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Qual a importância da relação entre o Brasil e Washington,
e em que medida ela se alterou ou melhorou desde a posse do Presidente Obama?
Bem, é uma relação com fortes laços históricos,
os EUA foram o primeiro país a reconhecer nossa independência, no século XIX,
mas hoje passa por um novo capítulo,
um capítulo que, creio, não se iniciou ontem,
mas que se contruiu durante o governo do Presidente Lula, incialmente,
e agora, com a visita da Presidenta Dilma a Washington,
e anteriormente, com a visita do Presidente Obama à Brasília,
o que almejamos é a criação de uma parceria para o século XXI.
Com isso,
queremos enfocar cada vez mais em C&T, inovação,
Os EUA são um parceiro formidável para o Brasil, em todas essas áreas,
possui uma criatividade extraordinária, algumas das melhores universidades do mundo,
estamos nos esforçando para enviar mais estudantes brasileiros para estudar fora,
por meio de um programa denominado "Ciência Sem Fronteiras",
e os EUA são um destino óbvio para esses alunos,
por isso a Presidenta Dilma esteve no MIT e em Harvard quando veio aos EUA,
e assinamos alguns acordos com essas instituições de renome mundial.
Além do mais, os EUA são um dos nossos principais parceiros comerciais,
os investimentos de empresas brasileiras nos EUA estão crescendo,
temos vários mecanismos de coordenação em diversas áreas
e estamos constantemente atualizando esses mecanismos
acabamos de criar um grupo sobre inovação que congregará governo, setor privado e academia,
temos um novo grupo sobre investimentos,
temos grupos do setor privado, como o Fórum de Altos Executivos,
que apóia algumas dessas novas iniciativas, tais como o "Ciência sem Fronteiras",
portanto uma relação muito dinâmica e muito robusta,
Fiquei muito feliz em receber a Secretária de Estado Hillary Clinton no Brasil, recentemente,
ela participou de mais uma iniciativa liderada pelos EUA e pelo Brasil,
que é a "Parceria para o Governo Aberto" (PGA)
sobre melhores práticas, transparência, prestação de contas por parte de governos,
Nesse contexto, também nos encontramos bilateralmente para discutir assuntos políticos,
o diálogo político também é parte muito importante de nossa agenda.
Com relação à PGA, o Sr. pode falar um pouco mais, quais são os objetivos?
É um grupo de países, que se uniram por vontade própria,
para assumir objetivos, alvos e planos definidos por eles mesmo,
não se trata de criar uma lista ou um ranking de países,
relacionado a abertura ou transparência
Deve ser visto como um fórum para a troca de melhores práticas
para que os países criem incentivos para a melhoria da governança.
Nesse sentido, um número cada vez maior de países tem se associado
Isso se extende para além do Ocidente?
Certamente, é uma iniciativa mundial, lançada pelos EUA e pelo Brasil no ano passado
pelos Presidentes Obama e Dilma às margens da Assembléia Geral da ONU
e estamos impressionados com o interesse que tem sido gerado desde então,
nos orgulhamos de fazer parte desse exercício
que tem estimulado muitos debates,
e mesmo alguns países que ainda não se sentem à vontade para participar vêm às reuniões
e participam das reuniões e aproveitam para aprendar sobre as práticas de outros países.
Ministro, gostaria agora de tratar das relações do Brasil com a África
Muitos países na África almejam o modelo econômico e político do Brasil
Qual a importância da África para as políticas externa e econômica do Brasil?
Á África é um continente vizinho
cada vez mais olhamos para a África como parte de nosso exterior, de nossa geografia próximos.
A identidade do Brasil não seria o que é hoje sem a contribuição da África
Mais da metade dos brasileiros se identificam como tendo alguma ascendência africana,
A África hoje é uma terra de oportunidades, de mudança, de crescimento econômico,
Ainda há desafios enormes, não quero aqui minimizá-los,
mas também vemos um movimento em direção ao progresso.
Temos estreitado cada vez mais as relações com a África,
por meio da abertura de novas embaixadas,
hoje temos mais embaixadas na África do que o Reino Unido, por exemplo,
na costa atlântica, há apenas um país onde não temos embaixada, nesse momento,
e devemos corrigir essa lacuna em breve.
