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Tenho quase certeza
de que o filme foi filmado nesta fábrica.
Aqui existem duas grandes fábricas de tabaco:
A H. Upmann e a Corona.
Pela disposição das ruas,
pelos ângulos das esquinas
e pela forma em que foi colocado
que entrava no edifício e saía e se via a rua,
acho que foi esta fábrica. Não tenho certeza absoluta,
mas acho que foi esta fábrica.
Esta seqüência deixou todos
de boca aberta.
Vi quando a fizeram.
Vi quando a fizeram. Eu não estava filmando.
Eu não participava dessa cena, mas estava lá.
- Você estava nela! - É verdade.
Não me lembrava disso. É a manifestação.
É verdade, faço parte do plano.
Você gosta do filme?
Eu ainda me pergunto
que filme eles queriam fazer.
Eles disseram que queriam fazer
um filme poético.
Acho que eles queriam fazer um grande poema épico,
e o clima romântico e de paixão existia
sem necessidade de forçá-lo.
Estava no país, estava em nós, estava em mim.
Eu estava, naquele momento,
na euforia de uma paixão romântica
pelos acontecimentos da revolução.
Eu via tudo grande,
de um jeito épico, epopéico.
Para mim era uma escola, uma aprendizagem.
O projeto era interessante. A idéia era excitante.
Na verdade, esse filme estreou e foi guardado.
Não apenas em Cuba, mas acho que em todos os lugares.
Um filme desconhecido, inclusive para muitos cubanos.
Hoje, você fala de Soy Cuba"
e muitos não sabem o que é isso.
O MAMUTE SIBERIANO
Para os atores, a criação do ICAIC
foi uma coisa extraordinária.
Poder fazer e trabalhar no cinema era
realmente algo inimaginável antes daquela época.
Aqui, no mundo do cinema, todos estamos aprendendo
e fazendo de tudo.
Tivemos de passar e inventar muitas coisas
para fazer uma coisa que valesse a pena.
Sem recursos, sem nada.
Acho que aquela foi uma das épocas mais bonitas do ICAIC.
26 DE JULHO DE 1959.
LOGO QUE RECEBI TUA CARTA,
ENTREl EM CONTATO COM A COMPANHIA E OFERECI:
PARA TRÊS FILMES MENSAIS, PAGOS EM AÇÚCAR.
DEPAREl-ME COM VÁRIAS SURPRESAS:
TODOS OS ESTÚDIOS USAM CÂMARAS AMERICANAS E ALEMÃS,
PRINCIPALMENTE AMERICANAS.
ENVIO-LHE UM LIVRO QUE, TALVEZ, POSSA SER ÚTIL.
NÃO SEl SEU VALOR PORQUE NÃO FALO INGLÊS
NEM ENTENDO DE CINEMA."
CHE
Bem, eram os primeiros tempos do nosso cinema.
Eram tempos de fundação.
Todos sentíamos,
finalmente, fundando. Tínhamos a oportunidade
de fazer andar uma cinematografia.
Em Havana e através de toda a república,
o público comparece entusiasmado
à estréia de Histórias da Revolução... "
o primeiro filme cubano revolucionário produzido pelo
Instituto Cubano de Artes e Indústria Cinematográfica.
Nós estávamos muito vinculados ao movimento neo-realista,
especialmente, com Cesar Zavatini,
com a Novelle Vague porque precisávamos de ajuda.
Procurávamos em todos os lugares.
Que venham todos. Que todos sejam diferentes
e que ninguém nos marque.
Nos visitavam: Chris Marker, Gerard Phillipe.
Vinham Joris Ivensz e Agnès Varda.
Era o instante em que todos
se dirigiam a uma esperança,
a uma nova possibilidade de vida e de mudança.
Tratam-se de dias especiais.
Trata-se de um momento,
de uma época histórica singular.
Era a etapa dos sonhos, era a etapa
da efervescência, da paixão renovadora.
Estavam em esboço todos os projetos
humanos, sociais,
afetivos.
Havia muitas mudanças. Havia muitas ilusões.
O povo queria trabalhar e tinha esperança de um mundo melhor.
De acabar com os velhos conceitos, de melhorar tudo.
Era a integração das raças.
Havia muito entusiasmo e muitas coisas concretas.
