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A minha infância, eu era criança e até mesmo um pouco jovem
antes da guerra começar em 1939
E é importante falar como era a minha vida normal antes da guerra.
Tinha família em Varsóvia, nasci em Kielce,
mas cresci desde quando era bebê em Varsóvia.
Minha família era meus país e
meus dois irmãos maiores.
Um já era um arquiteto jovem e o outro estudava em Technion.
Eu era a menor da casa, vocês sabem como é,
tem alguém aqui que é o caçula? É confortável, é bom.
E dia 1 de setembro de 1939, o que houve?
Vocês sabem? Começou a guerra.
No mesmo dia voltei de uma kaitaná (acampamento de verão) da escola,
que foi em um lugar muito bonito, e de repente vieram muitos oficiais do Terceiro Reich
e começou o bombardeio a Varsóvia.
Varsovia era a capital, um lugar importante. E por duas semanas houve bombardeios.
É claro que mataram muita gente, não só judeus, ainda não era essa a situação.
Parte de Varsóvia foi destruída. Nós nos salvamos dessas duas semanas.
Tive muito medo de que o exército entrasse dentro da cidade, eu já tinha 15 anos,
não era uma criança pequena, eu já entendia o que acontecia.
E o exército entrou. A Shoá não aconteceu de repente, seis milhões!
Rápido! Não! Levou dois anos de e gueto e estive dois anos no gueto,
vou falar o que fiz nesse tempo.
Até que houvesse o gueto fechado com muros se levou um ano.
Mas durante todo ese ano toda vez houve prisioneiros, ordens e começou a ficar cheio,
porque traziam judeus refugiados de toda a cidade e também das redondezas.
Eu não vou detalhar para vocês essa parte do gueto, porque para isso há filmes, livros, certo?
As coisas difíceis da guerra. Vou contar o que aconteceu comigo, particular.
Em frente a casa dos meus pais, frente a essa casa,
havia uma casa de bogrei Dror de antes da guerra.
Certamente vocês estudaram ou sabem que antes da guerra
havia kibutzei hachshara (preparação para aliá).
Havia vários kibutzim desses na Polônia, Holanda e Alemanha.
E com a guerra todos se dispersaram, ou voltaram para casa de seus pais
nas quais se rebelaram antes contra os pais (para ir a hachshará),
parte fugiu para Russia, ou ficaram em frente a minha casa em uma
comuna com essas pessoas que resolveram ficar
Meus irmãos conheciam alguns dos roshei (líderes) Dror,
que estavam nessa comuna
como Antek (Itzchak Zuckerman), eles conhecem eles?
Tzivia, Frunka. E comecei a visitar o lugar.
Eu me impressionei muito com essa comuna, pois eram pessoas jovens,
idealistas e havia muita diferença entre a atmosfera de lá com o
ambiente das ruas, que já estava muito triste.
E depois alguns meses, foi organizado o primeiro seminário na clandestinidade.
Em um salão muito longe da rua, éramos como uns 15 jovens
e por 6 semanas aprendemos de pessoas muito habilidosas
- tinham muitas dessas -
e estudei história judaica, sionismo, não era sionista antes,
e socialismo porque era o Dror. E também psicología,
e vinham verdadeiros professores universitários nos ensinar.
Korczak veio nos visitar uma vez com Stepha, sua ajudante, que era psicóloga.
Deste seminário sai com uma visão de mundo, que permanece até hoje.
Nós tínhamos um professor excelente de biologia que dizia:
"eu sou biólogo porque sou humanista e sou humanista porque sou biólogo"
Entenderam?
Falo disso com facilidade,
mas na clandestinidade qualquer sinal que alguém avisa desde o portão
e era perigoso qualquer coisa, incluso um policial judeu,
não podiam descobrir porque era proibido
e todos nós tínhamos que nos dispersar.
Depois destas seis semanas tão importantes da minha vida,
eu comecei a participar dos movimentos de resistência.
Darei uns exemplos,
porque não é fácil entender que há resistência não armada,
que pode existir uma resistência espiritual.
Nós juntamos jovens como vocês, madrichim para dar peulot.
