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ABERTURA
Helena de Tróia
Eis Tróia há 3000 anos,
uma cidade de destino,
situada de forma a dominar
o Helesponto,
conhecido hoje
como o Dardanelos.
Era a única rota marítima
de ida e volta para o leste.
Como resultado,
Tróia tornou-se próspera
e um tentador prémio de guerra
para as nações gregas.
Os troianos ainda se lembravam
de os gregos, liderados por Esparta,
terem saqueado e incendiado
a cidade dos seus antepassados.
Tinham preparado defesas resistentes
contra a hipótese de futuros ataques.
Era por isso que a nova Tróia,
a sua cidade reconstruída,
era protegida por muralhas imponentes,
um abrigo intransponível
para um povo feliz
apaixonado pela beleza.
Na praça do palácio
e nas ruas movimentadas,
os cidadãos activos gozavam
os benefícios da paz,
como se esta era de despreocupação
fosse durar para sempre.
Lá ia o Lorde Eneias,
sobrinho do Rei Príamo,
a caminho do palácio,
onde o futuro de Tróia estava
a ser estudado pelo conselho real.
Excluímos o entendimento
entre as nacões
e já deitámos o veneno. Os troianos
andam em sobressalto com os boatos,
a apontarem o dedo uns aos outros.
Só há uma solucão.
Faz como quiser. Vai a Esparta.
Vai onde quiseres,
mas não tentes arrastar contigo
o destino de Tróia.
Que destino? Viver como uma amêijoa
dentro da concha?
Vivemos bem.
Tributamos os mercadores no canal
marítimo. Está-nos no sangue.
Que estupidez! Os nossos navios
de mercadorias têm de se fazer ao mar.
Como, se cada porto é um inimigo?
- Estou farto dos teus sonhos loucos.
- Cuidado, irmão.
Páris sempre conseguiu
acabar contigo.
E tu consegues arrasar-nos
aos dois.
- Diz-lhe que ele é um tolo, Heitor!
- Meus filhos...
...tolo é o homem que faz
de um debate uma discussão.
Páris, abençoo o teu plano
de navegar para Esparta.
Sei que não irás implorar pela paz.
Tentarei convencer os gregos
que é aconselhável um acordo.
Eu convencê-los-ia.
Levaria 100 navios de guerra
e pintava de *** o solo de Esparta!
Não duvido, Polydorus,
e criarias uma guerra interminável.
E tu, Heitor,
tens alguma aspiração...
...além da esgrima e do boxe?
- Sim, senhor.
O dardo e o disco.
O Heitor é um bom filho, Príamo.
E um bom marido, Majestade.
Isso não é glória que chegue?
Se nos dá licença,
o navio do Páris vai partir.
Os deuses aprovam o dia
e a hora?
Os auspícios e as profecias são bons,
com uma excepção.
Uma sacerdotisa transtornada
do templo.
- A minha filha.
- Não fiques zangado, Príamo.
- A Cassandra está doente.
- Doente da cabeca.
Levanta-te, Páris...
...e vai.
A virgem Cassandra levantou
uma questão que me preocupa muito.
Parece que o Príncipe Páris
venera apenas uma deusa.
- Afrodite.
- Não sei se venero seja o que for.
Não.
Admiração é mais a palavra.
Admiração pela beleza
de uma imagem de mármore.
Não foi a deusa da beleza que nos
ensinou a armar-nos contra o inimigo,
mas Atena, a deusa da sabedoria
e a padroeira
dos cavalos de guerra.
Atena não aprecia...
...essa tua adoracão solitária.
Nem aprecia que empreendas
uma missão de paz.
E suponho que o seu cavalo malvado
aparecerá e me espezinhará.
Muito bem.
Ele que venha, senhor,
se é esse o preço de viver
num mundo de fábulas.
Não digas isso, Páris.
Não procures a paz noutro lugar,
querido irmão,
até antes teres apaziguado Atena.
Minha pequena Cassandra,
não pode haver adiamentos.
Abençoa a minha viagem.
Não posso abençoar
o que vejo no teu futuro.
Cassandra!
- Pára com isso, Cassandra.
- Mas é verdade, pai.
O que vejo e sinto é real.
Vai, Páris.
Vem, Cassandra.
- Vem descansar um pouco.
- Como posso, mãe?
Quem me dera
que não me tivesse sido dado
esta agonia com que vivo.
Páris!
Não vás, Páris!
Por favor, não vás!
- Tenho de partir imediatamente.
- Se amas Tróia,
não nos submetas
a essa coisa terrível!
- Não era eu quem mais amavas?
- Sim, mas...
...o barulho, a tempestade
está a aumentar!
Os gritos dos cavalos,
os gemidos dos moribundos!
- Cuidem dela.
- Minha querida...
Talvez não pudesse ser
de outra forma.
O que tem de ser,
ninguém pode mudar.
Onde estamos hoje? Em Elísio?
Longe disso. Estamos
a aproximar-nos de Esparta.
Uma terra onde um homem corta
o braço para provar a sua valentia.
- Que aspecto terão as mulheres?
- O meu profundo primo Eneias.
Para ter pensamentos profundos,
temos de pensar em mulheres.
Elas trazem toda a vida a este mundo
e também muita morte.
- Elas influenciam o destino dos homens.
- O meu destino não.
O que se passa?
A brisa aumentou.
Mas não gosto do bafo quente
que ela traz.
Não é nada, apenas uma nuvem
que está de passagem.
Toca a subir o mastro!
- Ordeno-vos! Subam o mastro!
- Soltem a vela!
As cordas estão em mau estado e os
homens recusam-se a subir o mastro.
- Vou chicoteá-los!
- Não!
Só há uma forma de curar
essas fantasias.
Não, meu príncipe, você não!
Não!
Páris!
Páris!
Páris!
Páris! Páris!
Páris!
Megas!
Afrodite.
O quê?
Um navio teve azar.
Ela existe.
- Quem?
- A mais bela das deusas.
Esta criatura é louca.
Mas é uma loucura agradável.
Que navio era o seu?
O Golfinho...
...de Tróia.
- Um troiano!
Solte-o, Andros.
Talvez possamos aquecê-lo um pouco
antes de o entregarmos aos soldados.
Mulheres! Porquê aquecer um homem
para depois lhe cortar a garganta?
Tapem-no, depressa!