Os primeiros anos foram como uma festa, algo novo.
Foi uma boa época para nós
apesar de que a escassez já começava.
Era um momento que podia ser muito duro.
Era também o momento da gravidade.
Sob as bandeiras do marxismo-leninismo.
Eram tempos em que apareciam
novos amigos quando outros desapareciam.
A relação com a URSS
se iniciava
e não tínhamos nenhuma experiência sobre ela.
Nosso objetivo era fazer andar o cinema cubano e nada mais.
O presidente do Instituto Cubano de Artes
e Indústria Cinematográfica,
Alfredo Guevara, recebe artistas e diretores soviéticos.
Dois povos distantes entre si
se aproximam e se conhecem
através de suas aspirações artísticas.
Eles propuseram fazer um filme,
sem uma idéia preconcebida ou elaborada,
sobre a solidariedade e a amizade com Cuba,
expressando a simpatia deles pela revolução cubana.
Eles propuseram
Kalatozov.
E, a partir dele, conhecemos
uma equipe de colaboradores que foi extraordinária.
Alfredo me chamou. Com ele, estavam
Julio García Espinoza E Saul Yelín.
Eu acabava de chegar ao ICAIC.
A proposta foi para eu ajudar e apoiar.
Eu seria uma espécie de assessor
que aportaria imagens, conhecimento de fatos,
apresentaria personagens, lugares e outras coisas
à equipe de realizadores soviéticos,
que, me explicaram, eram significativos e muito importantes.
Eles tinham realizado filmes como Quando Voam as Cegonhas... "
que tinha recebido o Leão de Veneza.
Eram Kalatozov e Urusevsky, de quem eu tinha referências.
E que viria o poeta Evtushenko,
Dele, eu não tinha referências nem o conhecia.
Me disseram que era um poeta muito importante
e que eu apoiasse a todos,
que eu proporcionasse imagens
e elementos de informação.
Nos encontramos, realmente,
diante de uma oportunidade excepcional
porque caiu em Havana
o melhor da intelectualidade russo-soviética.
Não estou dizendo que Kalatozov fosse o maior dos diretores,
mas ele teve a virtude de nos conectar
com o que acontecia naquela época.
Quando chegamos, não sabíamos muito sobre a história,
nem sobre sua cultura, e idioma falado em Cuba
apenas sabíamos sua localização no mapa.
e, foi uma grande surpresa.
Ficamos impressionados porque a Revolução Cubana
nos parecia uma revolução mais humana que imaginávamos.
Nós não sabíamos como tinha acontecido,
mas nos falaram
que era uma revolução com perfil humanitário
e que se derramou bem menos sangue que outras revoluções.
E depois eu comecei a pensar de outro jeito,
mas, naquele momento, todos nós ficamos maravilhados
com o que víamos nas ruas:
garotas vestidas com uniforme militar,
que chamavam de milicianas... "
E isso pareceu bem estranho, porque não existia na Rússia.
Havia três pessoas-chave no filme:
uma delas era Kalatozov,
outra era Urusevsky, o diretor de fotografia,
e, além disso, câmera muitas vezes.
A outra pessoa fundamental era Belka,
a assistente de direção
e esposa de Urusevsky.
Eu acho que vieram com uma grande ingenuidade,
com um grande romantismo
e com uma grande vontade de realizar,
mas pensavam que fariam uma coisa grandiosa.
Queriam saber e conhecer de tudo.
Eles vinham com um back ground da revolução deles.
E, talvez, eles medissem a revolução cubana
por seus parâmetros, apesar de eles falarem sempre
de uma coisa fresca, nova, renovadora.
Eles pensavam em fazer uma coisa grandiosa.
Eles não chegaram com uma idéia fixa.
Eles chegaram para ver como elaborar um roteiro.
Começaram por querer conhecer Cuba,
por falar com todos nós, com outros,
com artistas e escritores.
Eles fizeram uma espécie
de esboço da ilha, de sua cultura,
do mundo que eles filmariam.
Me chamava a atenção a atitude de Kalatozov.
Ele ficava no carro
e olhava as coisas da janela.
Mesmo que eu tivesse apresentado uma coisa extraordinária.
Eu pensava que uma coisa era extraordinária
e o levava para vê-la.
