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A seguir, em "A Centelha Humana"...
Bem-vindo ao meu cérebro.
Certo. Alan. Você tem um cérebro.
Entre na minha cabeça enquanto procuramos
o que torna o homem singular.
Vamos explorar os papéis da linguagem e símbolos,
nossa habilidade com ferramentas...
de se identificar com outrem,
- Gostou de qual? - Até com um boneco.
Este?
E imaginar o amanhã.
Está nos observando planejar o futuro
quando sequer sabemos quem somos.
Agora, vou pegar o cérebro humano.
MUSKETEERS Albattroz | Otoni | Kakko
A CENTELHA HUMANA Episódio 3
Bem-vindo ao meu cérebro,
o produto de 3,5 bilhões de anos de evolução
e umas poucas décadas de vida.
Ele pesa apenas 1,4kg,
mas é sem dúvida a coisa mais complicada
no universo conhecido,
junto, é claro, com mais uns 7 bilhões de cérebros humanos,
incluindo o seu, habitando os crânios de pessoas no planeta.
Dentro dele estão meus pensamentos, minhas memórias,
todos os meus preconceitos, minhas ambições,
meu conhecimento, meus amores, as palavras que falo
apenas milissegundos antes de saírem da minha boca.
Mas embora os nossos cérebros sejam singulares,
todos têm algo em comum.
Todos possuem a centelha humana,
algo que os diferencia de todo o resto
que esses 3,5 bilhões de anos de evolução criaram.
E esta centelha é algo novo.
Nossos ancestrais viveram sem ela durante milhões de anos.
Andamos traçando a origem e a natureza da centelha humana,
e, na próxima hora, tentaremos achá-la aqui.
Ali.
Estaria ela na nossa facilidade singular com a linguagem,
em nossa habilidade com ferramentas,
nossa capacidade de decifrar
o que os outros estão pensando e tentar superá-los,
na capacidade de reviver o passado e prever nosso futuro?
Ou a centelha humana reside
nas profundezas dos nossos pensamentos pessoais?
O que a nossa mente faz
quando parece que não estamos fazendo nada?
Entre na minha cabeça. Vamos ver o que encontramos.
A IMPORTÂNCIA DO CÉREBRO
Eis um cérebro humano. Felizmente, não é o meu.
Enrugado, bege, denso e modesto
sendo posto numa bancada da Universidade Emory, Atlanta.
Eles têm muitos cérebros aqui, preservados para pesquisa.
Este é o de um chimpanzé. Um pouco menos enrugado
e com cerca de 1/3 do tamanho do cérebro humano,
mas fora isso, não parece muito diferente.
O próximo da fila é o cérebro de um macaco,
menor ainda, mas com uma forma familiar.
Por fim, o cérebro de um rato.
Até recentemente, a ciência sabia muito mais
sobre os cérebros do rato e do macaco
do que o do chimpanzé ou o nosso.
O quanto pode dizer acerca
da diferença entre nós, apenas observando o cérebro?
Não muito. Cada pedaço do córtex
é como um pedaço muito sofisticado de conexões
ou de um circuito de computador sofisticado.
O que gostaríamos de saber
é se tais circuitos são os mesmos ou são diferentes?
E se assim for, no que diferem?
E como isso se relaciona às diferenças
na forma como pensamos e agimos?
Não basta olhar as características superficiais.
Temos de entrar no cérebro.
E assim, passei muitas horas dos últimos meses
em aparelhos de ressonância magnética, como este no MIT.
Os aparelhos de RM empregam um poderoso campo magnético
para representar o cérebro, e também podem descobrir
quais partes do meu cérebro estão ativas
quando realizo tarefas distintas.
Está no meu cérebro, em algum lugar.
Mas antes, como sempre nessas sessões de ressonância,
eles vão começar pelo básico.
Certo. Alan. Você tem um cérebro.
Estamos prontos para o primeiro exame.
Para este, só precisa ficar deitado e relaxar.
- Está pronto? - Estou.
Certo. Lá vai. Vai durar uns 4 minutos.
A RM registra fatias do meu cérebro de um lado ao outro,
de cima até embaixo...
e da frente para trás.
Randy Buckner parece feliz com o que vê.
O que tem de bom no meu cérebro?
Há muitas mudanças que vemos enquanto envelhecemos,
e isso ocorre conosco. Até quando temos 30 anos,
nosso cérebro difere de quando tínhamos 18.
Ao olhar seu cérebro, devo dizer que é extraordinário.
E algumas das coisas que observamos...
Estes espaços cheios de líquido,
esta área escura aqui é líquido,
estes espaços existem em nós,
conforme envelhecemos, eles tendem a crescer.
O seu não cresceu muito.
Parece que o seu cérebro, eu diria, tem de 40 a 50 anos.
Até aqui, tudo bem.
As fatias tiradas na RM serão agora combinadas
para gerar uma completa imagem tridimensional
de toda a minha cabeça, incluindo o cérebro.
É neste meu cérebro virtual
que procuraremos sinais da minha centelha humana.
Mas vamos começar a procurar a centelha
em cérebros bem mais jovens.
Estou visitando um laboratório em Harvard
que realiza experiências inteligentes
para descobrir o que as crianças sabem e não sabem.
E logo de cara, sou surpreendido.
Estamos tentando entender a centelha humana,
o que nos torna humanos.
E nós com certeza parecemos ser
bem diferentes dos outros animais.
Para dizer o mínimo.
Nascemos com algo que, de pronto,
- nos torna diferentes? - Acho que não.
- Não? - Essa é uma questão
que venho tentando responder há cerca de 30 anos,
e na maior parte desse tempo,
meu palpite foi de que sim, que veríamos nos bebês
sistemas de conhecimento que só eles apresentariam.
Mas quando analisamos
o que um bebê de 4 meses ou de 6 meses pode fazer,
vemos semelhanças muito próximas
entre as capacidades dos bebês humanos
e as capacidades de bebês e adultos de outras espécies.
Não creio que essa centelha humana
surja no início do desenvolvimento.
O que a faria surgir?
