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COM A COLABORAÇÃO DE INÚMEROS OUTROS APRESENTAM
''BERLIN ALEXANDERPLATZ''
BASEADO NO ROMANCE DE ALFRED DÖBLIN
FILME EM 13 PARTES...
E UM EPÍLOGO DE RAINER WERNER FASSBINDER
Dois marcos e cinqüenta...
sessenta...
setenta...
oitenta...
noventa.
Fim.
Fim é fim.
Mas se eu... Por favor, não me interrompa de novo.
- E se eu... quem sabe? - Não!
Se eu disse não, é não.
Não quero que ganhe dinheiro por mim.
Não quero viver do dinheiro da pessoa que eu amo.
Dá azar, entendeu? E eu jurei.
Eu jurei na primeira noite, Lina.
Sim, Franz.
Prometa não falar mais nisso.
- Uma aguardente, Maxe. - É pra já.
Quantos desempregados há em Berlim?
Não sei. Uns 2OO mil.
Você acha?
Bem...
Um marco, dois marcos... dois e cinqüenta...
sessenta, setenta, oitenta, noventa.
Olá.
Olá, Meck.
Sente-se conosco.
- Saúde. - Obrigado.
- Uma cerveja para mim. - Certo.
Isso é o que resta?
É.
Bem, então...
Sim?
Vamos ver.
2. COMO VIVER QUANDO NÃO QUEREMOS MORRER
Você não receberá auxílio social nem trabalhará na fábrica.
E está muito frio para cavar na terra. O comércio é a melhor coisa.
Em Berlim ou no interior, você escolhe.
Pelo menos estará de barriga cheia.
Por que o proletário não usa gravata?
Porque não sabe dar o nó.
Por isso, compra um prendedor. Mas depois que compra...
continua na mesma, pois não sabe usá-lo.
Isso é um embuste e deixa o povo amargurado.
É o que leva a Alemanha para o buraco.
Por que o povo não quer usar um prendedor de gravata?
Porque ele não quer um espanador de pó no pescoço.
Nem um homem, nem uma mulher.
Nem um bebê gostaria.
Compre um desses na Tietz ou na Wertheim.
Ou numa outra loja, se você não gosta de judeus.
Sou ariano. Os grandes magazines não precisam de mim...
para fazer propaganda. Eles sobrevivem sem mim.
Comprem um prendedor como este aqui...
depois pense como irá amarrá-lo.
Quem tem tempo de amarrar uma gravata de manhã?
Quem não preferiria dormir um pouco mais?
Todos nós precisamos dormir.
Trabalhamos muito e ganhamos pouco.
Esse prendedor ajudará você a dormir melhor.
Fará concorrência às farmácias.
Compre um prendedor comigo...
e não precisará de comprimidos para dormir.
Você não precisará de nada.
Vai dormir feito um bebê no seio da mãe.
Chega de complicação de manhã. O que você precisa...
está em cima da cômoda. É só pôr debaixo do colarinho.
Vocês gastam dinheiro com tanta porcaria.
''Das Deutsches Tageblatt''.
Última edição.
''Das Deutsches Tageblatt''.
-Última edição. -Salsichas quentes.
Espere.
''Das Deutsches Tageblatt''.
Aqui podem comprar mercadoria de qualidade.
Não é celulóide.
É borracha de verdade.
Vinte centavos cada. Três por cinqüenta.
Saia da calçada, rapaz, senão um carro o atropela.
E quem vai limpar a sujeira?
Vou explicar como se amarra uma gravata.
Não é preciso quebrar a cabeça para entender.
Segure as duas pontas assim, mais ou menos 3Ocm.
Depois dobre a gravata, mas não assim.
Parece um percevejo amassado, um arenque defumado.
Nem um defunto usaria isso.
Então use o meu aparelho.
Ele poupa tempo, e tempo é dinheiro.
Essa maravilha é justamente o que você precisa.
Vejam, o presente ideal para o Natal.
Combina com o seu gosto...
e é muito útil.
Se o plano Dawe lhes deixou alguma coisa...
é o seu cérebro e ele deve lhe dizer...
que isto é para você, que você deve comprar...
levar para casa e fazer bom proveito.
Salsichas quentes! Salsichas quentes!
- Quem era aquela mulher? - Era...
Era Eva.
Alguém que conheci há muito tempo.