Ele ficava dentro do carro. E eu me dizia:
"Ele verá a vida desse jeito?"
De longe, de uma posição cômoda?"
Eu dizia para Lázaro, o motorista:
"Esse cara não desce por nada do carro. "
A gente Ihe mostra coisas interessantes
e ele nem abre a porta. Ele sentado confortavelmente"
no Cadillac.
- Meu Deus! - É maravilhoso!
Olha o que eles fazem! Veja como eles dançam!
E feitiçaria!
É a cultura cubana, é a cultura do Caribe!
Temos que registrar isso para sempre, em nossa memória
Nossa, de todos, dos revolucionários, dos patriotas,
será a mesma sorte
e de todos será a vitória.
Pátria ou morte.
Farei um filme em Cuba,
e isso vai ser a minha resposta
e de todo o povo soviético
contra o Bloqueio Naval,
esta cruel agressão do imperialismo norte-americano!
No começo, era
como um labirinto.
Não sabíamos por onde começar.
Iniciamos as conversas, as discussões
e falamos
em dividir o filme em várias histórias.
Isso foi discutido desde o começo.
E também dar um peso determinado
à cidade,
à vida da cidade antes da revolução.
Ou seja, tudo seria anterior
ao triunfo da revolução.
Em outro momento, falamos
da luta estudantil. Eu mostrava
imagens de cinejornais,
de documentários.
Os jovens descendo a bandeira cubana
na praça da universidade.
Nós fazíamos intercâmbios.
Eu mostrava a Evtushenko um texto meu,
ele me mostrava o dele; ou trabalhávamos separadamente. "
Foi um toma lá, dá cá o tempo todo. "
Um intercâmbio no qual Kalatozov
escolhia, mas eu percebia
que a escolha dele era mais literal
e que a escolha de Urusevsky, e fiquei fascinado com isso,
era mais subjetiva,
mais levada ao clima e à imagem.
A situação, o trabalho estudantil
e o perigo de ser jovem na ditadura
eram bem conhecidos por mim.
Eu já os tinha experimentado
e, em algum momento, também fui vítima
dessa circunstância.
Era estimulante levar a experiência que eu conhecia
para um acontecimento artístico, para um filme.
Mijail Kalatozov, diretor de Quando Voam as Cegonhas... "
"A Carta Que Não Se Enviou"
Sergei Urusevsky, diretor de fotografia dos dois filmes,
realizam, atualmente, na nossa pátria,
a primeira co-produção cubano-soviética:
"Soy Cuba. "
No primeiro dia de filmagem de Soy Cuba... eu fiz vinte anos. "
26 de fevereiro de 1963.
Quer dizer, me lembro muito bem por essas duas coisas:
pelo começo da filmagem,
que foi algo para se lembrar,
e porque eu fazia 20 anos, uma idade também para se lembrar.
Na filmagem
de Soy Cuba... fiz também vinte e um. "
Foi uma filmagem longa. Acho que
a filmagem mais demorada
de um longa-metragem em Cuba.
Sou técnico de som no filme. O filme tem 4 contos.
Eles encontraram os atores
do conto 1, 2 e do 4.
Faltava Enrique.
Enrique era o estudante.
Eles não encontravam Enrique.
Começamos a filmar os contos que tinham atores.
E Enrique continuava sem aparecer.
Havia um tradutor no filme
que se chamava P. Grusko.
Eram vários dentro de um staff de mais de cem.
Ele me contou que teve a idéia de dizer:
"Por que não testam Raúl?"
O *** foi a cena,
ou seja, eu dizia o texto da Alma Mater da escadaria,
era o mais difícil.
Sou Cuba
O homen quando nasce tem dois caminhos
Ele corre para o sucesso.
Será difícil
Será feito com sangue
Muitos atores, nós encontramos por acaso.
No elevador do hotel, Jean Boise,
o qual nós convidamos para o nosso filme e ele aceitou.
Um rapazinho, que era operador do filme,
fez o papel do estudante Enrique.
A garota que fazia a claquete
fez uma participação no filme.
Todos, até o maquinista Juan Varona,
fez uma pequena participação no filme.
Todos que apareciam na nossa frente
podiam terminar como atores do filme.
Você já beijou alguém antes?
Quer tentar?
