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A ÚLTIMA CAMINHADA
- Olá, Irmã Prejean.
- Olá, Billie Jean. Como estás?
A atrasada Irmã Helen.
Trago um bilhete da minha mãe.
Precisa dum livro novo?
E tu, Melvin?
O consultor quer que vamos à reunião
amanhã. Podes estar lá ás 7?
Posso. Novos livros de poesia!
- O teu poema ficou esborratado.
- Esborratado?
Recebi outra carta do tal tipo.
- Qual tipo?
- O branco na Fila da Morte.
Pode escrever-lhe?
Ele precisa dumas palavras amigas.
Claro. Tratarei disso depois da aula.
- Ficou esborratado.
- Mesmo assim podes lê-lo.
“Há uma mulher no escuro.
“Ela tem grandes braços
para te abraçar,
“mas tu não sentirás esse abraço
até poderes ver a cara dela.
Então ficas ali à espera da luz
ao fundo da rua.
- Muito bem, Idella.
- Obrigada.
Parece que o meu
advogado desapareceu.
Preciso de apoio legal,
mas se não pode dar-mo,
aceitarei uma palavra
amiga ou uma visita.
Às vezes a solidão é imensa.
Nenhum desses homens pode pagar
a advogados para recursos.
Imagine os telefonemas que recebemos
de homens na Fila da Morte,
implorando que arranjemos advogados.
- Que trabalhem de graça.
Exacto. E os advogados não fazem
bicha para esse trabalho.
Cara Irmã Helen,
obrigado por me escrever.
Escrevo da minha casa,
a minha cela de 2m por 2,5m.
Estou aqui 23 horas por dia.
Não trabalhamos na Fila da Morte.
Somos especiais. Mantêm-nos
à parte da população prisional.
Somos a elite,
porque vamos ser executados.
É difícil não enfraquecer nesta cela.
Tento erguer o armário
para me manter em forma,
mas é difícil não engordar.
Arroz, batatas, panquecas, feijão.
Às vezes sinto-me
como uma porca numa quinta
que é engordada
para ser morta no Natal.
Uma vez sonhei que ia ser
executado na cadeira eléctrica.
Deus entrou na minha cela
com um barrete de cozinheiro.
Começou a passar-me por pão ralado,
enquanto lambia os beiços.
Talvez ache estranho
eu ter sonhos destes,
mas o cérebro prega-nos partidas
quando estamos rodeados
de gente que nos quer matar.
Obrigado por me escrever.
Não recebo muitas cartas nem visitas.
Ninguém da minha família vem cá.
Eu compreendo.
Slidell fica muito longe.
- Bom dia.
- Bom dia, Padre.
- Irmã...
- Helen Prejean. Muito prazer.
- Sente-se.
- Obrigada.
- Já esteve numa prisão?
- Não, Padre.
Cantei com a Irmã Clement no Centro
de Detenção Juvenil em New Orleans.
Cantámos “Kumbaya”
e os rapazes gostaram.
Começaram a fazer
os seus próprios versos:
“Alguém está a fugir, Senhor.”
Os guardas fizeram-nos
cantar outra canção.
O seu hábito?
Há 20 anos que as nossas
irmãs não usam hábito.
Sabe do pedido Papal sobre o vestuário
das freiras, não sabe?
Creio que o Papa disse
“roupa característica”, não hábitos.
Decerto interpretará à sua maneira.
Como achar conveniente.
Matthew Poncelet.
Lembro-me de notícias sobre ele.
Ele e outro homem mataram dois jovens
com tiros na nuca.
Violaram a pequena,
apunhalaram-na várias vezes.
Sabe no que se mete?
Porquê, Irmã? Fascínio mórbido?
Compaixão por um coração que sangra?
Ele escreveu-me
e pediu-me que viesse.
Isto não é nenhum romance.
Não é o Jimmy Cagney
em “Eu fui erradamente acusado”.
Ou “Se eu tivesse alguém
que acreditasse em mim.”
Eles são todos condenados.
Tirarão partido de si
de todas as formas que puderem.
Tem de ter muita,
muita cautela. Compreende?
Sim, Padre.
Estes homens não vêem
muitas mulheres.
Vestir o hábito
podia ajudar a impor respeito.
Desprezando a autoridade,
só os encorajará a fazer o mesmo.
Mulher no andar!
Pode esperar ali.
Já trazemos o seu homem.
Cá estou, Matthew.
Obrigado por ter vindo.
Nunca pensei receber
a visita duma freira.
- Então é freira.
- Sou.
Estou aqui para ouvir
o que me quiser dizer.
É muito sincera.
Que quer dizer?
- Já tinha feito isto?
- Não.
Nunca esteve tão perto dum criminoso?
Que eu saiba não.
Vive em St. Thomas. Há muitos pretos.
Eles matam-se por dá cá aquela palha.
Quando vi Helen na sua carta,
pensei na minha ex-mulher
e quase a rasguei.
Ela denunciou-me. Chamou a polícia.
Deixou o nosso filho sem pai,
a estúpida.
Tem um filho?
- Um condenado com um filho.
- Rapariga ou rapaz?
- Rapariga.
- Como se chama?
- Faz muitas perguntas.
- Não o conheço.
Esqueça.
Diz que trabalha com pobres.
O seu pai era advogado.
A sua família tinha dinheiro, não?
Algum.
Vive em St. Thomas Projects.
Qual é o mais louco, você ou eu?
- Vivo onde trabalho.
- Num sítio miserável.
- E você?
- Eu vivo aqui.
Foi criado pobre?
Na Fila da Morte
não há ninguém com dinheiro.
Então temos algo em comum.
- O quê?
- Ambos vivemos com os pobres.
Não vai perguntar-me o que fiz?
- O Capelão informou-me.
- O Farley?
Ele é um homem muito religioso.
Eu não matei ninguém.
O Carl estava doido.
Ele é que devia estar aqui.
Passou-se completamente.
Eu tive medo, fiquei com o miúdo
como ele disse. Ele matou-os.
Viu-o matar aqueles garotos?
Eu vou dizer-lhe a verdade.
Eu e o Carl estávamos cheios de droga
e de álcool quando aquilo aconteceu.
Eu não dormia há duas noites.
Estava como louco.
Mas não os matei.
Não matei ninguém. Juro por Deus.
- Ali?
- É o nome dela.
- É tão bonita.
- Agora tem 11 ou 12 anos.
Nasceu quando fui preso
a primeira vez. Via-a uma vez.
- Quando?
- Quando ela tinha três anos.
- Escreve-lhe?
- Não sei onde ela está.
Está algures no Texas.
Com pais adoptivos.
Terminou o tempo.
Vai haver farra.
Esta noite vão matar o Tobias.
Os guardas apostam em quem segue.
Eu estou empatado. Não é bom.
Tenho duas hipóteses: a Comissão
de Indultos ou o Tribunal de Apelação.
Escrevi o pedido de recurso
mas preciso que o entreguem.
Pode ajudar-me?
Sabe escrever um recurso?
Quando se está em apuros,
depressa se aprende leis.
Chame-lhe motivação especial.
Estou aqui há seis anos.
Leio todos os livros
de leis que encontro.
Tudo isto é sobre o meu caso.
Talvez ajude a terem acesso ás coisas
que precisam mais rapidamente.
Arranje-me um advogado
e apresentamos o pedido de recurso.
- Não volta, pois não?
- São as únicas cópias?
Tenho uma cópia minha,
mas se não me vai ajudar
não quero desperdiçar estas consigo.
Farei tudo que puder.
E agradeço a sua confiança.
Irmã, eu não confio em ninguém aqui.
Não me lisonjeou nem pregou
aquelas tretas do fogo do inferno.
Você tem coragem.
Vive numa zona onde todos
os pretos andam armados.
Força, Helen, dá-lhe!
Estás a fazer-te de morto?
Pensas que nos enganas,
animal estúpido?
- Eu ia muito depressa?
- A 120 Kms/h.
- É freira?
- Sim.
Nunca multei uma freira.
Uma vez multei um tipo do Fisco.
No ano seguinte viram-me as contas.