Mas passou. Acabou.
Sabe, Lina, não sei falar desse jeito.
Não sou um orador.
Quando anuncio meu produto, eles me entendem...
mas não é do jeito certo.
Sabe o que é espírito?
- Não. - Espírito é cérebro...
e não só um crânio.
E um orador é um orador.
Mas você é, Franz.
Não precisa me dizer. Eu, um orador? Não.
Sabe quem era um orador?
Viu? Também não sei.
Isso não é para mim.
Passei o dia todo pensando. Quero vender jornais.
- Jornais? - Sim, jornais.
Isso me veio à cabeça e ficou lá dentro. Deve estar certo.
Jornais.
Vou ver o que se pode fazer.
Fique aqui e continue por mim.
Você sabe fazer isso melhor que eu. Tchau.
Olá.
Então, já pensou?
Prendedores de gravata não são para mim.
É como vender algo que eu mesmo não preciso.
Em seu lugar, eu tentaria educação ***.
É a sensação do momento e vende bem.
O que é isso?
Tome.
Dê uma olhada, depois não precisará mais perguntar.
Mulheres peladas. Desenhadas.
Não tenho de outro jeito.
Diga, colega...
- isso o diverte? - O quê?
Mocinhas, desenhos assim.
''Vida Sorridente''.
Desenham uma moça pelada com um gatinho.
O que ela faz na escada com um gatinho?
Que estranho.
Posso dar uma olhada? Só quero ver.
Esta se chama ''Fígaro''.
E esta, ''O Casamento''.
E esta, ''O Casamento Ideal''.
Esta é diferente de casamento.
''Amor de Mulheres''.
Tudo separado.
Há bastante informação, se você tiver dinheiro.
Mas são muito caras.
Diga-me...
- o que há por trás de tudo isso? - Por que haveria de ter algo?
É tudo permitido.
Tenho permissão para vender o que vendo. Não há malandragem.
Não faria esse tipo de coisa.
Só posso dizer que ficar vendo desenhos não é bom.
Posso lhe contar um caso.
Isso corrompe o homem, acaba com ele.
Começa com desenhos...
e, mais tarde, quando você quer, não vem mais naturalmente.
Não estou entendendo.
Não cuspa nas minhas revistas, elas custam dinheiro.
E não amasse as capas.
Tome...
leia esta.
''Os não-casados''.
Para cada coisa existe uma revista especial.
''Os não-casados''.
Como se eles não existissem.
- Também não sou casado com Lina. - Veja, leia isto...
e diga se não está certo. É só um exemplo.
''A tentativa de regulamentar a vida *** dos cônjuges...
com um contrato...
e ditar obrigações conjugais, como a lei prescreve...
é a forma mais degradante e abominável de escravidão...
- que se pode imaginar''. - Como assim?
É verdade ou não é?
Não é o meu caso.
Uma mulher que exija algo assim de um homem, não é possível.
- Coisas assim realmente acontecem? - Leia.
Eu queria ver.
''A tentativa de regulamentar a vida *** dos cônjuges...
com um contrato...
e ditar obrigações conjugais...
como a lei prescreve...
é a forma mais degradante e abominável de escravidão...
que se pode imaginar''.
Pronto.
E aqui temos ainda ''Amor entre mulheres''...
e ''Amizade''.
E não é conversa fiada. É uma luta...
pelos direitos humanos.
Qual é o problema?
Parágrafo 1 75, caso não saiba.
É uma grande injustiça e acontece a milhões de alemães todos os dias.
É de arrepiar os cabelos.
Os meninos me dão pena.
Mas não é da minha conta.
E então? Achou alguma coisa?
Talvez.
Eu disse ao velho que vamos desistir dos prendedores.
Eu também não consigo. Ninguém compra nada de mim.
Há uma estória estranha nessa revista.
É um careca que vai passear de noite...
em Tiergarten...
e conhece um rapaz bonito...
que logo segura seu braço.
Depois de passear uma hora...
o careca fica com vontade...
de demonstrar seu afeto para o rapaz.
E ele é casado.
Ele já se sentiu assim umas vezes, mas agora tem que ser...
porque parece maravilhoso.
''Você é meu raio de sol'', ele diz.
''E você é meu anjo''.
E ele é tão doce.
Nem imagina que tal coisa possa existir.