Procuramos a nossa soberana,
a Rainha de Esparta.
Ela veio à costa para visitar
uma ama da sua infância.
- Majestade.
- Dei ordem para não ser incomodada.
Aconteceram coisas que
tornaram esta praia perigosa.
Foi avistado um navio desconhecido
a sair da tempestade.
Não conseguimos ir atrás dele.
O mar estava revolto.
Pode ter sido troiano
e pode ter deixado espiões.
Vocês vêem fantasmas troianos
por todo o lado.
- Não era um navio fantasma.
- O emblema da Casa Real de Tróia.
O rei quereria que eu insistisse que
a sua rainha regressasse de imediato.
Digam ao Rei Menelau que a Cora
está a tratar muito bem de mim.
Agora, podem ir.
Muito bem, Majestade.
Andraste!
- Ajuda-nos a levar este homem.
- Um homem, Majestade?
Que interessante!
Não posso correr o risco
de esconder um troiano.
E se ele for soldado e estiver
apenas a fingir? Tem de ter cuidado.
As mulheres que têm sempre cuidado
perdem muita da vida, Andraste.
Ele parece não recuperar.
Mas o coracão bate.
Dá-lhe um pouco de caldo
e vamos entregá-lo aos soldados.
- Óptimo.
- Não! Eles vão matá-lo.
- Continuo a dizer óptimo.
- E eu diria o mesmo...
...se ele fosse tão feio como tu.
- Obrigado.
A quem devo
tão galante defesa?
A ninguém importante.
Sou apenas uma escrava.
Fale-nos de si, troiano.
Eu mencionei isso?
Tenho a memória turva.
Mas lembro-me que lhe achei
uma visão.
Uma deusa.
Querida Afrodite...
...permita-me apresentar-me.
- Príncipe Páris de Tróia.
- Dispensamos a petulância.
Também é petulante
para uma escrava.
- Silêncio! Está a falar com...
- Uma escrava do palácio, Andros.
Que importância tem isso?
Falo a verdade,
sou o Príncipe Páris.
Vim propor um tratado de paz
ao Rei Menelau.
Mas, claro, não acredita em mim.
Os meus documentos
de identificação,
todas as ofertas que trazia
para a Corte de Esparta...
A minha tripulação não se
aproximará de um porto espartano.
Devem achar que os deuses
me lancaram raios.
Talvez eu acredite em si.
O mar prejudicou a sua aparência,
mas não os seus modos.
Tem de partir ao anoitecer.
Siga a costa. Chegará a uma enseada
onde atracam navios fenícios.
- Não. Ainda tenho uma missão.
- Faça o que lhe digo!
Os nossos soldados têm o hábito
de espetar punhais em desconhecidos.
E por que haveria isso
de a preocupar?
Não interessa. Os sentimentos
de uma escrava não têm importância.
Para mim, têm.
Em qualquer lugar menos em Esparta,
alguém tão belo seria rainha.
Em Tróia, escreveríamos canções
sobre si.
O Rei Menelau
não o permitiria aqui.
Porque você ofuscaria completamente
a rainha dele.
Ela ficaria magoada
se ouvisse isso.
Conhece-la?
Ela é minha dona.
Sou a sombra dela.
E sempre achei que a conhecia.
Não, acho que ninguém conhece
a Rainha Helena muito bem...
...incluindo a própria Helena.
- Nem mesmo o rei?
O grande poder não necessita
de conhecimento.
Espere. Só lhe pergunto isto...
...porque tenho de ir ao palácio.
- Não se arrisque!
Tenciono ser discreto,
por isso, prepare-me.
Se Menelau não me ajudar,
pedirei à rainha.
Não pode fazer isso! Eu...
Se fosse velho e feio,
então talvez ela o pudesse ajudar.
Mas você não é velho nem feio.
É tarde, Andros. Temos de levar
o peixe para o mercado.
Sim. Se os soldados o encontrarem
aqui, não quero estar envolvido.
Eu não me importaria.
Temos de voltar para o palácio.
Já fiquei aqui demasiado tempo.
Prometa-me...
...que voltaremos a encontrar-nos.
Já podes voltar.
Mantimentos, para a sua viagem
de regresso.
Ainda tem esperanças
de que eu não vá ao palácio?
Mais do que nunca.
Os reis da Grécia reuniram-se lá
para estudar uma guerra contra Tróia.
Então a minha missão
vem em boa hora.
- Quando é que se reúnem?
- Amanhã, talvez.
Mas esta noite...
...somos só nós os dois.
Sob a magia do luar.
Veja o que eu lhe trouxe.
Minha querida escravazinha...
...não quero o que rouba
do palácio.
Só quero o que eu roubo
do palácio.
Não, meu príncipe.
Está bem,
vou pedi-la emprestada.
Mas vamos ser honestos
quanto a isso.
- Vou oferecer-me para a comprar.
- Não! Isso seria a minha morte!
Que disparate!
Explico à rainha que, para mim,
você não é uma escrava,
mas sim a minha futura
Princesa de Tróia.
Largue-me, Páris.
Não acredita que eu sou capaz
de amar uma escrava?
Sim, acredito.
O meu coracão acredita
e ama-o.
O meu coração é seu, Páris,
mas eu nunca poderei ser.
Não deve falar com a rainha
nem com ninguém do palácio,
e este momento terá de ser
o nosso último momento.
Não me pergunte porquê.
Chame-lhe magia,
chame-lhe um sonho,
e nunca o conte
a ninguém.
Escutem o nosso anfitrião espartano,
o Rei Menelau.
- De certeza que o Ulisses vem?
- O navio dele não vinha longe do meu.
Esse grande itacense recusou-se
a deixar a mulher e a quinta.
Está tão farto de guerra,
que não largou o arado.
Até atirarmos o filho para a frente,
para o convencer que a glória da Grécia
vem antes da satisfação pessoal.
Podes ficar com a glória.
Eu prefiro o ouro de Tróia.
Não a minha parte, irmão.
Ulisses, Rei de Ítaca!
Saudações, amigo.
Conhece toda a gente.
Ájax, Príncipe de Salamina.
Nestor, Rei de Pylos.
Diomedes, governante da Etólia.
E acho que conhece o meu irmão,
o Rei Agamémnon de Micenas.
Saudações, amigos piratas.
A guerra que planeamos é justa,
Ulisses,
é uma guerra de ataque defensivo.