Desta vez vou fechar os olhos.
- Mas vá devagar, está bem?
- Sim, sr. agente.
Na sexta-feira à noite,
Walter Delacroix, de 1 7 anos,
e Hope Percy, de 18,
eram duas pessoas felizes, celebrando
um momento decisivo da vida.
O casal foi alvejado duas vezes
à queima-roupa na nuca
com uma espingarda de calibre 22.
- Além das acusações de homicídio,
Poncelet e Vitello enfrentam seis
acusações de rapto e uma de violação.
Nas quatro últimas
semanas antes do crime,
os dois acusados tinham
espalhado o terror na zona.
Um porta-voz da Polícia disse hoje...
... que Poncelet
tratou o juiz por “Cap”
e sorriu quando o júri
o considerou culpado.
Poncelet afirma
que Vitello matou os dois.
Acha que ele mente.
Ambos dizem que o outro é que matou.
Alguém mente.
Sabemos que estavam lá os dois.
Por que é que só um deles
é condenado à morte?
O Estado deve ter provas
mais fortes contra Poncelet.
O Vitello tinha um advogado melhor
que criou uma dúvida razoável no júri.
Vitello salva-se, e Poncelet é
condenado à morte. Pouca sorte.
Ele precisa de ajuda, Irmã.
Há um advogado, Hilton Barber.
Ele está a par do caso
e disse-me que não.
Talvez a Irmã o faca mudar de ideias.
Para ele ser outra vez julgado
e libertado?
Não sei bem se quero
cruzar-me com ele na rua.
Não há hipótese de ele ser libertado.
Foi cúmplice.
A prisão perpétua
na Louisiana é para sempre.
Só tento evitar que o Estado o mate.
Quer desistir? Por mim, tudo bem.
Não tem de voltar lá.
Sejam duros nas sentenças,
sejam-no com as comissões
de liberdade condicional brandas
e com juízes
que ditam sentenças leves.
- Quem fala?
- Matt Poncelet.
Eu sei que estou na Fila da Morte,
mas houve quem estivesse aqui anos.
Eles marcaram uma data.
Vão matar-me no dia 13.
Ignorava que precisava de um
advogado para a audiência de indulto.
Eu tratava disso
se me deixassem, mas dizem.:
“Sem advogado, não há audiência.”
Conheço um advogado
que talvez possa ajudá-lo.
Farei tudo que puder, está bem?
Irmã, ajude-me. Só conto consigo.
Eles preparam-se para me matar.
Não tive notícias suas.
Não me abandona, pois não?
Vou arranjar-lhe o advogado.
Não se preocupe.
Já passaram seis anos, está na hora
do Estado avançar com o programa.
Chamem-me sentimental,
mas prefiro vê-los executados.
Se não houver apelos
ou suspensões de última hora,
Poncelet morrerá pelo novo processo
de execução, a injecção letal.
Luís, fala a Helen.
Como se chama o advogado
com quem querias que eu falasse?
Há quanto tempo faz isto, Irmã?
- Faço o quê?
- Aconselha gente na fila da Morte?
- Não o aconselho. Só o vi uma vez.
- Qual é a sua impressão?
Não sei se gosto dele.
Ele precisa de ajuda, mas achei
que o melhor é apresentar-lho.
Farei o que puder.
Os tribunais não querem atender
recursos de sentenças de morte.
Pode até ter
uma nova prova de inocência,
que o tribunal não examinará o caso.
“Tenho muitos coelhos”
Acha que é um letreiro do tipo
“Vende-se” ou um grito de socorro?
Ou será fanfarronice?
Imagine o desgraçado.
Comprou dois coelhos
há um ano e agora está cheio deles.
Multiplicam-se como pipocas.
A minha execução é na véspera
da reeleição do Governador Benedict,
para mostrar que tem mão firme
com os criminosos.
Concordo consigo.
Os políticos pensaram
muito nessa decisão,
mas não se pode recorrer
à Comissão de Indulto.
Está cheia de nomeados políticos.
De nomeados pelo Governador.
A última coisa que querem ouvir é um
condenado dizer-lhes que são inúteis.
Temos de o apresentar
como um ser humano
e convencê-los a poupar-lhe a vida.
- Temos de provar que estou inocente.
Apresentamos recursos
ao Tribunal Federal e ao Supremo,
mas isto é uma Comissão de Indulto.
Não lhes interessa
se puxou ou não o gatilho.
Vão pensar no crime,
e em si como um monstro.
Matar um monstro é fácil,
mas é difícil matar um ser humano.
Por isso é que precisamos de pessoas
que falem bem de si, como a sua mãe.
- A sua mãe tem de estar na audiência.
- Não quero. Vai desatar a chorar.
Talvez, mas a sua mãe
deve estar presente.
Deve ouvir os Delacroix, os Percy...
Desculpem interromper.
Tem razão, vai ser perturbador
para ela, mas é a sua mãe.
Deve ter oportunidade de falar
pelo filho, se ela quiser.
- Ela vai desatar a chorar.
- Ela tem esse direito.
E se você morrer sem ela ter
tido a hipótese de o defender?
Vai atormentá-la para sempre
pensar se podia tê-lo salvo.
Pensarei nisso,
mas eu tenho o meu orgulho.
Não vou rebaixar-me
diante dessa gente.
Que estás a fazer, Kenitra?
Um cartão de Páscoa
para a minha mãe.
O SOFRIMENTO
DOS PAIS NUNCA ACABA.
Feliz Páscoa.
Sra. Poncelet?
Sra. Poncelet, por favor.
Ela não mora aqui.
Quem é?
Sou a Irmã Helen Prejean.
Conheço o seu filho Matthew.
Feliz Páscoa.
- Tem a certeza que é freira?
- Sim.
- Não é da televisão?
- Não.
De certeza?
Como conhece o Mattie?
Conheci-o na Fila da Morte.
Nunca se sabe quem nos bate à porta.
Que quer? O Mattie mandou-a
buscar dinheiro ou cigarros?
Não.
Então que quer?
Sabe que marcaram a data
da execução do Mattie.
Telefonaram da prisão a perguntar
se eu tenho Seguro de Morte.
Que piada.
Eu nem tenho dinheiro para comer.
A audiência da Comissão
de Indulto é na quarta-feira.
O advogado dele pensa que seria
bom a senhora estar presente.
O que pensa o Mattie?
- Está preocupado. Quer protegê-la.
- É um pouco tarde para isso.
O programa “Inside Crime”
falou no Mattie.
Disseram como eu tentei ajudá-lo.
Como uma verdadeira Ma Barker.
Agora sou famosa.
Ontem, numa loja, vi duas
senhoras a olharem para mim.
Quando me aproximei
ouvi uma delas dizer,
“Estou ansiosa por saber
que executaram o Matthew Poncelet.”
Que crueldade.
Os meus rapazes passam
um mau bocado na escola.
Embirram com eles,
batem-lhes, chamam-lhes nomes.
Puseram um esquilo
morto no cacifo do Troy.
O infeliz veio para casa a chorar.
Que mal é que ele fez?
Não deixo de pensar
onde é que eu teria errado.
Ele começou a meter-se
em sarilhos quando tinha 15 anos.
O pai nunca estava presente.
A maioria dos garotos dos projectos
são criados por pais sós.
Não violam nem matam gente.
Estás a ser levada, Helen.
E os pais das vítimas? Já os viste?
Achas que quereriam falar comigo?
Não há gente boa no teu bairro
que precise da tua ajuda?
Há. E eu continuo
a trabalhar com eles.
Mas por que visitas criminosos?
A energia que gastas com eles,
podias empregá-la evitando
que outros garotos fossem presos.
Amigas da mamã leram um artigo
que associava o teu nome ao Poncelet.
O meu nome veio no jornal?
Não tem nada a ver com isso.
Apenas tenho curiosidade.
O que te levou a isso?
Não sei, mãe.
Sinto-me mais presa do que arrastada.
O homem está em apuros
e, não sei porquê, só confia em mim.
Eu sei que tens um grande coração,
mas ele não deve turvar-te a razão.