Então o moço diz para ele: ''Sabe...
vamos a um pequeno hotel. Você me dá 5 marcos...
ou 10, porque estou completamente liso''.
Então o velho diz...
''Para você, qualquer coisa, meu anjo''.
E ele lhe deu todo o seu dinheiro.
Mas, no quarto do hotel...
há buracos nas portas para espiar.
O dono do hotel vê algo e chama sua esposa...
e ela vê algo também.
Depois dizem que não toleram uma coisa dessas em seu hotel...
o tipo de coisa que viram.
Ele deveria se envergonhar de seduzir o rapaz.
Eles ameaçam denunciá-lo à polícia.
Depois vem o camareiro, a arrumadeira...
e todos ficam rindo.
No dia seguinte, o velho compra duas garrafas de aguardente...
e parte para Helgoland a trabalho.
Ele quer afogar as mágoas.
Então ele pega o navio e se embebeda...
mas acaba não se matando.
Certo dia, enquanto estava numa estação de águas...
sua esposa recebe uma intimação.
Ela assina, mas olha para ver o que é. E lá está tudo escrito.
Os buracos na porta, o dinheiro da carteira...
e o bom menino.
Quando o careca volta do descanso...
todos ficam chorando em volta dele...
a mulher e as duas filhas.
Ele lê a intimação.
''Mas, Sr. Juiz, o que foi que eu fiz?
Fui para o quarto e tranquei a porta.
Não tenho culpa se espiam por buracos.
Nenhum crime foi cometido. O rapaz pode confirmar.
Então, o que foi que eu fiz?''.
E o careca, de casaco de pele, chora.
''Será que eu roubei?
Fui pego invadindo?
Eu só entrei no coração de uma boa pessoa.
E eu disse: 'Você é meu raio de sol'''.
E ele era isso.
Bem...
será que você também é desse jeito...
como o rapaz da revista?
O quê?
Lina!
Lina!
Lina, espere.
Lina, que história é essa?
- Que bobagem. - Não, Franz.
Não vou com você. Para mim acabou.
Pode ir embora.
Que bobagem é essa?
Por favor, Lina! Vou devolver esse lixo ao velho.
Meu Deus, Franz!
Fiquei com tanto medo.
O que foi?
- Bem, sabe... - Eu...
Pronto.
No campo de batalha, a adorável e chorosa Lina...
fez um avanço solitário ao estilo do Príncipe de Homburg.
''Meu nobre tio Friedrich von der Mark.
Natalie! Deixe! Deixe!
Meu Deus, agora ele está perdido. Não importa. Não importa.
Ela correu decidida e apressada para a banca do velho...
e Franz Biberkopf esperou, nobre em seu sofrimento...
conseguindo se controlar.
Ele ficou parado, diante da tabacaria...
de onde ficou observando...
por entre uma neblina de luz, bondes e transeuntes...
o desenrolar da briga.
Os heróis se atracaram, figurativamente falando.
Apalparam suas fraquezas.
Num ânimo inflamado, Lina Przyballa de Cernowitz...
filha única filha do agricultor Stanislaus Przybilla...
nascida após dois frutos de partos prematuros...
que também iriam se chamar Lina...
jogou as revistas no chão.
O resto ficou perdido no trânsito da rua.
''Que mulher!'', admirava-se o paciente Franz.
Ele se aproximou da cena como uma força de apoio.
E em frente à loja de bebidas, a heroína vitoriosa e sorridente...
Srta. Lina Przyballa, deliciosa e desleixada, o saudou: ''Franz!
Ele levou a dele''.
Então, ela foi desabando para aquela parte do corpo dele...
que ela imaginou que fosse seu coração...
mas que, sob sua camiseta de algodão...
era exatamente o osso externo e o lóbulo de um pulmão.
Ela havia triunfado.
''Ó, imortalidade! És minha, agora.
Quanto brilho se espalha.
Salve o Príncipe de Homburg...
vencedor da batalha de Fehrbellin. Salve!''
Abre parêntesis, damas de companhia, oficiais...
e tochas aparecem na rampa do castelo, fecha parêntesis.
- Que tal? - Fantástico! Fantástico mesmo!
Quando faço uma coisa, faço direito.
Posso não ter mais trabalho...
- mas tenho você, Lina. - Sim, Franz, você tem a mim.
