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Queria começar dizendo...
um ponto importante que a gente tem que resolver.
Nós temos que resolver um conflito de identidades que nós temos.
Nós somos deuses ou nós somos uma espécie animal?
Se por acaso nós formos deuses,
a gente pode continuar fazendo o que nós estamos fazendo com o planeta.
Se não formos, aí nós vamos ter, realmente, alguma dificuldade, cada vez maior.
Um planeta, conversando com outro planeta, disse o seguinte:
"Estou com uma coceirinha nas costas".
O outro planeta respondeu:
"Não se preocupa, isso é a humanidade. Já já passa".
Um economista conversando com outro economista, disse assim:
"Que saco! Agora a gente vai ter que se preocupar com o planeta!"
O outro economista respondeu:
"É, o problema somos nós. O planeta não está ameaçado.
Mas não se preocupa não, já já a gente arranja outro planeta".
Então, essa é a mentalidade dos economistas.
E é isso que realmente me trouxe até a economia ecológica.
Quando eu estudei economia,
eu me dei conta que duas variáveis foram excluídas dos modelos.
As pessoas e toda a natureza.
Não há uma só variável nos modelos dos economistas
que contabilize a contribuição dos recursos da natureza.
A única análise feita é a introdução dos recursos naturais tangíveis,
como o metal, o petróleo, aquelas coisas que eu posso pegar e comercializar.
Então, o mito de total separação entre economia e meio-ambiente,
dentro da economia tradicional,
ele é extremamente forte,
ele rege a maior parte das políticas governamentais,
as políticas que estão girando ao redor da gente
elas são regidas por esse pensamento.
Eu até ia pedir, por favor,
mantenham em segredo a informação do Antônio Nobre,
que aqui na Amazônia tem 600 bilhões de árvores.
Não sai desta sala essa informação!
Porque, para um economista,
uma árvore só tem valor quando derrubada ao chão.
As consequências, na prática, para a vida de todos,
desse modelo mental, desse pensamento, ela é muito severa.
Quando a economia nasceu,
a proposta de um pensador, de um economista clássico,
era para que a economia fosse uma irmã siamesa da biologia.
O Alfred Marshall fez essa proposta, foi voto vencido.
A economia é hoje uma irmã siamesa da mecânica clássica de 200 anos atrás.
Então, esse é um dos problemas que produz um pensamento econômico
completamente alheio à realidade social e ambiental.
Em relação ao aquecimento global, esse ponto...
eu estava fazendo uma releitura, e teve um comentário dos economistas...
vocês sabem que a maior ameaça do aquecimento global é o fim da água
e o fim dos alimentos.
Já foi dito isso aqui, inclusive.
O ponto é que os economistas se deram conta do seguinte:
"Bom, se isso acontecer, não vai ter problema nenhum".
alimentos representam uma parte pequeníssima da economia".
Então, se sumirem os alimentos...
Gente, se preparem,
vocês vão ter que comer carro, celular, televisão,
se preparem porque é o que vai sobrar!
Então, essa visão é um modelo mental
que foi construído durante séculos
e que está regendo a nossa história até os dias de hoje.
Aqui... vou ser muito breve nesta parte.
A história da vida, a história do planeta, ela é extremamente importante.
Por exemplo, a Terra, quando se originou, não tinha uma gota de água.
A água foi trazida, em grande parte, 70%,
através do bombardeamento contínuo de cometas.
E, quando Júpiter surgiu, esse planeta gigante, o quê aconteceu?
Criou paz cósmica para a Terra.
Então, agradeçam a Júpiter.
Sem Júpiter não estaríamos batendo papo agora.
Quando vocês tomarem um copo d'água,
agradeçam também a todos os seres vivos, a todas as plantas,
porque se todas as plantas e todos os animais sumirem da Terra,
a água potável some junto.
A gente não é capaz de perceber essa inter-relação das nossas vidas,
do nosso sistema econômico, com todo o meio-ambiente natural.
Então, esse é um grande problema de nossa concepção de mundo.
Então, o problema não está só com os economistas,
mas como a forma como a gente se desvinculou.
O meu coração, o coração de vocês só bate
porque tem um ser vivo na Terra que armazena luz do sol.
Sem ele não estaríamos aqui batendo papo.
As abelhas são responsáveis por grande parte dos alimentos
que chegam nos nossos pratos.
Então, a ideia de sustentabilidade começa reconhecendo essa interdependência.
E a história com o planeta é muito importante.
O planeta não tem o menor interesse na gente,
somos nós que teremos que negociar com a Terra.
Aqui a gente tem um gráfico que mostra uma das consequências desse pensamento.
A gente tem o quadro maior, que seria o meio-ambiente, o planeta.
E dentro dele, a economia e as pessoas, ou seja,
economia e pessoas são um sub-sistema do planeta.
Qual é a visão que os economistas têm?
O contrário.
Eles acham que o planeta é um sub-sistema da Terra.
Então, é uma forma de enxergar o mundo
parecida com a época em que acreditávamos
que a Terra era plana,
ou que o sol girava em torno da Terra.
É uma irrealidade, no fundo.
Mas, com essa visão de mundo,
a gente construiu um conflito,
entre o sistema econômico e a natureza, gigante.
Primeiro conflito: a economia é linear, extrai, produz, consome, descarta.
Extrai, produz, consome, descarta.
A gente acredita no jogar fora. Jogar fora não existe!
O sistema é fechado materialmente.
A economia é totalmente circular.
A gente transformou a Terra numa enorme lixeira
com a gente dentro! E vivos! O que é pior.
O sistema é degenerativo, introduz queima de combustível fóssil.
Inegavelmente é um processo totalmente anti-natural.