Organizamos um colégio para crianças pequenas clandestino
que funcionava com grupos pequenos em casa privadas
Eu tinhas dezesseis anos
e então
sai de casa. Meus pais ainda estavam lá,
mas eu pensei que se eu estava com eles,
Eu não ficava muito tempo, porque eu recebi um cargo na comuna.
E também os meus irmãos eram militates clandestinos
toda a minha família... Minha mãe depois também.
Depois desse período, começamos a publicar um jornal ilegal
e eu escrevia em polonês, poque eu não sabia idish.
Mas depois de alguns meses a gente resolveu
- e que fique claro que eu não participava da hanagá (liderança) -
e então decidiram que era preciso chegar aos outros guetos também.
E eu já vou explicar o porquê.
Mas como a gente iria fazer isso?
Os alemães já eram robôs,
existiam os muros e qualquer judeu que fosse encontrado do lado de fora era morto
e foi assim basicamente que se criou o cargo das kashriot (mensageiras).
E para esse cargo precisava-se certas características, também físicas.
Cabelos longos, loiros, bonitos como os que eu tinha.
Eu era jovem, bonita, orgulhosa.
Sabia polonês como uma polonesa, porque não falava idish em casa, então não tinha sotaque.
Aí eu podia sair e me passar por não judia.
Mas essas eram características externas, e o mais importante era o que estava dentro.
Eu já estava comprometida com a tnuá, com os meus amigos, com o Dror:
e não era qualquer mulher que podia ser kashrit (mensageira),
só quem era de tnuá, de qualquer outra e também do Dror.
Tínhamos alguns objetivos ao querer chegar a outros guetos.
Havia judeus em outros guetos que estavam fechados, ainda que sem muros,
e não sabiam de nada do que se passava na guerra,
que os judeus ja começavam a ser expulsos para o Leste...
Não sabiam nada, simplesmente esperavam o fim da guerra, ou o Messias...
Eu vi uma das primeiras deportações, que foi da cidade de Gniezno na Polônia.
Também é preciso saber, e eu sei que vai ser um pouco difícil de acreditar para vocês,
mas não havia nenhum meio de comunicação acessível, nem internet a gente tinha!
E a gente pensava que era importante que eles soubessem da verdade,
que era importante contar a verdade sobre as transportações, que chegariam a todos os lugares.
Para que saberem? Eu dizia procurem lugares em que vocês possam se esconder,
deixem seus filhos com algum polonês. Era um trabalho difícil,
porque dizer coisas assim para as pessoas... Até então eles se esquivavam da verdade.
É certo que um milhão e meio de crianças judias foram assassinadas pelos nazis, mas milhares puderam se salvar.
Sempre que eu viajava eu levava debaixo das roupas - do casaco - jornais clandestinos,
os quais eu entregava principalmente aos chavrei Dror, porque eu sabia onde eles estavam.
Vários jovens me perguntam se eu não tinha medo. Claro que eu tinha medo!
Eu tinham muito medo. Nos trens, eu viajava muito de trem, e eu precisava esconder o meu temor.
E por vezes eu ficava triste, porque a vida no gueto era triste,
e quando me dava vontade de chorar, eu sorria e atuava como que em uma peça de teatro.
Como ja lhes contei, em um dos lugares que fui, vi uma das primeiras deportações.
Eu não costumo contar esse tipo de coisa, porque e muito difícil por em palavras.
Porém um pouco depois da guerra, eu escrevi parte dessas histórias nesse livro.
E nesse livro eu coloquei, entre outros, o meu testemunho dessa deportação,
e é importante lembrar que naquela época ainda não se sabia dos transportes em todos os lugares.
E teve a deportação dos judeus do gueto de Varsóvia, no verão de 42
e eu entrava e saia do gueto com frequência, não todos os dias.
A deportação durou seis semanas, e num dos trens levaram o meu pai.
Depois de um ano trabalhando como ksharit,
eu estava em Cracóvia com um grupo de pessoas de várias tnuot distintas que agia clandestinamente.
Eu cheguei lá no dia 22 de Dezembro de 42,
e éramos um grupos de mais ou menos 15 pessoas
e alguns dos meninos fizeram um atentado com granadas a um café,
frequentado por altos oficiais alemães.
