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Tradutor: Raissa Mendes Revisor: Claudia Sander
Vamos falar sobre como a narrativa da África está sendo contada,
e quem a está contando.
Quero compartilhar com vocês uma seleção de trabalhos
de artistas contemporâneos da África e de sua diáspora.
Adoro esta arte.
Ela é linda, inspiradora e eletrizante,
e espero conseguir atrair seu interesse para ela.
Quero contar sobre mim e a importância da arte na minha vida.
Sou filha de um artista, por isso, na minha criação,
tive a chance de ver meu pai fazer arte em seu estúdio.
Minha casa tinha arte pra todo lado
e, desde pequena, tive uma educação artística,
sendo arrastada para museus e exposições nas férias.
O que eu não percebia na época
é que isso também me deu o entendimento precoce
sobre a importância da arte,
como apreciá-la,
como entendê-la, mas também como amá-la.
Então, pra mim, a arte é importante num nível pessoal.
E não apenas porque é linda, inspiradora e eletrizante,
mas porque a arte conta histórias poderosas.
Todos esses artistas têm histórias sobre o que significa ser africano.
Histórias que eles contam e nos tocam sobre nossa identidade africana,
histórias de quem somos como africanos,
e histórias sobre nossa complexa história.
Então, como a arte pode contar histórias poderosas?
Quero compartilhar com vocês esta série
do artista senegalês Omar Victor Diop.
Esta é uma série de autorretratos
e, nesta série em particular, o artista
está focado na representação dos africanos na história da arte
entre os séculos 15 e 19.
Quero lhes mostrar como, com uma imagem,
Diop é capaz de tocar na nossa identidade africana,
na política da representação,
mas também no nosso sistema de valores sociais.
Neste autorretrato em especial,
Diop está na verdade aludindo a um outro retrato, de Anne-Louis Girodet.
Esta pintura retrata Jean-Baptiste Belley.
Jean-Baptiste Belley era nativo do Senegal,
e ex-escravo no Haiti,
mas, durante sua vida, ele também foi eleito para representar a colônia
no terceiro governo da Revolução Francesa.
Ele lutou ferozmente pela abolição da escravatura.
O genial sobre Diop aqui
é que ele volta na história.
Ele está restaurando essa figura
ao representar esse lindo uniforme azul real,
no qual ele revive também a pose,
e faz isso pra destacar as questões
que impactam os indivíduos de cor ainda hoje.
Não havia nada de especial
nesse retrato político bem típico daquele tempo,
exceto que, pela primeira vez,
um indivíduo de cor, Jean-Baptiste Belley, no caso,
foi na verdade nomeado e reconhecido numa pintura.
O que Diop está adicionando nessa pintura é um elemento crucial,
que é a bola de futebol sob seu braço
e, ao fazer isso,
Diop remete à nossa cultura de cultuar como heróis
as estrelas do futebol africano,
que, infelizmente, apesar da fama,
de seu imenso talento e de seu status de realeza,
ainda são invisíveis.
Diop pede para irmos mais fundo,
ir além da história e do que foi escrito
e, basicamente, ver como isso ainda nos influencia e impacta no presente.
Quero mostrar esta outra linda série
chamada "Kesh Angels", do artista Hassan Hajjaj.
Aqui nesta série,
o artista está testando os limites do estereótipo e do clichê.
Hassan Hajjaj é meu amigo
e eu o admiro demais,
mas essa série em particular cala fundo em mim como uma mulher muçulmana.
Vivo isso o tempo todo,
as expectativas religiosas e culturais das pessoas,
mas o que adoro nesse artista é que ele vira tudo isso de cabeça pra baixo.
Na verdade, ele está desafiando todas as representações
existentes das mulheres árabes muçulmanas.
Hassan Hajjaj é filho da diáspora.
Ele cresceu no Marrocos entre produtos com logotipos chamativos,
com cópias piratas sendo vendidas nas feiras.
Assim, ver esses símbolos representando em seu trabalho
uma celebração da cultura global, uma crítica à cultura urbana global,
não é surpresa,
mas no âmago do trabalho está o desejo de uma representação cheia de nuances.
Ele quer que paremos um pouco para pensar na percepção que temos
das pessoas, de uma certa cultura e do ambiente.
E, por exemplo,
essa pintura em especial, sua associação mais comum seria
com uma certa marca para um certo consumidor ocidental.
Bem, ele mistura tudo isso
quando ousa imaginar uma cultura feminina de motociclistas,
em que a Chanel ou a Louis Vuitton está desenhando a jelaba,
e a Nike, a babucha,
e esse é na verdade o uniforme padrão.
O que adoro sobre as mulheres em "Kesh Angels"
é que elas são capazes de prender nosso olhar.
Participamos completamente da imagem,
mas são elas que nos convidam a entrar, e a seu modo.
"Kesh Angels", de Hassan Hajjaj, ou "Project Diaspora", de Omar Victor Diop,
me oferecem dois fortes exemplos da razão de a arte ser tão instrumental.
É instrumental não só por nos inspirar a questionar,
mas por provocar mudanças.
Ver diversidade de raça e etnia na arte contemporânea
é a única forma de vermos mudanças na indústria da arte,
mas também nas relações entre a África e o cânone ocidental.
Como vamos participar de tudo isso cabe a nós decidir.
Há muito progresso a ser feito
e, honestamente, ainda precisamos apoiar vozes mais fortes,
já que são elas que sacodem as coisas e trazem nova perspectiva.
Quero compartilhar essa linda pintura antiga
da artista jovem emergente Kudzanai-Violet Hwami.
Para mim, o trabalho dela representa a liberdade.
Hwami tem sacadas fantásticas sobre o que significa ser africano
e a vida africana.
Ela viveu em três países diferentes:
Zimbábue, África do Sul e Inglaterra
e, assim, foi influenciada por múltiplas camadas
de comunidades e culturas,
da cultura LGBT a culturas eco, Xhosa, emo e inglesa.
E, como ela mesma diz, o bom de ser uma filha da diáspora
é ser capaz de reinventar a nós mesmos e o que significa ser africano.
Quero deixá-los com uma obra poderosa
do artista sul-africano Lawrence Lemaoana.
Lawrence Lemaoana também criticou
a influência da mídia em nossa consciência moral,
e fez isso usando esses tecidos como cartazes em demonstrações políticas,
em que ele nos pede para impormos nossa voz.
Acredito no poder transformador da arte,
já que é nossa única forma de pintar a África com suas nuances,
mas também sua diáspora,
que vai ser retratada por seus artistas e seus produtores culturais
com uma visão radical, mas também única de ver o mundo
e seu lugar nele.
É realmente através da arte que podemos retomar
nosso papel e nosso empoderamento.
É através da arte que podemos contar nossa própria história.
E, como diz Lawrence Lemaoana, o poder é nosso.
Obrigada.
(Aplausos)