
Esta bala de canhão é um pêndulo.
Está me puxando para frente, que peso enorme.
- Erga-a até o seu nariz. - Aqui vamos nós.
Quando eu soltar o pêndulo, ele vai voltar em minha direção.
Se ele me atingir, minha cabeça vai acabar como o melão.
Certo, lá vamos nós.
Por que não está atingindo minha cabeça?
Não é possível para a bala de canhão
ir além de onde você a soltou,
pois ela não pode ganhar energia do nada,
na verdade, ela está perdendo energia
por causa da fricção no cabo,
por causa da resistência do ar quando ela vai e volta.
A amplitude diminui conforme ela balança e dá para notar isso.
Para Kelvin, isso mostrava que o planeta,
tal como o pêndulo, deve perder energia o tempo todo.
A Terra não pode estar em ciclo de mudança
que nunca reduz e nunca para.
É uma demonstração simples mas efetiva
do real problema que Kelvin tinha com a teoria de Hutton,
a noção perversa que a Terra estava constantemente criando,
destruindo e depois recriando sua superfície,
repetidamente, para sempre.
Na verdade, a Terra devia estar constantemente perdendo energia,
assim como esse pêndulo uma hora irá parar...
uma hora.
Baseado no princípio de que tudo tem de começar e parar,
Kelvin estava certo que a Terra tinha um começo, uma idade.
Hutton foi um pouco vago,
por nunca ter dado uma idade precisa para a Terra.
Kelvin não iria deixar isso passar em branco.
Grandes alegações precisam ser apoiadas por números concretos,
e ele, Lorde Kelvin, era o homem para consegui-los.
Ele iria enfrentar a mais audaciosa
e polêmica questão da época.
Lorde Kelvin ia calcular a idade do planeta Terra.
Isto é um pedaço de granito.
Vamos tentar fundi-lo.
O granito funde a cerca de 1.200 graus Celsius,
a várias dezenas de km enterrado sob nossos pés.
Vamos tentar fundi-lo aqui com um maçarico.
Acabe com ele.
Enquanto isso, vou filmá-lo
com uma câmera termal infravermelha
que vai registrar o calor e já posso vê-lo aumentando.
Está a 280, 300 graus Celsius.
Sem dúvida, está brilhando!
Kelvin acreditava que a Terra começou fundida.
Agora está difícil de olhar. Estamos em 1.000 graus Celsius.
O ponto de fusão da rocha foi o ponto de início de Kelvin
para calcular a idade da Terra.
Ele o considerou como a temperatura do planeta
quando foi criado.
E aí está. 1.200 graus Celsius!
Veja só isso!
Isto é rocha fundida!
Linda!
Kelvin alegou que o planeta não podia ficar fundido para sempre.
Podemos parar um segundo?
Agora é pura Física básica. Após algo ser aquecido,
não pode permanecer quente. Tem que se resfriar.
A partir de suas experiências, Kelvin descobriu quanto tempo
os objetos pequenos levavam para resfriar.
Se ele adaptasse seus números para calcular quanto tempo
levaria um objeto do tamanho do planeta para resfriar-se,
então, ele teria a exata idade da Terra.
Durante anos, Kelvin continuou a aperfeiçoar seus cálculos.
Ele finalmente estabeleceu a idade da Terra
entre 20 a 40 milhões de anos.
Apesar de sabermos que os cálculos não são exatos,
os números de Lorde Kelvin tiveram enorme impacto.
Ele provocou intenso debate sobre a idade da Terra
e incomodou quase todo mundo.
Este é Kelvin.
Na maioria das vezes que vi esta estátua,
ela tinha um cone de trânsito na cabeça.
Ele também foi ridicularizado ao publicar sua idade da Terra.
A Igreja odiou, pois deixou a Terra muito velha.
Os colegas cientistas odiaram
porque deixou a Terra muito jovem.
Não era tempo suficiente
para a teoria da evolução de Darwin acontecer.
E quanto ao motor térmico de Hutton,
na escala de tempo de Kelvin, ele não existia.
Lorde Kelvin cometera um erro crucial.
Seu cálculo baseou-se na ideia de que a Terra
havia resfriado para um estado totalmente sólido.
Mas, como hoje sabemos,
o interior da Terra não esfriou como uma bola de rocha fundida.
Partes dela continuam fundidas,
como Hutton imaginara,
mas não pudera provar.
Kelvin podia estar errado,
mas a sua idade da Terra sustentou-se por quase 50 anos.
Até 1898,
quando as próprias rochas revelaram a verdade.
Poucos anos antes de Kelvin morrer,
houve uma importante descoberta.
Os cientistas descobriram uma fonte de energia
nas profundezas do planeta,
que ajudou a manter a Terra fundida por muito mais tempo
do que Kelvin podia ter imaginado.
A radioatividade.
Uma amostra de granito comum das Terras Altas escocesas.
Este barulho são partículas atingindo
a fina lâmina na frente deste contador Geiger.
Elas vêm de uma minúscula quantidade de urânio radioativo
contido na rocha.
Tendemos a pensar a radioatividade como obra humana,
mas na verdade é um fenômeno natural.