Uma justiça clara...
Acha que os troianos construíram
uma cidadela para os amantes da paz?
Já ouviu falar nos filhos
de Príamo?
Polydorus implora pela guerra!
Heitor espera apenas uma provocação.
Páris é exímio com o cesto,
o arco e o dardo.
Acham que eles querem paz?
Mais uma razão para não
fazermos planos sem Aquiles.
Mas ele odeia a mim
e ao meu irmão.
Ele odeia-o quase tanto
quanto gosta de guerra.
Para se escudar de qualquer
tentação de se juntar a nós,
ele escondeu-se, em segurança,
numa casa de mulheres.
Foi lá que o encontrei,
escondido de toda a persuasão...
...vestido de mulher!
E persuadiu-o?
Sim. Ele está nos estábulos,
a tratar dos seus cavalos.
Aquiles, uma rapariga que cora.
Vou louvá-lo pela beleza
do seu rosto e da sua figura.
O homem que se autovangloriza.
Louve-o, Menelau.
Louvo-o, Aquiles.
E eu desprezo-o.
E a si também, Agamémnon.
Mas parece que temos de nos unir,
por isso, estou aqui
para vos liderar.
- Para nos liderar, Aquiles?
- Claro.
Eu e o meu grande amigo
Pátroclo.
Desde meninos que podíamos
enfrentar um exército sozinhos.
- Duvido.
- Quem duvida?
Eu, Ájax.
O meu imitador.
Seu repugnante caçador de glória.
Para o imitar, teria de usar
três camadas de armadura.
É aí que ele vai buscar a sua fama
de invencível.
Silencie este tolo, Menelau.
Preferia que ele não me irritasse.
A verdade é que a pele dele
é tão frágil quanto a sua vanidade.
E sobretudo o seu calcanhar.
- Ele nem suporta cabedal nos pés.
- Não luto com os pés.
Fique à vontade, meu príncipe.
Eu trato deste imbecil.
Chega. Temos de nos unir.
Impossível.
Nunca estivemos unidos
nem nunca estaremos.
Mantenham os meus cavalos
preparados.
Pátroclo, vamos embora.
Não vejo nenhum objectivo ético
para um ataque a Tróia.
- Nem eu.
- Esperem. Esperem.
Falou de ética.
Eis o sinal de um navio troiano
a percorrer a nossa costa.
Não é um navio mercante inofensivo,
mas um navio real da Casa de Príamo.
O navio era meu, Majestade.
Sou Páris de Tróia.
- É o Rei Menelau?
- Sim.
Desculpe apresentar-me assim, mas
uma tempestade atirou-me borda fora.
Felizmente, esta reunião
da realeza grega
torna a minha missão mais fácil.
- Como sabia que estávamos aqui?
- Peço a indulgência de sua Majestade.
Fui poupado ao trabalho
de viajar até cada rei,
se rejeitar as oferendas de paz
que trago de Tróia.
- O quê?
- Tróia não tenciona fazer guerra?
Está enganado, Menelau.
Pare com isto
ou perde o seu saque troiano.
- Onde encontraram este impostor?
- Ele veio ao palácio.
- Pensei que quisesse interrogá-lo.
- Interrompeu o conselho!
- Oica-o.
- Isto é assunto nosso.
Ele não passa de um vagabundo.
Vejam os trapos que veste.
É hábito estes bobos errantes
virem ao meu palácio
e têm sempre um talento ágil.
O que faz, para além
deste embuste real?
Parece que tento fazer
o impossível.
O cesto.
Se ele é mesmo Páris,
deve dominar o cesto.
- Brilhante, irmão. Brilhante.
- Ouviu o Ájax, Aquiles?
Aquiles está cansado da viagem.
Aquiles não ganhou fama
lutando contra criancas.
Esta Esparta, meu filho,
é um ninho de víboras.
- Farei com que não...
- Se ofendermos este aspirante...
...deixá-lo-ei ir.
- Não.
Afinal, parte da minha tarefa
era espalhar a civilização.
Mas tenho de definir um acordo.
Se eu for bem sucedido neste combate,
acreditarão que sou Páris
e ouvirão os termos de paz
de Tróia?
Se ainda tiver a cabeca
nos ombros, sim.
Páris!
Usou uma técnica de persuasão
espartana comigo: Coragem.
A coragem quase me abandonou
face à ideia de enfrentar Ájax.
Descanse.
Amanhã, falamos...
...sobre as suas aventuras,
a sua viagem,
e o encanto secreto
que me faz chamá-lo "amigo."
E Tróia chamará "amiga"
a Esparta.
Alpheus, aloje o nosso convidado.
E, Alpheus...
...dizem que os troianos
apreciam muito a beleza.
Encontre-lhe uma escrava
e certifique-se de que é bonita.
Há uma escrava no seu palácio de
quem me tornaria escravo com prazer.
Menelau!
Ontem, manifestaste o desejo
de me apresentar aos teus convidados.
Um desejo orgulhoso.
Helena, Rainha de Esparta,
esposa de Menelau...
...apresento-lhe Páris,
Príncipe Real de Tróia.
O que veio cá fazer, troiano?
Estudar a nossa arte e cultura?
Sim, Majestade.
A arte de autopreservação.
Petulância troiana!
Se me permites, Majestade,
receberei os gregos
numa altura mais propícia.
Soube que sua Majestade foi
verdadeiramente espartana esta tarde.
O meu coração comportou-se tolamente.
De certeza que Menelau
o ouvia a bater.
Manda os teus criados saírem.
Podem ir.
- Saiam!
- Quando é que aprendes?
Ele é surdo-mudo.
O que achaste do troiano?
- Viste o que achei.
- Sim, vi o que achaste.
Deste troiano, pelo menos.
Que jogo é este
que estás a jogar?
Helena, revelas-te.
Ele também.
Fala claramente. Se te ofendi
de qualquer forma, castiga-me,
mas não acolhas um estranho com
uma mão e o ataques com a outra!
Agora, gostamos de troianos?
Posso fazer várias coisas com ele.
Posso mandá-lo para casa...
...com outra aparência.
Posso mantê-lo refém para
conseguir a submissão de Príamo.
Antes imaginava que tinha casado
com um rei.
- E casaste.
- Casei com um ladrão.
Por que casaste com ele?
Por que casaste com ele?
