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Chegamos a Siracusa
Acho que não vou esperar muito pela correspondência.
Mas o que você vai fazer em Siracusa?
"Contos da Lua Vaga"...
Os camponeses não têm história.
Os operários...
... também não têm história.
Um escritor como Pavese, que lutou como um...
... até se suicidar,
e como Vittorini... - E Fortini.
Aliás, havia uma pessoa em França, uma pessoa de quem eu gosto muito,
que se chamava Charles Péguy,
que disse: "Fazer a revolução seria...
... é também repor no seu lugar coisas antigas...
- Muito antigas. - ... muito antigas, mas esquecidas".
Ele era prudente, dizia "também" e era esse o sonho do Pavese.
O mito, ou seja, a história não escrita, a história dos camponeses, a história...
tinha tanto peso na balança
como a história contemporânea e a história das lutas ditas contemporâneas.
E quando percebeu que era o caos,
que o seu partido não era capaz de juntar as duas coisas
e equilibrar a balança,
Pavese se suicida, no quarto de um hotel, em julho de 1950,
em Turim e, nesse momento, o Vittorini,
que pertencia à mesma editora, a Einaudi,
senta-se nas escadas da editora e começa a chorar.
Continua a viver e a escrever,
há uma relação entre os dois,
eram velhos amigos...
O Pavese foi importante para nós porque era um intelectual,
portanto, um pequeno burguês italiano,
que não se comprazia
na sua própria complacência.
E que, sem ser nada masoquista,
era alguém que reagia constantemente contra...
... contra a corrente.
E isso é importante porque se chega a um ponto em que não se aguenta mais.
Ah, você viu?
Ali... uma borboleta.
Vi-a quando estávamos filmando, mas já tinha esquecido.
Viu?
- Como é que me reconheceu? - Gostaria de saber...
Venha, tenho um arenque no fogo.
Não tem frio?
- Não
-Quê?
- Tem fome? - Não sei.
O avô era um grande homem?
Era sim, você não sabia?
Era um grande homem, capaz de trabalhar 18 horas por dia.
E era um grande socialista,
um grande caçador,
e um grande cavaleiro, na procissão de São José.
Ele ia a cavalo na procissão de São José?
Claro que ia! Era um grande cavaleiro,
melhor do que todos daqui da terra, até que os de Piazza Armerina.
Era impossível fazer a procissão sem ele.
- Mas ele era socialista... - Era socialista,
Não sabia ler nem escrever, mas entendia de política
Ele era socialista.
Como podia ir a cavalo atrás de São José se era socialista?
Os socialistas não acreditam em São José.
Que idiota você é... Teu avô...
não era um socialista igual aos outros. Era um grande homem.
Podia acreditar em São José e ser socialista.
Naquela cabeça cabiam mil e uma coisas
e era socialista porque entendia de política.
Mas podia acreditar em São José.
não falava mal de São José.
Mas os padres deviam pensar que ele era contra...
Não vamos conseguir melhor.
Eu disse-lhe: "Essa foi boa, agora faz outra só para mim".
Funciona sempre.
Não é verdade.
- Que número é esta? - 14, eu acho.
Fizemos mais ou paramos?
Não sei,
mas temos a 11 na primeira versão, a 12 na segunda e esta é a 14,
se há mais, não devem ser tão boas.
- Lixo com elas. - Mas este filme teve altos e baixos.
não é como o "Empédocles", por exemplo,
em que as últimas eram sempre as melhores.
Porque, apesar de tudo, eles tinham trabalhado menos...
Não é isso, são é mais extrovertidos.
O "Empédocles" era totalmente introvertido, portanto, a concentração era enorme.
Há também um outro elemento a considerar.
O "Empedocles" foi um trabalho de um ano e meio,
não era diário, e este foi um trabalho de três meses, diariamente,
não é a mesma coisa.
Vale mais um ano e meio para dominar o texto,
mesmo sem trabalhar todos os dias, do que três meses.
mesmo que se trabalhe todos os dias, mesmo aos domingos.
Não há nada a fazer, tempo não é dinheiro.
E eles também tiveram a oportunidade de descobrir o que é um texto
e mesmo, de modo geral, o que é a literatura.
- Uma coisa que toda a gente... - Mas não sabiam onde iam se meter
porque foi trabalhando que eles viram que era trabalho sério.
- O que estava dizendo? Que é trabalho extra,
demasiado cansativo, demasiado difícil... É mesmo cultura popular.
Eram pessoas que travalhavam durante o dia inteiro,
que vinham para os ensaios às 6,
no melhor dos casos, às 5 e meia. É um esforço enorme.
Tinham mesmo de estar interessados, senão não teriam aguentado.
E também é uma questão de confiança,
quer dizer, nunca tinham ouvido falar do Straub,
não sai nos jornais.
e como a TV italiana, quando passa os nossos filmes, é à uma da manhã,
e é gente que trabalha, não vê TV à uma da manhã.
Mesmo assim, depois, descobriram o Vittorini,
não o teatro, porque já tinham uma idéia,
eles descobriram o cinema e entre nós criaram-se laços de amizade.
Aqui, tem uma ligeira derrapada do ator,
que não é feia, mas é uma derrapada.
e o que tínhamos combinado, ou seja, de ele dizer: Uma COISA de padres"
e não "Uma coisa de PADRES".
"Uma COISA de padres"
e não "Uma coisa de PADRES".
"Uma COISA de padres"
Mas os padres deviam pensar que ele era contra.
E ele lá queria saber dos padres!
Mas a procissão era uma coisa de padres.
Sempre ignorante!
A procissão era cavalos e homens a cavalo.
Era um cortejo a cavalo.
Olhe,
o cortejo saía dali,
havia uma pequena igreja...
... que não se vê, naquela montanha,
mas a iluminavam por dentro e por fora,
e parecia uma pequena estrela,
e o cortejo a cavalo saía da capela, com lampiões e guizos,
e descia a montanha.
Era sempre de noite, claro, e viam-se os lampiões
e eu sabia que o meu pai vinha à frente.
Que grande cavaleiro!
E íamos todos esperar naquela praça, lá longe, e na ponte.
E os cavalos entravam no bosque,
e deixávamos de ver os lampiões, só escutávamos os guizos.
Passado muito tempo, os cavalos apareciam na ponte
com todos os guizos tocando e os lampiões
com ele à frente,
como se se sentisse um rei...
Acho que me lembro...
Lembra nada!
Você só tinha três anos, na única vez que viu a festa!
A dificuldade de um plano destes é saber como chegar lá.
Cada um de nós parte de um clichê,
nem sempre, mas na maioria das vezes,
e depois é melhor limpar.
Neste caso, partimos da idéia de descoberta,
ou seja, mostrar uma montanha, sem a janela, sem nada...
... uma cortina rasgada.
E depois pensamos: "Sim, mas porquê?"
Isto vai bloquear a imaginação do espectador, ao invés de abri-la.
E pensamos: "Sim, depois de filmarmos a montanha de Tebas em 'Moisés e Aarão',
e o Etna e a Montanha de Santa Vitória,
por que temos que filmar uma quarta montanha?
E renunciamos, aos poucos,
E num belo dia,
num belo dia descobrimos que é melhor ver-se o menos possível.
E com isso chegamos a uma espécie de...
... de redução que não é uma redução, mas uma concentração
e que de fato...
permite dizer mais.
Mas isso não surge de repente, de um dia para o outro,
é preciso ter tempo e paciência.
Um suspiro... torna-se um romance.