Eu estava na cafeteria da Habana Libre"
e uma senhora se aproxima de mim.
Eu estava horrível, com o cabelo oleoso
e desarrumada.
Ela se aproxima e diz:
"A senhora gostaria de fazer um filme?"
Eu fiquei olhando e disse: Eu?"
Com esse óleo todo na cabeça?"
Ela me deu o número do quarto,
eles moravam numa suíte de hotel
e disseram que iriam fazer um *** comigo.
Fiz o *** e eles gostaram de mim.
Inclusive, o cinegrafista... Qual é nome dele?
Começou a me pintar, porque ele era pintor.
Fiz poses, com ele me pintando o tempo todo,
isso me emocionou muito.
Me lembro muito de Kalatozov.
Ele dizia: Maria, Maria, mais loucura,"
mais temperamento. Mostre sua tristeza, sua angústia. "
Era assim que eu o sentia.
Ao ver-me agora, me dá muita tristeza.
O personagem tinha muito a ver comigo.
Por isso Kalatozov, logo quando me viu, me aceitou.
Kalatozov era muito concentrado,
muito pausado,
muito observador, como todo diretor.
Mas há diretores que acompanham a observação
com movimento porque são inquietos.
Ele não. Ele era estável.
Onde ele se sentava, ele se mantinha
e dali dirigia.
Havia outra coisa característica nele:
seu olhar era muito penetrante.
Ele nos estudava.
Fazia um raio X do nosso pensamento, através do olhar.
Kalatozov foi
um diretor único
da nossa cultura visual,
porque, na juventude, ele foi câmera-man.
Mas todos se esqueceram disso.
E ele conseguiu fazer dois filmes maravilhosos.
Um se chama Prego Dentro da Bota"
e o outro, O Sal Para Svanetia.. "
Para os comunistas Não existem obstáculos
Ao ver esses filmes, é fácil ver que existe uma analogia
entre os filmes de Kalatozov,
que foram feitos no final dos anos 20,
e o filme Soy Cuba... que foi feito nos anos 60."
Naquele momento, os soviéticos descobriram em Cuba
algo que restou do capitalismo que eles não conheciam.
Ver, de repente, um hotel de luxo,
como aquele, meninas bonitas na piscina,
era uma espécie de deleite do erotismo tropical.
Naquela época, nada conhecido.
Eu achava um pouco ingênuo
buscar esse erotismo que eles, habitualmente,
evadiam nos seus filmes.
Mas eles o encontravam no Caribe
e diziam que eram as seqüências do pecado,
do pecado erótico caribenho.
Esta canção estava programada
por Kalatozov
para um personagem
de caráter popular, um trovador.
Para ele, Enrique Piñeda e eu tínhamos de compor uma canção
A escolha do ator ainda não tinha sido feita.
Enrique e eu fizemos uma canção.
E, para nossa surpresa, dias depois,
soubemos que Kalatozov já tinha filmado a seqüência
com um personagem encontrado na rua.
Quando vemos, pela primeira vez essas imagens,
percebemos que ele não tocava violão, nem cantava.
Kalatozov o escolheu só pela imagem oferecida por ele.
O velho ficou sentado.
Ele não sabia cantar, falava muito mal.
Depois ele disse a Fariñas e a mim que tínhamos que fazer uma cação
para ser colocada na boca do velho.
Tivemos de inventar uma canção,
trabalhando na moviola, uma loucura tecnológica,
tirando os fonemas dela.
Para depois, tirar as medidas de tempo,
construir uma letra coerente.
Seria uma canção romântica, triste, mas alegre.
Triste, mas otimista; cubana, mas universal;"
nostálgica, mas contemporânea.
Então, fizemos um novo trabalho,
uma nova letra com seus tempos.
Carlos fez a música
e, na edição, foi colocada na boca do velho.
Finalmente, fizemos a canção nessas condições terríveis.
Esse é o final da espontânea, doce e triste canção
que o *** canta
e que foi incluída, no meu repertório.
Nomeei de Canción Triste pois há um tom e uma história triste. "
Hoje é um clássico da música para violão contemporânea,
chamada Canción Triste de Carlos Fariñas. "
Uma surpresa da qual me lembro
é o cuidado que eles tinham com a luz.