E vamos encontrar trabalho.
- Me dê minha bolsa. - O quê?
Minha bolsa.
Espere, tenho que mijar.
Seis mil...
Seiscentos e setenta e três mil...
quinhentos e oitenta e dois.
O que disse?
Você perguntou quantos desempregados havia em Berlim.
Eu me informei.
673. 582.
Nada disso. 673. 583.
O que está dizendo?
Eu disse 673. 582.
Você esqueceu de me contar.
A última contagem deu 673. 583. Entendeu?
O que é verdade, é sempre verdade.
- Sim, mas... - Nada de ''mas''.
Se até 1O minutos atrás, havia 673. 582 desempregados em Berlim...
agora existem 673. 583.
- Você tem razão. - Assim é.
Escute, Lina.
Sabe o que é uma almoxarife?
- Uma almoxarife? - Sim.
Uma almoxarife é...
Ela deve... Não sei.
Uma almoxarife precisa guardar coisas armazenadas...
verificar estoques e...
- Isso deve ser uma almoxarife. - Não é isso que eu quero dizer.
Se eu lhe der um empurrão e você cair ao meu lado no sofá...
aí você vai ser uma almoxarife, e eu, um almoxarife.
Você ia gostar disso.
- Vamos fazer uma extravagância. - Por que logo hoje?
Porque ontem passou e amanhã ainda não chegou.
- Entendeu? - Entendi.
Ótimo. Então vamos ao Novo Mundo.
Novo Mundo?
Sim, na Hasenheide.
- Você não conhece? - Não.
Melhor. O que não conhecemos, devemos conhecer. Vamos.
673. 583.
Ele é seu dono
Que orgulho
É verdade Dentro de certos limites
Quando se considera Quais são os termos
De um casamento como esse Na Sicília
Aí está o marido Do lado de fora
Do lado de dentro Está o amante dela
Sem a menor vergonha É a mesma coisa
Nas melhores famílias
Na cama ela ficará até tarde
Depois se levantará
Sentada e altiva Com um rosário na mão
Senhoras e senhores, comigo saberão da verdade.
Beba, amigo Deixe as preocupações em casa
É isso que farei.
Deixarei minhas preocupações em casa.
Saúde!
Falando em salvação Falando em danação
A economia não é Sua preocupação
Ele é um verdadeiro otário
Em Berlim Isso não aconteceria
Homem algum Falaria desse jeito
A cozinha Também não é seu lugar
Mesmo assim Ele leva o café na cama
Ela só precisa sorrir Isso é tudo que ele diz
O homem berlinense É esperto e alegre
E é ele quem manda
É por isso que, Há muitos anos
Todas as músicas em Berlim Mudaram tanto
Agora cantamos
Mãe, o homem de coque chegou
Cale a matraca Eu se disso, querido
Não tenho dinheiro O que fazer?
Quem pediu Para o homem de coque vir?
Mãe, o homem de coque chegou
Cale a matraca Eu sei disso, querido
No sul O calor é de graça
Mas em Berlim Você precisa pagar pelo carvão
Sim, pelo carvão
Bis! Bis!
Então cantamos
Mãe, o homem do coque chegou
Cale a matraca Eu sei disso, querido
Não tenho dinheiro O que fazer?
Quem pediu Para o homem de coque vir?
Vamos, Franz.
Ninguém vem aqui para ficar triste.
As pessoas vêm aqui para ficar alegres.
para dançar...
e rir. Entendeu?
Sim, mas...
- O mundo... - Como assim, ''o mundo''?
Este é o Novo Mundo.
Venha, vamos beber.
Quer tentar? Vinte centavos.
Um pequeno preço para saber o quanto é forte.
Por 2O centavos você fica sabendo se é homem.
- Quer tentar? - Não sei.
Bobagem. Você é mais forte. Vamos.
Essa é a única coisa que a mulher não tem como saber...
se o seu homem é forte.
Duas cervejas.
Saúde.
E eu? Fico de fora?
- Saúde! - Saúde!
Um brinde, um brinde
Á prostituição
Um brinde, um brinde
À prostituição
Que tal?
Muito bom.
- Que voz alta. - É sim.
Tenho uma voz alta.
Tenho uma voz muito, muito alta.
Não olhe dentro dos meus olhos.
Olhe para mim.