- Qual país? - A Gâmbia
É um país com que temos boas relações de amizade
Porém as embaixadas não são um fim por si mesmas,
São um posto avançado, uma ilustração de nossa vontade de nos relacionarmos
politicamente, de participar do desenvolvimento econômico, de estarmos presentes
da maneira que for possível
de ajudar no desenvolvimento agrícola e rural
nas políticas administrativas, segurança alimentar e energética
em alguns países compartilhamos experiências com biocombustíveis, como o etanol,
e isso aliviará seus gastos com energia.
E além disso há um número cada vez maior de empresas brasileiras,
as empresas privadas estão entrando com grande velocidade na África.
Então há grande empresas muito atuantes em locais como Angola, Moçambique,
mas também se deslocando para outras áreas, como a África ocidental, como a Guiné Conacri.
Estive recentemente na Mauritânia, um país no qual um chanceler brasileiro jamais havia estado,
e pude identificar muitas oportunidades.
Esteja segura de que estreitaremos cada vez mais as relações com a África
em um verdadeiro espírito de parceria
em que nos temos muito com o que contribuir, eu creio, mas também muito com o que aprender.
Ministro, gostaria agora de falar sobre as nações que compõem os BRICS
da qual vocês fazem parte, é claro.
A sigla BRICS passou a simbolizar uma mudança do poder global, dos países do G-7
envolvendo o Brasil, a Rússia, a Índia e a China.
No momento parece mais um agrupamento econômico
porém existe o objetivo, a intenção de ir além da economia para um bloco político?
Você tem razão ao apontar que no início se tratava de agrupamento econômico,
e a coordenação mais intensa se realiza, por exemplo, no debate relacionado
ao regime de cotas no FMI e no Banco Mundial, a assuntos do G20.
No entanto, à medida que os BRICS se reúnem com mais frequência em cúpulas
e vários subgrupos são criados,
a agenda política está surgindo.
O que também contribuiu para isso
foi o fato de que estivemos no Conselho de Segurança no ano passado.
A Rússia e a China como membros permanentes, é claro, mas o Brasil, a Índia e a África do Sul,
foram membros não-permanentes em 2011, e isso criou um contexto favorável
para uma coordenação estreita.
Não quer dizer que as posições são idênticas, não significa que votamos da mesma forma,
mas acredito que o consenso no âmbito do BRICS
é que há benefícios a serem colhidos da estreita coordenação e troca de opiniões sobre as questões.
Também destacaria outro grupo do qual o Brasil participa, que é grupo IBAS
Índia, Brasil e África do Sul
é menor e tem uma agenda de transformação
que talvez o BRICS não tenha, sobre a promoção da reforma do Conselho de Segurança
governança mais democrática
também tem agido em conjunto para promoção de projetos em pequena escala, mas significativos
em benefício de países menos desenvolvidos.
Há projetos no Haiti, nos Territórios Palestinos Ocupados, no Sri Lanka e em outros locais
Acredito ser uma demonstração da vontade desses três países de assumir uma maior responsabilidade
em favor da paz e do desenvolvimento no mundo, e do fortalecimento do sistema multilateral.
Essa é uma afirmação interessante
eu imaginaria que o Brasil poderia em algum momento vir a ter algum conflito com algum membro do BRICS
talvez a China, ou a Rússia, tendo em mente o histórico desses países em direitos humanos
e outras posições que talvez o Brasil tivesse dificuldades de aceitar
Não usaria "conflito" nesse contexto, há diferenças, determinadas pela evolução histórica
e como dizia ontem no Comitê Judaico Americano, quando se trata de direitos humanos,
nosso ponto de partida é de que em todos os países do mundo existem avanços a serem alcançados
seja um país altamente desenvolvido, seja um país de base rural ou de menor desenvolvimento
mencionei Guantánamo e os Estados Unidos, tendências xenófobas na Europa,
temos nossos próprios desafios no sistema prisional do Brasil,
outros terão desafios diversos.
O importante é fazer isso em um ambiente multilateral, livre de acusações seletivas
de maneira a incrementar a cooperação
e assim atingir as pessoas que sofrem violações ou ameaças aos direitos humanos.
Ministro, temos falado sobre as convergências entre os EUA e o Brasil
mas existem arestas, assuntos em que há discordâncias.
Quais são essas áreas?
O que acho importante enfatizar é o nível de maturidade da relação.
Quando se tem relações maduras, pode-se destacar as afinidades
que nos unem e pode-se também ter áreas de desacordo.
