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Estes somos nós.
Quer dizer, ele e eu.
Estamos os dois estafados.
Voltamos duma viagem.
Vimos palazzos,
vapporetos e espressos.
Fomos em viagem em Itália,
o que parece o nome
de filme com um final feliz.
Mas estivemos
principalmente em Veneza
porque é a cidade
de todos os apaixonados.
É também a cidade em cima de água
que ainda acabará debaixo de água.
Verdes, ocres, rosas, azuis,
até cinzentos que brilham;
é isso a Itália.
E as massas, claro.
Somos realmente um casal,
vivemos juntos há dois anos.
Dois anos nos tempos que correm
é quase milagre.
Dois anos de felicidade
com altos e baixos,
e entre as duas coisas,
principalmente.
Só vamos buscar o Jean-Luc,
que deixámos com os meus pais
na ida do aeroporto para a gare.
O comboio nocturno
para Veneza foi ideia minha.
E antes do regresso a Nova Iorque
ficaremos dois dias em Paris.
2 DIAS EM PARIS
Ai meu Deus!
Ele mata-o, vai matá-lo.
Não é aquele o chef
que me ia esfaqueando
quando pus parmesão
na *** com marisco?
Não foi assim mau...
Tive envenenamento alimentar
quatro dias.
Que gostaste mais nela?
- A vista da janela do banheiro.
Olha, chamas um táxi?
Vem aí um dilúvio.
Foi só uma gota...
- Mas vem aí carga d'água.
Eu chamo um táxi,
como és feito de açúcar...
Não posso adoecer,
mal chegue recomeço a trabalhar.
Não há sinal.
Vou apanhar uma sinusite,
a diarreia reduz as defesas.
Naquela paragem de autocarros
passa o directo para os meus...
Na Europa nada de autocarros,
de metros...
O terrorismo...
Porque Nova Iorque
é mais segura?
Acredita,
não há terrorismo em Paris.
É claro, a França tem um acordo
com terroristas fundamentalistas,
afinal é um país muçulmano...
És tão paranóico...
Vou ver onde apanhado rede.
Desculpe, ouvi-os falar...
É americano, certo?
Sou, claro.
Somos um grupo internacional
de decifradores do Código
e a delegação francesa
espera-nos no Louvre às 10;
sabe se estamos perto?
Por acaso estão até muito.
Tanto que um táxi não os leva,
eles aqui são uns chatos.
Não, seguem por aquela rua,
depois viram à esquerda,
na primeira à direita,
e depois é sempre em frente
aí por uns dez minutos.
Tem a certeza?
Agradeço-lhe tanto,
americanos são tão prestáveis...
E franceses
são tão antipáticos...
É um cliché, mas verdadeiro.
E nós, americanos, temos de
ser solidários... Obrigadíssima!
Boa sorte.
E decifrem-me esse código!
Nem um táxi na zona.
- Já não é preciso.
Que houve?
Que aconteceu?
Queriam saber onde fica
o Louvre, e disse-lhes.
Disseste? Mas tu sabes?
Fica a quilómetros daqui!
Mas estamos na frente da bicha;
a vida é dos mais fortes.
Mandares compatriotas teus
para os subúrbios...
Compatriotas meus
os que votaram no Bush?
Vêm com o Da Vinci em riste,
são a personificação
de tudo o que está errado,
cultural e politicamente,
neste mundo.
Em vez de verem a Mona Lisa
talvez se envolvam num motim
e isso lhes abane um pouco
a consciência política.
És tão mau...
Mas tens tanta razão!
Adoro-te.
A sinusite.
Ah, é automática...
Importa-se de baixar a rádio?
Passámos 12 horas num comboio
e estamos para o cansados...
12?
Vêm de onde?
- Veneza.
Detestei, fui lá com
as minhas duas mulheres.
Vão falar de mulheres espancadas;
vou pôr mais alto, interessa-me.
Porquê?
Porque tive duas
e desanquei-as às duas.
Que horror!
- Sei que fiz mal, mas...
Paris... Eu nasci no 13º Bairro,
cresci no 14º e vivi nos 9º,
10º, 11º, 12º, 19º e 20º,
até ir para Nova Iorque.
Chamo-me Marion
e sou fotógrafa.
O que é irónico visto ver pouco;
tenho uma deformação congénita,
a minha retina é cheia de buracos.
Como descrever o que vejo...?
Pronto, eis como vejo o mundo.
Pois, todos o vemos diferente,
literalmente.
E depois preguei-lhe
uma sova das antigas.
Ele é o Jack,
desenha interiores.
Miúdos e ratos
são portadores de doenças,
disse ele à 3ª vez que saímos.
Achei tão amoroso...
Olha-me esta luz,
parece um postal de Paris.
A fotógrafa sou eu mas nesta
viagem tirou ele as fotografias;
cada instante foi digitalizado e
imortalizado sob todos os ângulos.
Ele tira fotografias a quê?
A tudo. A tudo mesmo.
Ouviu? Mais outro
fast food a arder.
A semana passada
foram duas lojas de desporto
e um mês antes um supermercado.
E não lhe deitam a pata,
ele é alter-mundialista.
Deita fogo aos fast food?
Se há merda nas carnes deles...
É já aí à direita.
É aqui?
Isso, sempre em frente.
Sobe um andar.
Há elevador?
É no 2º andar;
achas que consegues?
Levaram séculos,
não chegavam às 9?
Pois, mas os engarrafamentos...
E só há greves,
a França está na merda?
Querias que enfermeiras
exploradas não fizessem greve?
Isto não é a América!
E lá estás tu com esse malão;
ainda arruínas as costas!
Nunca ouves o que te digo...
Sim, a minha mãe é uma chata
mas é também graças a ela
que eu sou o que sou.
A Marion voltou a bloquear!
Ela é débil mental?
Em nova fui um pouco especial
mas não duma forma boa;
chegava sempre atrasada a tudo
por passar a vida num mundo meu.
Passava horas e horas
a olhar coisas...
Acho até que ouvia vozes,
não das que nos mandam salvar
o mundo, de outro género.
Temos dois pirilaus,
temos dois pirilaus!
Chega para lá, chega-te.
Certos pais teriam ficado
seriamente ralados,
os médicos tinham receitado
toneladas de remédios.
Mas a minha mãe não mos deu,
comprou-me uma Polaroid
e em vez de olhar coisas
durante horas, fotografava-as.
Desde miúda que sempre
fizeste só o que querias.
E nós tínhamos de ir atrás...
Bom dia, Madame.
Como está?
Jack, Anna...
Lamento mal nos termos
conhecido, à chegada...
As apresentações foram curtas, sim,
foi o tempo de deixar um embrulho.
O Jean-Luc.
Dá cá o bichano...
Fizeram boa viagem?
- Fizemos, muito boa.
Foi boa? É uma viagem linda...
Bom, daqui a uma hora
desçam para almoçar.
E não te atrases,
o teu pai detesta.
O Jean-Luc?
- Está a dormir.
Que amorosa...
Que tens?
- Não sei.
A mala dá-te problemas?
Preciso de ajuda...
Que um homem forte ma leve.
Não querias ser independente
e carregar a tua própria mala?
Pois, sou uma mulher forte,
independente, e...
Pronto, dá-a cá.
Foi este o grande investimento,
uma casa por cima dos teus pais?
É prático.
Especialmente
gostando-se de privacidade...
Nada de sarcasmos, cá.
- Não abro boca dois dias.
Gostas? Não gostaste?
Que foi?
Nada, não é...
Ele é bastante...
Antiquado, mas...
- Não meados do século, eu sei.
É meados mas do séc. 15.
Não, é muito... parisiense.
Isso é elogio?
Não te cheira a pântano?