Claro.
- Estou olhando para você. -O que a mulher sonha na primavera
Essas coisas tolas e frívolas
Venha aqui. Venha.
Mais perto. Assim.
Você é alemão?
Alemão puro?
Sim.
- Como se chama? - Franz.
Franz Biberkopf.
Palavra de honra que é alemão?
Não está com os vermelhos?
Se estiver, é um traidor.
Quem é traidor não é amigo meu.
Poloneses, franceses...
a pátria pela qual derramamos nosso sangue.
Este é o agradecimento da nação.
Diga-me...
você é mesmo alemão, não? Alemão puro?
Eu logo vi que você era um alemão de verdade.
- Onde serviu no Exército? - Não faz diferença, onde servi...
se hoje estou desempregado?
Que diferença faz onde servi?
Essa é a injustiça do mundo. O homem alemão está desempregado.
As coisas são assim! Saúde!
Sabe de uma coisa? Porque você é alemão...
um alemão puro e está desempregado...
e porque esta é a injustiça deste mundo...
e porque não devia ser assim...
vou lhe dizer uma coisa. Sabe o que é?
- Não. - Nem teria como saber.
Escute.
Sou representante em Berlim...
do ''Observador Popular''.
Sabe o que é o ''Observador Popular''?
- Bem, é... - É exatamente isso que eu digo.
É o único jornal que um homem sensato pode ler.
É porque penso assim e você também pensa...
que quero dar-lhe uma chance. Uma chance.
Muito bem, é isso que sempre digo.
A Alemanha deve voltar a ser dos alemães. Certo?
Saúde.
Arenque defumado em molho temperado de primeira classe!
Filés de peixe. Arenque defumado em molho temperado.
Peixe delicado com picles.
Isso já representa alguma coisa, não?
Exato.
Já representa alguma coisa.
- Algo errado? - Como assim?
Está me olhando de um jeito.
Não. Só estou só pensando... se não me esqueci de nada.
Bem, vai dar tudo certo. Boa sorte.
Obrigado.
Viu? Eu sabia que tinha esquecido algo.
Foi isso que esqueci.
Isso é preciso?
Acha mesmo necessário que eu...
O quê? Uma faixa como essa não é uma vergonha.
Pelo contrário, é uma condecoração.
Bem, se o senhor acha, então...
Venha aqui, eu coloco em você.
Pronto.
Está bem diferente. Vê-se que há algo sólido por trás.
- É? Talvez. - Talvez, o quê?
Está ótimo, muito bonito.
E tem o seu efeito. Mais uma vez, boa sorte.
Bem...
O ''Observador Popular''.
Agora por vinte centavos.
O ''Observador Popular''.
DEVE HAVER ORDEM NO PARAÍSO
Deliciosas salsichas quentes!
- Olá. - Olá.
- Você é novo aqui? - Sim.
O ''Observador Popular''!
Dizem que os caras são decentes.
Mas pressinto outra coisa.
- Eles não são contra os judeus? - Não tenho nada contra eles.
Mas sou pela ordem.
Acho que todos sabem que deve haver ordem.
Potsdamer Platz.
Potsdamer Platz!
Trem para Krumme Lanke.
Embarcar.
''Ao povo alemão na festa da colheita.
Acabem logo com suas ilusões...
e castiguem os que querem enganá-los.
Virá o dia em que, do campo de batalha...
a verdade se elevará, com sua espada e seu escudo...
para vencer o inimigo''.
- Algum problema, colega? - Não, nada.
Deve ser assim mesmo.
Cada um é feliz a seu modo. E além do mais...
os tempos são como são.
Desejo-lhe boa sorte, colega. Boa sorte.
Arenque defumado em molho temperado.
Deliciosos filés de peixe.
Arenque defumado em molho temperado.
Eu sou judeu, sabe?
Mas não tem importância.
Boa sorte, mesmo assim.
Obrigado.
Salsichas quentes! Salsichas quentes, senhores.
Assim é a vida. Salsichas quentes.
Salsichas quentes. Salsichas quentes.
Ei, Dreske!
Salsichas quentes!
Não podem passar assim.
Poderiam pelo menos dizer ''olá''.
Mas esse é o Biberkopf!
Sim, é o Franz Biberkopf...
com uma suástica no braço.
O que está fazendo com uma suástica?