Eu diria que a luz era a protagonista desse filme.
O cuidado com as locações, com a luz,
com os movimentos de câmara era
de uma meticulosidade extraordinária.
Essa é a lembrança que tenho.
Uma vez ficamos quase três dias,
aqui em Cabaña, sentados,
esperando por umas nuvens.
Mas aconteceu que, durante três dias,
o céu ficou limpo, sem nuvens.
E todo o staff parado esperando.
E Urusevsky, tranqüilo, calmamente dizia:
"Céu sem nuvem não é interessante. "
Ele gostava muito de céu com nuvem.
Com o céu limpo, ele não filmava nada.
Quando ele precisava de um plano com características especiais,
ou seja, um plano onde o céu tivesse uma presença grande
e que fosse luminoso e muito complexo,
ele se afastava da câmara por um tempo,
colocava uma venda nos olhos,
para tentar dilatar a pupila o máximo possível.
Isso Ihe permitia, com as mãos na câmera,
na hora de olhar pelo visor,
ter uma visão muito mais brilhante da imagem,
do que se fizesse de outro jeito.
Ele só pensava no seu trabalho.
Ele estava, constantemente, ligado no seu filme.
Eu acho que ele olhava uma cena
e pensava
no resultado em branco-e-preto dessa cena.
Gastei alguns meses para ir de Moscou até cidade
onde foi feito o negativo.
Ele foi feito em uma fábrica
que produzia material militar.
Ele foi feito na mesma fábrica
que faziam negativos para filmar o lado escuro da lua,
pois o negativo infravermelho possui um forte efeito visual,
que é difícil de ser controlado,
e todo o segredo também está que este negativo é pancromático
e nele são adicionadas algumas substâncias químicas
que o fazem ficar mais sensível
à luz infravermelha.
Sou Cuba.
Às vezes penso...
Havia um grande entusiasmo com o trabalho,
um desejo de cooperar.
Era um país que veio filmar aqui.
Nós, imagine...
Eu não sabia nada de nada de cinema.
"Eu posso Ihe falar sobre a queda,"
a cachoeira, a queda d'água. "
E ele me disse: Luis,"
por aí não é bom. "
"E o que você quer?, disse eu. "
"Por aí não há água. "
Eu disse que não, que era impossível.
Ele disse: Sim, dá. EEEntão está bem... disse eu. "
Então todos participamos, colocando madeira
até que a água começou a cair onde ele queria.
Por quê?
Porque tinha um plano onde o sol batia na câmera,
batia na câmera.
Então, quando ele conseguiu o que queria,
me disse: Luis,"
o homem pode tudo. "
Mas foi um filme muito duro, muito duro
em relação ao trabalho.
Cada vez que Urusevsky pedia uma coisa
era terrível.
Cada cena que a gente filmava parecia uma batalha,
uma guerra,
como se fossemos fazer uma pequena revolução
para filmar cada plano do filme
Com um machado, numa luta corpo a corpo,
conseguiu desarmar o soldado.
E ele já tinha um fuzil.
Puxou o gatilho e começou a atirar.
Ele não percebia quantos tiros dava
nem quantas balas tinha o fuzil.
Ele só atirava contra o inimigo,
frente ao inimigo,
sempre contra o inimigo,
até que cheguei aqui.
Neste lugar, os pirotécnicos tinham marcado uma trilha.
De lado a lado, eram doze bombas.
Olhe, aquilo foi terrível.
Eram doze senhoras bombas.
Eu atravessei tudo.
Quando consegui chegar ao final,
toda a equipe soviética e a cubana estavam me esperando.
O pirotécnico subiu em cima de mim,
para revistar meu corpo, para ver se eu tinha algum ferimento.
Bem, foi uma alegria
sair ileso daquilo tudo,
e, além do mais, era uma tomada única.
Outro plano fantástico
é quando o exército rebelde vem descendo,
depois do triunfo da revolução.
Vêm cinco mil soldados.
Imagine quando Urusevsky pediu cinco mil soldados.
"Onde vamos encontrar cinco mil soldados?"
E Kalatozov dizia: Preciso de cinco mil soldados. "
Tiveram de falar com Raúl Castro.
E vieram cinco mil soldados que foram tirados
de diferentes bases militares da Província do Oriente.