Nem deixar-te a barriga vazia.
Em criança, trazias sempre
animais abandonados para casa.
Se os tivéssemos acolhido a todos,
não teríamos tido dinheiro
para vos alimentar.
És muito generosa.
Custava-me muito ver
alguém aproveitar-se disso.
Está bem, mãe.
O meu pai levou-me
a um bar quando eu tinha 12 anos
e disse-me
que escolhesse o meu uísque.
Apontei para uma garrafa no bar,
e disse: “Quero a do peru bonito.”
Os tipos do bar fartaram-se de rir.
Nessa noite,
ficámos a cair de bêbedos.
O meu pai era um bom homem.
Trabalhava na lavoura, no duro.
É uma coisa que herdei dele:
mãos de trabalho.
- Que idade tinha quando ele morreu?
- Catorze anos.
- Por que é freira?
- Fui arrastada, acho eu.
É difícil dizer. É o mesmo que
perguntar-lhe porque é um condenado.
- Azar.
- Sorte, então.
Tinha uma família que me amava,
muito apoio.
Acho que me senti obrigada
a devolver parte disso.
Não quer casar,
apaixonar-se, fazer sexo?
Não quer falar sobre isso?
Tenho amigos íntimos,
homens e mulheres.
Nunca tive experiências sexuais,
mas há outras formas de intimidade.
Partilhar sonhos,
pensamentos, sentimentos.
Isso também é intimidade.
Agora somos íntimos,
não somos, Irmã?
Fui ver a sua mãe.
Disse que iria à audiência da Comissão
de Indulto, se você quisesse.
Gosto de estar consigo.
Acho-a muito bonita.
Ora veja...
Com a morte tão perto,
e arma-se em conquistador.
Eu não estou aqui para sua diversão,
Matthew. Respeite-me.
Por que hei-de respeitá-la?
Porque é freira?
Porque sou uma pessoa.
Toda a pessoa merece respeito.
Que é que eu digo à sua mãe?
O Mattie teve uma vida dura,
mas era um bom rapaz.
Quando ele tinha 16 anos...
Senhoras e senhores,
sejamos honestos.
Não vão encontrar muitos ricos
na Fila da Morte.
Matthew Poncelet está
aqui hoje porque é pobre.
Teve de aceitar o representante
que o Estado lhe deu.
O Estado deu-lhe um advogado
que defendia processos fiscais.
Um amador.
A selecção do júri
demorou quatro horas.
O julgamento durou cinco dias.
O advogado levantou uma objecção
durante o julgamento todo.
Se o Matthew tivesse dinheiro...
podia ter contratado
advogados famosos,
que teriam contratado bons
investigadores, peritos em balística,
um psicólogo para traçar
o perfil desejável dos jurados,
e podem ter a certeza...
... que Matthew Poncelet não estaria
a pedir-lhes que lhe poupem a vida.
A pena de morte. Não é nada de novo,
temo-la há séculos.
Enterrámos pessoas vivas,
cortámos-lhes a cabeça
com um machado,
queimámo-las vivas na praça pública...
Queria que eles vissem
esta fotografia.
Neste século, continuámos
a procurar formas mais humanas
de matar pessoas
de quem não gostávamos.
Fuzilámo-las,
sufocámo-las em câmaras de gás.
Mas agora,
aperfeiçoámos um método
que é o mais humano de todos.
A injecção letal.
Amarramo-lo, anestesiamo-lo
com a injecção nº1 .
Depois damos-lhe a injecção nº2
para lhe destruir os pulmões.
A injecção nº3
paralisa-lhe o coração.
Matamo-lo como um cavalo velho.
O rosto dele adormece,
enquanto por dentro,
os órgãos se desfazem.
Os músculos do rosto
dele deviam contorcer-se,
mas a injecção nº1 descontrai-lhe os
músculos e nós não vemos esse horror.
Não sentimos o sabor do sangue
da vingança nos nossos lábios,
enquanto os órgãos desse
ser humano se contorcem.
Sentamo-nos aí calmamente,
acenamos com a cabeça e dizemos:
“Foi feita Justiça.”
Passaram seis anos desde
os brutais assassínios
de Hope Percy
e Walter Delacroix.
Há muito que devia
ter sido feito justiça.
O processo de Matt Poncelet
foi minuciosamente revisto.
Teve um novo julgamento
para a leitura da sentença,
assim como numerosos recursos
para os tribunais Estatal e Federal
e sucessivas petições
apresentadas pelo Dr. Barber.
O Tribunal nunca teve a menor
dúvida de quem cometeu o crime.
Matthew Poncelet não é um bom rapaz.
É um assassino impiedoso.
esses crimes foram premeditados,
odiosos e cruéis.
Este homem alvejou Walter
Delacroix na nuca duas vezes.
Violou Hope Percy
e apunhalou-a 1 7 vezes
antes de lhe dar dois tiros na nuca.
Essas famílias...
... nunca verão os filhos
formarem-se na universidade.
Nunca assistirão ao casamento deles.
Nunca tornarão
a festejar o Natal com eles.
Não terão netos.
Tudo que eles pedem é justiça
para essa perda irreparável.
Peço-lhes que respirem fundo,
sejam inflexíveis
e procedam à execução
de Matthew Poncelet.
Ter de esperar é sempre bom sinal.
- Não sei se fizemos algum progresso.
- Eu achei-o formidável.
O ideal seria eles sentirem a sua
própria culpa na morte de um homem.
Com licença, Irmã.
Sou o pai de Walter Delacroix.
- Sinto muito a morte do seu filho.
- Irmã, eu sou católico.
Como pode estar ao lado de Poncelet
sem nunca me ter procurado
ou à minha mulher
ou aos Percy para nos ouvir?
Como pode passar todo o seu tempo
preocupada com o Poncelet
e não pensar que nós também
podemos precisar de si?
Sr. Delacroix, eu não pensei
que quisesse falar comigo.
Earl, vamos entrar.
Estes são Mary Beth e Clyde Percy.
- Sinto muito a morte da vossa filha.
- Também nós. Com licença.
Ouça, Irmã,
estou certo que viu um lado de Matt
Poncelet que nenhum de nós viu.
Estou certo
que ele se porta impecavelmente
e deve suscitar-lhe muita compaixão.
Mas Irmã, ele é um homem mau.
É um homem que raptou adolescentes,
que os violou e matou.
Esse biltre tirou-me
o meu único filho.
O nome da minha família morre comigo.
Não haverá mais Delacroix, Irmã.
Eu preocupo-me consigo,
com a sua família
e com o que aconteceu ao seu filho.
Vou dar-lhe o meu telefone,
e se precisar de alguma coisa,
telefone-me.
- Eu, telefonar-lhe?
Pense nisso, Irmã.
Pense na arrogância desse gesto.
Com licença.
Sente-se bem?
É melhor irmos entrando.
Esta comissão decidiu negar
clemência a Matthew Poncelet.
A execução será daqui
a uma semana conforme estipulado.
Não percas a esperança, Matt.
Ainda podemos contar
com o juiz do Tribunal Federal,
Além disso, há o Supremo Tribunal
e o Governador.
Conseguirei uma reunião com ele,
nem que seja a última coisa que faça.
Parece que a Irmã
é tudo que me resta.
Posso ter um conselheiro espiritual.
Quer sê-lo?
Acompanhe-me até ao ocaso.
Vai ter de passar várias
horas diárias com ele
à medida que a morte se aproxima.
No dia da execução,
terá de passar o dia todo com ele.
Não é uma tarefa fácil.
Geralmente é missão de um capelão,
um padre ou um clérigo muçulmano.
Quero que seja realista.
Temos uma possibilidade em mil
das coisas nos correrem bem.
É um caminho difícil.
Se isto fosse um rei,
podias ter recuado outra vez.
Podes andar três casas para aqui
e depois voltar para trás.
Ela tem um joker que não quer jogar.
É a minha vez.
Tenho um ás! Tenho imensa sorte.
De quem era esta carta?
Por favor não o matem.
Ele é um filho de Deus.
Ele merece mais. Corrigiu-se.