Quando um rei tira algo,
não rouba a ninguém.
Quando mata, não é homicídio.
Está apenas a fazer justiça.
O método dos Espartanos.
Compreendo isso, tu não.
Compreendo o suficiente.
Então compreende que o teu lugar
é no palácio e em mais lado nenhum!
Já tinhas visto este homem.
Admite-o.
O teu silêncio condena-te.
Saíste do palácio secretamente.
Admite-o. Conheces esse homem.
Silenciosa como sempre. Não falas
com o teu marido. Sou teu marido!
- Não.
- Chama-me "marido".
Chama-me "marido."
Sei de muitas formas
de lidar com o teu troiano, Helena.
Andraste.
Sou a escrava que foi enviada
para o Príncipe de Tróia.
A criada da rainha?
O rei ordenou que eu entretivesse
os seus convidados.
Convidado? Mal ele sabe
que está numa prisão.
Tenho ordens
para não o informar disso.
Tem de ser o próprio Rei
a dar-vos a ordem?
O rei já está mal humorado
que chegue.
Digo ao rei que disse isso?
Vá à sua vida,
sua arruaceira.
Devia estar na cama.
Sim, devia, mas...
Mas a sua senhora mandou-a
para me pregar mais uma partida.
Não. Mandou-me
para o ajudar a fugir.
Fugir?
Aqueles dois soldados
de vigia ali em baixo...
...também me vão ajudar?
Você é um prisioneiro.
O rei planeia torturá-lo.
Tem de partir rapidamente.
Volte para a cabana do pescador.
Eu irei consigo
uma parte do caminho.
O meu bom amigo Menelau.
- A porta também está guardada.
- Então que hipóteses tenho?
A Helena lembrou-se
de o fazer passar por mercador.
Qualquer idiota veria
que é um príncipe.
- Soldados.
- Pescador!
- Sim?
- Pescador!
Sim?
- O que querem?
- Um copo de vinho.
- Temos as gargantas salgadas da brisa.
- Cora, o odre do vinho.
O capitão é um idiota. Ele acha que
o homem voltará a nado para Tróia?
A esta hora, já deve estar
no meio da floresta.
Tomem. Levem isso convosco.
Vá e lembre-se que haverá
soldados ali em cima,
portanto, é melhor ir pelas rochas
sob o penhasco.
Chegue à enseada depois da torre.
Lá, um barco o levará o navio.
As asas de Mercúrio o acompanhem.
De que está à espera?
Foi só uma tola esperança.
- Tinha esperanças de que ela viesse.
- Aqui?
Ela mandou-lhe roupa
e conseguiu um navio fenício para
o levar para casa. O que queria mais?
Não esperava mesmo
que ela viesse.
- Só tinha essa esperança.
- Nem pense nisso.
Se ela aparecesse aqui
e fosse reconhecida...
Eu sei.
Gostaria de poder recompensar-vos
pela vossa gentileza.
Quanto à rainha...
...diga-lhe que ela estará presente
em todos os meus sonhos.
Espera!
O barco ainda não está
na enseada!
Helena.
Andraste, estás livre.
- Afasta-te o mais possível de Esparta.
- Majestade...
Deixaste claro a Adelphus
o que eu disse?
- Ele já vai longe.
- Então, podes ir.
Às vezes, a liberdade é feita
de mercúrio.
Vá, despacha-te.
Helena.
Helena é a rainha.
A rapariga que pensavas que conhecias
não tinha nome nem realidade.
Não acredito nisso.
- Foi ela quem me ajudou a fugir.
- Não.
Isso foi a rainha
que odeia crueldade.
Ela teria feito o mesmo
por qualquer escravo.
Entendo.
Ela é a rainha que vem aqui
dizer isso.
Ela nunca se esquecerá
do gentil Páris
e dará o seu pequeno contributo
para afastar esta nação da guerra.
- Não és espartana.
- Sou, sim.
Filha de um rei que me escolheu
um marido espartano.
Um homem que desprezas.
Desprezo a opressão,
tal como muitos outros aqui.
É preciso ser-se espartano
para aguentar.
E precisamos de ser
compreendidos.
E são.
Tu, e não o Menelau,
será Esparta para mim.
Direi ao meu pai que há esperança.
Contarei a Tróia o que vi e ouvi.
Os governantes estão divididos, sem
encontrarem uma razão para a guerra,
até mesmo o povo espartano.
Não se preocupem mais. Os reis
passaram a noite na pândega.
Afinal, a minha amada é real.
Sim.
Às vezes, os deuses mudam
a mais corajosa das intenções.
São bondosos.
Nunca mais duvidarei deles.
Oh, Helena.
Helena, enquanto Menelau te possuir,
não passas de uma escrava.
Vem para a liberdade.
Vem para Tróia comigo.
E destruo a esperança de paz
que levas para casa contigo?
Não.
Basta morrer um só troiano nas
muralhas para eu ser um fracasso.
Perdoa-me, Helena.
És duas mulheres,
ambas sábias e boas.
Eu sou dois homens.
Um bastante bom,
quero acreditar,
mas o outro muito mau.
Um é um homem.
O outro apenas um menino,
julgo.
Ele que seja sempre assim, Páris.
Nunca o deixes envelhecer.
Helena.
O barco.
E agora tenho de voltar.
É comum dos deuses...
...darem com uma mão
e tirarem com as duas.
Não, isto não é uma despedida.
Continuarás comigo
mesmo do outro lado do mar.
E tu estarás comigo.
E sempre jovem, Páris,
lembras-te?
O que é lembrado
permanece sempre jovem.
Alto!
Quieto, troiano!
- Majestade, peço que se retire...
- Mande os arqueiros embora.
Imploro à rainha
para que se afaste do perigo.
Não se atreveria.
Morreria.
A minha vida já estará perdida
se eu o deixar ir.
Silêncio!
Helena!
Helena! Helena!
- Está a mentir. Ela está lá dentro.
- Não.
- Ela está aqui. Quebrem a fechadura!
- Quebrem-na.
Quebrem-na!
É verdade.
O troiano levou a Helena.
Levou-a nos bracos.
À força, contra a vontade dela.
Quando penso na luta dela, nos
seus pedidos de ajuda infrutíferos.
Tínhamos as nossas divergências,
mas ela era minha esposa.
Vai para além disso.