É como... o Lido.
Cheira a quê?
Meu Deus!
Que raio é aquilo?
Uma infiltração; o prédio
é velho, acontece muito.
E não há canalizadores em França.
Aquilo é bolor preto?
- Que é bolor preto?
O fungo mais mortal,
quando inalado?
Pois não inales.
- Não tens graça.
Falo a sério.
Já havia quando cá estive
em Janeiro, é inofensivo.
E não é preto, é verde.
Olha, verde, como no queijo.
Se calhar até te faz bem.
Vá, todos para a rua.
Esta casa-de-banho
é de acesso interdito.
Há aqui um bio-risco.
- Cagamos num canto do quarto.
Cagamos lá fora.
Isto é como um cadinho
de agentes alérgicos.
Só temos alergias
por nos lavarmos de mais;
há cem anos vivíamos cobertos
de parasitas e não havia alergias.
É essa a teoria que faz
os franceses não tomar banho?
Não viste mesmo
as lentes de contacto?
Não, não as vi.
- Na tua mala?
Não me sinto bem...
- Qual é a do meu pai?
Não me sinto bem!
Não sei se é uma enxaqueca,
se gripe...
Emprestas-me o termómetro?
Esse não ponho na boca.
Não o ponho na boca...
Tu não regulas?!
Porquê?
É um termómetro francês!
Tens cinco anos?
Ainda os metes no cu?
É a melhor maneira
de tirar a febre.
Porquê, porquê?
E não o uso há meses...
Bom, vou tomar um ***.
- Primeiro toma antibióticos.
Tento enviar uma planta
e devia ser mais rápido
enviá-la por correio normal...
Esquece-se o lenta
que é por telefone.
Mais dois dias
e voltamos à civilização.
Essa colcha é um pavorosa.
- Não é nada!
Compraste-a quando, em 1982?
- Em 86... Sei lá.
Não te mexas. Quieta.
Um insecto?
Vai ser uma fotografia
à Nan Goldin. Fica quieta.
Perfeito... Deita-te.
Vá, finge-te drogada.
Com quê?
- Heroína, claro.
Vê.
Linda, linda fotografia,
és um fotógrafo de talento.
Vai-te foder.
Sabes o que atrai realmente
uma pessoa por outra?
Quero um beijo e levo palestra...
Espera, falo a sério.
- Diz lá porquê.
Pessoas com sistemas
imunitários diferentes
atraem-se umas às outras
para os filhos o terem mais forte,
por ser uma combinação
dos dois.
Não ressones, é importante.
Claro, eu dizia o mesmo...
- Isto tem interesse!
Estar contigo é como ver
um canal educativo, sabes?
E não gostas?
Não, é muito educativo,
muito, muito sexy...
E um disparate completo;
os meus pais adoravam-se
e olha só para mim,
vê o meu sistema imunitário.
Pois, a atracção deles
devia ser mais intelectual...
E por isso se separaram
depois de nasceres.
Amorosa... Dizes que por os teus
pais viverem juntos há 87 anos
- há 38 - isso faz tu seres
geneticamente superior?
Não disse isso, porque tornas
tudo numa competição?
Eu mal viva estou!
- Torno tudo numa competição?
Por exemplo: sou fotógrafa
e tens tu fotografado tudo;
outro dia, em Veneza, enquanto
te tirava uma debaixo da ponte,
começaste a tirar-me fotografias
fotografando-te a ti.
Hoje é dia de quê,
de cagarem todos no Jack?
Mal tento dar-te um beijo passo
logo a geneticamente inferior,
a tipo sem identidade própria?
- Nunca te achei geneticamente...
Sei exactamente o que disseste
e não vejo porque não tomas como
um elogio eu interessar-me por...
Estou a adorar a discussão,
continuamo-la mais um bocadinho?
Que foi?
Que foi, que tens?
Estás a assustar-me...
- Sinto qualquer coisa.
O quê, que tenho cancro?
Cheira-te a tumor, ou...
Como aqueles cães,
treinados a farejar coisas...
Não, não farejo tumores,
sinto é que temos sistemas
imunitários diferentes
e que é melhor fazermos
qualquer coisa...
O meu é tão diferente do teu
que um filho nosso
saía mesmo forte à brava?
Mas entretanto,
enquanto não procriamos,
vais buscar um preservativo?
- Onde estão?
Por baixo do lavatório.
Compraste-os e à colcha
da Nan Goldin no mesmo ano?
Em Janeiro.
Pensavas pôr-me os cornos
em Janeiro?
Pensei foi ter sexo contigo,
só que cancelaste devido
à inflamação nos olhos...
Estavas para vir a Paris,
lembras-te?
Ah pois, a clamídia no olho.
Tão rara...
Mas tão sexy.
Mas que merda é esta?
Isto é sequer um preservativo?
Que mais pode ser?
- Eu sei lá.
Assim rompe-lo,
não puxes assim da ponta...
Ainda é mais pequeno
que o italiano, se é possível.
Pronto, desisto.
Onde está?
Não, faz assim.
É tão simples...
Mas se nem te toquei...
Mal te toquei.
É um preservativo para putos?
Fazem-nos para miúdos?
Já está.
Não admira os franceses
terem de ser românticos.
Mas que disparate...
- Bom, vamos lá.
Isso, aí.
Isso é a minha perna.
Assim não te vejo, podia estar
a ter sexo com o Gregory Peck.
Sorte a tua.
Lá se vão os preliminares...
A mãe, é a minha mãe.
Tudo bem, é só a mãe...
Não entres,
estamos a mudar-nos.
Vou fazer uma máquina;
vocês têm roupa suja?
Levo-ta daqui a bocado.
- Está bem, então espero.
Mas esperas lá em baixo?
Vá, obrigada.
Obrigada, até já...
- A tua mãe tem a chave?
Claro que tem, passo fora
dez meses por ano.
Tens alguma roupa para lavar?
Pergunta ela.
Não, eu não... Não tenho...
Vai fazer uma máquina.
- Olha, vou tomar ***,
isto e a tua mãe bloquearam-me
a circulação ao cérebro.
Falas de quê?
- Desculpa. Amo-te.
Lindo... Está bem, adeus.
Olá, Marion...
Estou a tratar do coelho.
Tenho de o partir aos bocados.
Tudo bem?
Já houve andorinhas outro dia,
mas tiveram medo do Jean-Luc.
Claro que tiveram,
ele tinha-as engolido.
Achas? É tão amoroso,
não fazia isso...
És doida? Só não nos come
a nós em segundos
por sermos maiores que ele
e o alimentarmos.
És tão pessimista...
- E ele não está mais gordo?
Como tinha latas de foie gras
a saírem do prazo...
Deste-lhe foie gras...
Sabes que só come
das bolachas dele,
há dez anos que não lhe dou
mais nada de comer,
a gordura faz pessimamente
aos animais.
Mas está enorme!
É isso, está igual ao Pai;
puseste-o um monte de banha,
mal apanhas alguma coisa
transforma-la em banha.
Não vou poder levá-lo
comigo dentro do avião.
É por isso que o quero magro,
com 5 kgs no máximo.
Vão ter de o meter no porão,
será preciso drogá-lo,
e muitos bichos morrem
durante as viagens...
Como podes dizer isso?
Trato dele há duas semanas,
adoro este gato, foi um inferno,
o teu pai detesta-o,
chama-o EnfardaCagaDorme,
queria pô-lo na rua
e dizes que está muito gordo!
Vá, calma...
Que mo metem no porão!
Que mo vão matar!
Que é que foi?
A minha mãe sempre conseguiu
tudo o que queria com lágrimas;
daqui a segundos
o meu pai vai descompor-me
e eu não volto a dizer que
o Jean-Luc engordou 5 quilos.
