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Gostaria de dirigir-me ao Sr. Brito Cruz.
O Brasil é uma das grandes histórias de sucesso no mundo,
com um impressionante crescimento econômico.
Porém a maioria de nós tem observado, o Brasil e sua política externa, sua inserção mundial,
é um país que resiste à esfera de hegemonia dos EUA, certamente, mas também da Europa.
É um país que se orgulha de fazer parte do Sul do globo.
Então gostaria de saber se o Sr. na qualidade de diplomata brasileiro,
ao fazer o planejamento de suas políticas;
se sente confortável com a ideia de um Atlântico mais amplo
no qual há diálogo sobre segurança
sobre todo tipo de assunto, incluindo Europa, EUA, Brasil, Marrocos etc.
Será uma transição confortável para o Brasil?
Você tem razão ao dizer que há mesmo um sentimento de otimismo hoje no Brasil.
E acho que os brasileiros se sentem muito mais confiantes sobre como ver o mundo,
como avaliar suas opções.
Em relação ao Atlântico, no Brasil, o vemos principalmente
em termos do Atlântico Sul.
Porque é, para nós, a vizinhança imediata.
Nesse contexto, se observarmos o que se passou com as relações entre o
Brasil e a África nos últimos 10 anos,
isso não começou há 10 anos, mas foi reforçado.
Observará que o Brasil fez grandes investimentos no que diz respeito à
pessoal e recursos públicos a fim de fortalecer nossas relações com
com um grande número de países africanos.
E para nós a ideia do Atlântico Sul evoca principalmente um espaço comum
que nos une à África.
E o que ouvimos aqui hoje, acho que precisamos compreender isso,
compreender as novas tendências.
e uma das tendências mais importantes hoje é que a África está se tornando
uma nova terra das oportunidades.
E a África está deixando de ser parte do problema para virar parte da solução.
E o Brasil compreendeu isso.
É por isso que temos hoje 36 embaixadas na África e teremos 37
até o fim do ano.
Então essa é a primeira observação.
A segunda observação que quero fazer ao responder seu questionamento
é que acho que a nova situação que temos hoje nas relações internacionais
é caracterizada por múltiplas identidades, múltiplos grupos
Se olharmos o caso do Brasil,
o Brasil é um país latino-americano, é um país sul-americano,
ele está engajado em um ambicioso projeto de integração
com nossos vizinhos na América do Sul.
Também integramos diferentes grupos
como o BRICS com China, Rússia, Índia e África do Sul,
ou o IBAS, com África do Sul e Índia.
E o interessante é que em cada um desses grupos temos uma agenda diferente.
Temos maneiras diversas de construir consensos e de contribuir.
(inaudível)
Entendemos que o Brasil está à vontade no papel de líder do Atlântico Sul
e tem forjado alianças com a África do Sul e com o continente africano
Gostaria de saber se também se sentem à vontade com a ideia de ser parte
de um Atlântico, pois esse Atlântico, creio, é o centro de nosso debate.
Entendo o nível de conforto do Brasil com o sul do globo
mas e o Brasil e esse mundo mais amplo?
Acho que é uma pergunte interessante,
é uma questão nova, pois ao se comparar a situação do Atlântico Norte ao do Sul
do meu ponto de vista, vejo diferenças importantes,
vejo semelhanças e atributos comuns,
mas há diferenças importantes.
No Atlântico Norte há, em primeiro, lugar, uma aliança militar,
que de certa forma se tornou sinônimo do Atlântico Norte.
No Atlântico Sul temos o que se chama de "Zona de Paz e Cooperação"
na qual tentamos excluir a ideia de militarização e de alianças militares
Então, ao começarmos a debater a questão, que é muito interessante,
temos de partir da realidade, e a realidade é o que estou tentando mostrar.
É o fato de que a situação no Atlântico Sul é muito diferente mesmo.
O Atlântico Norte é um oceano que une duas
das partes mais desenvolvidas do mundo,
América do Norte e Europa Ocidental.
O Atlântico Sul une duas partes do mundo em desenvolvimento, do Sul.
São diferenças importantes.
Não significa que não se possa pensar na possibilidade
o Brasil, claro, tem uma identidade atlântica também.
Temos uma série de identidades.
Mas não significa que é possível
começar a construir novas instituições etc.