Tirar 5 mil soldados era deixar a Província do Oriente
sem proteção.
Então, pelo rádio,
avisavam, por onde passavam as tropas,
que se tratava de um filme.
Porque era o começo da revolução.
Pensariam que estávamos de novo em guerra
porque vinham as tropas.
Todas as seqüências mais conhecidas,
que foram filmadas nesse filme,
como a do enterro do estudante,
ou a da Fábrica de Tabaco,
ou a repressão do protesto estudantil,
ou a cena em que começa o filme,
na cobertura do arranha-céu,
onde a câmera desce até piscina,
isso tudo foi muito difícil de filmar,
e as seqüências foram repetidas várias vezes,
para se ter uma boa qualidade.
Nós filmamos esse filme, como todos sabem,
durante 2 anos, por isso todo dia
eram feitos inúmeros ensaios e repetições de cenas.
Sabíamos que se podia fazer filmes em doze semanas,
em oito semanas
e que doze, quatorze semanas já era um luxo.
Quatorze meses era um desatino.
Esta é a Rádio Rebelde,
transmitindo das montanhas do Oriente, na Sierra Maestra,
território livre de Cuba.
Liberdade ou morte.
Ou morte.
Urusevsky e Kalatozov
eram pessoas que tinham um grande prestígio
na cinematografia soviética, que permitia
que eles fizessem todas essas coisas.
Foi permitido a eles fazerem coisas em Cuba, que, talvez,
não fosse permitido a outra equipe cinematográfica.
Se você soubesse... Vou ser sincero, não me lembro
da estréia de Soy Cuba.. "
Perdeu-se no tempo. Para você ver como a vida é.
Me lembro agora: a estréia foi em Santiago de Cuba.
Em Santiago de Cuba.
Acabo de me lembrar. Só agora.
A co-produção cubano-soviética Soy Cuba"
estréia no Teatro Cuba, simultaneamente em Moscou,
apresentando, pelo ICAIC, outros 5 filmes cubanos.
FIM
Foi horrível.
A primeira coisa que me incomodou
foi aquela voz, aquele texto:
"Sou Cuba. "
E a forma melodramática
e exagerada, em termos gerais, do filme.
Me incomodava muito.
Me sentia responsável e culpado diante daquilo.
É uma sensação terrível. E de dor, ao mesmo tempo,
de pensar que tudo foi feito com tanto esforço,
com tanto sacrifício, com tanto amor.
Não gostei muito.
Não gostei muito.
Às vezes, tinha a sensação de que eles queriam
mostrar uma realidade que não era aquela, exatamente.
Acho também que a fotografia estava acima do roteiro.
Acho que um diretor pode ser fotógrafo e autor de um filme.
O que eu não aceito é que Urusevsky foi o autor do filme.
Eu não posso conceber que a imagem seja
mais importante que o conteúdo.
A imagem tem de estar subordinada a um conteúdo
e subordinada a um diretor.
E é um fotógrafo que está Ihe dizendo isso.
Mas esse nível de participação,
esse nível de evidência que ele tem,
acho que lastima o filme.
Kalatozov dá um tom épico, poético,
que eu acho, não era bom,
falando de coisas históricas da Sierra, da universidade,
do campo.
Talvez não tenhamos entendido a caráter dele.
Com certeza, ele não entendeu o nosso.
Para mim,
o tempo do cinema soviético de então,
o tempo
das cenas
quando, por exemplo, o estudante sai com a pedra
para jogar no chefe de polícia,
que era um assassino,
é um tempo demorado, de avanço lento,
contínuo, sustentado, que não termina nunca.
Esse não é o temperamento cubano.
O temperamento do cubano
não é o do soviético.
Cada povo tem sua idiossincrasia,
sua maneira de sentir,
sue forma de reagir, seu tempo
diante das diferentes situações da vida.
As pessoas diziam: "Essa não é nossa realidade".
Esse personagem não existe, não é cubanos.
Diziam que era a realidade cubana
vista através de um prisma eslavo.
Estávamos mais perto, sabe de quem?
De um movimento extraordinário que estava surgindo
no Brasil que era o Cinema Novo.
Nos interessava muito mais o que acontecia no Brasil,
inclusive com poucos recursos,
do que no cinema soviético.