Arenque defumado em molho temperado!
Tenros filés de peixe.
Por que estão me olhando feito uns paspalhos?
Como assim? Só estamos olhando.
- É por causa da suástica? - Por causa da suástica?
Bem, Franz.
Uma suástica é uma suástica, não é?
Sim.
Uma suástica é uma suástica.
Federalismo...
é anti-semitismo.
A luta contra o judaísmo...
é a luta...
pela independência...
da Baviera.
A luta contra o judaísmo...
é a luta pela independência da Baviera.
Está rindo de mim, Richard?
- Talvez. - Por quê?
Só porque você é casado?
Você só tem 27 anos e sua mulher, 18.
O que sabe da vida? Nada vezes nada!
Quanto à faixa, Dreske, olhe bem para ela.
Não há nada nela pelo que não se possa responsabilizar.
Eu também saí, assim como você.
E o que aconteceu depois?
Que o selo do charuto seja vermelho e dourado...
ou preto, vermelho e branco, o gosto não muda.
O que importa é o tabaco, rapaz.
As folhas internas e externas, devidamente desidratadas...
e sua origem. É isso que eu digo. E que fizemos? Vamos, diga.
Quando olho para você, Franz...
só posso dizer, e o conheço faz tempo...
só posso dizer que o enganaram muito bem.
- Por causa da faixa? - E todo o resto.
Deixe disso.
Você não precisa andar assim por aí.
Isso mesmo. Você não precisa disso, Franz.
Deixe disso, Richard. Você é um bom sujeito.
Mas isso é coisa de homem.
Só porque vota, você não pode falar assim comigo e com Dreske.
- Fizeram mesmo a sua cabeça. - Tivemos a inflação...
as cédulas, milhões, bilhões.
Nada de manteiga, nem carne. Nada.
E nós? Andávamos por aí, roubando batatas das fazendas.
Revolução! Desmontem o mastro, escondam a bandeira.
Pendurem essa coisa no armário.
Peçam os chinelos à sua mãe...
e aposentem a faixa vermelha.
Fazem revolução com o focinho.
Mas a república de vocês não passa de uma calamidade.
Uma abelha, uma vespa, um marimbondo em pleno inverno.
Seus companheiros de origem estão mortos.
Ou ainda não nasceram. É a Era do Gelo.
Ninguém sabe por que, só o marimbondo sobreviveu.
O brilho do sol é antiqüíssimo.
Tudo parece efêmero quando pensamos nisso.
Os raios ultrapassam milhas...
passam velozes por uma estrela.
O sol brilha há milhões de anos antes de Adão e Eva...
do ictiossauro. Ele brilha nas profundezas da estação de metrô.
Mas Franz está muito leve, como a luz do céu.
Nós apenas não conseguimos.
Nós, não. Isso podemos dizer.
Ou eles, ou vocês que participaram.
Não havia disciplina, ninguém comandava...
- era sempre um contra o outro. - Porque fomos traídos...
em 1918 e 1919 pelos manda-chuvas.
Eles mataram Rosa e Karl Liebknecht.
As pessoas deviam se unir e agir?
Mas veja a Rússia. Lênin.
Eles são unidos.
Isso sim é união.
Aguarde.
Sangue deve correr. Sangue deve correr. Rios de sangue.
Nada disso me importa.
Mas o mundo acaba e você vai junto com ele.
Para mim, esta é a prova: Eles não conseguiram nada...
e isso me basta.
Nada foi alcançado.
Não sei o que vão conseguir com essa faixa.
Eu não disse nada, mas essa é outra questão...
e é isso que importa.
- Salsichas quentes. - O ''Observador Popular''!
É um pintassilgo?
- É fêmea. - Sim.
O que me diz, bichinho?
Não se sente bem com essa confusão?
O que me diz disso? Não é fantástico?
Tanta fumaça não faz mal a um pulmão tão pequeno?
Ela não conhece outra coisa. Sempre há fumaça.
Hoje até que tem pouco.
Hoje não vou fumar, senão haverá mais fumaça.
Podemos abrir as janelas depois. Não vai ventar demais.
Sangue tem que correr. Sangue tem que correr grosso.
Boa noite, Dreske.
Cinco cervejas, Max, e depressa.
O que há com esta bodega? Tudo tão quieto!
- Ninguém toca piano? - Para quem?