Isto é um ataque a todas
as mulheres na Grécia.
É uma vergonha
para todas as nações gregas.
Tripulem os navios
e sigam-nos!
Ulisses, que faz sentado?
Tenho de a recuperar.
- Agora não, Menelau. Mais tarde.
- Sim. Agora, agora, agora!
Não vai apoiar-me?
Vamos recuperá-la e, com ela,
toda a fortuna de Tróia.
Mas para isso tem de esperar.
Enviaremos um pedido de ajuda
a todas as cidades da Grécia.
Todos os gregos unidos
numa guerra de honra.
Sim, é isso que o futuro
a chamará.
Eu chamo-lhe isso agora.
Este Príncipe de Tróia
pediu guerra, não paz.
Ulisses.
Por certo concordará
que é meu dever ser o nosso líder.
Líder?
Só aceito Aquiles como líder.
É o meu dever consagrado ser nosso
líder para vingar o meu querido irmão.
Exacto, Agamémnon,
e eu segui-lo-ei.
E dir-lhe-ei o que deve fazer,
como sempre.
E convencerei
o sensível Aquiles
com certos factos fascinantes
sobre a grande fortuna em ouro
que há em Tróia.
Não quero tesouros.
Matarei.
E nós também, irmão.
Para defender a tua honra.
Quem são?
Não sei, mas conheço a cor
do ouro deles.
Esparta faz parte do passado,
Helena.
Tróia fica nesta direccão.
O que nos chamarão lá?
Uma mulher que deixou o marido.
Um príncipe que virou ladrão.
O que mais poderemos
alguma vez ser?
Duas pessoas apaixonadas.
Contra o mundo,
se for necessário.
Se eu pudesse travar um acordo
com os deuses,
fugiríamos do mundo...
...e nunca desembarcaríamos
em costa alguma.
É um belo sonho, mas em algum
lado vamos ter de desembarcar.
Páris, há uma ilha
chamada Pelagos.
O mar pode alimentar-nos
e há casinhas ao pé do poço
da aldeia.
Vamos para lá.
Não posso.
Nasci com uma obrigação.
Páris, filho de Príamo,
herdeiro de responsabilidades.
Eu poderia deixar os reinos do mundo
e nunca sentir falta deles.
- Mas tu...
- Helena...
...a nossa vida juntos murchará,
se eu fugir disto.
Tornar-se-á algo frágil que
qualquer tempestade pode destruir.
Não, Páris.
Perdoa-me.
Esqueço-me de que és uma mulher
e não uma deusa.
Capitão.
- Conhece a ilha de Pelagos?
- Fica para sul...
...depois do estreito de Cytherean.
- Navegue para sul.
- Capitão.
- Sim?
Mudámos de ideias.
Navegue para norte
para Tróia.
- O que foi?
- Veja com os seus próprios olhos.
Espera.
Eneias, chama a rainha.
Páris!
Páris.
Vem conhecer os meus irmãos.
Heitor, Polydorus.
Falei-te neles.
Homem de sorte. Podias cair
no poço escuro de Hades
e sair com os bracos cheios
de raios de Sol.
Ele sempre teve jeito
para surpresas.
Fico feliz por ver que desviaste
a tua missão
para outra que tem mais a ver
com os teus talentos.
Venham!
- Eneias.
- Páris.
- Páris.
- Eu devia ter tido fé.
O grande deus Zeus
jamais o deixaria morrer...
...e com ele a nossa esperança de paz.
- É um milagre.
Conta-nos o que aconteceu,
Páris.
Eis o vosso milagre.
Se não fosse ela,
eu não voltaria a ver Tróia.
Teria sido preciso um espírito do mar
para te salvar.
Como é que alguém tão frágil
pode tê-lo feito?
Adiem as vossas perguntas.
Ela sofreu uma provação
que não relatarei na sua presença.
Já é suficiente que o nosso filho nos
tenha sido devolvido por si, querida.
É bem-vinda, minha filha.
Páris, chama o criado-chefe.
Acomodem-na confortavelmente.
Contas-me as tuas aventuras,
mais tarde.
Às suas ordens, pai.
O meu irmão parece ter-se
esquecido as suas boas maneiras.
Por que nome lhe devemos tratar,
minha senhora?
- O meu nome é...
- O nome dela é morte.
- Cassandra!
- Perdoa-lhe. Ela está doente.
Esperem.
O que ia dizer?
Sou Helena, Rainha de Esparta.
A esposa do Rei Menelau?
- Já não.
- A deusa da beleza, Afrodite...
...que desceu à terra
na sua forma mortal.
Ela trará a desgraça
que profetizei.
O seu nome será escrito
em letras de fogo. Helena.
Helena de Tróia.
E ela voltou a salvar-me a vida,
arriscando-se de tal forma
que não pude deixá-la
à mercê dos espartanos.
Vejo que o deixei perturbado.
Mas com base na sua afeição por mim
e a minha por si,
espero que me julgue com justiça.
Jamais acreditaria
que isto fosse possível,
não com este meu filho.
Este filho que partilhava a minha
esperança de uma paz duradoura,
que prometeu que a traria.
E o que trouxeste tu, afinal?
Desonra.
Uniste os gregos.
Acendeste uma chama que os unirá
contra nós.
Isto vai trazê-los à nossa costa.
E isso deverá deixar-te muito feliz.
Poderás ser responsável pela morte
de muitos bons troianos.
Presumiste demasiado,
com base na nossa afeicão.
Páris...
...manda-a de volta para Esparta
e faz as pazes com Menelau.
Jamais a mandarei de volta.
- Rejeitas as palavras de sabedoria?
- O meu amor não tem lógica.
Só podia escolher
entre Tróia e Pelagos.
A Helena queria ir para Pelagos,
mas eu tinha de vos vir avisar
e ela teve a coragem de vir comigo.
Mas ela tinha razão.
Tróia não tem compaixão.
Vamos procurá-la noutro lugar.
O método do cobarde
para fugir do combate?
- Abusas dos direitos de irmão.
- E tu...
Tu desprezaste todos os deveres
como troiano.
O mal já está feito.
Vai ou fica. Não faz diferenca.
- Não voltarei a ver-te.
- Príamo.
Chamem à sala do conselho o comando
militar e os administradores locais.
Quero uma ideia da capacidade
de Tróia para aguentar um cerco.
