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Tradutor: Gustavo Rocha Revisor: Romane Ferreira
Eu sou professor de engenharia,
e nos últimos 14 anos,
eu só ensinei "bosta".
(Risos)
Não que eu seja um professor ruim,
mas eu venho estudando e ensinando
sobre resíduos humanos
e como os resíduos são levados
através das usinas de tratamento de águas residuais,
e como planejamos e projetamos
essas usinas de tratamento para proteger
águas de superfície, como os rios.
Minha carreira científica é baseada
em técnicas moleculares de última geração,
métodos baseados em DNA e RNA,
para observar populações microbianas em reatores nucleares,
e novamente otimizar esses sistemas.
E durante os anos,
eu desenvolvi uma obsessão pouco saudável por toaletes,
e fiquei conhecido por entrar em toaletes
e fotografá-los com meu celular
por todo o mundo.
Mas ao longo do caminho, eu aprendi
que não é somente o lado técnico,
mas também há uma coisa chamada de "cultura do cocô".
Por exemplo,
quantos de vocês preferem lavar
e quantos preferem limpar?
(Risos)
Se é que me entendem.
Se você prefere lavar, então usa água
para a limpeza ***. Esse é o termo técnico.
E se prefere limpar,
então usa papel higiênico
ou, em alguma regiões do mundo
onde não há papel, usa jornal
ou trapos ou espigas de milho.
E não é só uma curiosidade,
mas é muito importante entender
e resolver o problema do saneamento.
E é um grande problema.
Há 2,5 bilhões de pessoas no mundo
que não têm acesso a saneamento adequado.
Eles não têm um toalete moderno.
E há 1,1 bilhões de pessoas
cujos toaletes são as ruas,
ou as margens de um rio, ou espaços abertos,
e novamente, o termo técnico para isso é
defecação a céu aberto,
mas é simplesmente
cagar ao ar livre.
E se você vive em meio a material fecal
e ela está à sua volta, você vai ficar doente.
Vai chegar à sua água potável,
à sua comida, a seus arredores imediatos.
As Nações Unidas estimam
que todo ano, há 1,5 milhões de mortes infantis
por causa de saneamento inadequado.
É uma morte prevenível a cada 20 segundos,
171 a cada hora,
4.100 a cada dia.
E assim, para evitar defecação a céu aberto,
municípios e cidades
constroem infraestrutura, por exemplo, como latrinas,
em áreas periurbanas e rurais.
Por exemplo, em KwaZulu-Natal, província da África do Sul,
foram construídas dezenas de milhares dessas latrinas.
Mas há um problema quando escalamos
a dezenas de milhares, e o problema é:
o que acontece quando as latrinas transbordam?
Isto é o que acontece.
As pessoas defecam ao redor do toalete.
Em escolas, as crianças defecam no chão
e deixam uma trilha ao redor do prédio
e começam a defecar ao redor do prédio,
e essas latrinas precisam ser limpas
e esvaziadas manualmente.
E quem faz esse trabalho?
Existem trabalhadores
que às vezes precisam descer nas latrinas
e remover o conteúdo manualmente.
É um trabalho sujo e perigoso.
E como podem ver, não há equipamento de proteção,
nenhum traje de proteção.
Há um trabalhador lá em baixo. Espero que consigam vê-lo.
Ele está usando uma máscara no rosto, mas sem camisa.
E em alguns países, como na Índia,
as castas mais baixas são condenadas
a esvaziar as latrinas,
e são ainda mais condenadas pela sociedade.
E vocês se perguntam: "Como podemos resolver isso
e por que não usamos toaletes com descarga, como no Ocidente,
para esses 2,5 bilhões?"
E a resposta é que não é possível.
Em algumas dessas áreas, não há água suficiente,
não há energia,
vai custar dezenas de trilhões de dólares
para construir a rede de esgoto
e construir as instalações
e operar e manter esses sistemas,
e se não os construirmos corretamente,
teremos toaletes com descarga
que vão basicamente direto para o rio,
assim como acontece em muitas cidades
no mundo em desenvolvimento.