Você pode começar o debate, mas sem saber onde irá parar.
Voltarei à temida sigla de 4 letras, OTAN, em um minuto.
Gostaria de me dirigir ao Emb. Shannon.
Mencionei a palavra que começa com P, "Pivô",
que tem sido comentada em Washington e até certo ponto na Europa, esse ano,
mas quero perguntar sobre os mapas mentais desse governo
e para a comunidade de Washington que prepara as políticas, como um todo.
Você debruçou-se sobre essa ideia de um Atlântico mais amplo,
pela conversa que tive com Craig Kennedy.
Mas qual sua impressão sobre o pensamento em Washington?
Você acha que a comunidade de Washington que prepara as políticas está pronta
para pensar conjuntamente o Atlântico Norte e Sul e começar a delinear
daí os paralelos de segurança?
A resposta objetiva é sim.
A reposta mais elaborada é a que o pivô implica o reequilíbrio
de atenção e de recursos
e o reconhecimento de que a ascensão da China, na Ásia e também no mundo,
apresenta grandes oportunidades e desafios para os EUA e uma
grande variedade de outros parceiros.
E, portanto, precisamos, ao sairmos da guerra no Iraque e no Afeganistão,
aumentar nossa atenção e recursos em direção ao Pacífico.
Isso não implica a diminuição do interesse no Atlântico.
Para nós, o Atlântico é histórico, certamente.
Não apenas o Atlântico Norte, mas também o Atlântico Sul.
Acho, porém, que aquilo que move essa reconsideração de mapas mentais
em relação ao Atlântico de modo geral é realmente a ascensão do Brasil
e da América do Sul na qualidade de atores mundiais relevantes.
José Humberto descreveu bem a ascensão do Brasil.
Mas o que se nota é não somente a presença crescente do Brasil na África
apoiando-se em vínculos demográficos e culturais
para estabelecer vínculos comerciais e de investimento que
beneficiam não apenas o Brasil mas vários parceiros seus, incluindo os EUA.
Também o que temos visto de modo mais amplo em termos de
desenvolvimento político, econômico e social no Brasil e na A. Latina em geral.
E se olhar para os países das Américas que historicamente tiveram conexões
no Atlântico, são Canadá, EUA, México e Brasil,
com algum interesse do Uruguai e da Argentina.
Mas à medida que a AL passou de governos autoritários a democráticos,
de economias fechadas a economias abertas,
da substituição de importações e de modelos autárquicos de desenvolvimento
para a integração regional,
e de ampla isolação internacional para a globalização,
o impacto foi significativo,
ao menos na forma em que os EUA enxergam o papel do Brasil
nas Américas como um todo e no Atlântico.
Vemos o Brasil e a América do Sul e outros países na América Latina
apresentarem um modelo e uma opção interessante
ao longo do Atlântico e em direção à Ásia Central
pois mostraram que os mercados, na democracia, fornecem desenvolvimento.
Mostraram que os mercados, na democracia, podem atacar
desequilíbrios sociais históricos, pobreza, desigualdade ou exclusão social
e podem fazer isso de maneira pacífica.
E também o tipo de democracia que vimos de modo geral nas Américas
para a qual a liderança do Brasil teve papel importante,
é uma diplomacia que lidou com contenciosos lindeiros,
e com programas de armas nucleares, e o fechamento desses programas,
e o monitoramento de programas nucleares via negociações e de forma pacífica;
significa que é uma região que tenta realmente se afirmar pelo soft power
e para nós isso é muito relevante.
Ao lidar com temas de segurança de maior monta em outras partes do mundo,
ao tentar convencer nossos aliados no mundo de que projeção militar e
armas nucleares não são necessariamente o melhor meio de inserção internacional,
países como o Brasil e a América do Sul podem ter papel muito importante
e as conexões que constroem pelo Atlântico Sul podem nos permitir
repensar amplamente nosso conceito geral a respeito do Atlântico.
Apesar de a aliança do Atlântico Norte ter sido o produto da guerra
e as consequências da guerra e a competição com a União Soviética,
o Atlântico Sul e o novo Atlântico é realmente um produto da oportunidade
e acredito que, nesse sentido,
meus colegas em Washington estão bem preparados para repensar o Atlântico.