Isso foi do lado de fora do gueto.
E eu me juntei a esse grupo,
ficamos em um lugar escondido e lá havia armas.
Daí foi que saíram para fazer o ataque. E eu precisei ficar lá, porque fez muito barulho.
O atentado foi exitoso. Não se sabe ao certo quantos oficiais foram assassinados...
Os homens do nosso grupo encarregados pelo atentado
voltaram na mesma noite para nosso esconderijo.
Eu ainda não tinha um cargo, pois tinha chegado na mesma noite,
eu comprei um pouco de comida
para estar pronta depois do ataque.
E à noite, a gente foi dormir e de repente se abre a porta e entram soldados disparando contra nós.
Eles tinham nos encontrado.
Agora eu gostaria de adicionar algo para os que estão desenvolvendo o projeto.
Nessa viagem, eu fui acompanhada por Itzchak Zuckerman.
Por que ele viajou comigo? Ele não era mensageiro.
Ele tinha ido comigo porque queria convencer os que estavam do lado de fora do gueto
a voltar e começar a revolta, para que saibam que tinham sido os judeus, e não "stam" poloneses.
Nós nos encontramos com os chefes clandestinos e então nos separamos,
eu fui com esse grupo pequeno a um esconderijo e ele foi com os responsáveis a um outro apartamento escondido.
Ele não estava com a gente no esconderijo.
Mas no dia seguinte, ele foi com um companheiro averiguar porque não receberam notícias nossas.
E eles (os alemães) os estavam esperando.
E então, havia um jardim na frente do prédio, e perseguiram
e capturaram um companheiro nesse jardim e Antek - que era grande e parecia polonês - que
tinha ficado na entrada do jardim,
pegou um cigarro e o acendeu devagar. Os alemães não desconfiaram dele e
não o perseguiram.
Mesmo assim, ele acabou recebendo um tiro na perna.
Ele estava vestindo uma meia alta e mesmo com o sangue escorrendo
ele passou a noite inteira andando por Cracóvia
e foi ele quem me contou sobre isso depois.
Pela manhã, ele foi até a estação de trem e viajou até Varsóvia.
Quando chegou lá, Tzivia e um de meus irmãos, que era militante, o receberam.
Antek lhes disse que tudo estava perdido, pois pensava que todos haviam sido mortos.
Ele ainda participou do primeiro levante - antes do de Abril - em janeiro de 43.
Já tinham cuidado da perna dele.
Eu, claro, fui presa com os que sobraram e os soldados alemães começaram com os interrogatórios.
Eu sempre afirmava, insistia que era polonesa.
No fim decidiram que eu era uma polonesa que tinha ajudado aos bandidos judeus.
Estive um mês no cárcere, depois fui transportada a Auschwitz-Birkenau
e a minha carreira de combatente acabou.
Eu era uma polonesa no campo, mas lá encontrei com amigas judias, porque lá era permitido esses encontros.
Sabiam que era judia. Estive 2 anos em Birkenau, saímos às marchas da morte.
A ponto de morrer cheguei ao campo de Ravensbrück, de lá fui para a Suécia e fim da guerra.
Já vou terminar, só quero falar sobre minha família.
e seus amigos poloneses o ajudaram se manter do lado de fora do gueto.
Ele se juntou aos partisans nas florestas e morreu em combate. Só fui ficar sabendo disso depois da liberação.
O meu outro irmão era um militante no gueto junto com Antek e atuou na Gymnasia.
Certa vez, quando tinha saído para organizar atividades em outros guetos,
foi descoberto como judeu em uma estação de trem e assassinado.
Não sabia disso até o final da guerra.
Minha mãe esteve sozinha e era bem polonesa e ajudou a clandestinidade,
se manteve trabalhando em alguns lugares que não sei bem ao certo do lado de fora do gueto.
Ela sobreviveu e a encontrei após a guerra na Polônia.
Ela se mudou para Israel, viveu aqui mais oito anos, e morreu ainda jovem.
Não sei. Sei que alguns foram mortos. Tem um que não estava junto no grupo,
mas era ativista que ainda vive, com quem mantenho algum contato e mora em Tel Aviv.
