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Vamos falar de cuidado como um paradigma.
O que é um paradigma?
Um paradigma é como um par de óculos
que se usa sobre o cérebro em vez de sobre os olhos,
que nos faz enxergar a realidade de certa forma.
Durante muitos, muitos séculos
o paradigma do sucesso, do poder, do ganhar,
do acúmulo, do ser importante, do vencer,
tem orientado grande parte de nossas decisões
pessoais, familiares, sociais e dos países e regiões.
Se perguntar a um pai
o que quer que seu filho seja, ele dirá
que quer que seja inteligente, que tenha um alto nível de educação
e um alto salário; o paradigma do sucesso.
Esse paradigma nos levou à seguinte situação:
de um lado há o risco de desaparecimento da espécie,
a mudança climática,
e do outro, a possibilidade de comunicação entre todas as pessoas,
com qualquer pessoa,
a comunicação de quarta geração,
a possibilidade de nos encontrarmos e nos reconhecermos como espécie.
É um paradoxo, por um lado podemos desaparecer,
e por outro, podemos atingir um nível superior de humanização.
A pergunta é como resolver esse paradoxo.
Não o podemos resolver com o mesmo paradigma
que nos trouxe até aqui, o paradigma do sucesso.
Precisamos buscar um paradigma melhor
e a proposta é que esse paradigma melhor é o cuidado.
O cuidado pressupõe uma nova ética.
O que é ética?
Ética é um critério que nos permite tomar decisões
perante dilemas e selecionar o que nos permite viver dignamente.
Então esta é a pergunta:
Qual é essa nova ética?
A nova ética que propomos é a do cuidado.
O cuidado compreende três saberes importantes:
saber cuidar, saber fazer transações ganhar-ganhar e saber conversar.
Esses são valores fundamentais do cuidado.
Esta frase de Leonardo Boff,
o brasileiro que vocês conhecem, resume o problema:
quando amamos, cuidamos, e quando cuidamos, amamos.
O cuidado é a categoria central do novo paradigma de civilização
que está emergindo em todo o mundo e isso é o mais importante:
"O cuidado tem uma dupla função:
prevenir danos futuros e reparar e regenerar os danos passados.
Esse é o valor do cuidado.
Gostaria que ficasse pelo menos esse conceito desta conferência:
"O cuidado, hoje, não é uma opção.
Ou aprendemos a cuidar ou vamos todos perecer."
Essa é a nova ética.
O cuidado tem a vantagem de nos permitir mirar o mundo
de uma forma positiva e evitar o medo do desaparecimento,
evitar o medo do controle, evitar o medo da inação,
de não gastar, de não consumir,
e nos permitir olhar para a realidade de um ponto de vista superior,
a do cuidado. O cuidado pode nos levar a novas posições.
O que é saber cuidar?
É cuidar de si mesmo. Cuidar dos outros. Cuidar do planeta.
Que é cuidar de si mesmo?
Cuidar do corpo, cuidar do espírito e cuidar do intelecto.
Cuidar do corpo basicamente significa
o auto cuidado e cuidar dos vínculos afetivos.
Porque é em torno do vínculo afetivo
dos que estão próximos do corpo, como nós mesmos,
do amor ao corpo como nos mesmos
podemos realmente descobrir quem somos. Creio que não preciso explicar isso.
Porém, é muito importante falar de cuidar do espírito.
Que significa cuidar do espírito?
Cuidar do espírito significa buscar formas de desenvolver autonomia (próprio é redundante! apagar nota na revisão!)
e desenvolver a autonomia significa aprender a auto regular-se,
aprender a auto-estima e ter autoconhecimento.
Auto regulação, auto-estima e autoconhecimento são as bases
da autonomia de uma pessoa.
Porém, ao mesmo tempo, como disse o Dalai Lama,
é preciso aprender a controlar os sentimentos aflitivos.
A doutrina cristã nos ensinou a negar os sentimentos aflitivos,
a ira, a inveja, a avareza, o desejo de acumular, a avareza,
porém, o que realmente temos de aprender é a entender
os sentimentos aflitivos.
Vamos sempre sentir ira, avareza, inveja,
o problema não é senti-los,
o problema é não ter consciência de senti-los.
Ao ter consciência de sua ira, você pode controlá-la.
Uma vez consciente de sua inveja, você pode controlá-la.