Nem tirámos férias
por tua causa
e desse lambe-botas de luxo.
- Tu adoras Paris no Verão,
dizes que os parvos se foram
mais as carripanas...
Voltas a chatear a tua mãe
e há sarilho.
Olha, se está gordo
é porque foi capado,
também engordei
por ter sido capado.
Foste capado?
- Pela tua mãe.
Sacana!
Tudo bem aí em baixo?
Claro, porquê?
Por nada...
Desces? Vamos almoçar
daqui a uma meia-hora.
Aterrado, mas desço.
Bom, vamos a isto.
Olá, como está?
Até que enfim
que o conheço.
O outro gato...
Este ao menos não é capado?
Já fui insultado?
Cuidado que está quente.
Cheira bem...
- Ele cozinha lindamente.
O que é?
- Lapin.
Que é "lapin"?
Coelho.
O Oliver...
- Quem?
O coelhinho que tinha aos 8 anos
e que foi morto por um Labrador.
Só restaram as orelhas...
Mas eu como.
Não tens de comer...
- Tenho, sim.
Coelho, não?
- Coelho, muito bom.
Vou lá irritar os nativos...
Uma perna.
O teu prato...
- Uma perna pequena.
Parece frango.
Não, dá-me a mais pequena,
estou habituada a miniaturas.
E a cabeça,
é boa para os homens.
Homens comem a cabeça.
Aquilo é o coração?
- Não, a cabeça.
Gosta da cabeça...
Carotte?
- Cenoura, claro.
Comemos também
a comida do coelhinho...
E os sininhos dele?
Molho, vinho preto,
vinho blanco...
Vinho blanco? Ah, vin blanc.
Dás-me o teu prato?
Eu não quero...
- Que desmancha-prazeres!
Tu tratas-te bem...
É essa a tua dieta?
Coelho é carne magra.
Mas já viste o teu prato?
E tu já viste
o tamanho do teu cu?
Tenho o cu grande porque
deixei de fumar há ano e meio.
Olha que recomeço a fumar!
Paras de chatear toda a gente?
- Ela é que não pára de chatear!
Veio de Nova Iorque
de propósito para isso.
Não é nada contigo.
Somos mais civilizados?
Está o meu homem à mesa,
gostava que falassem com ele.
Deixa que falo com ele.
Hã, Jack?
De literatura americana.
Kerouac.
Claro, gosto imenso,
"On the Road"...
Faulkner.
Isto é um ***?
- É, de boas vindas.
Faulkner, sim, "Sound and Fury".
O Som e a Fúria...
Miller Henri.
- Henri Miller.
Expatriado,
à frente do seu tempo...
Sexo?
Sexo é bom, pois.
Miller, "Sexus", "Plexus"...
Não comeces...
Tudo bem, esquece.
Escritores franceses.
Diz escritor francês.
Passámos aos franceses?
Rimbaud.
Rambo, muito bom, sim.
- Rambo?
É como se pronuncia em inglês;
tu exageras...
Ah, pronunciei mal?
Eles são mais parvos...
Pai, por favor!
- Humor de intelectuais...
Baudelaire.
Verlaine... Moliére...
Nada mal...
- É para que vejas.
E Auguste Renoir?
Grande escritor.
Era pintor!
Quis que eu caísse...
Não é como os imbecis
que cá costumas trazer.
Obrigada, és muito amável.
Feio como é,
só faltava que mordesse.
Nada!
Olhem, a Rose.
Também tem chave...
Mas que pivete.
Desculpa, não houve tempo
para desodorizar...
A estas horas?
- Hoje larguei mais cedo.
Olá, como está?
Sou a Rose.
- Jack, muito prazer.
Bonito como na fotografia.
- Sempre amável...
Bom, há café?
Na cafeteira, na cozinha;
amanha-te, sim?
Ela está pior...
- Coitados dos putos que trata.
Aviso que se ouve tudo.
Pensam dar uma volta por Paris?
Vamos ver Paris?
Adorava ir às catacumbas.
E ao... Pere Lachaise?
Catacumbas, Pére Lachaise...
É animado, o teu amigo.
Ver a campa do Jim Morrison.
Disse o que não devia?
Tirou fotos, em Veneza?
Fotografias, Veneza.
- Sim, montes delas.
Quer ver fotografias?
Tens usado o computador?
Não, pedimos à Rose
que nos ensinasse, mas...
Não tive tempo, lamento.
- Não lhes explicaste nada?
Nem arranjaste quem explicasse?
Para ti é fácil, dás os presentes
e depois eu que me vire...
Estou farta.
Mas não trabalhas com gente
que aprende dificilmente?
Duma vez por todas, trato de gente
com problemas psicológicos,
não de atrasados mentais!
- Vocês baixam a bola?
Não é lá por mandarem e-mails
que se vão sentir superiores.
A Praça de São Marcos...
O número de fotos
que se tira com a máquina...
Pois, é digital.
Fotografias muito bonitas...
Obrigado, só as tiro
para o meu trabalho,
mas gosto muito...
Não aparecem balões, nessas?
Eu não disse nada,
foi só a brincar...
Mostraste a fotografia
à tua irmã?
Não, mas contei-lhe...
Balões, balões na foto!
Pai, não!
Não faças isso, vá...
Pilinha linda com balões.
Vocês são insuportáveis!
- Desculpa...
Pilinha bonita.
Mãe!
Francamente, vocês...
Tem graça, amor,
isto tem graça...
Pára de o mimar.
Isto era um passarinho...
Na varanda do hotel.
Bom, até logo.
Passem pela galeria, o teu pai
gostava, hoje há um vernissage.
Os homossexuais
dá para acreditar?
Acho repugnante o que fazem.
Tu não fazias aquilo, Kiki?
Não ronques.
Gostavas que roncasse,
quando me conheceste.
Sei que disse que gostava...
- Ao fim de dois anos, cansa?
Disse que gostava por querer
saltar-te para a cueca;
agora que já saltei
não preciso de o elogiar mais.
Agora discute-te?
- Não me "discute";
"discutia-me" só se
discutíssemos alguma coisa.
Desculpa, falo quatro idiomas...
Ah, e qual deles falas bem?
Porque eu não...
Não posso saber se é o francês,
podes ser uma burra em francês.
Como vou saber?
Não sou maluquinho pela morte,
mas isto é curiosamente
não-deprimente.
E tão tranquilo...
- São os parisienses mortos.
Por isso é tão tranquilo?
Je rr-t'aime.
- Que fazem aí os "rrs"?
Je t'aime. É francês, é fácil,
"rrs" põem os alemães.
O teu francês é tão feio...
E que vamos ali fazer?
Porquê o Jim Morrison
se tu nem gostas dos Doors?
A campa é muito famosa
e sou um fã do Val Kilmer.
Pronto, tiras a fotografia
e vamos.
Começou a festa.
- Tira a...
Ela não regula?
Ouça lá, qual é a ideia?
Embora.
- Sou um espírito livre...
Isso, super cool.
Que pena as catacumbas
estarem fechadas,
é das coisas que mais gosto
de fazer em Paris.
Não acredito que não tenha
encontrado um único conhecido.
Então e as "Collective Dynamics
of the Small World Network"?
"Collective Dynamics
of the Small World Network",
um livro que o Jack
lera em Veneza.
E queria provar a teoria
fosse como fosse.
Ela é simples;
o nosso mundo é pequeno,
e quem viaja até ao outro lado
do planeta
tem altíssimas hipóteses de
encontrar um vizinho do lado.
Está cientificamente provado,
não se trata só de um acaso,
somos um todo
e tudo está relacionado.