Prestem todos atenção,
advogados de criminosos
e violadores de crianças.
Não podem pisar terrenos sagrados.
Não têm autoridade moral para o fazer.
Condescendam com biltres...
Que quer?
Desculpe incomodá-lo,
mas não consegui esquecer-vos.
Tenho tentado telefonar,
mas não me atenderam.
Por favor,
posso falar convosco?
Com certeza.
Peço desculpa
por não ter vindo visitá-los antes,
mas nunca me vi envolvida
numa situação destas.
Está com medo.
Estou.
Eu também estaria.
- Entre.
- Obrigada.
Irmã,
posso fazer-lhe uma pergunta?
- É comunista?
- Comunista? Não.
Eu achava que não, mas é o que dizem
por aí por defender esse assassino.
Mas eu não achava.
- Sente-se.
- Obrigada.
- Quer um café?
- Obrigada.
Desculpe a desarrumação.
Eu e a minha mulher tivemos
uma grande discussão
quando voltámos da audiência.
Ela meteu as roupas
do Walter em caixas
e telefonou para a Goodwill.
Diz que quer esquecer o passado,
que a vida tem de continuar.
- Ela não está em si.
- Deve ser tão duro.
Quando aquilo aconteceu,
obrigava-me a levá-la todas as manhãs
à sepultura do Walter.
Fartava-se de chorar, coitada.
Dias e noites durante semanas,
meses até.
Quem me dera que houvesse
uma maneira de alterar o passado.
Custa-me tanto.
Ela era tão alegre.
Divertíamo-nos tanto.
Bons tempos...
Riamos... O que nós riamos.
O Walter aprendeu a andar aqui.
Partiu o queixo no braço desse sofá.
Nesse sofá aí,
sentou-se ele com a Hope
na semana antes de morrerem.
Quando se perde um filho,
todas as recordações
se concentram num sítio.
Concentram-se...
... como um... relicário.
Então pediu para ser a conselheira
espiritual de Matthew Poncelet.
- Sim, Padre.
- Porquê?
Ele pediu-me.
- Isto é muito invulgar.
- Porquê?
- Seria a primeira mulher a fazê-lo.
- A sério?
A situação requer experiência.
O rapaz vai ser
executado daqui a seis dias
e tem uma terrível
necessidade de redenção.
Está à altura disso?
Não sei, Padre. Espero que sim.
Tenho pedido ajuda a Deus.
Pode salvar esse rapaz,
levando-o a receber os sacramentos
da Igreja antes de morrer.
Essa é a sua missão.
Nem mais, nem menos.
Se precisar de ajuda,
não hesite em procurar-me.
Obrigada, Padre.
Não quero ser enterrado aqui.
Vão chamar a minha mãe
para tratar do funeral.
- Ela sucumbirá. Pode tratar disso?
- Posso.
Alguma vez leu a Bíblia?
Li. Não sou grande leitor dela,
mas pego-lhe de vez em quando.
Como o W.C. Fields.
- Quem?
- W.C. Fields.
Fazia de bêbedo nos filmes.
Ele está a morrer, um amigo vai
visitá-lo e vê-o a ler a Bíblia.
O amigo diz: “W. C. , tu não acreditas
em Deus, porque estás a ler a Bíblia?”
E Fields responde:
“Estou à procura duma saída.”
Eu não procuro nenhuma saída.
Chuva, chuva, chuva.
É mau sinal.
Já executaram um ***, o Tobias.
Esta noite é o Wayne Purcell.
Dois negros.
O Governador é pressionado
para executar um branco, que sou eu.
Esteve um preto na marquesa
antes de mim. Espero que a limpem.
- O seu pai era racista?
- Onde quer chegar?
Pergunto-me quem o ensinou a odiar.
- Não gosto de pretos.
- Conheceu alguns negros?
Claro. Viviam à minha
volta quando era miúdo.
- Já brincou com uma criança negra?
- Não.
Mas eu e o meu primo
uma vez fomos assaltados.
Que aconteceu?
Atirámos-lhes pedras. No dia seguinte,
escavacaram-nos as bicicletas.
Pode censurá-los?
Não, mas a escravatura
acabou há muito.
Eles estão sempre a queixar-se
da pouca sorte que têm.
Os garotos da bicicleta?
Todos eles. Não suporto
gente que se arma em vítima.
- Vítimas?
- São todos vítimas.
Não conheço vítimas no meu bairro.
Conheço gente decente e trabalhadora.
Pois eu conheço uma data de pretos
calões que vivem à custa do estado.
- Parece um político.
- O que quer dizer com isso?
- Já foi alvo de preconceitos?
- Não.
Sabe o que as pessoas pensam
de quem está na Fila da Morte?
- Não. Diga-me.
- Que são monstros.
Escumalha, inúteis
que vivem à custa do Estado.
Eles vão matar-me e eu estou inocente.
Mas não choramingo:
“Escravatura, escravatura.”
Gosto de rebeldes,
há negros porreiros.
Martin Luther King levou os dele
até Washington e humilhou os brancos.
- Respeita o Martin Luther King.
- Ele lutou, não era calão.
- E os calões brancos?
- Não gosto deles.
Então é dos calões que não gosta.
Podemos falar doutra coisa?
Jesus também disse: “Quem com ferros
mata, com ferros morre.”
Purcell merecia ser executado.
9... 8... 7... 6... 5... 4...
... 3... 2... 1 .
É a única forma de ter a certeza
que eles não voltarão a matar.
Vida sem liberdade condicional, pois.
Quantos guardas e outros presos
têm eles ainda de matar?
Eles são cães raivosos. Tarados.
Vamos embora.
Se o Governador
e os tribunais rejeitarem o pedido,
o Matt morrerá daqui a seis dias.
Temos de arranjar uma agência
funerária e onde o enterrar.
Talvez as nossas irmãs
cedam uma sepultura.
Precisamos de alguém
que faça o serviço fúnebre.
- E roupas. Um fato.
- Fato?
Que tamanho achas que ele veste?
Não sei.
Que altura tem?
Não sei. É bastante grande.
Que tamanho é bastante grande?
Vai de grande a médio e pequeno?
Não sei.
Nunca comprei um fato de homem.
Vai ser o máximo.
Uma freira a comprar um fato de homem.
Estou fora do meu meio.
Isto é tão surrealista.
A Hope tinha terminado
o liceu em Maio.
Ia ingressar na Força Aérea
a 15 de Junho.
Foi nesse dia.
Por pouco ela saía de Slidell.
Ela esperava ser
colocada no estrangeiro.
Gostava de viajar.
Adorava estar com pessoas
de culturas diferentes.
A 15 de Junho, um sargento
vinha buscá-la a Slidell
e conduzi-la a Baton
Rouge para se alistar.
Fui com ela comprar
coisas que precisava.
Nessa tarde, pelas cinco horas,
foi para o Coreys, onde servia à mesa.
Depois do trabalho,
ia sair com o Walter.
Quando ela ia a sair,
vi que a bainha da saia
dela estava descosida.
Ela estava com muita pressa,
por isso prendi-a
com alfinetes-de-ama.
Ela saiu porta fora.
Quando vemos uma filha sair
não sabemos que será a última vez.
Se eu tivesse sabido,
tinha-lhe dito quanto a amava.
As minhas últimas palavras,
as últimas que ela me ouviu,
foram sobre a bainha da saia.
Na manhã seguinte esperávamos
vê-la sair por essa porta.
Era o grande dia da Hope.
A nossa filhinha ia sair de casa.
O quarto dela estava vazio
e a cama estava feita.
Então telefonei para os Delacroix.
O coração caiu-nos aos pés
quando eles disseram
que o Walter também não voltara.
Por um instante pensámos...
... que talvez tivessem
fugido e casado.
Mas sabíamos que ela era
demasiado sensata para fazer isso.
Eu fui à polícia e participei
o desaparecimento dela.
Três dias depois o xerife
deu início ás buscas.
Eu fui com eles.
Percorreram quilómetros o dia
todo e não encontraram nada.
Na quinta-feira, 20 de Junho,
uns garotos encontraram
perto de Flank's Cove uma mala,
roupas e uma carteira.