Somos muito dependentes dessa cultura que temos?
Acho que essa é uma ótima pergunta
e que é bastante debatida no momento.
Minha opinião pessoal é que o principal,
na ativação da centelha das capacidades cognitivas
exclusivamente humanas, é a capacidade para a linguagem.
É quando as crianças de fato iniciam
na tarefa de aprender a linguagem,
aprender as primeiras palavras aos 9 ou 10 meses de idade,
a juntar palavras alguns meses depois,
é quando começamos a ver
as capacidades exclusivamente humanas surgindo.
Liz Spelke vê a linguagem como o princípio da centelha humana.
Ela está explorando essa ideia ao estudar como a linguagem
permite que crianças interpretem mapas
como representação do mundo real.
Pegamos uma criança de 2 anos e meio
e mostramos a ela um desenho bidimensional
que possui apenas uma simples figura geométrica,
um triângulo, e dizemos...
Nora, adivinha. Kermit.
Ele tem um balde favorito no qual gosta de sentar.
Tem um que ele gosta mais.
E hoje vamos colocá-lo no balde favorito dele, certo?
Eis nossa foto do quarto.
Eis um balde, o outro balde e mais outro.
Kermit, qual é o seu balde favorito?
"Meu favorito é este aqui".
Oh, Kermit disse que este é o favorito dele.
Nora, pode pôr Kermit no balde favorito dele?
É isso aí!
É uma habilidade incrível.
Mas se perguntar: "O que fizemos com essa criança
"para desenvolver tal habilidade,
"para desenvolver essa função simbólica?
Falamos com ela. Dissemos a ela.
Eis um balde, o outro balde e mais outro.
Isso suscitou a questão: E se não fizéssemos isso?
E se apenas mostrássemos o pedaço de papel, dizendo...
Eis um, outro e mais um.
Agora, Kermit, qual é o seu favorito?
"Meu favorito é este bem aqui."
Note que, diferente de Nora, Zander não é avisado
que a marca no mapa representa um balde.
Pode colocá-lo no balde favorito dele?
Isso aí! Bom trabalho. Você o pôs no desenho.
Queremos colocar Kermit no balde favorito dele na sala.
Qual é o balde favorito do Kermit?
Sem a dica da linguagem, Zander não pôde
relacionar o mapa ao mundo real,
mas quando ele é estimulado...
Vou dá-lo a você.
E elas têm essa habilidade, na sua opinião, pois
já estão manipulando símbolos na linguagem?
Exato.
E até onde posso ver, essa habilidade se desenvolve
espontaneamente em nós em virtude de sermos humanos.
Não se desenvolve no nascimento. Não a vemos...
até que as crianças tenham cerca de 9 a 10 meses de idade.
Mas até onde posso ver,
essa é uma capacidade inata, exclusivamente humana,
que surge nas crianças ao final do primeiro ano.
Para Liz Spelke, a chave para a linguagem e a centelha humanas
é a habilidade de manipular símbolos em nossas mentes,
uma habilidade inata, mas que não se manifesta
até que tenhamos quase um ano de idade.
Para descobrir como nossas habilidades linguísticas
desenvolvem-se na infância,
vim até a Universidade do Oregon.
Acha que podem descobrir o que há em nós
que nos capacita a conversar uns com os outros?
A primeira coisa que aprendemos quando criança são sons.
Murmúrios, balbucios, fazer sons.
Com cerca de um ano, começamos a aprender
que as palavras representam objetos do mundo.
Normalmente, começamos com os substantivos.
Dizemos: "bola", "gato".
Mais tarde, aprendemos alguns verbos: "comer".
Apenas com cerca de um ano e meio
começamos a formar pequenas frases,
a juntar 2 palavras, como: "mamãe colo".
Tenho um neto e a primeira frase dele
com duas palavras foi "coma tudo".
Helen está descobrindo como chegamos dos sons às frases
com a ajuda do que deve ser a touca mais atraente do mundo.
Uma bela touca. A cor combina com você.
Não entendo por que ela não entrou na moda.
Quero perguntar sobre a diferença
entre nós e os outros animais.
Se eu disser a um cão bem treinado:
"me traga o osso".
Provavelmente ele conseguirá fazer isso.
Mas se eu disser a ele:
"traga o osso que está atrás da porta".
Ele pode ter problemas, certo?
Porque há muitos detalhes nessa frase.
Essa é a grande diferença entre nós,
ou isso é extensível a outros animais?
Acho que quase todos concordam que a principal diferença
entre a comunicação humana ou a linguagem humana
e os sistemas de comunicação de outros animais,
é que eles podem...
ter símbolos visuais esquisitos, ou até símbolos sonoros
podem representar objetos particulares no mundo.
Como o meu cão conhece o significado de várias palavras.
"Carro. Nós vamos no carro."
Ou "osso". "Biscoito". "Você quer um biscoito?"
Também conheço todas elas.
Até agora, estou na mesma situação que seu cão.
Mas quando o cão enfrenta problema?
Se você dissesse:
"Quero que me traga o biscoito que está atrás do carro",
ao invés de...
"Biscoito que está no carro".
Ele pensaria que iríamos passear e onde estaria o biscoito.
Isso mesmo.
- Certo. - Isso mesmo.
A principal diferença entre a linguagem humana
e os sistemas de comunicação animal é a gramática.
Acho que todos concordam com isso.
Sente-se. Temos um travesseiro.
A gramática é o que torna a linguagem humana
crucial para ativar a centelha humana,
é aí onde entra minha nova touca.
Certo. Então, é uma cadeira elétrica.
Isso vai verificar minhas habilidades gramaticais
enquanto assisto a um vídeo.
Só tenho que assistir e estes eletrodos
irão captar o que estou pensando?
Sim, vemos uma reação cerebral em cem milissegundos,
quer esteja fazendo algo ou não.
A narração do vídeo às vezes faz sentido.
O bebê pinguim se balança na porta.
E às vezes, não.
O caminhão sobe e desce e os "papéis" sobre as colinas.
Os eletrodos estão registrando onde e quando
meu cérebro reage a esses erros.