SOU CUBA? SIM OU NÃO?
Em vez de a imprensa cubana chamar o filme
de Eu Sou Cuba... chamou-o de "Eu Não Sou Cuba...
O jornal do partido escreveu um artigo,
que meus amigos enviaram para mim em Moscou,
no qual o crítico, sem piedade, humilhou o filme,
falando que os operadores com as câmeras dançantes
representavam cenas de circo
e isso não era interessante para os cubanos.
O espectador comum, como se falava na Rússia,
não entendeu para que foi feito esse filme.
Por isso ele só ficou uma semana em cartaz.
Não gostaram dele nem em Cuba nem na Rússia.
Em Moscou, até tinham medo desse filme,
porque ele era muito idealizado
e mostrava, ao povo soviético,
episódios da vida americana em Cuba
que eles não queriam mostrar nas telas soviéticas.
Por isso o filme fracassou aqui e lá,
e, depois disso, foi arquivado.
Uma cópia no ICAIC em Cuba e outra na URSS.
Era impossível para nós, na época,
saber o quanto circulava na União Soviética,
que era um país muito secreto.
Mas em Cuba não houve nenhum limitação para esse filme.
A gente nunca sabe.
Às vezes, prefere não saber
porque algumas coisas são arquivadas.
O que é triste
O que é triste
é desconhecer
por que algumas coisas são esquecidas.
Quando eu o vir de novo, vou me lembrar
de coisas fascinantes, mas acho que,
em termos artísticos,
realmente, não pensaria em tirá-lo do arquivo,
talvez para que fosse visto num evento histórico
para mostrar certas coisas.
Quando eu recebi a notícia
foi como se me dissessem
que um parente distante e desaparecido
tinha sido encontrado
embaixo de um desgelo no Alasca.
Era como
um objeto perdido e reencontrado.
Uma coisa muito estranha.
Esse filme, tirado do fundo da gaveta
onde ele fora coberto por naftalina
e Ihe deram uma nova vida.
Isso aconteceu no começo dos anos 90.
E deram a ele um novo caminho e, neste começo
a luz verde foi dada por dois nomes:
Scorsese e Coppola,
Inclusive Scorsese me falou que,
se tivesse visto o filme quando jovem,
quando ele ainda estava no começo
da sua atividade cinematográfica,
ele teria sido um outro diretor.
Comecei a questionar coisas.
Comecei a pensar se o filme era bom.
"O que acontece com o filme? Diziam que não era bom,"
agora dizem que é. Por que apareceu?
Estarão estudando algo? O modo que Kalatozov trabalha,
da época, de Cuba.
Me fiz muitas perguntas. Me deu muita alegria.
Vou fingir que vejo, mas não vejo nada.
Ler apropriadamente.
Espetacular.
Esse é o filme completo?
Nunca imaginei que isso fosse acontecer.
Minha nossa!
Martin Scorsese está no meio disso.
Interessante.
Estão fascinados.
Estão deslumbrados com um cinema
que nunca havia imaginado.
Acho que,
há coisas aqui que estão exageradas,
do ponto de vista da crítica cinematográfica.
Durante anos o chamado mundo ocidental,
do qual somos mais ocidentais que os ocidentais,
criticou brutalmente o realismo socialista.
Todo o academicismo da pintura do realismo socialista era criticado.
Até que um crítico americano
começou a falar bem do realismo socialista.
E as grandes obras do realismo socialista foram trazidas
aos museus americanos depois que o comunismo
não era mais perigoso.
Isso tem a ver
com a dialética dos interesses econômicos.
Encontrar um filão na plástica russa,
desconhecida e oculta para o mundo capitalista.
Adquiri uma experiência tão grande no filme Soy Cuba... "
que me serviu para o tempo todo
que levo trabalhando no cinema.
Na época de Soy Cuba... não tinha nem trinta anos. "
Agora vou fazer sessenta e seis.
Sempre que você trabalha numa co-produção estrangeira,
as experiências ficam.
As que eles levam de nós e as que nós adquirimos deles.
Acho que,
do meu ponto de vista,
"Soy Cuba foi um marco na cinematografia cubana. "
A partir de Soy Cuba... "
no cinema cubano, os fotógrafos que faziam direção de fotografia
de longas-metragens e documentários
começaram a trabalhar muito mais com a câmera na mão.