A gente está perseguindo a composição química dos planetas mortos,
que são ricos em gás carbônico.
Planeta vivo é rico em oxigênio, nós estamos fazendo o caminho oposto.
Não é só isso, tem uma série enorme de materiais degenerativos.
E o sistema econômico é infinito, só que o planeta é finito.
A maior obviedade é que o planeta tem um espaço
que não aumenta de tamanho.
Por quê, cargas d'água, a gente aumenta quantidade de gente e coisas
numa velocidade infinita num espaço que não aumenta de tamanho?
Não há como não ter problema.
A gente não enxerga a restrição que existe para o planeta.
Outra coisa muito engraçada nesse debate
é que os ambientalistas entraram na briga com os economistas
e falaram assim: "Vão acabar, os recursos! Vai acabar, o metal! Vai..."
Gente, é ridículo porque existe um problema aí,
o planeta é muito maior do que a gente.
Eu fico até imaginando a cena.
"Olha, aquela placa tectônica que existia já acabou,
vamos para a próxima".
O planeta não oferece restrição como fornecedor de recursos.
O planeta oferece restrição como depositário
daquilo que nós estamos fazendo nele.
E no esfacelamento dos serviços ecológicos,
esse conflito aqui, transformar a Terra em lixeira,
ele vai trazer consequências, já está trazendo,
no esfacelamento de serviços ecológicos que nós dependemos para viver.
Como que é o bicho da economia?
Não tem boca nem estômago.
De onde vêm os recursos, pouco importa.
Não tem intestino, nem reto.
Para onde vão os recursos, pouco importa.
Só tem sistema circulatório. Está flutuando no ar.
Tem conexão nenhuma com a realidade.
Completamente autista.
E essa visão de mundo é a causa dos nossos problemas.
Se a gente quer atingir a sustentabilidade, a gente tem que inverter o eixo.
Não é a economia que é mais importante que as pessoas,
e não são as pessoas que são mais importantes que o planeta.
É o inverso.
É o planeta que é mais importante que as pessoas,
e as pessoas, olha só que incrível, são mais importantes que a economia.
Na verdade, a gente tem um sistema hoje
em que as pessoas servem à economia, não é a economia que serve às pessoas.
Nós temos cidades que servem ao trânsito de automóveis,
não servem à coletividade.
Então, uma inversão de eixo monumental em todas as áreas
em função dessa visão de mundo.
Aqui a gente tem uma fotografia de noite, do mapa mundi,
para mostrar várias histórias aqui.
A primeira delas é:
Os países ricos já destruíram praticamente
a totalidade das suas florestas naturais.
O atual modelo de desenvolvimento econômico,
ele é completamente conflitante com a recuperação,
preservação do meio-ambiente e da natureza.
E, por ventura, se os países ricos estivessem sozinhos neste planeta,
não houvesse mais nenhum outro território adicional,
eles já teriam entrado em colapso ambiental há muito tempo,
como foi no caso da Ilha de Páscoa.
O comércio global permite que países que já exorbitaram
o que a gente chama de sua "pegada ecológica",
através da importação de produtos,
a sua capacidade de continuar usufruindo de recursos ecológicos,
principalmente água, que eles não possuem mais.
Então, a ideia aqui é mostrar isso para vocês.
Se esse modelo continuar, nós vamos ter problema.
Se os chineses resolverem usar papéis para coisas mais básicas,
nós vamos ter problema.
Nós vamos ter que encontrar uma nova forma de produção,
nós vamos ter que tirar a ênfase do crescimento
e colocar ênfase na distribuição.
O caso da Ilha de Páscoa está ilustrado aqui.
Ele mostra, na linha preta, nesse gráfico,
a trajetória populacional da Ilha de Páscoa.
A Ilha de Páscoa dependia de uma floresta para viver.
Eles precisavam da floresta para pescar em alto mar, fazendo canoas,
para construir os seus templos, para manter o solo fértil para agricultura.
E eles cortaram até a última árvore e terminaram em canibalismo
e os últimos dez ilhéus foram escravizados por espanhóis.
O problema da Ilha de Páscoa foi local.
O problema que nós estamos vivendo agora,
na nossa "Ilha de Páscoa 2", é global!
Por causa do comércio global,
nós estamos exorbitando todo o modo de produção para o resto do mundo
sem pensar no quanto ele foi danoso para o meio-ambiente.
Bom gente, eu vou finalizar a minha palestra aqui
com uma frase importante que eu queria dizer,
que, em primeiro lugar, nós somos vozes e várias vozes,
pronome na primeira pessoa, esquece,
a gente tem que evitar.
Em segundo lugar, evitem, pelo amor de Deus, a filosofia do "nunca morri".
Eu estou conversando com vocês agora, significa que eu nunca morri.
Por acaso, eu nunca vou morrer?
O planeta, no qual nós chegamos, nos últimos segundos da vida desse planeta,
nunca expulsou a humanidade da Terra.
Por acaso significa que esse planeta não irá nos expulsar da Terra?
Stephen Jay Gould entrou num debate com economistas
que foi a seguinte história.
Os economistas escreveram,
"de acordo com Gould, toda a vida na Terra está fadada à extinção.
Por isso, se a economia causar alguma extinção,
estamos prestando um favor à natureza".
Gould respondeu: "é verdade, toda a vida na Terra está fadada à extinção,
mas isso ocorre em eras geológicas, em milhões de anos".
Coisa que o nosso cérebro, que vive décadas, não entende.
"E não em décadas, e não causado por uma única espécie".
E Gould terminou: "É muita ingenuidade achar que essa extinção
jamais irá se voltar contra os causadores".
Obrigado.