Quando o erro é só uma palavra que não faz sentido...
Pinga aumentou bastante o pinguim.
Uma área na parte traseira do cérebro,
sobretudo à esquerda, reage em 2 décimos de segundo.
Mas quando o erro é gramatical...
O concerto "estão" começando.
Meu cérebro reage ao erro em 1 décimo de segundo,
desta vez numa região frontal e somente à esquerda.
Acompanhando-me na cabine de vídeo
e equipada com uma touca mais elegante,
está Danika, de 6 anos.
Quando ocorre um erro de significado...
Pinga bate "bola" alegremente.
O cérebro dela, como o meu, reage em 2 décimos de segundo.
Mas quando no vídeo tem algo gramaticalmente incorreto...
A panqueca cai para "cima" de sua cabeça.
O cérebro dela é mais lento em reagir que o meu,
e a reação não é tão concentrada na área frontal esquerda.
De fato, defende Helen Neville,
leva talvez de 10 ou 15 anos para o cérebro se organizar
para analisar a gramática rápida e eficientemente
em apenas uma região concentrada especializada.
Parece, por exemplo, que essa é uma área importante
para sequenciar diferentes tipos de informação,
e o sequenciamento é parte importante da linguagem.
Parece que as áreas situadas atrás são muito importantes
para o uso de ferramenta no lado esquerdo, também.
- Uso de ferramenta? - Isso mesmo.
O uso de ferramenta onde a linguagem ocorre?
É possível que um aspecto da linguagem
esteja intimamente ligado ao uso de ferramenta,
sobretudo esse...
plano de ação e sequenciamento,
que temos de fazer para conseguirmos falar.
Mas esta é a uma visão fascinante da centelha humana,
que duas das características mais marcantes
do que nos torna humanos:
a linguagem e fabricação e uso de ferramentas,
poderiam estar ligadas de algum meio em nosso cérebro.
O que torna isso ainda mais fascinante
é que já ouvi essa ideia antes,
num contexto bem diferente.
Ótimo. Está pegando o jeito.
Em busca das primeiras fagulhas da centelha em nossos ancestrais
participei de uma aula de tecnologia da idade da pedra
ministrada por John Shea da Universidade de Stony Brook.
Consegui fazer uma borda cortante num pedaço de pedra.
- Está bem afiada. - Isso mesmo.
Mas um momento importante na evolução humana,
instante em que muitos antropólogos creem
que a centelha humana surgiu,
foi quando o homem deixou de fazer
ferramentas simples de pedra
para combinar setas mais finas e menores de pedra
com outros materiais para criar lanças e flechas.
É possível que a combinação de diferentes elementos
seja paralela à estrutura linguística,
onde o significado vem da recombinação
de diferentes elementos em diferentes ordens.
E como há apenas uma forma adequada,
um número limitado de formas
para eu falar a frase que digo neste momento,
há apenas alguns meios adequados e efetivos
de combinar estes elementos, pedra, corda e madeira.
E se fizer isto do jeito errado, vai morrer.
É a seleção natural.
Para descobrir o quão próximos
a linguagem e o uso de ferramentas
estão ligados em meu cérebro,
é hora de voltar ao aparelho de RM.
Estou, de novo, na Universidade do Oregon,
onde uma equipe de pesquisa tenta descobrir
por que o homem é tão naturalmente adepto
ao uso de ferramentas.
Está indo tudo bem até agora? Muito bom.
Vou pôr a pinça na sua mão direita.
O plano é que eu use uma ferramenta
ou imagine estar usando uma ferramenta
para realizar uma tarefa que aprendi há algumas horas.
Vamos fazer vários *** com sua mão. Pode começar.
Primeiro, tenho que pegar este puxador
com o polegar e o indicador.
A ideia era ver se o meu polegar ia para o lado branco ou rosa.
Agora faça o mesmo com esta ferramenta.
A princípio, vai parecer meio esquisito.
Vamos chamar a ponta da ferramenta marcada de azul
de "o polegar" da ferramenta.
- Isto? Isto é o polegar. - Isso mesmo.
Não vou tentar imitar o que fiz antes.
- Tentar tornar mais fácil... - O que for mais confortável.
Escolha o que for mais confortável.
Scott Frey acredita que, quando usamos uma ferramenta,
nosso cérebro rapidamente começa a tratá-la
como uma extensão do nosso próprio corpo.
Porque isto está modificando a mecânica do seu braço.
Pode ser que fique mais estranho do que antes.
Sinto-me mais à vontade agora, fazendo algumas vezes.
Não tenho que decidir o que fazer.
Meio que faço isso mais intuitivamente.
Quando me habituei a tarefa, é hora de voltar à RM.
Certo, Alan, agora começa a diversão.
Vamos examinar seu cérebro enquanto você decide
como pegar esses objetos. Com sua mão...
ou com essa nova ferramenta que aprendeu a usar anteriormente.
Vamos tentar ver onde estão os padrões de atividade.
Em razão do meu tronco não poder se mover no aparelho,
estou pressionando um pedal para sinalizar qual lado do puxador
eu agarraria com meu polegar ou com o polegar da pinça.
E mesmo que em cada caso, meu braço e mão
se movessem de forma bem diferente,
as áreas do meu cérebro que são ativadas, são as mesmas.
Ao usar a ferramenta,
meu cérebro a trata como uma extensão do meu corpo,
planeja ativamente os movimentos musculares
necessários para manipulá-la.
Todo esse planejamento de uso da ferramenta
ocorre no lado esquerdo do meu cérebro,
bem perto das áreas que usamos para a linguagem.
O fato de estarem tão próximos, a produção da fala e...
do planejamento, bem aqui...
acha isso significativo?
Pode refletir o fato...
de que há alguns processos subjacentes em comum.
Por exemplo, uma candidata que eu diria que merece,
ao menos, ser considerada
é a habilidade de ajustar um comportamento
que está ocorrendo neste momento
em antecipação a um objetivo que queremos alcançar no futuro.