De cabeça, posso mencionar uma que foi um tópico candente na última Cúpula das Américas
da qual participou o Presidente Obama e muitas outras lideranças do Hemisfério,
e como você deve ter acompanhado, um dos tópicos discutidos foi a participação de Cuba
Há um consenso entre países da América Latina e do Caribe
de que Cuba deveria ser convidada e deveria participar
Cuba irá assumir a presidência de uma nova comunidade de países caribenhos e latino-americanos
a CELAC
criada ano passado em Caracas
Cuba tem contatos plenos com todos os países da América Latina e do Caribe
todos os países da região têm relações diplomáticas com Cuba
Os líderes de Cuba têm realizado reformas significativas, como a atualização do modelo econômico
tem mostrado abertura a novas ideias
e acho que isso deve ser incentivado e a melhor maneira de fazer isso é
incorporar Cuba nos fóruns que criamos.
Gostaria de retornar rapidamente ao tema do Oriente Médio
por exemplo, o Irã, que tem recentemente estendido sua influência sobre a América Latina
O Sr. vê isso como um fênomeno positivo ou potencialmente negativo?
Os países tem liberdade de ampliar seus horizontes para além de sua região como bem entenderem
Não é necessariamente positivo ou negativo
no sentido de que, se trouxer prosperidade e mais oportunidade aos envolvidos, é desejável
Portanto não temos dificuldades com uma presença mais robusta do Irã em nossa região,
o Irã é uma civilização antiga, com uma sociedade vibrante,
Recentemente um filme iraniano ganhou um Oscar aqui nos EUA, o que é interessante,
de melhor filme estrangeiro,
o que demonstrou o apelo universal daquela indústria cinematográfica
então vemos isso como um acontecimento natural,
Diria também que, malgrado as preocupações sobre a natureza pacífica do programa nuclear do Irã
que estão sendo tratadas pela AIEA, pelo Conselho de Segurança
o comércio e as relações diplomáticas com o Irã não foram banidas, então vemos isso com naturalidade.
Por outro lado, é possível caracterizar o Irã como um mau ator,
ele apóia organizações terroristas,
fomenta o extremismo. Isso não afeta sua região?
Não queremos ninguém apoiando ou fomentando o terrorismo em nossa região
Comparativamente, a América do Sul é uma região pacífica do mundo,
Se buscar outra região do mundo em desenvolvimento, não irã encontrar uma que seja totalmente democrática,
com crescimento econômico, com redução de pobreza,
ausência de armas de destruição em ***,
na verdade, um dos orçamentos militares mais reduzidos do mundo
Nesse caso, serei firme ao dizer:
Se alguém planeja exportar terrorismo
ou introduzir tensões militares em nossa região, nos oporemos a isso.
Com relação ao programa nuclear iraniano, como o Sr. sabe, há um novo enfoque
sabemos que o Brasil e a Turquia fizeram uma proposta para que o Irã parasse de enriquecer urânio
à níveis para produção de armas etc. que não foi bem sucedida
Agora, digamos, há um enfoque de sanções severas e também de diplomacia.
O Brasil apóia esse enfoque atual dos P5+1 de impor sanções e de resolução diplomática,
qual a posição brasileira sobre o atual enfoque?
O Brasil sempre foi favorável ao enfoque diplomático
ao que chamaremos de desafio iraniano.
Isso é algo que discutimos na AIEA e no Conselho de Segurança.
Portanto, na medida em que os esforços atuais privilegiam a o diálogo diplomático e a negociação
somos a favor, é claro.
Também somos firmes, como expressado pela nossa Presidenta em várias ocasiões,
inclusive ao Presidente dos EUA,
na crença de que uma intervenção militar no Irã seria algo desastroso.
Poderia desestabilizar uma região já conhecida pelos altos níveis de instabilidade
com conseqüências bastante imprevisíveis.
Na verdade, sem conseguir atingir de forma alguma os objetivos que os defensores dessa idéia
pretendem atingir.
Quando o Brasil e a Turquia se uniram em 2010,
para tentar avançar e construir medidas de construição de confiança
foi sob a égide de idéias já discutidas entre os P5+1
De certa maneira, acho que perdemos uma oportunidade
pois já poderíamos estar em uma etapa posterior
na criação de confiança entre o Irã e o Ocidente.
Há um abismo de confiança e de dificuldade de comunicação que necessita ser superado
para que a reunião se beneficie de condições mais estáveis
a última coisa de que o Oriente Médio precisa de um novo foco de atrito militar.