O caos em que vivemos
é uma ilusão,
a ordem reina e tudo tem ligação.
Mas é só teoria, o Jack passou
duas semanas a tentar prová-la,
e nada.
Marion, que incrível!
Falava de ti e...
Falaste de mim?
- Hoje mesmo.
E então, como vão
as coisas contigo?
O meu livro acaba de sair...
- Que bom, é romance?
Não, este é de pequenos contos,
mas têm coerência.
Que bom! Jack, Manu...
Como está? Muito prazer.
Fala francês?
E novidades? Isto quer dizer
que te ficas pelos States?
Nunca se sabe, para já sim,
vivo com o Jack,
sinto-me muito bem...
Que foi?
Hoje vão à festa da Vanessa?
Vamos lá, sim.
- Também eu.
Vamos à festa da minha amiga.
É incrível o que tu não mudaste,
parece que o tempo parou...
Decidiste não envelhecer, foi?
Pára com os disparates,
estou estoirada,
depois de não sei
quantas horas de comboio...
Tu estás é fantástica...
- Vá, pára.
Falo a sério.
Bom, tenho o meu pai à espera,
ainda temos de nos mudar...
O Pai Jeannot;
dá-lhe cumprimentos meus.
Então até logo.
Prazer em conhecê-lo.
- Também tive, homie.
"Também tive, homie?"
- Ele teve graça...
Chamemos um táxi.
Bom, o gajo olhava-te como
se fosses uma peça de carne
e ele tivesse o garfo,
a faca, o guardanapo...
Eu sou uma peça de carne.
- A minha peça.
Conhece-lo como?
De há anos, tivemos um caso.
Acho que lhe fiz um bobó...
Nada de especial.
Um bobó é nada de especial?
Quis dizer, nada de especial
comparado com o que aí vai,
há o Bush, a guerra no Iraque,
a gripe das aves...
E há um bobó, percebes?
Gostei da transição.
- Uma coisa sem significado.
No grande esquema da política
até tem bastante significado,
não esquecer que foi um bobó
que arruinou a última chance
de sermos uma democracia saudável...
Temos de ir à tal festa?
Não te apetece? Não temos,
mas adorava ver amigos meus.
Claro, tudo bem...
És amiga de todos os teus ex?
Amiga de alguns dos ex,
talvez da maioria.
Aquele ali é um escritor/poeta
maravilhoso.
Poeta francês...
Não és amigo
de nenhuma das tuas ex?
A sério? Não sabia...
Se acaba, acaba.
Quer dizer, se acabássemos
nunca mais me querias ver?
Se chocasse contigo
não te evitava,
mas não fazia de propósito
para te encontrar...
Achas que fora da relação
não mereço amizade?
Se quiseres...
Interessante... Eu gosto de ti, queria
ser tua amiga quando acabarmos.
Quando acabássemos.
Se acabássemos! Gostava
de ti mesmo não estando juntos.
Que evoluído da tua parte...
Em França somos assim,
muito chegados aos nossos ex.
A França é responsável
por tanto do teu comportamento...
Que diz o governo a isso?
- Faz-me pagar impostos.
Passamos por uma farmácia?
Dói-me horrores a cabeça,
estou sem comprimidos...
Cá vendem codeína sem receita?
Porque não?
Aqui não vendemos opiatos,
isto não é o Afeganistão.
Aqui não há táxis, anda,
talvez ainda encontremos
alguma heroína à venda.
Foi esta a ponte.
Fui no planeta quem mais vezes
viu "O Último Tango".
Vá, tu és o Brando
na cena inicial.
Faço lá de Brando!
Porque não fazes tu?
Pareces mais o Brando do que eu,
eu não me pareço nada.
Dedos nos ouvidos e cabeça
para trás, cheia de dores.
Tu estás aflita, vá.
Dedos nos ouvidos, e...
Olha, sabes que mais?
Tirar sempre fotografias
faz-nos ser só observador,
exclui-nos automaticamente
do momento.
Nesta viagem a Veneza quis
estar no momento com o Jack,
mas em vez de beijos na gôndola
ele tirou 48 fotos à gôndola,
em vez de passearmos pela Praça
de São Marcos de mãos dadas
o Jack fez 72 fotos da Praça...
Etc, etc.
Qual destes faz mais Godard?
Godard... Ou Godard?
Os pretos.
Que tal estou?
- A questão é...
Que tal eu estou.
Estás muito bem, lindamente.
Não demasiado gorda, ou...
- Estás gorda, mas bem.
Sem os óculos,
tinha esquecido o bem que tu...
É, dei por fim com as lentes.
E esforçaste-te?
Não como em Veneza;
é para o Manu?
Passamos pela galeria do pai
no caminho, não te importas?
Acho que ele ia gostar.
Lês a Bíblia?
Tenho uma?
Nem sabia que tinha.
Isto, numa Bíblia?
Ah, isso é...
Que graça! Encontraste-a.
Andei à procura dela outro dia,
é do... Como se chamava?
- Não sei.
São tantos...
É o namorado de uma grande
amiga minha de infância,
Jean-Phillipe... Jean-Louis.
Jean-François!
Mas foi há dez anos.
Não é um ex-namorado meu,
só um amigo.
Era o 14 de Julho,
estava bêbeda, estávamos todos...
À volta dele havia umas
vinte pessoas, só com balões...
Não será para o insultuoso,
a fotografia ser igual?
É exactamente a mesma.
Que quê?
Que quê?
Que a minha.
- Não é nada!
Esses balões são azuis,
vermelhos e brancos.
Era o 14 de Julho...
É o equivalente a ter cabeças
de antigos namorados na parede,
só que tu os fotografas
com balões amarrados à pila?
Há mais, se abrir os livros todos
encontro um catálogo de homens
com balões atados às pilas?
Começarão a chover
balões em pilas?
Foi só coincidência...
Vá, não é nada de mais!
Pois, sinto-me mesmo especial.
És especial para mim,
a foto que tirámos foi especial,
nada como esta, esta foi...
Estava bêbeda, estávamos todos.
Ficaste ofendido.
Tu és especial.
- Como um atrasadinho.
Que é obviamente
porque vou contigo.
Tudo bem, quido?
São americanos?
Ele é, eu sou francesa.
Mas vivemos em Nova Iorque.
Porreiro, adoro Nova Iorque,
fui lá o ano passado.
Adorei o downtown, o SoHo...
Que cool.
- Super...
Vocês são casados?
Têm filhos?
Tens que idade?
Agora que nos conhecemos
posso tratar-te por tu...
Tenho 35.
Tens de te despachar...
O teu amigo não te faz um?
Eu é que não quero ter.
Não acredito, sei que todas
as mulheres querem filhos,
manda a Natureza.
Mas se não quer faço-te eu um.
Se quiseres, claro.
Dizem que faço filhos
muito bonitos,
portanto querendo um Brad Pitt
ou um George Clooney, escolhe...
Já sabes com quem falar.
- Diz que tem filhos lindos...
Quem diria...
Digo isto porque
até que não és mal.
Pareces a gaja americana
da Ligação Fatal, a do Douglas.
Acha-me parecida com
a Catherine Zeta-Jones...
Essa! Eu acho.
Temos um taxista cego.
Eu sou loura,
mas não me pareço com ela...
Sem tirar nem pôr, são iguais,
olhos que brilham...
Olho-te e diria que são gémeas.
Só que tu és mais bonita.
Sinsinsky.
Ah, anjos fodendo...
O De Gaulle a comer o cu de...
Do francês da classe média.
Maio de 68, barricadas!
É a Anna.
A Anna porque o Micha
estava com ela.
Partilharam a mesma mulher,
a minha mãe...
Tinham sexo com ela.
- Mas é claro.