Por exemplo, se você fosse dizer a palavra "tulipa"
em relação a "tíquete",
observe o que os lábios fazem quando dizemos "tulipa".
Começamos, por antecipação, a fazer biquinho, durante o "t",
antecipando-se à vogal que vem logo a seguir.
Observe o que fazemos quando dizemos a mesma consoante,
"t", na palavra "tíquete".
Tulipa. Tíquete.
Começo a preparar caminho para o "u" em "tulipa".
Mesmo quando ainda estou pronunciando o "t".
Mas em "tíquete", não faço isso. Pronuncio direto.
- Em "tulipa", eu estou... - É algo um pouco diferente.
É um indício de que há um planejamento ocorrendo?
Está planejando adiante, e na linguagem...
E quando os chimpanzés dizem "tulipa",
- eles não fazem isso? - Até onde sabemos.
Chimpanzés e outros animais usam ferramentas, claro,
mas a gramática e a complexidade de significado
fazem com que a fala humana difira da comunicação animal.
Da mesma forma, é a complexidade de nossas ferramentas
que diferencia o uso pelo homem.
Meu palpite é que podemos estar muito próximos
de um elemento chave da centelha humana.
Por isso, vim a Londres encontrar um pesquisador
que trabalha com uma família com uma rara mutação genética,
uma mutação que parece inibir a habilidade de fazer
o sequenciamento preciso dos movimentos musculares
necessários ao uso da ferramenta e da fala.
- Ficou. - Ficou.
- Cresceu. - Cresceu.
Como descreveria o problema que ele tem?
Ele tem dificuldade em enunciar as palavras.
É bem difícil para alguém que não está presente
e ouve o que ele diz,
compreender as palavras que ele repete.
- Suco. - Suco.
O problema torna-se mais evidente
quando ele cria frases espontaneamente.
É uma questão de sequenciamento. O cérebro também
- não consegue sequenciar? - Praticamente isso, pois...
o circuito que parece ser afetado
por essa mutação genética
é o especializado no sequenciamento,
na noção de tempo, na geração.
Todas essas habilidades são incorporadas
na produção da fala articulada e fluente.
Quando falamos, não se planeja o que vai dizer.
Se fôssemos planejar tudo o que fôssemos dizer,
ficaríamos um bom tempo sentados aqui tentando dialogar.
Quando temos uma ideia em mente,
de alguma forma ela é...
Odeio usar a palavra "mágica",
mas de fato é como mágica, pois o pensamento
organiza-se num fluxo de expressão
que acaba saindo perfeitamente coerente
na ordem correta,
e perfeitamente cronometrado em milissegundos.
Às vezes há uma sensação de um impulso geral,
um impulso muito incoerente
em expressar um tipo de pensamento,
e, de repente, as palavras saem.
Às vezes as dizemos em frases inteiras e parágrafos.
- Isso mesmo! - E é incrível...
como o processo de pensar ocorre
- durante a fala. - Exato.
Mas essas pessoas, essa família,
- têm dificuldade no processo. - Isso mesmo!
Aceite.
Localizar a fonte do óbice
significava investigar o gene defeituoso na família.
A grande esperança era que aqui pudesse haver
um gene da linguagem ou mesmo "o" gene da linguagem,
certamente fornecendo uma compreensão da centelha humana.
O gene foi identificado
no laboratório de Simon Fisher, na Universidade de Oxford.
...pois esta ligação é muito forte.
E se olhar para o consenso aqui...
Ele é chamado de Fox-P2,
mas o gene nada tem a ver com raposas.
Apesar que ele se mostrou presente em várias criaturas,
de camundongos a peixes.
Era de se achar que o gene envolvido na fala e na linguagem
fosse exclusivo do homem, mas, em verdade,
tal gene é muito similar em muitas espécies diferentes.
Similar, mas não idêntico.
A forma humana do gene é um pouco diferente
do gene Fox-P2 em chimpanzés, por exemplo.
E ainda mais diferente do gene Fox-P2 em camundongos.
Ao menos, na maioria dos camundongos.
Estes camundongos em especial receberam o gene Fox-P2 humano
numa experiência ambiciosa com o objetivo de descobrir
do que exatamente a forma humana do gene é capaz.
Vim ao Instituto Max Planck, em Leipzig, Alemanha,
para conhecer o homem por trás dos camundongos,
Svante Paabo.
A primeira pergunta é: "Como se analisa
a fala de um camundongo?" Tentamos muito falar com ele.
Mas ele nunca respondia.
Tínhamos um grande problema.
Talvez não estivessem dizendo a coisa certa.
- Pode ser. - Qual a segunda diferença?
A segunda nos pegou de surpresa. Eles vocalizam diferente.
- É mesmo? - É.
Não há, é claro, uma forma de dizer se eles vocalizam
numa forma similar à humana, mas é diferente.
Camundongos machos emitem guinchos agudos
quando estão com fêmeas,
altos demais para o ouvido humano.
Mas os guinchos podem ser alterados no computador
para que um ouvido treinado possa ouvi-los.
Comparado a um camundongo normal
o camundongo com o gene humano
guincha de forma levemente menos aguda.
Isso não significa é claro que tais camundongos possam falar,
mas que talvez a forma humana de algum meio
impactou os circuitos neurais envolvidos na produção da fala.
A minha opinião acerca da história do Fox-P2,
é de que ele já existia há muito tempo
fazendo coisas interessantes nos cérebros de nossos ancestrais,
e ele estava no lugar certo, por assim dizer,
para ser recrutado pela linguagem da fala.
Isso faz sentido evolutivo, considerando que nosso Fox-P2
não é o mesmo que a versão do gene nos chimpanzés e ratos.
O Fox-P2 do chimpanzé é na verdade mais similar
à versão encontrada no camundongo
do que a que nós temos.
Isso indica que embora o Fox-P2 possa não ser
"o" gene da linguagem,
ele é um dos poucos genes que os cientistas identificaram
que contribuem para as habilidades que temos
e que os chimpanzés carecem.
Com certeza, os cientistas encontrarão outros,
mas, por ora, há outra diferença bem mais óbvia
entre os chimpanzés e nós.
