Tip:
Highlight text to annotate it
X
Gênero, sexualidade e religião.
Como é que as igrejas, as religiões cristãs percebem,
concebem os gêneros, a divisão de papéis,
a concepção de feminino, a concepção de masculino
e como percebem a sexualidade,
numa perspectiva...
E a minha conclusão é que essa perspectiva
tem muito de comum
entre católicos e evangélicos,
porque quando a gente vai fazer
uma pesquisa sobre uma igreja,
a gente também faz uma pesquisa bibliográfica antes,
faz uma reflexão sobre esse campo,
que é católico, que é evangélico.
E tem uma coisa em comum,
é esse discurso, hoje,
mais igualitário,
mas que convive muito
com posições hierárquicas, posições de diferença
entre homens e mulheres,
lugares pra cada um dos gêneros.
Gênero e sexualidade relacionado,
ou incorporado ou não incorporado
nas aulas de ensino religioso,
que são ministradas no estado de Santa Catarina,
na rede estadual de ensino.
Violência é uma das temáticas
bastante recorrentes
nas escolas do estado de Santa Catarina
e a violência se dá especialmente
em torno daqueles sujeitos
que fogem de uma dita normalidade.
Então são os sujeitos que não têm
um corpo considerado normal, adequado,
não são magros, não são brancos
não são cristãos ou não são católicos,
são pobres, ou são negros,
enfim, sujeitos que fogem
um pouco dessa normalidade.
E, uma ideia de sexualidade
muito ligada a uma naturalização,
melhor ainda, a uma divinização
das relações da sexualidade exercida,
das regras, de uma sexualidade
exercida por homens e mulheres apenas,
uma regra que é universal,
divinizada e uma idéia de que a sexualidade
deve ser exercida apenas no casamento.
Tanto homens quanto mulheres, aí eles tem uma perspectiva
até mais igualitária,
devem só ter esse exercício da sexualidade
no casamento, e não antes,
portanto, então preservação da virgindade, da castidade.
Essa violência então,
ela não se dá só entre estudantes,
mas também a partir da ação dos professores
ou da ação dos profissionais da educação.
Outro aspecto, também,
da violência na escola é em torno,
justamente, da orientação ***, ou seja,
aquele que não é visto como heterossexual,
ou seja, que foge ao dito padrão
cristão e normal,
ele também sofre violência.
Um menino, que diz pra seus amiguinhos,
que ele não quer jogar futebol,
que não gosta de jogar futebol,
ele gosta, por exemplo, de brincar com boneca.
que este professor tem a dizer pra esse menino?
Se ele for muito rígido
em princípios religiosos - e que as
vezes passam pra gente como princípio de senso comum,
mas eles estão imbuídos dessa socialização nossa,
religiosa/cristã -
ele vai logo ficar preocupado com esse menino.
Acho que esse professor tem que pensar,
primeiro no que ele está sentindo
sentindo em relação a essa colocação do menino.
Bom, aí, essa é a minha parte:
O que eu tenho pra dizer pra ele?
Dizer que, qual seria a nossa primeira tendência?
Dizer para ele:
“Aaah, você tem que aprender a jogar futebol,
brincar de boneca é pras meninas.”
Isso numa concepção mais rígida,
de que existem coisas para as meninas e coisas para os meninos,
que não podem se misturar e que
as fronteiras têm que ser muito rígidas.
Embora o estado seja laico,
a laicidade seja o princípio primeiro,
tanto a postura dos professores de ensino religioso,
quanto dos diretores,
quanto da formação desses sujeitos docentes,
se pautam por outro princípio,
que é o princípio do proselitismo,
que é o princípio de uma moral religiosa cristã,
bastante tradicional.
Essa é uma perspectiva que eu acho
que esta na contramão daquilo que gostaríamos
que se trabalhasse na escola, ou seja,
de que a escola trabalhasse numa perspectiva mais ampla,
mais aberta, mais respeitosa.
Essas concepções,
elas tem um impacto grande sim,
nas escolas, porque são concepções
muito arraigadas, muito internalizadas.
Afinal de contas, nós somos formados
dentro dos preceitos cristãos, basicamente,
e as vezes a gente até pensa que saiu deles,
que já está até questionando eles e tendo outros,
mas a gente, de repente, se pega nesses, nesses valores,
nesse ideário cristão
e é muito difícil se ampliar essa visão,
colocar que existem outras
maneiras de se exercer a sexualidade,
que a sexualidade
pode ser concebida de diferentes formas.
Eu acho que, para os professores,
é uma tarefa, de poder abrir isso pra seus alunos,
pra que seus alunos também possam se sentir à vontade
de ver qualificadas e acolhidas manifestações
de seus desejos que estão fora
desses preceitos religiosos cristãos, fundamentalmente.
Porque se a gente fala, por exemplo,
das religiões afro, existe uma outra concepção,
a sexualidade transita muito mais entre
os gêneros do que nas religiões cristãs.
Essa ideia de que existe uma orientação ***
pra um determinado gênero,
pra um determinado sexo,
essa coisa casadinha, nas religiões afro isso se desfaz...
Também é bom mostrar isso,
mostrar essa diversidade, dentro do próprio
campo religioso existe essa diversidade,
essa concepção mais homogênea
é do campo cristão né, isso que eu to falando,
tanto evangélico como católico.
O que é laicidade?
É uma categoria extremamente importante
pra pensarmos o modelo brasileiro de educação.
A laicidade é o Brasil ou os vários,
as várias sociedades do estado moderno
que o Estado deve estar separado de qualquer perspectiva
religiosa e não deve se pautar
por nenhuma perspectiva religiosa
na definição das suas políticas, nas suas ações.