Houve alturas que quase esqueci
que tinha outros filhos, Páris...
...outros para morrer, talvez.
É o destino, Páris. O destino.
Todas as troianas com filhos
ou maridos te amaldicoarão.
Não te preocupes, irmão. Uma guerra
pode dissipar o mau ambiente.
Guerra, a única coisa
que te deixaria satisfeito.
Sai-me da frente,
senão não viverás para apreciá-la.
- Lorde Eneias.
- Pode ir.
O navio que a trouxe a Tróia
ainda está no porto.
O meu cocheiro levá-la-á lá.
Entendo.
Ou se preferir,
arranjarei uma escolta real.
Não, não esperarei mais.
Espera por nós.
A minha quadriga está no pátio.
Atena tem muito poder,
parece-me.
- Se eu voltar para Menelau...
- Não.
Pelagos?
Sim, levar-te-ei para Pelagos.
Disseste que as nossas vidas
murchariam, se fugisses.
E também disse
que serias feliz em Tróia.
Páris, a notícia já se espalhou.
- Não estão armados com flores.
- Depressa, antes que invadam o pátio.
Não o farão, desde que gozem
o seu carnaval.
- Leva a Helena para o porto.
- Não te mostres!
- Leva-a a bordo do navio.
- Páris!
Sacana!
Espera que travemos uma guerra
para seu entretenimento?
Meus corajosos troianos...
...mostrarão tanto ardor
contra o exército espartano
como contra uma só
mulher espartana?
Conseguem combater sozinhos
em batalha
ou precisam da cobardia da quantidade
para vos dar valentia?
Vão para casa e perguntem
aos vossos corações, troianos...
...porque tudo isso terá de ser
respondido em breve.
- Podes partir em segurança agora.
- Sem ti?
Conquistei uma espécie de vitória
esta noite. Não posso perdê-la.
Não haverá Pelagos,
se eu estiver lá sozinha.
Mas há sempre uma ilha onde
a tempestade não pode chegar.
É qualquer lugar
onde estejamos juntos, Páris.
- Aqui?
- Sim, até aqui.
A Tróia, chegou a notícias de que os
gregos se preparavam para navegar
com a mais poderosa armada alguma
vez vista. Os troianos prepararam-se.
Nunca fomos avisados
de tantos navios.
- Não faz mal. Estamos preparados.
- São centenas.
- Muitos mais do que podemos contar.
- 500, 600. Mais!
- Não são menos de 1000 navios.
- Eles pagarão caro por isto.
E nós, o que vamos pagar?
Eneias, trá-los cá. Eles que vejam.
Sim, senhor.
Mais depressa!
- Está a ver o que nos fez?
- Pai.
O rosto que lançou à água
1000 navios.
Lembrem-se, as muralhas de Tróia
são a nossa força e substância,
portanto, que nenhum tolo ansioso
tente atravessar a planície,
até este baluarte
ter servido o seu propósito.
Para os vossos postos.
Heitor, onde devo ficar?
Ao lado da tua mulher espartana.
Vem comigo, irmão.
Partilharei sangue espartano contigo.
Podes ficar com a minha parte.
Não há troianos
para nos receberem?
Tinha esperança de que eles fossem
tolos e dispersassem as suas forças.
- Onde montamos acampamento?
- Acampamento? Não, avancemos.
A minha Helena sofre,
cada minuto que esperamos.
O nosso acampamento é o palácio
de Tróia. Temos de atacar já.
Contra as muralhas de Tróia? Não.
Temos de nos munir contra a fortaleza.
Ulisses tem razão.
Temos de nos preparar.
O conselho sábio de Ulisses
prevaleceu.
Os gregos consolidaram a sua posição
e construíram máquinas de ataque,
numa escala à altura
das muralhas de Tróia.
Sigam Aquiles!
Heitor.
- Para as rampas! Recuem!
- Estamos cercados! Recuem!
Regressem às torres!
Para as rampas! Recuem!
Recuem!
Polydorus.
É uma boa guerra, Páris.
Heitor, o homem da paz...
...agora, o nosso maior guerreiro.
Agradece a Helena
o teu destino.
- Agradece ao Páris.
- Agradeço-lhe pela minha vida.
Ó grande Zeus, rei de todos...
...damos-te Polydorus,
Príncipe de Tróia.
Peço que o julgues
com compaixão e compreensão.
Não deixes que o ódio de Atena
se alimente do meu filho indefeso,
mas na nossa tristeza.
Nós, os mortos-vivos de Tróia,
pagaremos a dívida dele
nos anos de cerco
que se avizinham.
E os gregos prepararam-se
para anos de cerco.
Descarregaram provisões
dos seus navios
e, com o passar do tempo,
saquearam e violaram
as pequenas aldeias dos arredores.
Tire as mãos de cima dela!
- Um soldado a dar ordens ao chefe?
- Ela é minha.
Continuo a ser seu chefe, protector
de todos os saques da guerra.
- Levem-na para os meus aposentos.
- Não.
Agamémnon, se levar esta rapariga,
voltarei para casa.
- Então voe, poderoso guerreiro, voe.
- Agamémnon!
- Ele não falou a sério. Vamos.
- Volte para casa, grande guerreiro.
Não, Aquiles!
Fora! Fora! Fora!
Aquiles, Agamémnon não fala
por todos nós.
Cretinos! Sacanas!
Nunca mais lutarei as batalhas dele.
Mas lutará pela Grécia.
Já não.
Durante estes anos de impasse,
os troianos,
protegidos pelas suas muralhas,
assolavam os invasores
com ataques nocturnos
aos seus acampamentos.
- Helena, que perfeição!
- A rapariga por quem te apaixonaste?
Guarda sempre essa imagem contigo,
Páris.
Não será preciso.
Tenho a fonte da sua magia.
Aqui mesmo, abraço o seu calor
e o seu espírito está sempre comigo
nas muralhas.
Então, não pode estar perdido,
pois não?
O que foi vivido e partilhado
nunca se perde.
- Nunca, Helena.
- Mas se me perderes...
...resignar-te-ias?
Não te preocupes,
nada vai acontecer-te.
Nada dura nesta Terra, Páris,
nem a tristeza nem a felicidade...
...nem o amor entre as pessoas.
Querida Helena, procuras a sombra
no único lugar iluminado de Tróia.
As pessoas apaixonadas
não devem ser cegas.
