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Um Universo que não foi feito para nós .
Nossos ancestrais concebiam as origens extrapolando a partir de suas próprias experiências. Como mais poderiam faze-lo?
Então o Universo foi chocado de um ovo cósmico, ou concebido de uma congregação *** de uma deusa mãe e um deus pai,
ou foi como um produto da oficina de um criador, talves o último de muitas tentativas falhas.
E o Universo não era muito maior do que vemos,
e não mais velho do que nossos registros escritos ou falados,e nem muitos diferentes do que os lugares que conhecemos.
Tendemos, em nossa cosmologia, a tornar as coisas familiares.
Apesar de nossos melhores esforços, não fomos muito criativos.
No Ocidente, o céu é plácido e confortável, e o inferno é parecido como o interior de um vulcão.
Em muitas estórias, ambos os reinos são governados por hierarquias dominantes, liderados por deuses ou demônios.
Monoteístas falavam sobre o rei dos reis.
Em todas as culturas, imaginamos algo como nosso próprio sistema político governando o Universo.
Poucos acharam as similaredades suspeitas.
Então veio a ciência e nos ensinou que não somos a medida de todas as coisas, que há maravilhas inimagináveis,
que o Universo não é obrigado a ajustar-se ao que consideramos confortável ou plausível.
E, novamente, se não somos importantes, nem centrais, nem a "menina dos olhos" de Deus,
o que isso implica para nossos códigos morais baseados na teologia?
A descoberta de nossa verdadeira importância no Cosmos foi segurada por tanto tempo e até tal ponto
que muitos traços do debate ainda persistem, as vezes com os motivos geocentristas revelados.
Então, o que realmente buscamos na filosofia e na religião? Paliativos?
Terapias? Conforto? Buscamos fábulas tranquilizadores ou um entendimento de nossas reais circunstâncias?
Desanimarmos porque o Universo não se ajusta a nossas preferências, parece infantil.
Poderia se pensar que adultos se sentiriam envergonhados em publicar tais desapontamentos.
A forma elegante de fazer isso não é culpar o Universo que parece verdadeiramente sem sentido
mas culpar os meios pelos quais conhecemos o Universo. Nem culpar ciência.
A ciência nos ensinou que, como temos o talento de enganarmos a nós mesmos, a subjetividade não pode reinar livre.
As conclusões derivam de interrogar a Natureza, e não são em todos os casos predestinadas a satisfazer nossos desejos.
Reconhecemos que mesmo líderes religiosos reverenciados, são produtos de sua época como somos da nossa,
e podem ter cometidos erros.
Religiões contradizem uma a outra em assuntos menores tais como, se devemos colocar um chapéu ou tira-lo
ao entrar em um templo, ou se devemos comer carne e abster de porco ou o inverso,
até as questões mais centrais como se não existem deuses, um Deus ou muitos deuses.
Se você viveu há dois ou três milênios atrás, não havia vergonha em acreditar que o Universo foi feito para nós.
Era uma tese atrativa consistente com tudo que conheciamos.
Era o que os mais estudados entre nós ensinavam, sem restrição. Mas descobrimos muito desde então.
Defender esta posição atualmente, equivale a desconsiderar intencionalmente as evidências,
e uma fuga do autoconhecimento.
Desejamos estar aqui por um propósito, mesmo que, apesar de muito auto-engano, nenhum seja evidente.
Nossa época tem o fardo do peso acumulado de sucessivas invalidações dos nossos conceitos.
Somos recém chegados. Vivemos no isolamento cósmico.
Emergimos de micróbios e detritos. Primatas são nossos primos.
Nossos pensamentos não estão em nosso completo controle.
Podem haver seres muito mais inteligentes e diferentes em algum lugar.
E além disso tudo, estamos fazendo uma bagunça em nosso planeta. E nos tornando um perigo para nós mesmos.
O alçapão em baixo de nossos pés se abrem. Nos encontramos em uma queda livre sem fim.