E será que essa é a solução?
Porque, essencialmente, o que estamos fazendo é
estamos usando água limpa
e usando-a para dar descarga,
e levar até a usina de tratamento de águas residuais
que, por sua vez, descarrega no rio,
e esse rio, por sua vez, é fonte de água potável.
Então precisamos repensar o saneamento,
e precisamos reinventar a infraestrutura sanitária.
E vou argumentar que para fazê-lo,
precisamos pôr em prática o pensamento sistêmico.
Temos que olhar para toda a cadeia de saneamento.
Começamos com uma interface humana,
e então pensamos em como as fezes
são coletadas e armazenadas,
transportadas, tratadas e reutilizadas;
e não somente descarte, mas reutilização.
Então vamos começar com a interface com o humano.
Digo, não importa se prefere usar água ou papel,
sentar ou agachar,
a interface com o humano deve ser limpa
e fácil de usar, pois no final das contas,
dar uma cagada tem que ser prazeroso.
(Risos)
E quando abrimos as possibilidades
de entender essa cadeia de saneamento,
aí a tecnologia por trás,
da coleta até a reutilização, não é tão importante.
E assim podemos aplicar
soluções locais e específicas a um contexto.
E podemos nos abrir a possibilidades como,
por exemplo, este toalete que separa a urina,
e há dois buracos neste toalete.
Há a parte da frente e de trás,
e a frente coleta a urina,
e a parte de trás, o material fecal.
Então, o que fazemos é separar a urina,
que tem 80% de nitrogênio
e 50% de fósforo.
Então, ela pode ser tratada
e precipitada para formar coisas como a estruvita,
que é um fertilizante de alto valor,
e o material fecal pode ser desinfetado
e também convertido em produtos finais de alto valor.
Ou, por exemplo, em nossas pesquisas,
podemos reutilizar a água tratando-a
em sistemas locais de saneamento,
como jardineiras ou pântanos artificiais.
Então podemos abrir todas essas possibilidades,
se esquecermos o velho paradigma de toaletes com descarga
e usinas de tratamento.
Vocês podem estar se perguntando: "Quem vai pagar?"
Bem, vou argumentar que o governo
deveria financiar a infraestrutura sanitária.
ONGs e organizações doadoras,
elas podem fazer o máximo, mas não vai ser o suficiente.
O governo deveria financiar o saneamento
do mesmo jeito que financia estradas
e escolas e hospitais
e outras infraestruturas como pontes,
porque nós sabemos, e a OMS fez este estudo,
que para cada dólar que investimos
em infraestrutura sanitária,
temos um retorno de três a 34 dólares.
Vamos voltar ao problema de esvaziar as latrinas.
Na Universidade Estadual da Carolina do Norte,
nós desafiamos nossos alunos a apresentar uma solução,
e foi isto que eles apresentaram:
um trado de parafuso simples e modficado,
que pode levantar o resíduo
da latrina até um recipiente,
e agora o trabalhador da latrina
não precisa descer à latrina.
Testamos na África do Sul, e funciona.
Precisamos deixá-lo mais robusto,
e vamos fazer mais alguns ***
em Malawi e na África do Sul no ano que vem.
E nossa ideia é torná-lo
um serviço profissionalizado de esvaziamento de latrina
para que possamos criar um pequeno negócio com isso,
gerar lucro e empregos,
e a esperança é que,
à medida que repensamos o saneamento,
estamos estendendo a vida útil dessas latrinas,
para que não precisemos recorrer
a soluções breves
que não fazem muito sentido.
Acredito que acesso a saneamento adequado
é um direito humano básico.
Precisamos parar com a prática
de pessoas de castas mais baixas e status mais baixos
descendo e sendo condenadas a limpar latrinas.
É nossa obrigação moral,
social e ambiental.
Obrigado.
(Aplausos)