Agora, vou pegar o cérebro humano.
A coisa mais notável sobre o cérebro humano é o tamanho,
bem maior em proporção ao nosso corpo do que o dos demais seres.
3 ou 4 vezes maior que o cérebro do chimpanzé, por exemplo,
que por si só é muito grande.
A questão de o porquê nossos cérebro tornaram-se tão grandes
é uma das que irão pautar boa parte
do resto de nossa pesquisa pela centelha humana.
É uma questão que há muito tem fascinado
Robin Dunbar, da Universidade de Oxford.
A história tradicional sempre foi...
da criação de ferramentas e caça,
esse tipo de especialização tecnológica.
Não acho que isso esteja certo.
Acho que são as habilidades sociais.
E isso remonta à visão geral
de o porquê os primatas têm cérebros maiores
do que as demais espécies de animais.
Tem a ver com a complexidade da sociedade na qual eles vivem.
Eles são apenas socialmente mais inteligentes, por assim dizer.
Toda a estratégia evolutiva deles foi dedicada
à resolução de problemas sociais, comunitários.
Na verdade, eles vivem num tipo de...
contrato social implícito, por assim dizer.
Eles ajudam uns aos outros para conseguir resolver
os problemas da vida e morte cotidianas.
A lógica da tese é que existe um problema ecológico
que precisa ser resolvido.
Isso é resolvido com um grupo.
Para viver num grande grupo, é preciso ter um cérebro
com poder de processamento suficiente
para lidar com as relações.
Um chimpanzé tem que acompanhar cerca de 50 indivíduos,
o tamanho típico de um bando na natureza.
Robin Dunbar sustenta que o homem, ao contrário,
pode lidar confortavelmente com cerca de 150 relações.
É aproximadamente o número de pessoas
que você conhece como indivíduos.
Você as conhece bem,
sabe onde elas se encaixam no seu mundo social,
sabe onde você se encaixa no mundo social delas.
Sabe que se pedir-lhes um favor,
elas iriam resmungar, mas iriam provavelmente concordar.
Robin registra que o aumento em três vezes no tamanho do grupo,
de 50 no chimpanzé para 150 no homem
coaduna-se com o cérebro 3 vezes maior do homem.
Para descobrir o quão hábil o grande cérebro humano
é em classificar nossas relações sociais,
vim à Universidade de Yale, onde os cérebros que conheceremos
têm apenas alguns meses de idade.
Olá, Jessica. Belo vestido.
- Muito bonito. - Diga oi.
E o laço no seu cabelo é muito bonito.
Jessica, de 9 meses, assiste a um show de marionetes.
Certo. Lá vamos nós.
Enquanto o boneco listrado parece querer jogar bola,
o de casaco verde não quer saber de nada.
Lá vamos nós.
O de casaco laranja, pelo contrário,
está feliz em participar.
Oi. Está vendo?
Oi. Oi.
De quem você gosta?
Deste? Bom trabalho.
Foi o coelhinho simpático.
- Foi obra do destino. - Bom trabalho.
Em muitas experiências similares com bebês de poucos meses,
as crianças quase sempre escolhem o boneco participativo.
Algo que é verdadeiro sobre a espécie humana
é que somos uma espécie social profundamente colaborativa,
onde a colaboração é necessária para sobreviver,
onde a cooperação mútua é necessária,
e a habilidade de identificar colaboradores mútuos
e também identificar quem não colabora é essencial.
E aqui vemos isso acontecendo em idade tão tenra.
Isso mesmo! Ela não teve dificuldade.
Está tentando descobrir se sou um rato ou um coelho.
Curiosamente, a habilidade de distinguir o bom e o ruim
estende-se até aos objetos que têm somente dois olhos
para sugerir que são seres com mente e intenções.
O triângulo amarelo empurra o círculo vermelho morro abaixo,
observado por Nora, de 6 meses.
O quadrado azul, por outro lado, dá uma ajudazinha.
Ei, garotinha.
De qual você gosta?
Deste aqui. Bom trabalho. Esse aí foi o bom.
Para Nora, detentora da centelha humana,
é perfeitamente natural ver a intenção, tanto boa como má,
- em objetos de madeira. - Esse aí é o bom.
Com que frequência o bebê escolhe o "ajudante"?
- Quase 100% das vezes. - Sério?
Oh, este aqui.
Seu trabalho é similar. Ele se confunde com o de Karen, certo?
Trabalhamos juntos em projetos diferentes.
Estou muito interessado no papel da compreensão social...
Essa percepção de intenção, mesmo em objetos inanimados,
fascina o marido de Karen Wynn
e seu colega professor de Yale, Paul Bloom.
Colaboramos em boa parte dos nossos projetos.
Ele defende que isso explica
outra característica da centelha humana,
uma compartilhada por todas as sociedades humanas.
Acho que somos teóricos naturais da conspiração.
A forma como agimos é.
Sempre que vemos coisas no mundo físico,
tentamos atribuir a elas um tipo de
causa intencional psicológica.
Um exemplo disso é o animismo. Quando as pessoas veem
o movimento das nuvens ou o farfalhar das árvores,
acreditam em um ser pensante intencional por trás deles.
Disso surgiram os deuses, fantasmas e espíritos.
Outra manifestação disso é quando vemos coisas no mundo,
como coisas biológicas, como árvores ou animais,
tendemos a crer que "alguém" os criou.
Não podemos evitar de olhar o resto da natureza dessa forma.
É isso? Atribuímos à natureza o que vemos um no outro?
Exato. Reagimos sem pensar. Somos hipersensitivos.
E isso faz sentido do ponto de vista evolutivo.
Se você me ameaçar, se tiver uma intenção ruim ou mesmo boa,
eu, com certeza, ficarei atento a isso.
Mas, se o custo para eu sempre ficar atento
é, às vezes, me equivocar, exagerar, ou dizer:
"O que houve com as árvores? "O que houve com o vento?"
Certo. É um custo.
Mas o benefício de notar quando isso ocorre é muito poderoso.
Aqui vamos nós.