Devem olhar para o futuro
e preparar-se para a separação.
Mas não tão sombriamente, meu amor.
Encontrar-nos-emos em Elísio,
onde o envelhecer dos anos
é apenas um instante no tempo.
Freta um navio.
Eu levo o cavalo voador, Pégaso.
Para a nossa ilha, Páris?
Ó deusa que desceste à Terra,
torna-me imortal com o teu beijo
e viveremos de néctar e ambrosia.
- Não sei se gosto de ser tão etéreo.
- Nem eu.
Quantos anos deveremos sofrer,
meus caros troianos?
A nossa única pausa, uma trégua
para queimar os nossos mortos.
O feriado de um troiano
que já viveu tempos felizes.
A pira funerária dos troianos
tem de ser sempre tão perto daqui?
- Quanto mais tempo vão acusar-me?
- Perderam muitos entes queridos.
Embalados pelas promessas
de uma paz eterna.
Pessoalmente, acredito
que poderíamos ter tido essa paz...
Pensava que podia fugir disto,
mas não existe lugar algum...
- Nem vitória para ninguém.
- Vai. Deixa-me.
Páris deu-me ordens para ficar
consigo enquanto está em serviço.
Deixa-me, já te disse!
Não, amigos!
Oiçam-me, troianos!
Entreguem-na aos Espartanos!
Expulsem Páris de Tróia!
- Se não têm fibra para isto...
- Helena, não saia.
Eles estão perigosos.
Mandei soldados dispersarem-nos.
- Veio pedir-me para deixar Tróia.
- Não, Helena.
Não.
O Páris salvou o Heitor. Tenho de
amar os meus filhos de forma igual
e a quem eles amam.
Você é boa.
O pontífice diz que até os deuses
lutam entre si.
Alguns por Atena e a Grécia
e outros por Tróia e Afrodite.
Assim, como posso culpá-la
por esta guerra?
- Eu podia pôr-lhe fim.
- Ninguém pode.
Eu podia...
...se regressasse aos gregos,
a Menelau.
Voltar para alguém que despreza?
Se acabar com a guerra e restituir
o amor dos troianos por Páris...
- Ele nunca a deixaria ir.
- E eu seria capaz de o deixar?
- Tem de me ajudar a decidir.
- Desafiaria as Parcas?
Mortal algum se deve atrever a isso.
No entanto, pergunto-me...
...se alguém tão belo pode ser mortal.
Belo? Não. Sou tudo o que
estava determinada a não ser.
Fui egoísta.
Só trouxe desespero, dor
e lágrimas.
Que diferente do sonho da ilha!
Regresse ao seu Rei de Tróia
e diga-lhe que receberemos Helena
no lugar designado.
Mas avise-o que não poderá haver
traições nem enganos.
Asseguro-lhe que não há
engano algum.
É o desejo dela
voltar para o Rei Menelau.
- O desejo dela. Ouviste, irmão?
- Já o ouvi várias vezes.
Espere, mensageiro!
Diga ao seu rei, por parte de Menelau,
que exigimos...
Não, não, não. Nada mais.
Nada mais, só o regresso de Helena.
Os troianos querem a paz.
Como homens de paz,
aceitamos a oferta deles.
Sofremos para regressarmos
de mãos a abanar?
De mãos a abanar, Menelau?
O regresso de Helena,
a integridade satisfeita...?
Falas de mais, irmão.
Depois de os troianos entregarem
a Helena, ensiná-los-emos
de que não nos compram facilmente.
Mas quero Aquiles connosco,
para o caso de darem problemas.
Ele ainda se recusa a lutar,
enquanto você estiver no comando,
e o palerma do seu irmão apaixonado
continuar a zurrar nesta praia.
Então não receberá
um único óbolo troiano!
Helena?
Helena.
- Onde está ela?
- Não está cá, Páris.
Não? Então está onde?
Foi para o acampamento
dos gregos.
Para Menelau?
Ela quis pôr fim a esta destruição
e devolver-te aos coracões
dos troianos.
- E você conspirou com ela...
- Ela não era prisioneira aqui,
mas, sim, uma mulher determinada,
uma rainha com mais coragem
do que eu teria tido para navegar
contra as marés dos céus.
- Ele não a levará.
- Já não vais a tempo, Páris.
Não podes impedi-lo.
Esperem, troianos!
Devolveram a esposa de Menelau,
mas devem mais do que isso.
Devemos?
- Não existe dívida alguma.
- Não?
Então, quem pagará o sangue grego
derramado nesta planície?
O sangue troiano pagou-o
na totalidade.
O sangue troiano não é
uma moeda válida em Esparta
nem paga o destacamento
de 1000 navios.
Os termos desta trégua
foram claros.
O regresso de Helena,
em troca do qual
concordaram abandonar
estas costas.
- Seus tolos crédulos.
- Só nos contentaremos com...
...metade do tesouro de Tróia
antes de partirmos...
...e, depois disso,
1000 talentos todos os anos.
Levem estes nobres como garantia!
- Eis o pagamento, Menelau!
- Levem-na para as portas!
Levem-na de volta a Tróia!
Sigam-nos!
Atrás deles! Atrás deles!
Para trás! Volte para trás!
Não se aproximem demasiado
das muralhas troianas.
Não contra o Heitor.
Pátroclo! Pátroclo!
- Traga-me a minha armadura.
- Sim, senhor.
Obrigado, troiano, por nos trazer
o corpo de Pátroclo.
Muito obrigado.
A traição dos gregos provou
que não travam uma guerra de honra.
Helena, através de si, descobrimos
que eles visam um saque e não justiça.
Peço-vos perdão.
Cassandra...
...temos nocão
da tua grande sabedoria.
- Que mais podes dizer-nos?
- Haverá novas tempestades,
mas a culpa é de Atena,
não de Helena.
- Obrigada, Cassandra.
- Tal coragem deve ser recompensada.
Helena, será uma princesa de Tróia.
Onde está o Heitor
e a Andromache?
São eles que têm de conceder
os louros.
Onde está o Heitor?
Ao pé das portas Scaean.
Ele espera um combate individual
pela morte de Pátroclo.
Eu é que o matei. Seria a mim
que os gregos pediriam contas.
Mas o Heitor não queria
que enfrentasses Aquiles.
- Ele venerava Pátroclo.