Uma poderosa fonte de energia que existe
desde o surgimento do Sistema Solar.
A radioatividade é uma das principais forças
que tornam a teoria de Hutton correta.
Eu adoraria encontrar Hutton e,
tomando um uísque e perto de uma lareira,
contar tudo o que descobrimos desde que ele morreu.
No topo dessa lista, estaria a radioatividade.
A energia da radioatividade e o calor que ela gerou
mantiveram partes do interior do planeta fundidas.
Ela é parte do motor térmico de Hutton
que tem permitido à superfície da Terra
ser constantemente reciclada e rejuvenescida.
Mas há outro motivo para contar sobre a radioatividade,
pois além de explicar esse "motor térmico",
ela foi responsável por nos contar a idade do planeta.
Podemos hoje olhar para as rochas mais antigas no planeta
e descobrir sua verdadeira idade.
Eu voltei a Torridon, nas Terras Altas do Noroeste.
Espero achar as rochas mais antigas da Grã-Bretanha aqui.
Quero descobrir a idade da Escócia.
E a radioatividade me dará a resposta.
Estou indo para a zona rural
com os colegas geólogos, John Wheeler e Ian Miller.
Parece serpentear, não?
Esta colina é 50 vezes mais velha
do que a era dos dinossauros.
É uma das regiões mais antigas do nosso planeta.
Nossa! Isto é espetacular, não?
Veja só!
Todo este afloramento...
é um veio após o outro...
desta linda rocha branca.
Esta rocha chama-se complexo Lewisian.
É como um Paraíso das rochas para mim.
As texturas, as formas, as cores.
Este complexo Lewisian é belo, grandioso.
E aqui vem na transversal e para.
Mas o que é mais fascinante,
mais impressionante que sua grandiosidade,
é que esta rocha pode ser parte
do primeiro substrato rochoso da Grã-Bretanha.
Lá vamos nós.
Este é o lado *** da Geologia.
É trabalho frio e árduo.
Vou retirar uma amostra. Isso!
Por mais que eu ame esta rocha,
preciso de uma amostra para definirmos a idade.
Está boa, não?
Está ficando feio, a neve está chegando,
mas conseguimos. Temos a rocha que queríamos.
É uma bela amostra do complexo Lewisian.
E fora o fato de ser grandiosa,
a questão é que estou segurando nas mãos
um fragmento de uma das partes mais antigas da Grã Bretanha.
Vamos descobrir, mas temos de levá-la ao laboratório.
Vamos sair desta montanha.
SEDE DO BRITISH GEOLOGICAL SURVEY
Então, aqui está a minha rocha.
É esta. O objetivo é descobrir a idade deste pedaço da Escócia.
A primeira coisa que temos de fazer
é esmagar esta rocha,
e fazemos isso nesta máquina.
A rocha triturada
contém os cristais radioativos que preciso.
Veja só.
A rocha começou assim, e virou isto.
Em algum lugar aqui dentro
estão os pequenos cristais que queremos.
Vamos examinar os cristais
usando um microscópio eletrônico.
- Isso cria um vácuo? - Cria um vácuo lá dentro.
Da amostra que coletaram,
conseguimos extrair
um grande número de cristais de zircão.
Os cristais de zircão são cápsulas do tempo.
Estão cheios de urânio radioativo,
que se decompõe em chumbo a uma taxa regular.
Pode ver perfeitamente a forma dos cristais.
- Sem dúvida. - É muito bonito.
A proporção de urânio e chumbo deixada nos zircões
revelará a idade da rocha.
A máquina mostra uma quantidade incrível de números.
- Um monte de números. - Muitos.
- Meu Deus, são muitos. - São muitos números.
Eles variam de 2,5 bilhões
até um pouco acima dos 3 bilhões de anos de idade.
Essas idades são inacreditavelmente antigas.
3,129 bihões de anos.
- É surpreendentemente antiga. - Incrível.
O fato de estar entre 2,6 e 3 bilhões de anos de idade
é realmente extraordinário.
Esta rocha existe há dois terços da idade do planeta.
A Terra tem 4,6 bilhões de anos.
E a ideia de que uma amostra da Escócia
tem quase 3 bilhões de anos.
O que Hutton teria feito com isso?
As rochas de Torridon foram criadas
quando os primeiros continentes na Terra surgiam.
A paisagem antiga da Escócia
é testemunha de bilhões de anos de mudança geológica.
Foi um pioneiro que tornou possível
essa visão de nossa paisagem.
James Hutton fez um dos maiores avanços
no pensamento humano.
Quando ele olhou a paisagem
e viu o que ninguém mais havia visto.
Ele foi o primeiro a entender a real e imensa idade da Terra.
E foi essa descoberta mais que qualquer outra
que nos permitiu montar
a complexa história da vida do nosso planeta.
No próximo episódio...
Vou seguir os passos do dedicado geólogo
que desvendou o passado vulcânico da Escócia.
E o herói não celebrado...
Dá para ver começando a subir.
...que resolveu o mistério do que faz os continentes
moverem-se pela superfície do globo.
MUSKETEERS Legendas Para a Vida Toda!