Entregaram-nas à polícia.
Eles encontraram
os corpos na sexta-feira,
seis dias depois
de terem desaparecido.
O corpo da minha filha
estava nu, as pernas abertas.
O relatório do médico legista
dizia que tinha a *** rasgada.
Ao princípio não encontraram
o pin do liceu que ela usava.
As punhaladas tinham-no
enterrado no corpo.
Ela adorava esse pin. Orgulhava-se
tanto dele que o usava sempre.
Dizia:
“A turma de 88 faz a diferença.”
A polícia não nos deixou ir
à morgue identificar o corpo.
Disseram que seria
demasiado traumatizante.
Mas eu não suportava a ideia
de enterrarem esse corpo
sem eu ter a certeza
absoluta de que era a Hope.
Então telefonei ao meu irmão
que é dentista.
Pedi-lhe que a identificasse
através da dentadura.
Antes de ele meter a mão
naquele saco cheio de cal
e agarrar o queixo da Hope,
ele era contra a pena de morte.
Depois, passou a ser a favor.
Eu sabia que tinha de ser a Hope.
Era o que a razão me dizia,
mas tinha de ter a certeza.
Esta é a Irmã Helen Prejean.
Muito prazer, Emily.
Vamos para a cozinha, eu farei café.
Vi Poncelet frente-a-frente
no corredor durante o julgamento.
Não vou ser
condenado à morte, paizinho.
Vais ser executado
e eu terei muito prazer nisso.
Havia um xerife perto de mim.
Podia ter-lhe tirado a arma
e morto Poncelet ali mesmo.
Podia tê-lo morto nesse dia.
E quem me dera tê-lo feito.
Hoje seria um homem mais feliz.
- Que a fez mudar de ideias?
- Mudar de ideias?
Que a fez virar-se para o nosso lado?
Só quis vir ver se podia ajudar-vos
e rezar convosco.
- Obrigada.
Ele pediu-me que fosse
sua conselheira espiritual
que estivesse com ele quando morrer.
E o que disse?
Que o faria.
Pensámos que tivesse
mudado de ideias.
Pensámos que era por isso
que estava aqui.
Não.
- Como pode vir aqui?
- Como pode fazer isso?
Como pode sentar-se
com esse biltre?
Sr. Percy, eu nunca fiz isto.
Só procuro...
Só procuro seguir o exemplo de Jesus.
Ele disse que toda a pessoa vale mais
do que o seu pior acto.
Ele não é uma pessoa. É um animal.
Não, retiro o que disse. Os animais
não violam e matam os da sua espécie.
Matthew Poncelet é um erro de Deus.
E você quer agarrar
a mão do pobre criminoso?
Quer confortá-lo quando ele morrer?
Não havia ninguém
para confortar a Hope
quando esses dois animais
lhe enterraram a cara na erva.
Eu só quero ajudá-lo
a responsabilizar-se pelo que fez.
Ele admite o que fez?
Está arrependido?
Ele diz que não matou ninguém.
A Irmã não avalia
a enormidade da situação.
Não sabe o que é ter
um filho no ventre e dar à luz,
estar a meio da noite
com uma criança doente.
Reza e dorme tranquilamente, não é?
Os meus pais ensinaram-me
a respeitar as religiosas.
Mas acho que é melhor
deixar esta casa, Irmã.
- Lamento.
- Espere um minuto!
Se lamenta muito
e se preocupa com esta família,
quer que seja feita justiça.
Não pode ter as duas coisas.
Não pode ser amiga desse assassino
e esperar ser também nossa amiga.
Trouxe o inimigo para esta casa, Irmã.
Vá-se embora.
Descendo duma família boa
que não pode ser acusada de nada.
Tive duas famílias.
Viveria e morreria por ambas.
A sua outra família é...
Os homens da prisão. A minha família
branca, a Irmandade Ariana.
É um discípulo de Hitler?
Hitler era um líder. Admiro-o
pela sua acção. É como o Castro.
Hitler pode ter-se excedido,
mas estava no caminho certo.
O caminho certo?
Com a morte de 6 milhões de judeus?
Que faço com este homem?
Devo estar louca.
O governo não devia ter
poder para executar ninguém.
Fala Hilton Barber. Precisamos
que venha a uma reunião de estratégia.
Na entrevista ao “Shreveport Times”,
Poncelet diz
que se tivesse de voltar ao princípio,
faria algo útil,
como ingressar num grupo terrorista.
Temos de o tirar desse caminho.
Quando sai a sentença do Supremo?
- Daqui a dois dias.
- Não dispomos de dois dias.
Não temos apoio legal.
Tiveram-no três dias.
Onde estiveste ontem?
Tive de levar o meu filho ao dentista.
Um homem vai morrer e tu...
O meu filho precisava do pai.
Se não te agrada,
arranja outro advogado.
Quem ler estas entrevistas
pensa que é um tarado.
Admirar Hitler, querer ser
terrorista e matar pessoas.
Eu não disse pessoas. Edifícios
governamentais, não pessoas.
Como pode fazer explodir
um edifício sem afectar ninguém?
Não gosto do governo americano.
Você é doido.
Está a tornar tão fácil
eles matarem-no.
Surgir como um nazi louco,
que merece morrer.
É o que pensa?
- Está a tornar tão difícil ajudá-lo.
- Pode ir-se embora.
Não vou fazer isso.
Se quer que eu vá, diga.
- Alguma vez pensa naqueles jovens?
- O que lhes aconteceu foi horrível.
Principalmente porque
não tinha de acontecer.
Alguma vez pensa no que você
e o Vitello fizeram aos pais deles?
É difícil ter muita compaixão
por eles quando tentam matar-me.
Pense nisso. Os filhos são alvejados,
apunhalados, violados...
Abandonados à morte, no bosque.
Como se sentiria se fizessem
isso à sua mãe ou ao seu irmão?
- Que quereria fazer-lhes?
- Matava-os, pode ter a certeza.
Eu compreendo-os,
mas eles querem a pessoa errada.
Quero submeter-me
ao detector de mentiras.
Eles não mudarão de ideias,
mas eu quero que a minha mãe saiba
que eu não matei ninguém.
Foi óptimo. Continuem.
Temos festa.
- Herbie, como está o teu grupo?
- Bem.
- Como estás, Kenitra?
- Estou bem.
Kenitra, vamos.
Que aconteceu?
Mexericos na vizinhança.
Leram os comentários racistas do
Poncelet. O teu nome vinha no artigo.
Também perguntam
quando estiveste no Centro.
Pensam que te interessas mais
por ele do que pelas aulas.
- Desculpa, Colleen.
- Tudo bem. Continuo a gostar de ti.
Só achei que devias saber.
Arranjei isto na Goodwill.
Falei com o Bispo Norwich.
Ele dirá a missa de corpo presente.
Também arranjei uma funerária
que doará os seus serviços.
Os chefes da congregação reuniram
e temos um dos nossos cemitérios.
Se o Matt morrer, adivinha
ao lado de quem fica enterrado?
- Quem foi a última pessoa a morrer?
- A Irmã Celestine.
Lembras-te quando aquela rapariga veio
ao convento apresentar-nos o marido?
A Irmã Celestine disse:
“Ainda bem que nunca terei de
partilhar a minha cama com um homem.”
Ela adorava tanto o celibato.
Eu sei. Vai ficar ao lado
dum homem para a eternidade.
O assassino da minha filha pode ter
liberdade condicional daqui a um ano.
Só cumpriu seis anos.
Não suporto a ideia
de ele estar em liberdade
e de ela estar morta para sempre.
Morta pelo ex-marido.
Apunhalada até à morte
pelo melhor amigo do meu filho.
Ele passou a noite na nossa casa,
foi à igreja connosco nessa manhã.
Eu perdi a minha filha.
Quando a nossa filha foi morta,
levaram uma semana
para achar o corpo dela.
Olhava pela janela...
No gabinete do Promotor, trataram-nos
como se nós fossemos os assassinos.
A minha mulher pediu
o divórcio esta tarde.