- Heitor mandou-lhe o cadáver do amigo
com os seus cumprimentos pessoais.
Ninguém está à altura de Aquiles,
nem mesmo Heitor.
Isto não pode acontecer.
Ele chorou que nem um animal ferido
e depois pediu a armadura.
Então, sempre vem.
Heitor!
Heitor!
- Já está, Andromache.
- Aquiles?
Ele matou o meu pai
e os meus irmãos.
- Enquanto viveres, ainda estarão em ti.
- Tenciono viver, Andromache, por ti...
...e pelo nosso filho.
Este elmo assusta-o sempre.
Rezemos para que ele
nunca precise de usar um...
...que ele encontre a paz.
Preparar armas!
Se Aquiles ganhar, avançamos.
Atacaremos de imediato!
Para o palácio!
E se Aquiles morrer, retirar-nos-emos
para estudar um plano que tenho.
- Ele tem um escudo imortal.
- Zeus, ajuda a encontrar uma fraqueza.
Aquiles está morto!
E assim morre a coragem grega,
mas não a sua astúcia.
Derrotados pelo homem,
abandonados pelos deuses.
Eu marcava os meses por uma batalha,
uma peste, uma fome.
Agora é tudo um longo pesadelo.
Combati em guerras, desde que vocês
eram bebés, mas nenhuma assim.
Vamos para os nossos navios
e regressemos a casa.
Faremos isso.
Tenho um plano que primeiro exigia
uma vitória troiana.
- Essa parte já conseguimos.
- Está a falar de traicão.
Chame-lhe o que quiser,
mas sejamos realistas.
O maior exército à face da Terra
perdeu a sua guerra.
Está a sonhar com o quê, Ulisses?
Estou a sonhar com a minha mulher,
a boa e constante Penélope.
E nos meus sonhos, vejo-me a voltar
para ela com os tesouros de Tróia.
- Mas como?
- Isto tem a ver com o trabalho
que Apagos e os homens dele
têm estado a fazer na floresta?
Estão a construir um monumento
ao triunfo de Páris e de Helena.
Uma oferta da deusa Atena.
Um cavalo sagrado,
tão grande e tão belo
que é impossível Tróia
não o acolher nos coracões.
Lembrem-se, a retirada
tem de ser notada por Tróia.
Os navios que partam, mas
mantenham tropas na floresta.
Os navios regressarão de madrugada.
De certeza de que os troianos levarão
esta monstruosidade para a cidade?
Prometo. A gratidão para com Atena
pela sua vitória será imensa
e acolherão o cavalo
de bracos abertos.
E a Baco, o deus do vinho.
Preparem-se, homens da Grécia!
Primeiro, fizeram soar a retirada
e agora chamaram os remadores.
As tochas deles dirigem-se
para o mar.
- A bordo dos navios?
- Em breve saberemos.
O Lorde Eneias foi para a costa
com os batedores.
Eles partiram. O último
dos seus navios fez-se ao mar.
Acendam a tocha da vitória.
Transportem-na pelas ruas!
Muito bem, Príamo!
- Os heróis querem que comemoremos.
- Acendam a tocha da vitória!
Verás um troiano
que nunca conheceste antes.
Vejo-o no teu rosto.
Abram! Abram!
Deixem-nos olhar para o mundo
outra vez!
A noite sorri-nos.
Olha, Príamo.
Tentei dizer-lhe.
É um estranho monumento
que os gregos nos deixaram à porta.
Cuidado com as ofertas dos gregos.
A minha irmã tem razão. É uma coisa
malévola que deverá ser queimada.
Concordo.
O inimigo não oferece
prendas agradáveis.
Meus filhos, isto não é
uma prenda dos gregos,
mas um símbolo de veneracão
que tiveram de abandonar.
O povo pede autorização para trazer
este prémio extraordinário para a praça.
Lutaram muito tempo e com coragem.
Não posso negar-lhes isso.
Pai, por favor escute-me.
Não é o fim da ruína,
mas o comeco.
Não devemos ser ingratos
com uma deusa que provou ser nossa
deusa. Tragam o seu cavalo sagrado.
Será um monumento
ao valor troiano.
Sim, senhor.
É algo perfeito e grandioso.
Que infantil da minha parte
ter tido dúvidas.
E da minha parte por ter medo
de um gigante de madeira.
Isso foi porquê?
Atena. Uma deusa rival
que soube perdoar.
Tens ciúmes, Afrodite?
Sou apenas a Helena...
...que se pergunta se algum dia
será realmente troiana.
Quando os troianos
olharem para aquela planície,
não pensarão sempre
em Helena de Esparta?
Agora, a paz reina em todo o lado.
Não temos de ficar aqui.
Eu levo-te para onde tu quiseres.
Viva o Príncipe Páris e a sua Helena!
Viva a Helena!
- Viva Páris!
- Viva Helena!
É o destino, Páris. O destino.
Parece que não há escapatória.
Nem mesmo da felicidade.
Não, e eu estou feliz. Muito feliz.
Homens de Esparta!
Homens de Esparta, para o palácio!
Avancar!
Tróia está perdida,
mas vocês não têm de morrer.
Enquanto os gregos pilham,
vão para a porta norte.
- Acha que o abandonaria agora?
- Ou eu?
Obedecam ao vosso rei.
Eneias, cuida de Andromache
e do meu neto.
Páris, Helena...
...ordeno-vos que partam.
Que liderança magnífica, Agamémnon.
Atena recompensar-te
com toda a glória.
Entrem todos!
Helena!
Levem-nos! Procurem-na!
Encontrem-na!
- Não me deixes perder, Páris.
- Nunca.
Páris!
Páris! Páris!
Páris!
Páris! Páris!
Páris! Pensava que estava perdida!
Os deuses estão connosco.
Vem.
Páris!
Por um instante, pensei...
...que eras aquela rapariga escrava.
- E sou.
Sou o que o teu amor desejar que eu
seja, o que estiver no teu coração.
Tu és o meu coracão.
Páris! Não.
O meu navio regressou
para te vir buscar. Vai para lá.
Lava o sangue dele de ti.
Isso é impossível.
O sangue é meu.
Não pode estar perdido, Páris,
pois não?
O que foi vivido e partilhado
nunca se perde.
Nunca, Helena.
Então, isto não é uma despedida.
Estarás sempre comigo.
E tu comigo.
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