Não valeria a pena.
Você que sabe.
Podemos cantar sem piano. Geralmente cantamos.
Povos, ouçam o sinal
Ergam-se para a luta final
A Internacional
Luta por direitos humanos
Gostou da música, camarada?
Eu? Muito.
Vocês têm boa voz.
- Pode cantar conosco. - Não, prefiro comer.
Quando tiver acabado, cantarei junto...
ou cantarei algo de minha autoria.
Combinado.
Saúde.
Um sujeito comeu um pão com salsicha.
Lá do estômago, o pão subiu até a garganta e disse...
''Falta mostarda''.
Só depois ele desceu direito.
É isso que faz um verdadeiro sanduíche...
de boa família.
- Vamos lá. - Deixe que eu faço.
Então, como é? Não vai cantar?
Claro. O que prometo, eu cumpro.
Meu nariz escorre quando começa o calor. Espirrar não adianta.
Bem...
O que devo cantar para eles?
Eles não entendem nada da vida.
Mas promessa é dívida.
Sei um poema...
de um sujeito da prisão.
Um belo poema.
Você, Ó homem
Que quer se tornar
Um macho nesta terra
Reflita antes de se deixar levar
À luz por essa parteira
A Terra é um vale de lágrimas
É um bom pai O Estado
Que se incomoda Do começo ao fim
Ele belisca e o sacode Com parágrafos e proibições
Seu primeiro mandamento diz: ''Homem, pague''
O segundo diz: ''Cale a boca''
Assim você vive No lusco-fusco
Num estado lamentável
E assim passam-se os anos
Um bando de traças Comem seus cabelos
A cabeça se funde
As juntas ficam fracas
A inteligência azeda no cérebro
E a linha fica sempre mais fina
Afinal, você percebe que é outono Guarda sua colher e morre
É...
Foi escrito por alguém na prisão.
Já faz tempo, mas não me esqueci.
Bonito, não? É uma coisa para a vida...
mas amarga.
Então, lembre-se...
da parte sobre o estado.
O ''Estado, bom pai''.
Como ele lhe oprime.
Decorar, camarada...
não é suficiente.
Não adianta.
Eles não têm mais ostras e caviar do que nós.
Temos que ganhar dinheiro.
Deve ser difícil para um pobre diabo.
Temos que agradecer por termos pernas.
Você pode ganhar seu dinheiro de diversas maneiras.
Então, como é? Vai cantar?
- Promete e não cumpre? - Está bem.
Cantarei. O que prometo, eu cumpro.
Lá vem um chamado Como o ronco do trovão
Como o chocar de espadas
Ondas batendo na praia
Convocado pelos tambores A lutar
Meu camarada Marchava ao meu lado
No mesmo passo que eu
No mesmo passo que eu
Veio uma bala
Seria para mim ou para você?
Ela o arrancou de mim
Ele jaz aos meus pés
Como se fosse Um pedaço de mim
Como se fosse Um pedaço de mim
Quero lhe estender a mão
Enquanto ainda posso
Não posso lhe dar a minha mão
Que permaneça na vida eterna
Meu bom camarada
Meu bom camarada
Meu bom camarada
-Meu bom camarada -Desça da mesa!
Lá vem um chamado Como o ronco do trovão
Não havia amigo melhor!
Ao Reno, Ao Reno alemão
Todos queremos ser Seus guardiões
Descanse em paz Pátria querida
Descanse em paz Pátria querida
Firme e fiel é a vigília
A vigília junto ao Reno
Firme e fiel é a vigília
A vigília junto ao Reno
Deve haver outras cadeiras neste lugar.
O que você comeu?
Eu disse que deve haver outras cadeiras, ou será que é surdo?
Não estamos falando nisso.
Eu quero saber o que você comeu.
Pão com queijo, seu imbecil.
Guardei-lhe a casca, cretino.
Que foi pão com queijo dá para sentir o cheiro.
Mas de onde?
Não quero saber de bagunça aqui. Nada de briga.
Se não conseguem ficar quietos, dêem o fora.
Saia daqui.
Não vai haver briga aqui, é só um ajuste de contas.
Quem quebrar alguma coisa, vai ter que pagar.
Eu me rendi.
Contanto que não me toquem.
Contanto que não me toquem, sou bom com todos.