Temos maneiras diferentes
de enfrentar a morte do nosso filho.
“Até que a morte nos separe”.
Nós não somos um caso especial.
À volta de 70% das pessoas
que perdem um filho, separam-se.
Eu só queria poder rir,
achar graça a alguma coisa.
Eu só queria poder rir,
achar graça a alguma coisa.
Este é o meu carro.
Obrigada por me convidar,
Sr. Delacroix.
Cuide-se, Irmã.
Que estás a fazer?
Sente-se ali.
Gosta dos meus novos aposentos?
Eu sou muito especial.
Eu sou muito especial.
Tenho este sítio só para mim.
Eles têm 10 guardas a guardar-me.
Um deles vem cá todos os 15 minutos
ver se me matei. Vigia de suicídios.
Vigia de suicídios.
Nunca tive tanta gente
interessada no que eu faço.
Quando o trouxeram para aqui?
Esta noite, já era tarde.
Não pude despedir-me da malta da Fila,
estavam quase todos a dormir.
Tratou do ***
no detector de mentiras?
Fiz alguns telefonemas,
mas ainda não tive sorte.
Então isto é o fim.
As minhas férias na casa da morte.
Três dias de sossego.
Muito tempo para ler a minha Bíblia.
Procurar uma saída.
Procurar uma saída.
Leu alguma coisa sobre Jesus?
Homem santo, fez o bem, no céu.
Louvado seja Jesus.
Há algumas passagens...
... sobre Jesus
a enfrentava a morte sozinho.
Eu e Jesus enfrentamos
as coisas de maneiras diferentes.
Ele é o-que-oferece-a-outra-face.
É preciso muita força
para oferecer a outra face.
Você gosta de rebeldes.
O que era Jesus?
Ele não era um rebelde.
- Ele era um homem perigoso.
- Que perigo há em amar o próximo?
O amor Dele modificou as coisas.
O amor Dele modificou as coisas.
Toda aquela gente a quem ninguém
ligava, prostitutas, pedintes, pobres,
finalmente tiveram alguém
que os respeitava e amava,
que lhes fez sentir o seu valor.
Tornaram-se tão poderosos
que os governantes ficaram nervosos.
Então tiveram de matar Jesus.
Como vão fazer comigo.
Não, Matt. Não tem comparação.
Jesus mudou o mundo com o Seu amor.
Você assistiu
ao assassínio de dois jovens.
Afaste-se da porta, Irmã.
Sai, rapaz.
Ele demora uma hora.
Porque não vai lá fora apanhar ar?
- Para onde o levam?
- Não posso dizer.
O Capelão Farley telefonou.
Está no portão. Vem já.
Sargento Trapp? Há quanto tempo
acha que aquela árvore está ali?
Sabe-se lá.
Vi-o fora do portão
quando Purcell foi executado.
- Parecia perturbado.
- Perturbado? Não.
Estava lá dentro
quando o executaram?
Eu sou um dos que os amarram.
A perna esquerda. E a minha missão.
Nós levamos o preso
para a câmara de execução.
Deve ser difícil.
É duro. Nessa noite nem dormi.
Penso que deve afectar
quem assiste, sejam a favor ou contra.
Faz parte do trabalho.
Esses presos têm o que merecem.
É fácil alguém entrar aqui
e fazer um julgamento
precipitado do processo.
O que superficialmente pode parecer
irracional ou desnecessário,
prova-se estar apoiado
na razão e na experiência.
Só pretendo tocar um hino
pelo Matt antes da execução dele.
A experiência diz-nos
que a música desperta a emoção.
Emoção que pode suscitar
uma reacção inesperada no preso.
Importa-se que eu solicite
a opinião do director?
Eu seria contra,
mas pode fazer o que quiser.
Obrigada.
E obrigada pelo seu tempo.
Sei que protestou à frente dos portões
durante a última execução.
- Sim.
- Conhece o Velho Testamento?
“Não matarás. Se alguém
derramar o sangue do homem,
“que o sangue desse homem
seja derramado”.
Conhece o Novo Testamento?
Jesus fala do perdão e reconciliação.
Poncelet tem de compreender
que Jesus morreu pelos pecados dele.
Se ele aceitar isso,
tem a reconciliação,
e a sua alma terá vida eterna.
Aqui não está em causa a opinião
pessoal sobre a pena de morte.
Veja os romanos.
“Que todos obedeçam
ás autoridades superiores”.
A única autoridade é a de Deus.
E os que se lhe opuserem,
serão condenados por isso.
Estou bem. Creio que desmaiei.
Por favor, podem dizer
ao Matt o que aconteceu?
- Quando terminarmos.
- Não, tenho de lhe dizer já.
- Eu faço isso, Irmã.
- Obrigada.
Boas notícias,
não é um ataque cardíaco.
Só tenho fome. Não deixam as visitas
comer na casa da morte.
Devem pensar
que nos alimentamos do ar.
É essa a máquina
que usam depois duma execução?
É, sim. Tem de ser tudo oficializado.
Ainda bem que acabaram com a cadeira
eléctrica. E melhor tirar a agulha.
Faz parte do trabalho.
Vamos buscar-lhe comida.
- Quem espeta a agulha?
- Essa informação é confidencial.
É você?
Não estamos autorizados
a revelar pormenores da execução.
Vamos buscar-lhe comida
e depois mandamo-la para casa.
Tenho de voltar para junto do Matt.
Desculpe, Irmã. Ordens
do director; por hoje acabou-se.
- Onde foi ontem?
- Não me deixaram voltar.
Está bem?
Ninguém me diz nada.
Não sabia? Eles disseram-me
que o avisavam do que aconteceu.
Levaram-me para uma sala
para me pesarem e medirem.
- Para quê?
- Para tratarem do caixão.
Quando voltei, já cá não estava.
Passei o dia sozinho.
Desculpe, Matt.
Sinto muito.
- Alguma vez se sente só?
- Claro que sim.
Às vezes, ao Domingo, quando sinto
o cheiro dos churrascos dos vizinhos,
ouço as crianças rindo
e eu estou sentada no meu quarto,
sinto-me uma idiota.
Do que eu sinto mais
a falta aqui é de mulheres.
Costumava sentar-me no bar,
a beber e a ouvir música.
Dançava até ás 3 ou 4 da manhã.
Não vou mentir, acredito no sexo.
Eu e as minhas amigas pegávamos
numa garrafa, num cobertor e em erva
e íamos para o bosque fazer sexo.
Sente-se a falta disso.
Se eu tivesse
um marido e uma família,
agora estaria com eles
e não aqui consigo.
É verdade.
Ainda bem que está aqui.
Quer que leve algum
recado à sua filha?
Esqueça-a.
Os cigarros vão dar cabo de si.
Não deixarei que eles me humilhem.
Peço a Deus que me dê força
nas pernas na minha última caminhada.
É a espera que dá cabo de nós.
Não tardaremos a saber
do recurso federal.
E o Hilton e eu temos uma reunião
com o Governador esta tarde.
Ele não fará nada. Ia arriscar
a reputação dele por minha causa?
Oxalá não tivesse falado
no Hitler e em ser terrorista.
Estúpido!
Hartman diz que não
haverá mais entrevistas.
Óptimo. Assim mantenho
a minha estúpida boca fechada.
Consegui um *** no detector
de mentiras para amanhã de manhã.
Ora aí está uma boa notícia.
O homem do *** duvida que tenham
uma leitura exacta da verdade.
- Porquê?
- Amanhã é o dia da sua execução.
Muitas vezes o *** confunde
tensão com desonestidade.
Tudo bem. É assunto arrumado.
Esteve a ler a Bíblia?
Tentei, ontem à noite.
Faz-me sono, e eu procuro
manter-me consciente.
Agradeço que tente salvar-me,
mas eu e Deus chegámos a um acordo.
Eu sei que Jesus
morreu na cruz por nós.
E sei que Ele cuidará
de mim do Dia do Juízo Final.
A redenção não é um bilhete de borla
que recebe porque Jesus o pagou.
Tem de participar na sua própria
redenção. Tem de fazer por isso.