Todo 22 de dezembro, HaNoar HaOved organiza um encontro para madrichim
aos quais eu sempre vou e, em um desses, o convidaram e ele também foi.
Conhecia vários, nem todos são lembrados, só se lembram de poucos, é assim a vida.
Mas eu conhecia vários. Mas de Tzivia e Antek eu era muito próxima.
Nós ainda vivemos juntos aqui no kibutz (Lochamei HaGuetaot) por mais 30 anos!
Ela foi ativa depois que acabou o gueto.
Não havia mais gueto.
Ela ficou no lado ário e havia uma organização que recebia dinheiro
de Londres para manter os judeus escondidos.
Vários estavam escondidos. E todos esses precisavam de dinheiro para se manter
e minha mãe ajudava a distribuir. Era muito perigoso ir a esses endereços.
Sionismo, socialismo.
Havia chug de teatro que eu participava e Itzchak Katznelson
com apresentações com crianças e jovens, mas eu não tive muito contato com crianças.
Antes de tudo, no gueto todos trabalhavam em todos os tipos de lugares, inclusive para os alemães.
Até nós que estávamos de seminário e por isso apenas estudávamos à noite tínhamos que limpar
todos os apartamentos da comuna. Todos trabalhavam.
Vejam, a relação era entre os líderes principalmente.
Eu, por exemplo, conheci Tolsha que era também kashrit, mas ao mesmo tempo da hanagá da HaShomer HaTzair.
Conheci pouco, uma vez, Mordechai Anielewicz. O contato era principalmente feito pelos líderes.
A revolta começou do meu seminário.
Bem, fomos educados a não nos vermos como vítimas, a não sermos indiferentes.
Essa educação serviu de motivação.
Dos que combateram, ninguém era militar, não tinham experiência e preparo.
Tivemos um pouco de treinamento no gueto. Mas muito pouco.
Como então puderam lutar? Eles lutaram a partir do sentimento de resistência,
por isso eu digo que a revolta iniciou com a primeira peulá clandestina!
Na minha casa, por exemplo, meu pai não ficou entusiasmado quando eu me mudei para a comuna com os chalutzim...
Mas ele foi a primeira vítima. Já a minha mãe era mais aberta desde o começo.
Na nossa casa, tinha um telefone e, no ínicio, a comuna não tinha.
Então minha mãe atendia, e quando era para a gente, ela gritava para chamar a Tzivia.
Minha mãe era aberta, mas não sei sobre os outros pais.
Mantenho muito contato com o HaNoar HaOved.
Me convidam em várias ocasiões para falar com eles e tenho muitos amigos lá.
Já viajei duas vezes com 600 chaverim a Polônia. Tenho contato com eles...
Tenho muitos amigos jovens, mais do que velhos, porque ja estão todos mortos.
Sim, pensávamos desde a Polônia sobre isso.
Passei um ano depois da guerra porque ainda tinha muito trabalho a ser feito.
Outra vez havia kibutzim e para os sobreviventes, que não tinham casa e família,
organizamos kibutzim e orfanatos, principalmente... Tudo para as crianças.
Mas a pequena kvutzá que participou da revolta ja pensava na Polônia em chegar a Israel e criar esse kibutz (Lochamei HaGuetaot).
Antes de tudo eu moro há 63 anos em um kibutz.
E tenho filhos e netos, não sei se eles vão fazer ou vão abandonar.
Eles estudam. Veja, dessa experiência de guerra
carrego uma maior sensibilidade em relação ao sofrimento dos outros
Não odeio ninguém, os árabes, aprendi a não odiar os outros, também não odeio os alemães, todos aqueles estão mortos.
Já estive na Alemanha e me encontrei com jovens de escola e me perguntaram se eu os odiava.
Disse que não. Não foram vocês, não foram vocês que fizeram isso. Mas vocês são responsáveis pelo agora.
Tem aqui um centro humanista no qual veem para seminários pessoas de aldeias árabes, druzas...
E eu me encontro com eles e falo sobre a Shoá. A Shoá foi principalmente para os judeus, mas não somente.
Também para os ciganos. Para todos...
Foi uma catástrofe para todo o mundo. �