Amant, amant, l'amant...
Amante, o amante.
Todos eles se tocam.
E galinha, galinha, galinha...
Claro, há que ter galinhas.
Galinhas, sexo...
A mim dá-me enxaquecas.
Que diz ele?
- Que o tinto lhe dá enxaquecas.
Fala-me em francês, merda!
És doido? Metes-lhe medo...
O tinto faz-lhe dores de cabeça,
não pode beber.
Lindos, adorei.
- Gostaste?
Um homem grávido,
a ter um filho...
Como no filme do Schwarzenegger.
- É hermafrodita...
Papá, mostra-lhe os que prefiro.
Deixo-te com o Jack,
trata bem dele.
Mas se mal nos entendemos!
Porcos...
Com uma espécie de salame?
O teu pai quer...
Cuninlingus, em francês.
Desculpa, amor!
Aonde vais?
Estás bem?
- Sim, e tu?
Adeus, Jack... Até breve.
Pois, até breve, sim.
Aonde vais?
Já estou despachada.
Vejo-te na Vanessa?
Quero dizer-te que acho mal
o que a Marion fez,
mostrar a tua fotografia
com os balões, à família.
Foi errado, demonstrou...
Mostrou falta de respeito
pela vossa "intimade" de casal.
Ah, intimidade... Também achei,
não estou doido?
Aquele quadro ali...
Se estivéssemos dentro
da expressão da violência,
numa espécie...
Digamos, de violência.
Porta-te bem.
Que fazes aí?
Tomava ar,
está abafado lá dentro.
É, faz calor... Queres ir?
Já podemos?
- Despediste-te do meu pai?
Sentes-te bem?
Ouve, achei mal mostrares
a fotografia à tua família,
isso mostrou total falta de
respeito pela nossa intimidade.
Mas tem tanta graça!
Não é nada indicada.
O meu pai adorou,
achou-a hilariante.
Vendo as obras que expõe,
pouco me admira...
Mas odeio que se riam de mim.
Nunca tomo o metro em NY.
Não há hipótese
de ataque terrorista agora.
Estão todos felizes.
Não parecem felizes...
Que não parecem felizes.
Está tudo bem.
Tudo bem...
Jack, o meu amigo;
Vanessa, uma amiga...
Prazer...
- És o novo namorado?
Como se chama?
- Sandra.
Novo namorado?
Não assim tão novo, mas pois.
Algo usado.
Estás bem?
Muito, como salsichas,
bebo uma cerveja...
Queres mais comida?
- Tenho 35 anos!
Ela ainda me dá de mamar,
mas não contes...
...Uns pequenos seres
que me vêm ajudar,
um dia não encontrava uma coisa
e encontraram-na por mim.
Dizes cada coisa...
- Juro, é verdade!
A propósito, reparou que
muitas mulheres
cortam os pêlos da rata
igual àqueles horríveis
bilhetes de metro?
Pois, os nossos de cá
são um rectângulo comprido...
Detesto isso.
- Não é de gostar...
É horroroso.
Chamo-lhes bigodes de Hitler.
Você detesta mesmo...
A coisa é assim como...
Horrível.
Faz sempre a minha picha recuar.
Picha, é a palavra certa?
Se apanha um susto ou frio...
Um susto percebo, mas frio?
Talvez os americanos
não tenham esse problema,
nunca receiem entrar
em território inimigo.
A propósito, chamo-me Mathieu.
Este fala de vaginas fascistas.
Olá, vi-te de longe...
Sei que preparas uma exposição?
De fotografia?
É mais conceptual, mais...
Mais Bill Viola,
mas com sexo.
Vais gramar à brava.
Ele prepara uma exposição,
é um artista interessantíssimo.
Ex-namorado?
De certeza? É um recorde.
Não tens de lhe falar, anda.
Eu quero, adorei o Manu.
Sempre achei
que uma pequena mentira
que não faça mal a ninguém,
não é realmente uma mentira.
Há que fazer um diagrama
na cabeça
com os prós e os contra
das consequências possíveis,
principalmente se a mentira
pode ser desmascarada.
Olha quem ele é! Isso vai?
Isso vai?
- Bem, bem... E contigo?
Muito, muito... Ela disse-te
que nós andámos?
Já foi há uns quinze anos,
portanto...
Não há problema.
Ela tinha dezanove...
- Uma criança.
Provoquei-lhe eu o primeiro
orgasmo num coito.
Que falta de tudo...
Desculpa, eu não devia.
Preparaste o caminho
a todos nós, não foi?
Brindo a isso.
E aliás aquilo não foi
um grande romance nem nada,
mais como irmão e irmã...
Irmão e irmã que se fazem?
- Pois, nada de mais.
Bom, tenho de ir à...
Vou buscar a...
Adoro este gajo.
Com que então um bobó?
Tu dormiste com ele.
Com quem?
- O Manu.
Pois, só vagamente...
Vagamente? Isto é
a ponta do icebergue?
Não vejo realmente
a necessidade de mentir.
Eu não menti!
Já para não falar que me disse
ter sido o primeiro a provocar-te
um orgasmo durante o coito.
Já ouvi isso em algum lado?
Só lho disse para o fazer
sentir-se melhor... Bem!
Razão porque mo disseste a mim.
Disse?
Mas contigo foi verdade.
Isso é quê, amnésia?
Vá, quido, não seja rezingão
nem ciumento,
sabias que não era virgem
quando me conheceste.
Não é isso que interessa
mas sim a mentira,
e estavas longe de ser virgem...
Vou ali servir-me.
Sou pedopsiquiatra,
trabalho com crianças problemáticas
do 16º, Neuilly-sur-Seine.
Miúdos ricos.
Ricos: problemas.
- Pois, acontece...
Mas deve ser fascinante.
Um dia - tenho de te contar isto -
tinha um miúdo no gabinete
e tive de ir aos lavabos.
E quando voltei,
tinha a cadeira encharcada.
O sacaninha tinha feito xixi nela.
Senti-me tão furiosa...
A única coisa
em que pensei depois
foi cortar o mal pela raiz!
Despedindo-te, ou...?
Não, em cortar-lhe o pénis.
Ah, o pénis dele...
Adoro, é uma salada...
E tem mexilhões?
Deixa-me...
Passamos a vida a discutir.
Vais às vezes à sinagoga?
Não, não sou realmente judeu.
A minha mãe nasceu católica
e apesar do meu apelido judeu,
tecnicamente, não sou judeu.
Se o teu pai é judeu
também tu és.
Um feliz e peludo judeu;
que é que achas?
Que o Hitler te tinha poupado
por a tua mãe não ser judia?
Não alterava nada, eras posto
num campo por esta malta toda.
Claro, estou a ver...
E nunca gostei do campo...
A propósito, vou ficar uns dias em
vossa casa, a Marion convidou-me.
Temos só um quarto,
e pequenino.
Eu levo foie gras.
Já me sinto teu irmão
e o que é meu, é teu.
Isso quer dizer
que o que for meu é teu?
Querendo tu dar, eu aceito.
- E isso aplica-se a tudo?
Deixa que te explique isto:
eu sou americano, certo?
E na América,
o que é meu é meu.
A minha primeira religião
é a propriedade privada;
não trespasses, não toques
nas minhas merdas...
Ou eu mato-te.
Vejo-te em Agosto.
Adoro esse humor!
Disseste àquele paranóico
que podia ficar lá em casa?
Disse que podia
se não estivéssemos.
Pois fala com ele, já acha
o apartamento a Terra Prometida.
Conversei com o teu gajo...
É super-simpático.
Nada crispado ou ianque,
sem vassoura espetada no cu...
Tem tatuagens por todo o lado,
mas deves gostar?