Mas haverá encrenca se ele encostar em mim.
Quem é esse insignificante, Dreske?
- Franz, por favor! - Deixe-o falar.
Os fascistas podem falar...
o que quiserem...
porque gozam do direito de falar.
Veja o que você arrumou com essas coisas e suas músicas.
Não, eu não vou me meter.
Isso nunca aconteceu aqui.
Lá vem o chamado Como o ronco do trovão
Fascista! Carniceiro!
Entregue a faixa.
Vamos!
Eu disse para entregar a faixa.
Me dê a faixa.
Eu vou tirar a faixa dele!
- Vá embora daqui, Biberkopf. - Estava esperando por Lina.
Eu me sento aqui toda noite.
Mas esta é a primeira vez...
que vejo esses dois.
É porque você é um fascista.
Está com a faixa no bolso.
- Seu nazista! - Eu expliquei a Dreske.
Expliquei exatamente por quê.
Mas vocês não entendem. Por isso estão gritando.
Você gritou: ''A guarda junto ao Reno''.
Se fizerem barulho e subirem na mesa...
nunca vai haver paz no mundo. E tem que haver paz...
para que possamos trabalhar e viver.
Operários, comerciantes...
todo mundo, para que haja ordem.
Senão não podemos trabalhar.
Do que querem viver? Vocês se embebedam com palavras.
Só sabem fazer barulho, criar discórdia...
até que eles dêem uma em vocês.
Deixariam que lhes pisassem no calo?
Vocês nem sabem o que estão fazendo.
É preciso arrancar suas idéias a paulada.
Vocês estão arruinando o mundo.
Cuidado.
Cuidado para que nada aconteça a vocês...
seus assassinos, vagabundos.
Cumpri pena em Tegel. Foi terrível.
Que vida aquela! Aquele que fez o poema...
ele sabe o que sofri.
Ele sabe muito bem o que passei.
Ida, meu Deus. Não pense nisso.
Não pensar em Ida.
Vocês não têm nada a dizer.
Vocês não têm nada a dizer!
Nada! Ninguém pode chegar e me dizer o que fazer. Ninguém!
Sabemos tudo melhor. Não ficamos lá fora...
nas trincheiras, para que vocês viessem...
e ficassem de provocação! Seus agitadores.
É preciso haver paz. Paz! Paz!
É preciso haver paz! Paz, nada mais que paz.
Vou fazer alguma coisa...
agarrar alguém pela garganta. Não, não...
eu vou cair, bater no chão.
E pensei que o mundo estava em paz, que havia ordem.
Mas há algo errado com o mundo.
Lá estão eles, terríveis.
Eu sinto isso, e me vejo lá.
No paraíso viviam duas pessoas: Adão e Eva.
E o Paraíso era o Jardim do Éden...
onde pássaros e animais brincavam.
A nuvem passou.
Graças a Deus, foi embora.
Os magnatas da indústria cuidam do seu dinheiro.
Krupp deixa seus aposentados passarem fome.
Um milhão e meio de desempregados...
um aumento de 226.000 em 1 5 dias.
Vou embora.
O prazer foi todo meu.
Não tenho nada a ver com o que se passa nas suas cabeças.
O que devo, acerto amanhã, Maxe.
Sinto muito, Dreske...
por termos nos desentendido.
Salve você, com sua coroa de louros e batatas!
''Deixe os renegados desprezíveis...
encorajados pela burguesia e pelos chauvinistas sociais...
insultarem a constituição dos soviéticos.
Isso acelera e aprofunda o rompimento...
entre os trabalhadores revolucionários da Europa...
e os separatistas, e assim por diante.
As massas oprimidas estão do nosso lado.
O que houve?
- Aconteceu alguma coisa? - No fundo, eles não são assim.
Não sabem que fazer com tanto sangue quente.
Se tivessem estado em Tegel, ou passado por algo...
talvez chegassem a entender.
Lina...
pensei que não viesse mais.
Lina, minha pequena!
Sabe...
eu te amo tanto!
O que aconteceu, Franz?
Algo deve ter acontecido.
O que teria acontecido?
O que poderia ter acontecido?
Só porque disse que gostava de você!
O que poderia ter acontecido?
Tudo bem, Franz. Pode fazer isso à vontade.
Uma mordida sua...
FIM DA SEGUNDA PARTE