Devia ler o Evangelho de S. João,
capítulo 8, onde Jesus disse:
“Conhecerás a verdade
e a verdade libertar-te-á.”
Vou ler. Gosto disso:
“A verdade libertar-te-á.”
Passo no detector de mentiras
e está o assunto arrumado.
Matt...
... se você morrer,
quero ajudá-lo a morrer com dignidade.
E não vejo como o posso fazer,
se não assumir o papel que teve
nas mortes do Walter e da Hope.
Hilton Barber, o Bispo Norwick.
A situação é a seguinte.
O Governador Benedict apoia
com relutância a pena capital.
Ele tem o poder de deter a execução
e salvar a vida dum homem.
É o último vestígio
o direito divino dos reis.
Mas temos de apelar para ele
a nível pessoal, sem espavento.
Por isso, solicitei
um encontro privado.
Devem compreender
que ao representar o Estado,
tenho de fazer cumprir as leis.
Tenho de abdicar
do meu ponto de vista pessoal
e cumprir o desejo expresso pelo povo.
Examinarei o caso cuidadosamente.
Mas se não houver uma prova
de inocência indubitável,
eu não interferirei no processo.
Ainda temos o tribunal, Irmã.
Podemos ser bem sucedidos
num dos casos.
Helen? Vem jantar.
Tu procuras um amor que é tão
grande que engloba todo o mal.
As anunciações são vulgares.
As incarnações são raras.
Tu não és uma santa, Helen.
- Sentes-te bem?
- Sinto. Estava a sonhar.
- A que horas tens de estar lá?
- As nove em ponto.
- Acertaste o relógio?
- Sim.
É tão estranho.
Amanhã, um homem
será morto à minha frente.
Ele admitiu alguma coisa?
Não.
Ele está tão cheio de ódio
que não confia em ninguém.
Afasta-me sempre.
Estás metida numa alhada.
Lembras-te quando
me puseste um olho ***?
- Tinha febre.
- Deliravas, gritavas.
Tentavas fugir para a rua.
Deste-me um soco no olho
e disseste que me odiavas.
Gritavas, mas eu segurei-te,
segurei-te com força.
Porque os braços duma mãe são fortes
quando a filha está em perigo.
Esta noite não dormi nada.
Não tomei o remédio para os nervos
que eles queriam dar-me.
Encaro a morte de frente.
Matt, quero que saiba que respeito
a sua necessidade de privacidade.
Se quer estar só ou quer
que eu esteja com a sua família,
eu compreendo. Não ficarei ofendida.
Deve estar aqui,
se não for muito incómodo.
Quero ter alguém
ao pé de mim até ao fim.
Lá estarei.
Ainda se eu soubesse
que morria logo. Sentirei?
Primeiro vão-se os pulmões.
Como uma...
... asfixia rápida.
Deve doer.
Eles dizem que o corpo nem se mexe.
Nem treme.
A minha pobre mãe.
- Alguma notícia do tribunal?
- Ainda não. E um bom sinal.
Talvez signifique que vêem
algo importante na petição.
- Tenho de desligar.
- Obrigada, Hilton.
Diga-me uma coisa, Irmã.
Que faz uma freira num sítio destes?
Não devia estar a ensinar crianças?
Sabe o que esse homem fez?
Como matou aqueles jovens?
Eu não desculpo o envolvimento dele.
Mas não vejo sentido em matar gente
para dizer que é errado matar.
Sabe que a Bíblia diz olho por olho.
Sabe que mais pede a Bíblia?
Morte como castigo por adultério,
prostituição, homossexualidade,
violação de locais sagrados,
profanação do Sabbath,
desprezo pelos pais.
Não discutirei a Bíblia
com uma freira porque perderei.
Ela só esteve uns minutos ao telefone
e rendeu-se logo aos encantos do Matt.
Tive de lhe tirar o telefone.
Querias roubar-me a pequena.
Ela parece uma miúda estupenda.
Pois é. Mas não é assim tão miúda.
Cuida dela, Craig.
Não faças nenhuma estupidez.
Ela parece-se...
Como se chamava a namorada
que tiveste no liceu?
Tive muitas namoradas no liceu.
- Aquela que tinha um nome estranho.
- Um nome estranho.
Maddie, Maldy...
- Madrigal.
- Madrigal Parmelee. Era tão boa.
Era uma doida.
Era uma jovem prendada.
- E tu, Troy, tens namorada?
- Não.
Porquê?
Não tenho tempo.
Tenho de pescar e acampar.
- O Troy comprou uma tenda nova.
- De que género?
Da tropa.
Não como essas amaricadas.
- Conta ao Matt a noite no quintal.
- Acampou no quintal.
Eu obriguei-o a vir para casa.
Estava preocupada.
Fui lá e fi-lo vir para dentro.
- Não foi isso que aconteceu, mãe.
- Vá. Diz-lhe.
Eu e o meu amigo Paul montámos
a tenda e fizemos o nosso jantar.
Fizemos uma fogueira
e uns cachorros.
E depois? Continua.
- Pela meia-noite,
- Não, eram 9 horas.
ouvimos um animal qualquer.
- Que género de animal?
Era grande.
- Um coelho?
- Uma sarigueia?
- Um esquilo?
- Um rato?
- Era grande e repelente.
- Olha-me nos olhos, homenzinho.
Foste para casa porque a mãe
mandou ou porque tinhas medo?
Diz a verdade.
Olha para mim.
Perguntam-me pelo teu enterro.
Eu fico furiosa e digo
que tu ainda não morreste.
Desculpem.
Temos de acabar com a visita.
Ainda é cedo. O regulamento diz
que podem ficar até ás 6:45.
São horas de se retirarem.
Tome, Poncelet.
Tenho as minhas coisas
nestes dois sacos. Levem-nas.
Não quero que seja a prisão
a enviá-las.
Craig, divide as coisas...
Menos as botas de Marion.
Quero levá-las para a execução.
Põe-te de pé. Despeçam-se.
Até sempre, Matt.
- Adeus
- Nada de despedidas, homenzinho.
Ela não pode abraçá-lo?
Desculpe, Irmã.
Razões de segurança.
Não chore, mãe.
Não quero que chore.
Não me despeço agora.
- Telefono-lhe logo.
- Até sempre, Matt. Força.
Não chore, mãe.
Eu depois telefono-lhe.
Gostamos muito de ti, Mattie.
Se abraçasse o meu filho,
nunca mais o largava.
A minha mãe está bem?
Está óptima, Matt.
Nunca tinha comido camarão.
É muito bom.
Que disse o ***
do detector de mentiras?
Que as respostas revelaram tensão.
Os resultados foram inconclusivos.
O perito teve a certeza?
A certeza absoluta?
Senti-me bem a responder.
Não senti tensão nenhuma.
Não posso ter falhado.
Teria de ser robot ou louco
para não sentir tensão agora.
Não posso acreditar
que o *** não saiu bem.
Vamos falar no que aconteceu.
Sobre aquela noite.
Não quero falar sobre isso.
Saiam.
Estão a violar
uma propriedade privada.
Estão presos. Saiam do carro.
- Vamos já embora. Não sabíamos.
- Saiam do carro!
- Para onde vamos?
- Há um barzinho algures por aqui.
Não podemos deixá-los ir embora.
- O nosso patrão vai ficar fulo.
- Talvez ele os deixe partir.
Cá está o bar. Querem uma bebida?
Ajoelha-te.
Estou danado com esses putos
por estarem no bosque,
com os pais deles
por virem ver-me morrer.
Danado comigo mesmo
por deixar o Vitello safar-se.
Mas eu tenho umas coisas a dizer
aos Percy e aos Delacroix.
Quer que as suas últimas
palavras sejam de ódio?
Clyde Percy disse que quer ser ele
a injectar-me.
Pense como ele deve estar irado.
Ele nunca mais vai ver a filha.
Nunca mais vai abraçá-la, rir com ela.
Privou esses pais de tanto, Matt.
Na vida deles só há tristeza.
Foi o que você lhes deu.
Que o levou a estar lá naquela noite?