É natural, ele esteve preso...
Coisa de Bolsa, tipo ENRON?
- Não, preso oito anos...
Por homicídio. Voluntário.
Tinha em casa dele e da mulher
um amigo, era novo, 19 anos...
E descontrola-se
quando se enfurece...
Convidou-me a ficar
em vossa casa uns dois dias,
mas não sei nada se possa...
Que pena...
Bom, preciso de outro copo.
Quero registar o dia
menos romântico
da história de Paris...
Não conseguia concretizar aqui
os meus projectos mais bizarros,
estava rodeada de tarados
que só queriam mamadas...
Era demasiado difícil.
- Que nojento...
Nunca tiveste de mamar?
Nas artes não se mama?
- Não se mama, mas...
Dá-se chupadelas.
- Isso, chupadelas.
...E ela é completamente abúlica.
Merda, perdi a lente!
Estou a vê-la.
Já a tens?
Vou ali pô-la.
Mas estás bem?
Não partas os cornos...
Que é que tens?
Amor, não me sinto bem.
Porquê, que tens?
- Os mexilhões...
Lembrei-me de repente,
acho que sou alérgica.
Não comi mexilhões?
Comemos o mês passado,
em Long Island!
Pois, mexilhões americanos;
posso ser alérgica aos franceses.
Alguém liga ao 911?
Cá há o 911?
Sou alérgica aos franceses...
- Alguém ligue para onde ela disse!
Que é que foi?
- Não sinto o pulso.
Sentes sim, estás viva.
- Não o sinto!
Eu morri!
Foi só uma vertigem.
Respire fundo.
- Não tinha pulso.
Sentia uma coisa na garganta.
Aqui. E tinha pêlos.
Tive uma reacção alérgica a
mexilhões franceses e vou morrer,
dê-me já uma injecção.
- Comeu só de mais...
Bebe um copo de água, vai lá fora
respirar ar fresco e já passa.
13/6 é a tensão ideal.
Estou viva, quido...
- Percebi logo pela conversa.
Tem um anti-histamínico
para a sinusite?
Não, mas ela fica boa.
Eu sei.
Aquele tem de ser árabe.
A última vez que levei um
fugiu-me num semáforo.
E outro dia foram alemães...
Nunca mais,
tinham salsichas nas malas,
ainda hoje é um fedor...
Olhe para ali,
só canalhada romena.
Gostaste da minha irmã?
Só falaste com ela...
Não é verdade, falei com
o Matthiew, o Manu, a Sandra...
Tu arrancas, ó chinoca?
- Foram encantadores...
Foram ou estás a ser sarcástico?
Não, falo a sério.
- Contigo nunca sei...
De onde é o seu amigo?
Não fala francês?
É americano.
O senhor não fala inglês?
Pois, não falo, desculpe...
- Não fala lá muitas línguas?
Falo francês, já não é mau.
Porquê, não nos quer no seu táxi
por falarmos outra língua?
Quem quer nele? Dos alemães
não parece gostar.
Árabes? Também não gosta.
Gosta de quem?
Aos romenos há que empandeirar
mais as putas deles
e meter judeus em campos.
Eu nunca disse isso,
que história é essa,
uma invenção
para nos sacar a ***?
Mas tu ouves-te,
ouves o que dizes?
Ai agora a loura trata-me por tu?
Loura é a tua mãe!
Calma, está tudo bem.
Ele é só um psicopata,
um palerma nazi racista.
Mas tudo bem e sabes porquê?
Porque isto é a França.
Bem-vindo à França.
Seu fascista!
Pare, nós descemos aqui.
Mas antes vais pagar
o que diz o taxímetro,
senão paro é junto
a uma esquadra!
Quem falou em não pagar,
parvalhão?
Estamos cheios dele,
somos americanos.
Tu fechas-me essa cloaca?!
Eu vou-te...
- Vais fazer-me o quê?!
Vais pagar e é já!
E tu, ó barbas, caluda!
Aqui está bem, deixe-nos aqui.
Arranjo só um lugar
onde estacionar,
encontro um lugar,
e já conversamos os dois,
de homem para mulher.
Queres falar da tua mulher?
- Qual da minha mulher.
Ah, pensei que íamos falar
da tua mulher,
parece que anda enrolada
com um árabe.
Muito obrigada,
muito educativa, a viagem.
Muito agradecida...
Boa noite.
- Isso, desampara.
Vai é fazer-te comer
por americanos, grande puta.
O gajo era racista.
Mal voltarmos meto-te
numa clínica de controlo da ira.
Nem sequer me enfureci...
E achas bem, ele ser racista?
A Rose ao menos está viva.
Cheira a cordeiro...
A cidade inteira cheira.
Que é isto, foi a tua mãe?
É a nossa roupa.
- Que simpática...
Disse que não a lavasse
mas não resistiu.
Engomou-me os jeans?
Quem engoma jeans?
Engomar jeans
é do que mais gosta.
Estão bem...
Não tinha sido hippie?
E foi, até que a influência
da mãe dela se fez sentir.
Era disto que eu falava.
Tento passar para cima
e tu não deixas!
Porque queres sempre
estar tu em cima.
Eu quero sempre?
Se é como gosto...
É como gostas? E eu sou
só o quê, um vibrador humano?
Não és?
A sério, só se diz que
as mulheres são objectos,
meros receptáculos sexuais,
que são bocados de carne,
máquinas de fazer filhos...
Os homens é que são
bocados de carne.
O ênfase vai todo
para o orgasmo feminino:
qual é a melhor posição
para ela, o que deve ele...
E devia ter dois sentidos,
há cedências a fazer.
Tenho tanta pena de ti,
deve ser horrível ser-se homem,
ser usado como um objecto...
Apoio mesmo a vossa causa.
Devias ligar à Amnistia.
Olha, desculpa,
já não me apetece.
Como ia poder agora
fazer sexo contigo?
Agora já não quero.
Fazemos isto por trás?
Quis passar para cima e tu...
Olha, fiquei traumatizada.
Sabes o que para nós é
ser rejeitadas durante o sexo?
Não, acabou-se,
se calhar nunca mais como,
vou ser bulímica ou anoréxica.
Larga-me.
Vá, nunca nos fizemos
em toda a viagem...
Porquê, a quem não apeteceu?
- Passei-a toda na retrete!
Querias montar-me
enquanto me cagava todo?
Já não consigo ouvir-te
dizer a palavra "cagar".
E estou cansada para discutir;
fica para amanhã?
Obrigada, hoje durmo com o gato,
que é mais sexy do que tu.
Há água por todo o lado!
Que foi?
- Não sei, ouço-os gritar.
Aonde vais?
Olha-me a alcatifa!
Chama os bombeiros!
Que foi?
Rebentaram os canos
da casa-de-banho.
Não entres,
vou desligar o quadro.
Já aí vêm.
Dizem que feche
a torneira geral; onde está?!
Eu sei lá! Pergunta a
Mme. Schindling, ela deve saber.
Rebentou um cano lá em baixo.
Mas já vêm aí.
Quem?
Os bombeiros.
Vou lá para ajudar.
Mãe, queres ajuda?
Bom dia...
Lamento mas somos bombeiros,
não canalizadores.
Merda!
Desculpem a minha mãe...
A senhora mora por cima?
Tenho um estúdio, sim,
mas vivo em Nova Iorque.
Lá têm cada carro de bombeiros...
Adoro as vossas camisolas,
onde as há à venda?
Fazem parte da farda,
dão-nas no quartel...
Mas acho que as há
à venda na Internet.
A lã parece ser óptima.
- E é, apalpe.
Tratam-nos bem.
Não é preciso...
- Não, toque-lhe.
É de boa qualidade, sim.