Assim, no instinto já afiado de Nora
em ver as boas e más intenções,
mesmo em pedaços de madeira, pode estar a origem biológica
da crença em quase toda cultura humana
em um deus ou em deuses.
Evoluímos para ver a intenção em toda parte.
Tem um bom aperto de mão.
Gostaria de ter meu dedo de volta.
Mas os bebês que visitam o laboratório de Karen em Yale
não só veem intenção nos bonecos.
Eles também preferem bonecos
que têm gostos similares... literalmente.
Eric pode escolher entre duas comidas.
Um prato contém vagens viscosas e pouco apetitosas,
talvez não a melhor forma de fazê-lo comer vegetais.
Como a maioria das crianças que tiveram de escolher,
Eric opta pelos biscoitos.
Escolha inteligente.
Gosto dos biscoitos.
Dois bonecos então provam os pratos.
Eca! Não gosto de vagem.
Oi.
Gosto de vagem.
Oi.
Eca! Eu não gosto dos biscoitos.
Quando pode escolher com qual boneco brincar,
Eric, como quase todos os bebês testados,
escolhe o que gosta da mesma comida que ele.
Esse é o que gosta dos biscoitos?
Acha que essa habilidade de identificar
quem é igual a nós e preferi-los...
teve algo a ver com o que hoje somos?
Acho que, de todas as coisas
que estudamos em nosso laboratório infantil,
essa pode ser uma das mais exclusivamente humanas.
Com certeza a habilidade de identificar,
dessa forma abstrata, quem tem preferência similar,
não apenas quem se parece conosco.
Acho que isso é uma indicação
do quão forte e profundo
esse instinto, por assim dizer,
de nos associarmos a outros similares a nós.
A todo momento do desenvolvimento,
estamos dividindo o mundo
em pessoas que são aliadas e pessoas que são inimigas.
E isso, mais tarde, pode se basear na raça,
no sexo, nas preferências alimentares
e no que alguém fez no passado,
mas sempre estamos escolhendo
com quem devemos ou não interagir.
E isso também está ligado à religião.
Uma das características das religiões
é ser um grupo de pessoas que têm estes laços.
Trabalham em conjunto. Cultuam um deus em comum.
Podem comer a mesma comida. Podem usar as mesmas roupas.
E estão unidas de uma forma muito forte e poderosa.
Mas, não se consegue essa unidade sem um custo.
O custo é que elas se unem contra
as pessoas que vivem logo ali
ou que praticam outras crenças.
Os bebês no laboratório de Karen Wynn
exibem duas das mais potentes características
da centelha humana.
A determinação de ver significado e intenção
em tudo ao nosso redor,
e uma tendência de se relacionar com outros que são como nós.
Retomando o exemplo de Paul, esses dois ímpetos humanos
são mais vividamente mostrados no poder da religião.
Mesmo muito diferentes na forma,
todas as religiões têm em seu núcleo
a crença num poder maior,
um deus ou deuses que nos criaram,
onde tudo existe por um motivo.
Todas as religiões também têm
os próprios rituais e regras elaborados,
e em muitos casos, símbolos e trajes
que dão à sua fidelidade uma sensação de identidade.
Com frequência, tais rituais envolvem cantar e dançar,
atividades com poder próprio.
A sensação extraordinária de elevação
que obtemos dessa experiência,
quando a realizamos em grupo,
cria um tipo de senso de comunidade.
Tudo faz parte de criar essa sensação de identificação.
O grande problema para a religião, por assim dizer,
é que quando temos uma religião em grande escala,
o casamento da Igreja e Estado,
os mecanismos da religião são tão poderosos,
criando tal senso de comunidade,
que pode ser explorado para fornecer
um certo tipo de grande coerência militarista.
Parte-se em cruzadas,
parte para consertar o mundo, por assim dizer.
Embora a religião possa levar a guerras santas,
ela também foi responsável por grande parte
das artes, música e arquitetura que o homem criou,
assim como a Universidade de Oxford
e vários grandes centros de ensino do mundo.
Robin Dunbar crê que no fulgor central da centelha humana
está um poderoso senso de comunidade
que vem da nossa habilidade
de nos relacionar e criar empatia com outros.
Essa habilidade gira em torno de um significado especial
da palavra "intencionalidade".
A palavra "intencionalidade" é muito usada,
e parece que de uma forma muito especial.
O que quer dizer com "intencionalidade"?
O termo vem da filosofia da mente.
É a habilidade de...
compreender ou acreditar em coisas sobre o mundo.
Alguns estados de espírito sobre os quais podemos refletir.
"Eu acredito, eu acho, eu me preocupo com o tempo",
esse tipo de coisa. A questão é:
Você pode imaginar o que os outros
também estão pensando dessa forma?
Eu imagino sobre o que você está pensando agora.
É um tipo de dupla intencionalidade,
porque estou num estado intencional,
e também imagino seu estado intencional.
E se eu estiver pensando sobre aquela moça ali,
sobre o que ela está pensando...
Você pode estar pensando o que estou pensando
que ela está pensando.
Você está na terceira ordem de intencionalidade.
Em tese, essa é uma sequência infinita.
E o que incomoda é que, até onde sabemos,
com possivelmente poucas exceções,
quase todas as espécies de aves e mamíferos
atuam no que chamamos de intenção de 1ª ordem.
Eles conhecem o teor de suas próprias mentes.
Acham que as coisas são a circunstância.
"Acho que vou comer uma minhoca".
"Acho que tem uma minhoca ali.
"Eu vou pegá-la." Certo?
Os casos duvidosos são os grandes símios.
Há evidência razoável, eu acho,
que sabem lidar com intencionalidade de 2ª ordem.
Eles podem entender seus estados de espírito,
não muito bem, mas fazem isso.
A questão é que esse é um grande divisor para crianças
com cerca de 5 anos de idade.
As crianças passam por esse estágio.
Os psicólogos desenvolvimentistas
chamam isso de teoria da mente, aquisição da teoria da mente.
Eles têm uma teoria sobre a mente, por assim dizer.
Mas o homem adulto pode chegar à 5ª ordem.