Estava drogado.
Não culpe a droga.
Metia-se com casais semanas,
meses, antes disso acontecer.
- O que foi?
- Que quer dizer?
Respeitava o Vitello?
Quis impressioná-lo?
- Não sei.
- Podia ter-se ido embora.
- Ele estava marado.
- Não o culpe.
Culpa o Vitello, o governo,
a droga, os negros.
Culpa o Percy
e os pequenos por estarem lá.
Onde está o Matthew Poncelet nesta
história? É um inocente? Uma vítima?
Eu não sou uma vítima.
Poncelet.
O recurso para o Tribunal
Federal foi recusado.
Sinto muito.
Irmã, por favor
venha para o corredor.
Estarei lá fora.
Não, não falhou. Agradeço tudo
que você e os outros fizeram por mim.
Que é que ela está a dactilografar?
Documentos
para as testemunhas assinarem.
Não falhou. O sistema judicial
deste país é que me abandonou.
Vou para aí imediatamente.
Meu Deus, ajudai-me.
Este sítio é tão horrível, Senhor.
Tão frio. Este crime, tão calculado.
Não o deixeis sucumbir, Senhor.
Ajudai-o a ser forte.
Ajudai-me a ser forte.
Ajudai-nos a ser fortes. Ajudai-me.
Eles raparam-me a barriga da perna.
Porquê?
Parece que receiam não
apanhar uma veia do braço.
- Que número é esse?
- Pu-lo aí quando estive em Marion.
Se me matassem,
podiam identificar o meu corpo.
Doeu quando fez isso?
Vendo estas tatuagens vai
pensar que eu sou má pessoa.
Tem o corpo mais colorido
do que eu pensava.
Eles tentaram dar-me duas injecções.
Um sedativo e uma anti-histamina.
- Um anti-histamina.
- Sim.
Se eu tiver uma reacção alérgica
à primeira injecção, é um sarilho.
Quero dar-lhe...
... a minha Bíblia.
Pus-lhe a data.
Obrigada, Matt.
Afaste-se da cela, Irmã.
Está na hora
de telefonar para casa.
Fica?
Fico. Só quero deixá-lo à vontade.
Que estás a fazer?
Sabes o que estou a fazer
e tu o que é que estás a fazer?
Estás a roubar o telefone?
- Vais dormir na tua tenda está noite?
- Vou.
Não chore, mãe.
Eles pensaram que sim.
Eu era pequeno.
REGISTO DE MORTES
MATTHEW PONCELET, 4/13/94
ANGOLA
Ouço. Deixe-me falar com ele.
Olá, Troy. Cuida da mãe, sim?
Cuida da mãe.
Mãe? mãe?
Gosto muito de si, mãe.
Fui falando...
Disse à minha mãe
que gostava muito dela.
Falei com os rapazes.
Detesto despedidas.
Disse-lhes que, se puder,
telefono-lhes antes de me ir embora.
Que foi, Matt?
A minha mãe foi sempre dizendo:
“Foi esse Vitello.”
E que eu nunca me devia ter
envolvido com ele.
Eu não queria que ela pensasse isso.
Foi como disse.
Eu podia ter-me afastado.
Não o fiz.
Fui uma vítima.
Fui um cobarde.
Ele era mais velho e duro como ferro.
Eu procurava ser tão duro como ele.
Não tive coragem de o enfrentar.
Eu disse à minha mãe
que fui um cobarde.
Ela continuou a dizer que não fui eu.
“Não foste tu, Matt. Não foste tu.”
A sua mãe ama-o, Matt.
O rapaz.
- Walter...
- O quê?
... eu matei-o.
- E a Hope?
- Ela não.
Violou-a?
Violei.
Assume a responsabilidade
de ambas as mortes?
Assumo.
Ontem à noite,
ajoelhei-me e rezei por eles.
Nunca tinha feito isso.
Há universos de sofrimento
que só Deus pode alcançar.
Fez uma coisa horrível, Matt.
Mas agora tem uma dignidade.
Ninguém pode tirar-lha.
É um filho de Deus, Matthew Poncelet.
Nunca ninguém
me chamou um filho de Deus.
Chamaram-me filho sabe-de-quê
muitas vezes, filho de Deus nunca.
Só espero que a minha morte
dê algum alívio a esses pais.
Talvez a melhor coisa que pode fazer
pelos Percy e pelos Delacroix
seja desejar-lhes paz.
Sabe, eu nunca soube
o que era o amor.
Nunca amei uma mulher nem ninguém.
Parece que tenho de morrer
para encontrar o amor.
Obrigado por me amar.
O tempo voa.
Estou com frio.
Pode dar-lhe um casaco? Ele tem frio.
Que é feito da canção que ia tocar?
O hino?
O regulamento proíbe
música na prisão.
Portanto não me deixam tocar.
Sabe a letra. Pode cantar.
- Não sei cantar.
- Não faz mal. Cante.
Se enfrentares o mar tempestuoso
Não te afogarás
Se atravessares
Chamas alterosas
Não te queimarás
Se enfrentares
O poder do Inferno
E a morte
Estiver à tua beira
Sabe que eu estarei
Sempre ao teu lado
Não tenhas medo
Eu estarei
Sempre contigo
Anda comigo
E descanso terás.
Obrigado.
Vá para o corredor, Irmã.
Dêem-me as minhas botas!
Quero as minhas botas!
Um adulto enfrenta
a morte de fralda e chinelos.
É o fim! Acabaram-se as grades,
as celas, a vida enjaulado!
Irmã Helen...
... vou morrer.
Conhece a verdade.
A verdade libertou-o.
Deus sabe a verdade
a meu respeito.
Vou para um sítio melhor.
Não estou preocupado.
Está bem?
Sim. Estou bem. Cristo está aqui.
Não estou preocupado.
Quero que a última coisa que veja
neste mundo seja o rosto do amor.
Portanto olhe para mim
quando eles fizerem aquilo.
Olhe para mim.
Eu serei para si o rosto do amor.
Sim, senhora.
Está na hora, Poncelet.
- A Irmã Helen pode tocar-me?
- Sim.
A última caminhada!
“Não tenhas medo.
“Porque eu ordenei-te,
chamei-te pelo teu nome.
“Tu és meu.
“Se cruzares o mar,
eu estarei contigo.
“Se atravessares o fogo,
“não ficarás queimado.”
- Eu recebi a tua alma.
Em nome do Pai,
do Filho e do Espírito Santo.
Não pode passar daí, Irmã.
Irá ver a minha mãe
de vez em quando?
Sim, Matt. Prometo-lhe.
Quer dizer algumas
últimas palavras, Poncelet?
Quero, sim.
Sr. Delacroix.
Não quero partir deste
mundo com ódio no coração.
Peço-lhe perdão pelo que fiz.
Fiz uma coisa horrível
ao tirar-lhe o seu filho.
E nós?
Sr. e Sra. Percy, espero
que a minha morte vos dê algum alívio.
Só quero dizer
que penso que é errado matar,
seja quem for que o faça.
Seja eu, vocês ou o vosso governo.
Amo-a.
INÍQUO
FIM
Que o amor de Deus e a paz
de Nosso Senhor Jesus Cristo
nos abençoe
e nos conforte,
e meigamente enxugue as lágrimas
dos nossos olhos. Ámen.
Que Deus Todo-poderoso
vos abençoe,
em nome do Pai,
do Filho e do Espírito Santo.
Ide na paz
e no amor de Cristo.
Louvado seja Deus.
Vais dar coragem à tua mãe.
Sr. Delacroix.
- Irmã.
- Que prazer vê-lo.
Não sei porque estou aqui.
Há em mim muito ódio.
Eu não tenho a sua fé.
Não é fé.
Oxalá fosse tão simples.
É trabalho.
Talvez...
... pudéssemos ajudar-nos a achar
uma maneira de ultrapassar o ódio.
Não sei.
Penso que não.
Tenho de me ir embora.
Boa tarde.
Herbie!
GOSTAMOS MULTO
DE SI, Irmã HELEN
PARA
LEE ROBBINSI
E TELMA BLEDSOE