Ah, é escocesa...
Que fazem esses dois ainda aí?
Anda ajudar em vez
de estares ao engate!
Bom, nós vamos.
Para a próxima chamamos
o canalizador, não os bombeiros.
Muito obrigada,
tenham um bom dia.
Olá, como vai isso?
Jack, muito prazer.
Também posso mexer?
Músculos...
Bom dia!
Será pílulas?
Finalmente resolvido.
Estou encharcada.
- Não duvido...
Sim, vou já.
Traz o americano ao mercado
para ver comida a sério.
Primeiro tomo um ***.
Queres vir, ao mercado?
A ressaca é tal... E não queres
estar sozinha com o teu pai?
Ele quer que venhas.
Para mim até pode ter dito
que matei Cristo...
Adoro fazer isto em Paris
e queria tanto partilhar contigo...
E depois comemos um brunch.
- Mas que estou adoentado...
Chaute...
Ah, chaud. (calor)
Chotte, chochotte...
Gostaste de ter vindo?
Gostei, é lindo...
Gostas do Jim Morrison?
- Até não...
E foi à campa dele porquê?
- É coisa de turista...
Ele sabe?
- Não, não lhe disse.
Olha, aproveito estares aí
para te dizer que da próxima
que faças férias de sonho
deixas o gato noutro sítio.
Deixo-o noutro sítio porquê,
ele incomoda-te?
Se todas as manhãs às 5
arranha a porta da casa-de-banho
para ter a sua água corrente...
- Eu avisei que gosta.
E que deixassem a torneira
aberta antes de deitar.
E o gato nem se mexe,
é um verdadeiro santo.
Pior que um ***...
Já agora, querem putos?
Não chateies, já te disse...
Olha-me para este,
que bem arrumado, hã?
Ele risca os carros
estacionados no passeio.
O quê, em vez da multa?
Cá é legal riscar carros?
Só risca os mal estacionados,
é uma mania dele...
E olha-me ali aquele.
Vai riscá-lo também.
Fá-lo parar!
- Posso lá fazê-lo parar.
Pai, vá, pára...
Ao menos faz isso à noite...
E estás a incomodar o Jack.
Apressamos o passo?
Carro feio, pois.
Não gosta de automóveis.
- Pelos vistos.
Poluição, pois...
E candidatando-se à Câmara?
Arando, isso.
Depois passo a buscá-lo.
Hoje não pago com o corpo,
a minha filha...
Não sleep, houve uma festa...
Não slip?
Sleep é dormir
e slip, cuecas.
Leitão.
- Este ainda ontem mamava.
É horrível de ver.
Vê o que os franceses
fizeram ao Babe...
É tão triste...
Essa língua é de quê?
- De vitela.
Língua de vitela.
Pronto, já percebi...
Cordeiro de leite.
Borrego bebé.
Amorosa, a forma como ele faz
de animais bebés esfolados.
Não me sinto muito bem...
Acho melhor voltar para casa.
Se estás adoentado, claro.
Fiquei até às 4 a ver a MTV
e estou a ficar paranóico,
os bichos esfolados...
Sinto que vou ser linchado.
Estou doente.
Sente-se para o engripado,
quer ir-se deitar.
Bebeu?
Tenho pena...
Mas adoro, adorei isto.
Pronto, vai.
Se te sentes melhor indo...
Tens as chaves, quido?
Está doente?
- É só uma gripe, mais nada.
Vá, anda ao vendedor
de hortaliças biológicas.
Não fales disto à tua mãe.
Bom dia, Madame.
- Desculpe, fazia-o no mercado.
Eles ainda lá estão,
só vim tomar um ***.
Lavei-lhe as pólos,
não se importa?
Obrigado, foi muito amável.
O Jeannot zangou-se comigo,
por causa do Jim Morrison.
Não gosta dos Doors?
- Por causa de mim e o Jim.
A senhora e o Jim...
Uma pequena ligação.
Em 69.
Muita gente muito contente
com o corpo,
não havia sida, mortes...
Sexo divertido, todos com todos.
A mãe também é puta...
Não, linda história, linda...
E depois, movimento
do avortement,
para mulheres?
O women's lib, pois.
- As "343 Salopes".
Eu fui uma, sabia?
Fui uma salope.
Passa-me o gato, sim?
Acho que está...
- Aqui está ele.
Adeus, e obrigado.
Consegue fechá-la?
Incrível.
Que flores mais bonitas!
Paras com os engates?
Engatas tudo o que se mexe.
É simpático, para o que se mexe.
Quando penso como gostastes
que vos lambesse a pachacha...
Sou teu salame para a vida
Querem ouvir o quê?
Que tem aí?
- Brel, Ferré, Trenet, Barbra...
Ponha o que quiser.
- Eu ponho-lhe uma coisa.
Hoje é o dia da música.
As pessoas põem música
por todo o lado...
É um dia especial.
E se passeássemos por aí?
Ursinho?
Trouxeste a máquina...
- Talvez tire umas fotos.
Montes de talheres
E facas p'ra bolos
E um molinete
P'ra vinagrete
Um belo ventilador
Que elimine o odor
Lençóis bem quentes
Pistola para queques
Um avião para dois
E somos felizes depois
Que vais comer?
Tenho pouca fome.
- Não queres comer nada?
De certeza?
Olá...
Ainda trabalhas
no jornal de tecnocratas?
Cumprimento só uma pessoa.
- Tu conhece-los?
Mal... Tudo bem, Édouard?
Ao menos és fiel aos amigos,
já é alguma coisa.
Saímos?
Já escolheram?
Um copo com gelo esmigalhado.
Uma cerveja.
Para mim uma omeleta.
É para já.
Foi boa, a ida às Filipinas?
Chamo-me Jack...
- Gael.
Édouard.
- Muito prazer.
Vês como fazemos na América?
- Só um segundo.
Pela qual me empandeiraste,
para ser "livre".
Vamos embora?
Quem vai a esses países
nunca mais é o mesmo.
É como os colonos,
lá a vida é tão bela,
as mulheres tão doces...
Tão jovens...
- Já acabaste?
Ah, tu falas? Cresceram-te
tomates, foi? Interessante...
Tenho lá culpa se não
digeriste levar com os pés.
Isso digeri, o que não
digeri foi outra coisa.
Mas não falemos disso
diante de gente.
Preferes que saia?
- Não, está tudo bem.
E se por cortesia
explicasses o que é isto?
Não? Está bem,
até é divertido...
Eras menos cinzento, tinhas
originalidades, como vim a saber.
Só não eras o meu tipo,
ponto parágrafo.
Sabem qual é o tipo dele?
Tu, cala-te!
Deixe, está tudo bem...
Não sou o tipo dele, o cavalheiro
trabalhava numa ONG na Tailândia
e fazia "mulheres" de 12.
E uma de 30 comparada às
dóceis de 12 é bem menos sexy?
Não deves regular,
isso é só na tua cabeça...
Pois, ele explicou
e não percebi.
As nossas mentes ocidentais
acham que não se deve fazer,
mas lá é muito diferente,
lá mulheres, miúdas, crianças,
é normal que se prostituam,
faz parte da cultura deles,
não há que sentir culpas
por enfiá-las na cama...
Mas espera, tu sozinho
representas bem como somos,
fingimos ajudar o 3º Mundo
mas fodemo-lo.
Inventas isso só por
teres levado com os pés,
só queria uma tipa
que se soubesse calar.
Pois, uma que se calasse...
E aos 12 anos elas calam-se.
Mas eu não me calo.
Sabes que comeu a mulher da tua
vida nas vossas férias no Luberon?
Ai que ele não sab...
Não lhe tinhas dito?
Desculpa, fiz cá uma gafe...