Estamos perdidos em uma grande escuridão, e não há ninguém para enviar uma equipe de resgate.
Dada esta realidade tão dura, é claro que somos tentados a fechar os olhos e fingir
que estamos seguros e confortáveis em casa, e que a queda é apenas um pesadelo.
Quando superamos nosso medo de sermos insignificantes,
nos encontramos no limiar de um vasto e imponente Universo que diminui totalmente,
em tempo, em espaço e em potencial, o palco arrumado, e antropocêntrico, de nossos ancestrais.
Olhamos através de bilhões de anos-luz no espaço para vislumbrar o Universo logo após o Big ***,
e exploramos a estrutura fina da matéria.
Fitamos o núcleo de nosso planeta, e o interior ardente de nossa estrela.
Lemos a linguagem genética na qual são escritas as diversas habilidades e propensões de todos os seres da Terra.
Nós descobrimos capítulos ocultos nos registros de nossa própria origem.
Inventamos e refinamos a agricultura, sem a qual quase todos morreríamos de fome.
Criamos medicamentos e vacinas que salvam a vida de bilhões.
Nos comunicamos na velocidade da luz, e viajamos ao redor da Terra em uma hora e meia.
Enviamos dúzias de naves para mais de setenta mundos, e quatro astronaves para as estrelas.
Para nossos ancestrais, havia muito na Natureza para se temer
Relâmpagos, trovões, tempestades, terremotos, vulcões, pragas, secas, invernos longos...
As religiões surgiram em parte como tentativas de conciliar e controlar,
se não de compreender, o aspecto desordenado da Natureza.
Quão mais satisfatório haveria sido se nos houvessem colocado em um jardim feito sob medida para nós,
com seus outros ocupantes colocados lá para serem usados como nos conviesse?
Há uma celebrada estória na tradição ocidental como esta, exceto que não estava tudo a nossa disposição.
Havia uma árvore em particular na qual não deveriamos tocar. A árvore do conhecimento.
Conhecimento, compreensão e sabedoria nos eram proibidos nesta estória.
Deveriamos permanecer ignorantes. Mas não pudemos resistir.
Estávamos famintos pelo conhecimento. Criados com fome, por assim dizer.
Esta foi a origem de todos os nossos problemas. Em particular, é a razão por não vivermos mais em um jardim.
Descobrimos demais.
Enquanto nos mativéssemos indiferentes e obedientes, suponho,
poderíamos nos consolar com nossa importância e centralidade,
e dizer a nós mesmos que éramos a razão pela qual o Universo foi feito.
Como começamos a satisfazer a nossa curiosidade, entretanto,
para explorar, para aprender como o Universo realmente é, nós mesmos nos expulsamos do Edem.
Anjos com uma espada flamejante foram colocados como sentinelas nos portões do paraíso para barrar nosso retorno.
Os jardineiros se tornaram exilados e peregrinos.
Ocasionalmente, lamentamos aquele mundo perdido, mas isso, me parece, melodramático e sentimental.
Não poderíamos continuar felizes sendo ignorantes para sempre.
Muitas coisas no Universo parecem ter sido desenhadas,
mas ao invês disso, nós repetidamente descobrimos que são processos naturais
- a seleção colisional de mundos, digamos,
ou a seleção natural de reservatórios genéticos, ou mesmo o padrão de convecção em uma panela de água fervendo -
podem extrair ordem a partir do caos,
e nos enganamos ao deduzir que há um propósito,
onde não há nenhum.
O significado de nossas vidas e do nosso frágil planeta
é então determinado apenas por nossa própria sabedoria e coragem.
Nós somos os guardiões do sentido da vida.
Ansiamos por pais que cuidem de nós,
que perdoem nossos erros, que salvem de nossos erros infantis.
Mas o conhecimento é preferível à ignorância.
É muito melhor aceitar a dura verdade do que uma fábula tranquilizadora.
Se sonhamos com um propósito cósmico, então que encontremos sozinhos, um objetivo digno.