Portanto, a laicidade é um princípio
do estado moderno
e é um princípio do estado moderno também brasileiro
e portanto, as escolas estão pautadas por isso.
Por que é importante entender
o que é laicidade quando a gente pensa,
a escola ou a formação do docente?
Porque embora seja formado
por sujeitos que tenham vínculos religiosos,
as ações não devem estar pautadas
por perspectivas religiosas,
que é a categoria de proselitismo, ou seja,
não deve trazer pra dentro da sala de aula,
não deve deixar com que os seus conteúdos
e a sua metodologia sejam minados por valores,
que são valores religiosos,
ou princípios religiosos.
Então a perspectiva proselitista
é uma perspectiva que muitas vezes
compromete o bom andamento,
dos conteúdos e, de certa forma,
promove violências contra estudantes
que não estão na mesma perspectiva
religiosa que este docente.
Então, eu diria que a busca do professor
é por perspectivas laicas,
por perspectivas que não deixem
com que os valores religiosos
tomem a frente nas suas decisões em termos de conteúdos educacionais.
Numa concepção mais tradicional cristã,
porque hoje eu acho que existem
grupos principalmente católicos,
que já estão vendo que existe uma possibilidade
de transitar em desejos, em forma de ser,
que gosta, do que não gosta,
no feminino e no masculino e diriam:
“Tudo bem, que bom que você gosta,
ninguém tem que gostar de futebol,
porque nasceu no sexo masculino
e também não pode gostar de boneca, tem que gostar de boneca.
É importante entendermos, a diferença
uma religiosidade institucional,
e uma religiosidade dita popular.
Essa categoria ela é complexa,
e ela atrapalha um pouco o entendimento,
do que é essa religiosidade.
Os sujeitos, recorrentemente,
no Brasil e em qualquer país,
são inseridos em instituições religiosas,
e nestes contextos eles devem seguir,
normas, padrões, estabelecidos pela instituição.
A Igreja Católica não é diferente,
é da mesma forma, ou seja,
segue padrões, normas, hierarquias, dessa instituição.
Uma religiosidade não institucional, dita popular,
uma religiosidade que é vivida em outro contexto,
em outros ambientes,
com outros sujeitos envolvidos com outras formas de organização.
A religiosidade não institucional,
ela é uma religiosidade que tem uma autonomia,
que tem uma valorização dos sujeitos,
esses sujeitos são sujeitos com idades diferentes,
são sujeitos com sexos diferentes.
Um exemplo: no catolicismo ortodoxo
ou no catolicismo tradicional,
na instituição católica,
mulheres não são reconhecidas como autoridades eclesiásticas.
Num catolicismo não institucional,
essas mulheres podem ter um reconhecimento,
e não só um reconhecimento e uma legitimidade,
mas uma valorização,
na sua ação com os sujeitos.
Então, esse catolicismo é um catolicismo
vivido fora da instituição.
Ou essa religiosidade,
ela é vivida fora da instituição,
com outra forma de organização,
que não é fixa, que não
respeita uma hierarquia marcada por sujeitos
e é também
um espaço que valoriza os vários saberes
e os vários sujeitos, eu diria.
A escuta do outro, pra eu pensar na minha...
pra eu elaborar as minhas reflexões,
pra eu fazer transformação,
a importância do outro é total,
não somos uma ilha.
E então é na relação
- e eu acho assim,
cada vez eu acredito mais nisso –
é que na relação é que nós nos repensamos.
Eu, sentada aqui, comigo mesma, faço isso,
mas isso só pode se concretizar nesse outro.
E aí, nessa relação com o outro,
eu preciso tomar o outro como outro mesmo
e não como reflexo daquilo que eu penso.
Então, muitas vezes eu,
e pra isso você tem que estar bem atento
que ele tem o olhar dele,
e que esse olhar é diferente do meu,
e que me cabe apenas olhá-lo
na perspectiva dele.
Esse esforço, que
eu acho que a Antropologia inclusive me deu muito,
de você olhar como outro,
significa olhar na perspectiva dele
e não olhar ele na minha perspectiva.
Porque aí eu não vejo o outro, eu vejo um espelho
e se eu ficar sempre no espelho, eu não cresço,
eu não amplio meus conhecimentos,
eu não amplio minha visão de mundo,
eu vou só me fechando, fechando.
Isso pra mim, é morte!
Ensino religioso, gênero e sexualidade em Santa Catarina,
embora seja recorrente, a solicitação
dos estudantes e também dos docentes,
pra que as temáticas de gênero e sexualidade sejam abordadas,
sejam qualificadas, não se percebe um investimento
por parte do estado e também por parte das instituições superiores,
formação desses sujeitos envolvidos.
Então é a matemática recorrente,
onde os sujeitos percebem a sua importância,
mas não há investimento nessa formação.
Eu como, estudiosa da religião,
vendo o quanto ela é importante
e forte na construção do nosso processo de ser,
faz com que a gente fique muito restrito
em concepções tradicionais.
E acho que pensar gênero,
e gênero na diversidade,
fundamentalmente isso, diversidade,
para aqueles que estão educando as novas gerações,
é muito bom, muito importante.
É preciso que os professores se reciclem,
que os professores se repensem,
que os professores se atualizem nessas temáticas
- tão constitutivas, das identidades, da forma como a gente é -
- e possam passar isso pra se abrir mais
e passar isso para essas gerações.
Eu acho que é um processo de transformação,
de ajudar na transformação,
e eu acho que esse é o lugar da academia também,
é um lugar de ir àqueles fora dela
e colocar o que a gente fala, pensa,
o que a gente teoriza né, para uma prática.
E realmente, os professores de ensino fundamental,
de ensino médio são os mediadores fundamentais.