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Bas tarde, dotô...
"Seu dotô, sô preto véio,
inda mais anarfabeto, é muito defeito junto
nesse seu modo de vê.
Conforme essa sua mente um preto véio doente
que valô que pode tê?
Mas já fui jove, seu moço, fui assim qui nem vancê.
Toda frô já foi botão mas tende por fenecê
e com véio, diferente não haveria de sê.
Nego teve amô de sobra, nego já sofreu de amô
mas dotô foi mais difíci curá picada de amô.
O véio se amufinô
chorô, o véio chorô,
e foi picado de cobra, nego mermo se curô,
doeu, o peito doeu.
mas dotô, também deu jeito,
véio arrancô do peito o veneno desse amô.
O amô que o véio conhece é desse amô que engrandece
num é do que faz sofrê.
O amô que machuca a gente se num matá na semente
logo adispois vai doê.
Véio sabe por sabê
se aminhã vai fazê só ô se acaso vai chovê.
Nego sabe, curá mazela de amô,
e rezá ventre virado
nervo torcido, espinhela, cachumba e mau oiado.
Vez em quando nego véio é procurado pelos homi casado,
preocupado, preocupado em casa tá tudo errado
no trabaio, atrapaiado...
Aí nego véi tem valô...
Nego reza, dá conseio Nego sempre arruma um meio
de arrezorvê sua dô.
Nego tem umas receita pra controlá emoção,
não fora assim desse jeito nego já teria feito
de certo uma danação.
Mas nego tem equilíbro nego tem os pé no chão,
tem orguio no pensamento e tem Deus no coração
e certeza no firmamento.
Nego tem medo de nada, pois foi cada chicotada
de espantá assombração
e fez calo, seu dotô... Mas a esperança, sim sinhô,
já fez acomodação
e posso lhe assegurá sem nenhum medo de errá
num sai do peito mais não.
Nego corria uma enxada rapidinho, sim sinhô.
Nas coisas da prantação nego era professô
e sabia da distança entre as cova de feijão
nego tinha umas noção das coieita inda nas frô.
Mas foi na lida, dotô, que o nego enfim se gastô
mode enricá o patrão.
Não hovera tempo ruim, quarqué dificulidade
nego ia com vontade semeá a dô no chão.
Em cada cova de mio nego prantô desafio,
fé, resignação...
E foi com pranto, dotô, que o nego véio regô
toda essa prantação.
O mio o patrão coieu e fé, deu no que deu
enrugô, ficô branquinha véinha, muito véinha
no entanto não feneceu.
O véio crê que esses home que a ambição inda consome
vai sim se modificá.
É questão de inteligência e nego tem consciência
num dá mais pra segurá
e vamos nós bem juntinho prantá feijão e carinho
nossas mão juntá, remexê o coração
terra boa de prantá amor, ternura, perdão...
Quem prantá erva daninha não coierá rosa não.
O véio crê, sim sinhô, nos home, sim, lavradô
das terra do coração!..."