Essa educação espiritual é fundamental
para a sobrevivência do planeta, e o cuidado do intelecto.
Fomos ensinados que o intelecto é um bem privado,
guerreiro, para vencer e ganhar, para triunfar
e para tirar uma nota alta no vestibular.
Formamos uma inteligência guerreira,
para ser o melhor, o mais bonito, o mais poderoso.
Não podemos sobreviver no planeta com esse intelecto.
Precisamos passar da inteligência guerreira à inteligência altruísta.
à inteligência solidária.
Precisamos entender que a inteligência é um bem solidário,
e aprender a perguntar,
aprender com quem andamos,
aprender a responder quando nos fazem perguntas.
Precisamos entender que hoje a inteligência consiste em saber pedir ajuda.
O que é um grande líder? É alguém que sabe pedir ajuda.
Araújo e todos que realizaram este TED,
o fizeram porque souberam pedir ajuda.
Saber pedir é ter um norte ético, saber pedir ajuda,
saber criar círculos de amizade,
emocionais, sociais e profissionais,
esses são indicadores fundamentais de um grande profissional hoje.
Não é o conhecimento, tudo está no Google,
e o que Deus não sabe, Google sabe.
Precisamos aprender a cuidar dos outros,
dos próximos, de quem está distante e dos estranhos.
Como podemos cuidar dos próximos?
Cuidando dos vínculos afetivos, aprendendo a ser amigos
e aprendendo a buscar um relacionamento estável.
67% dos jovens do mundo que vivem em grandes cidades se sentem sós,
por isso a depressão, as drogas e o suicídio.
É preciso ensinar a ter amigos,
é preciso ensinar a ter um relacionamento,
a cuidar dos estranhos, cuidando das instituições.
É preciso aprender a desenvolver as instituições,
a criar organizações e protegê-las,
assim poderemos evitar a dor e cuidar dos estranhos.
Como podemos cuidar dos estranhos? Cuidando dos bens públicos.
Imaginem o seguinte:
como cuidados da criança
que está em uma favela de uma grande cidade no Brasil ou na Colômbia?
Se tivéssemos um sistema de educação pública, realmente pública,
e não dois sistemas, um para os ricos e outro para os pobres.
Esse sistema não cuida de ninguém.
Quando aceitamos a existência de dois sistemas educacionais no país,
não estamos cuidando dos filhos dos outros.
Nós estamos acostumados que nossos filhos tenham uma boa educação
e que os outros que se virem.
Se tivéssemos um sistema educacional com a qualidade do da Finlândia,
estariam certos que estaríamos cuidando das crianças que não conhecemos.
A abundância de bens públicos é a base da igualdade, não é o dinheiro.
A sociedade é mais igualitária à medida que tem mais bens públicos de qualidade.
Fazer transações ganhar-ganhar.
O nosso cérebro foi feito para fazer transações ganhar-perder.
Buscamos a namorada mais bonita,
o carro mais bonito, a casa mais bonita,
ou seja, todos os sistemas de competência são sistemas de exclusão.
O mundo não resiste a modelos ganhar-perder
Não sou eu que estou dizendo isso.
John Nash, aquele do filme Uma Mente Brilhante,
ganhou um Nobel por causa disso.
A pergunta de Nash é
como é possível que tenhamos criado riqueza
e ao mesmo tempo a desigualdade.
Ele o demonstrou usando transações ganhar-perder e disse:
se queremos gerar riqueza e igualdade,
temos de aprender a fazer transações do tipo ganhar-ganhar.
Saber conversar, disso vocês sabem bem.
Vou encerrar com o seguinte:
do Rio Bravo à Terra do Fogo,
a América Latina tem 22 milhões de km².
Nesse território vivem 550 milhões de habitantes.
Temos três vezes o território da China
e um terço de sua população.
Todo o nosso território é habitável.
Somos a maior reserva de água doce do mundo.
Somos o continente verde do planeta,
no que todos os demais continentes estão de olho no momento.
Porém, não podemos erigir um muro,
uma muralha para mantê-los do lado de fora.
Se pudermos olhar para este continente como latinos americanos,
do ponto de vista do paradigma do cuidado,
podemos oferecer uma alternativa de boa humanização ao mundo,
de uma nova humanização diante da mudança climática.
Muito obrigado.