Começa a ficar bem complicado.
"Acho que você supõe...
"que Jim quer...
"que Ella imagine...
"se Peter não presta."
Isso é análise muito complicada.
Por que isso não é infinito em nós?
Simplesmente porque exige muito processamento.
Hoje podemos mostrar isso,
que conforme você avança por tais ordens,
o cérebro tem que trabalhar muito mais,
isso foi constatado em experiências de neuroimagem,
para lidar com esses níveis mais mais altos.
É simplesmente uma "limitação da máquina".
Certo. Isso vai durar cerca de 4 minutos.
Estou no aparelho de RM cerebral do MIT,
para ver o quão duro o maquinário do meu cérebro
tem que trabalhar para decifrar os pensamentos dos outros.
Não o quanto meu cérebro está trabalhando,
mas qual parte dele estou usando.
Conduzindo a experiência estão Rebecca Saxe, do MIT,
e um colega de Harvard, Randy Buckner.
Minha tarefa é ver um vídeo de um cão se escondendo
enquanto uma menina sai da sala.
E descobrir onde ela procurará pelo cão quando ela voltar.
Quando penso onde o cão está,
uma parte do meu cérebro é ativada.
Mas para prever onde ela procurará,
tenho que pensar não onde o cão realmente está,
mas onde ela acha que ele está.
Mais uma vez. Certo.
Outra parte do meu cérebro foi acionada quando pensei em...
"Oh, espere. Ela não o viu, ela não sabe?"
Quando você presta atenção, não apenas à realidade,
não apenas onde o cão está,
mas aos pensamentos dela, onde ela pensa que o cão está,
uma parte diferente do seu cérebro está sendo usada.
É o que mostra esta foto. Esta parte do cérebro é chamada
junção temporoparietal direita ou RTPJ.
Esta é a parte do cérebro que normalmente vemos
quando as pessoas pensam sobre o pensamento das outras.
- Espere. Ela fica por aqui? - Exato. É.
Logo acima da minha orelha direita
fica uma parte da superfície do meu cérebro
que me permite ver a mente dos outros.
Ou ao menos imaginar o que estão pensando.
Isso é algum tipo de pensamento,
ou eu tentando pensar sobre os pensamentos de outrem?
É apenas você pensando nos pensamentos dos outros.
- Incrível, não? - É realmente incrível.
Você tem alguma opinião? Como isso se encaixa
na questão que sempre fazemos sobre o que nos torna humanos?
Há algo exclusivamente humano nisto?
Deve ter, certo? Achamos que outros animais não fazem isso.
Há alguns indícios de que isso pode ser verdade.
Esta é uma das poucas regiões corticais
mais diferentes no cérebro humano
comparada a outros cérebros.
Também deve-se indagar como isso se desenvolve
ao longo da vida de uma criança.
Pois algo que geralmente descobrimos
é que coisas que se desenvolvem mais tarde na vida da criança
também surgiram mais recentemente em tempo evolutivo.
E, de novo, descobrimos
que esta é uma de poucas regiões corticais
que levam muito tempo para atingir a maturidade
na vida de uma criança humana.
Mas esse trecho na parte externa do nosso cérebro
não é a única região que é ativada
quando pensamos nas outras pessoas.
Há também regiões bem lá no meio do nosso cérebro.
Se está pensando sobre como são outras pessoas
ou como elas se sentem hoje ou de onde elas vieram,
qual a religião delas, como elas cresceram,
qualquer coisa sobre outra pessoa,
você utilizará estas regiões cerebrais.
Embora eu não soubesse disso à época,
estas regiões interiores profundas do meu cérebro
abrigam outras habilidades únicas e inesperadas,
como eu iria descobrir com Randy Buckner.
Você verá palavras, só quero que as classifique.
No meio dessa atividade,
vai surgir uma pequena mira na tela.
Quero que olhe para ela. Você não precisa fazer nada.
Só quero que olhe para esta pequena mira.
Certo. Vamos começar.
Como sempre ocorre nas experiências
de ressonância cerebral,
o que me disseram ser a tarefa, na verdade não era.
Randy estava, na verdade, estudando meu cérebro
enquanto eu fitava a pequena mira,
com meus pensamentos alternando para reflexões aleatórias.
Na talvez mais surpreendente descoberta
que já fizemos sobre o meu cérebro,
durante estes momentos de ócio aparente,
ele está tudo, menos inativo.
Achamos que o homem adaptou
a habilidade de usar os momentos inativos,
quando ficamos a pensar sozinhos e refletir,
em usá-los para nos prepararmos para o futuro.
Uma diferença entre o homem e os outros animais
é que eles, como nós, são muito bons em sobreviver ao instante,
assimilando informações e pensando no que fazer.
O homem é extraordinário em pensar no instante a seguir,
o que pode acontecer no futuro,
para preparar-se para o que está por vir.
Isso está ligado ao porquê...
tenho ideias interessantes sobre algo no qual trabalho
quando estou dirigindo ou no chuveiro
ou pensando que estou realizando outra atividade,
e, de repente, isso surge na minha mente?
Tem a ver com o que está dizendo?
É o que estou dizendo. Está usando os momentos de ócio,
quando não tem que usar tanto poder cerebral
para pensar na estrada. Você devaneia.
Pensa em mundos distantes do que está vivenciando.
Pensa no que pode ser.
Uma das razões pelas quais o homem é tão criativo e flexível,
é que pode usar esse este tempo ocioso
para pensar em algo que não pensou antes.
E eis a maior surpresa...
As regiões ativadas nesse tempo ocioso,
quando meus pensamentos divagam,
parecem ser similares às regiões mostradas
pela pesquisa de Rebecca, que eu uso quando penso em outrem.
Parece-me uma área similar do cérebro. É isso?
Muitas das regiões se sobrepõem.
Isso é algo curioso como cientista.
Estávamos estudando as áreas que estão envolvidas
quando pensamos com nós mesmos,
e Rebecca me procurou e falou sobre o trabalho dela,
e convergimos totalmente
em áreas comuns do cérebro que eram usadas
quando pensamos em nós mesmos, no futuro,
mas também quando as adaptamos para cenários sociais,
quando pensamos nos pensamentos de outrem,
e achamos isso extraordinário.