Um exemplo é Jorge Herrera,
fotógrafo de Lucía... "
o primeiro filme de Humberto Solás, e de Manuela.. "
Mesmo que nunca ninguém tenha reconhecido,
o cinema cubano e o cinema latino-americano
devem grandes cenas de homenagem, ou de memória,
ou de reminiscência, ou de influência
à câmera de Sergei Urusevsky.
Podemos ver isso em imagens clássicas
de La Primer Carga al Machete... de LLLucía... "
de muitos outros filmes cubanos e de filmes do cinema brasileiro,
como os de Glauber.
Nós devemos essa grandiosidade ao cinema,
às imagens de Sergei Urusevsky carregadas de toda uma poética.
Depois da morte Urusevsky, Belka veio a Cuba
trazendo uma mostra de pinturas dele
exibida no Pabellón Cuba.
Eu me emocionei muito quando a vi exposição.
Quando ela me viu, me abraçou
e, chorando, me disse:
"Sergio já não está. "
Ela dizia Sergio.. SSSergio já não está. "
Me emocionei muito.
Quantos companheiros, que como eu, que participaram
deste filme, merecem esta informação.
Nós que sobrevivemos, porque o tempo
tem o seu papel.
Ter o privilégio de participar deste filme
e, depois de quase quarenta anos,
receber este reconhecimento é um fato muito emocionante.
Eu Ihe agradeço de coração.
Isso, para mim, e para minha família,
é um patrimônio de um valor incalculável.
Do grupo de criação, dos mais próximos, estão vivos,
Evtushenko, que está nos Estados Unidos,
não sei exatamente onde,
eu não o vejo desde aquela época,
e Sacha.
Ele e eu nos esforçamos para nos comunicar.
Não nos vimos nunca mais,
mas nos comunicamos por correio eletrônico,
e através de amigos mandando notícias e abraços.
Quando eu deixei Havana,
essas foram as horas mais tristes,
os dias mais tristes.
Quando eu parti de Cuba e voltei para casa,
parecia que deveria ser o contrário.
Quando voltei para a Rússia, eu estava tão cubanizado"
que nem saía, ficava trancado em casa,
porque tudo era desinteressante para mim.
Não vejo Sacha há mais ou menos quarenta anos.
Tenho esperança de ver o mesmo rapaz
que vi há quarenta anos.
Que branquinho!
Pintado.
Sim, acho que Soy Cuba mudou o meu destino,"
7 anos depois voltando de Cuba...
imigrei para o Ocidente, o que...
demonstra a importância de ter vivido em Cuba por 2 anos
isso teve uma grande importância na minha vida, na minha história.
Vou agradecer sempre a ele
- a possibilidade. - Obrigado Vicente!
Não, foi o destino.
Agora, em forma de retrospectiva,
podemos ver e afirmar taxativamente
que ele não teve influências sobre nós.
Isso não quer dizer que não vejamos
com nostalgia e grande simpatia
o esforço feito por aquele grupo de intelectuais soviéticos
para se aproximar de Cuba,
por descobrir com um olhar de amor a realidade cubana.
Se eles nos entenderam ou não, pouco importa
O que sei é que, naquele momento,
eles buscavam nos apoiar.
E, hoje, o redescobrimento do filme, por outras pessoas,
me fascina.
Mas também me faz refletir:
quando o filme era um apoio necessário
foi ignorado,
quando é uma obra da arqueologia, ele é resgatado.
Ver pessoas
de diferentes culturas e de outras gerações
valorizando o filme
é, realmente, surpreendente e delicioso.
É um prato delicioso Reencontrar-se com a vida"
e ter um reconhecimento, mesmo tardio.
Houve
uma atitude inteligente
de procurar,
depois da queda do Muro de Berlim,
acima de qualquer diferença ideológica ou política,
grandes artistas e grandes obras de arte.
Que temos de mostrar e resgatá-los
para a história da humanidade.
Do mesmo jeito que Soy Cuba emergiu,"
teriam que emergir dezenas e dezenas de filmes,
porque essas obras de arte estão aí.
Em tempo, quem governava será esquecido.
E serão lembradas as obras de arte que permanecerão.