Está nos observando planejar o futuro
quando sequer sabemos quem somos.
É realmente interessante.
Achamos que estamos vendo o cérebro ocioso
- não ser tão ocioso. - Exato.
Isso é importante em o que nos torna humanos?
Com certeza, sim.
Até a habilidade de pensar no futuro nos faz querer planejá-lo
querer construir sociedades para ensinar nossos filhos,
porque prevemos e esperamos que eles continuem.
E essa habilidade, chamada "viagem mental no tempo",
de pensar nas diferentes possibilidades,
é o que nos compele como sociedade.
Aqui, parece que chegamos muito próximos
à centelha humana basilar.
Curiosamente, ela está centrada em regiões cerebrais
que são mais ativas quando parece que estamos ociosos,
mas, na verdade, estamos vivendo intensamente
em nossa imaginação.
Todo instante em que não estamos ocupados
fazendo algo no presente,
estamos em outro lugar no tempo, é o passado ou o futuro.
Quando o presente se torna difícil,
exigente, interessante, inesperado,
nossa mente se concentra imediatamente nele.
Mas, na maior parte do tempo, a maioria de nós
faz coisas bem rotineiras que não requerem tanto
de nossa atenção consciente quanto esperado.
E nesses momentos, a mente vai para "outro tempo".
"Outro tempo" não foi o único termo que
Dan Gilbert, da Universidade de Harvard,
criou para descrever como divagamos em nossa mente
rumo a outras épocas.
Ele também usa o termo "prospecto"
como antônimo de "retrospecto".
Você pode fechar seus olhos e simular qualquer ponto no tempo.
Pode pensar sobre aposentadoria. Pode lembrar-se da infância.
Parece ser o truque que outro animal não consegue fazer.
Somos o animal que pode aprender com os erros sem cometê-los.
Não precisamos mastigar um monte de tachinhas
para saber que é uma péssima ideia.
Ninguém fica ansioso por saber
qual o sabor de um sorvete de fígado,
pois podemos simular tais tipos de experiências.
Isso nos impede de cometer erros drásticos
que seriam péssimos para o nosso bem-estar.
Essa habilidade de "analisar", de pensar no que vai acontecer
nos permite escolher entre os futuros
que são melhores e os que são piores.
Ainda estou fascinado com o fato de que, no fundo do meu cérebro,
há regiões aparentemente sobrepostas,
me permitindo, por um lado, ler as mentes dos outros
e por outro, viajar no tempo.
A questão é:
Para que uma delas, ou ambas, foi selecionada,
em termos evolutivos?
Era importante que conseguíssemos
ler as mentes dos outros,
e a viagem no tempo seja um bônus por ter esse sistema,
- ou é o contrário? - Por quê?
Por que seriam necessariamente idênticas.
Sim. Qual é a ligação?
A ligação é que ambas requerem que você fuja
de seu ponto de vista atual.
Num caso, saio do meu ponto de vista,
e tento descobrir qual o seu ponto de vista.
E no outro, saio do meu tempo presente,
- e vou explorar o futuro. - Exato.
De certo modo, seu "eu" futuro é outra pessoa cuja mente
- você quer compreender. - É interessante.
Você pode se mover na dimensão do tempo,
ou pode se mover pela dimensão interpessoal,
mas o movimento entre essas duas dimensões
é realizado pelas mesmas partes do cérebro.
Olhar dentro da minha cabeça
revelou vislumbres intrigantes da centelha humana.
Entre a habilidade de usar ferramentas e linguagem
e a habilidade de colaborar com outros,
nosso cérebro evoluiu para algo
realmente singular no mundo animal.
E, literalmente, no centro do nosso cérebro
e no centro de nossa humanidade,
está a percepção especial que temos
das mentes de nossos companheiros humanos,
até mesmo de nossos "eus" futuros.
E com isso, está a imaginação
de ver como as coisas podem ser diferentes do que são.
Percepção e imaginação.
Ambas parecem estar no centro da centelha humana.
Percepção, não apenas da mente dos outros,
mas também das forças invisíveis
que fazem nosso mundo funcionar.
E imaginação para criar a partir do que a natureza nos dá
um lugar como este,
e não só para nós, mas para as gerações futuras.
E são a percepção e a imaginação
que nos distinguem de nossos parentes,
tanto vivos quanto extintos.
Enquanto nossos primos extintos, os neandertais,
ainda fabricavam machados igual aos seus antecessores
por mais de um milhão de anos,
nossos ancestrais tiveram a percepção de ver
num galho, numa pedra e numa corda
uma poderosa arma,
e a imaginação para criar novas formas de caçar.
Diferente dos neandertais,
as pessoas que se tornariam nós tiveram a percepção de ver
como uma pedra furada podia se tornar uma conta
e a imaginação para ver tal conta
como símbolo para transmitir status
e forjar senso de comunidade.
Apesar de termos tanto em comum
com nossos primos vivos, os chimpanzés,
nossa maior percepção das forças invisíveis, como a gravidade,
nos dá poderes além do alcance dos símios,
enquanto nossa maior percepção da mente de cada um
nos leva além da mera competição
e para a aventura participativa, que é ensinar.
Essa percepção também nos dá a habilidade de colaborar
em atividades grandes e pequenas,
que chamamos de civilização.
Finalmente, claro, há o precioso elo da linguagem,
a habilidade exclusivamente humana
de criar de uns poucos sons
uma gama infinita de significados,
para que a percepção e a imaginação de cada um de nós
possam ser compartilhadas com todos nós.
Percepção e imaginação.
Duas características que,
ironicamente, são talvez melhor expressadas
quando aparentemente não estamos fazendo nada,
quando nossa mente está cheia de ontens e amanhãs,
devaneios e divagações,
arrependimentos e esperanças.
Essa é a centelha humana!
Pense nisso.
MUSKETEERS Legendas Para a Vida Toda!