Tu calas a boca, puta?!
Estou bem! Eu estou bem.
A gaja é doida!
Pronto, já acalmei...
Tudo bem, amor, estou bem.
Tudo sob controlo...
Agora chega!
Não lhe partimos nada!
Desampare-me a loja.
Que boa educação,
boa imagem dá da França...
Turista!
Mas tu não regulas?
Pronto, desculpa.
Às vezes pareces uma louca,
ficas com um olhar esgazeado.
És quem, o Mike Tyson?
Vivo com o Mike Tyson.
- Não vives nada!
Ele era um tipo com quem andei
e que fez uma coisa tão horrível...
Não, ouve, tão horrível...
Que saiu do normal.
- O quê, quando?
Há sete anos.
Há sete?! E continuas assim fula!
O que fez foi desprezível,
ele representa tudo o que odeio,
é um pequeno burguês
e fez uma coisa tão nojenta...
Pronto, lá vamos nós...
Mentia e fazia coisas horríveis.
Não quero saber, não quero.
E nada merece
comportamentos daqueles;
tens uma desordem
no controlo de impulsos,
precisas de tratamento.
É esse o problema!
Eu estava controlada...
Pronto, estava fula mas não
volto a enfurecer-me assim.
Só perdi a cabeça
porque ele ia com crianças!
Sabes mesmo escolhê-los...
- Não nos podiam ter posto fora.
Achas que não? Sorte tivemos nós
de não levar um tiro!
Nós em França não matamos.
Isso é tudo peta, mas deixa...
Portanto, era outro ex?
Mas nada de importante,
encontraste uns tantos...
Não é nada de importante?
- Porque havia de ser?
Para ti um caso é importante?
Portanto, o caso com este
foi importante?
Com o Matthew?
O quê?
Deixei o telemóvel em Paris,
lembras-te que só o recuperei
quando viemos trazer o gato?
Deixei-o, a mãe deu-o
à minha irmã,
ela teve um caso com ele
e ele deixava-lhas lá.
As mensagens.
- Pois...
Certo, nada mal, nada mal...
Mas tenta outra com mais emoção,
acho que essa não engoli.
Deves achar-me a pessoa
mais estúpida à face da Terra?
Queres convencer-me que fomos
vítimas duma farsa à francesa?
Olha que realmente! E a tua irmã
passa a bode expiatório?
Aquela já tem problemas
que cheguem,
está ocupada a tornar dúzias
de crianças em assassinos seriais.
Pronto, eu tive um caso
com o Mathieu, sim,
há dois anos, não foi nada sério
e foi antes de te conhecer.
Portanto não conta,
não significa nada.
Olha, sabes o que começo a achar?
Que a tal teoria só existe
aplicada à tua vida ***.
E qual há dois anos,
não sei que porra
significam as frases
mas foram escritas em Janeiro.
E sei que são horríveis.
Que quer dizer lécher la chatte?
Desampara, tarado!
Vês como são feias?
São feias, ele não gostou.
Ele continuou a mandá-las
mesmo depois...
Aquilo não foi nada
mas ele enviava-as.
E até têm piada,
algumas delas têm piada.
Eu tento traduzir a graça...
Têm piada, não são
mensagens de sexo a sério.
Mentiste.
Eu não minto! Só te quis proteger,
não te queria magoar...
Pronto! Eu menti.
Mas só nisto.
E acredita em mim,
não fiz nada de mal.
Não fiz nada de mal,
não te enganei.
E como é que sei,
como volto a acreditar em ti?
E sei lá o que "nada de mal"
significa para ti.
Se cá ter um sexozinho ***
nas costas do parceiro
seja como ir pescar
ou jogar um scrabble.
Desculpa. Acredita, as mensagens
não querem dizer nada,
não fiz nada de mal...
E estamos em Paris!
Não estamos nada em Paris,
estamos é no Inferno!
Vá, diz.
- Digo o quê?
Diz sou uma puta.
- Sou uma puta.
Sou eu a puta.
Não, sou uma puta; diz!
- Não, sou uma puta.
Não queres dizer, queres ser
um bonzinho John Wayne?
Queres ser tu sempre o bom?
Sou eu o índio!
Pois, o índio sou eu.
Mas não é a tua pila grande de mais
para preservativos franceses,
grande de mais é o teu ego.
E para os italianos também.
Nada mal...
A primeira canção
é dedicada a todos vocês.
Bom, dava-me
um duplo cheeseburger,
batatas fritas grandes
e uma Pepsi?
Não diga mais nada,
não falo inglês.
Duplo, dois.
E batatas fritas grandes.
E Pepsi tem de ser Pepsi
em qualquer língua?
Há quatro menus,
há o menu crudités,
o menu salada, o menu Burger
e o menu Duplo Burger.
Escolha um, não é complicado.
Quero esta coisa, esta.
Não quero comer o papel
mas o que está no papel.
A comida, no papel.
São 5 euros e 30.
Ora aqui tem, dinheiro europeu.
Ficou fula com aquilo do franco?
Deve tê-la irritado, hã?
Fantástico, obrigado.
Odeio Paris.
Mathieu? Fala a Marion.
Posso sentar-me?
Metade dos animais desta fast food
ainda respira quando é esfolada.
E tudo o que come
foi geneticamente manipulado.
E esse pão tem bolor.
- O pão tem bolor?
Problemas de comunicação,
a nível do idioma?
Do idioma, da comida...
Não, eu estou bem.
Parece stressado?
Acabo de descobrir
que a minha namorada é uma puta.
Dorme com uma data de homens,
uma e outra vez,
durante anos a fio.
Se calhar, por dinheiro.
Nunca tem que chegue.
Porreiro, hã?
Tem graça teres-me ligado,
tinha-o trazido do atelier
e estou a acabá-lo.
Ali tens.
E é o quê? Aliás, quem?
- És tu.
Nada mal, hã?
Está fenomenal mesmo,
o teu estilo evoluiu imenso.
Sim, pois evoluiu.
Obrigada...
- Eu é que agradeço.
Estás ali toda, é incrível.
Não sei, talvez seja um imbecil
e a tenha empurrado para isto,
tantas acusações
acabam por produzir uma...
Talvez não me queira entregar
ou ser completamente honesto,
por ter medo do que ela
me dirá sobre o seu passado...
De qualquer forma não há
uma troca séria, franqueza...
É estúpido mas nunca
confessei a ninguém que...
Que me masturbo.
Percebo o que me diz,
mas importante é o amor.
O mundo à nossa volta
está uma merda
e só nos temos
uns com os outros.
Sou fairy (gay), sabe?
Não, sou fairy (fada) mesmo.
E precisa de voltar para ela,
ela não é puta.
Talvez deva ser mais cuidadoso,
de cuidar melhor dela.
E quando a vida acabar e olhar
para trás, em que pensará?
Do emprego que não lhe deram,
do dinheiro que ganhou?
Vai é pensar nas pessoas
de quem gostou,
da mulher que mais amou.
E se calhar o melhor
é que a terá ao seu lado,
de mãos dadas consigo...
Volto já.
Vai ter de correr.
E voltar para ela?
- Não, só correr.
Mal o alarme disparar,
o meu fogo é sempre retardado.
O meu número,
caso precise de ajuda.
Há fumo nos lavabos
e trancaram a porta; que é isto?
Eu explico as mensagens
ao teu fulano.
Vais explicar-lhe o quê?
Que foram só gozo,
que não te ligo nenhuma,
que nem gosto de ti...
Ninguém gosta de mim,
não aguento mais!
Isto é mentira...
Anda, sai daí.
Que estás a fazer?
Não partas nada, não sujes.
Ligo à tua irmã.
Vim parar ao Iraque...
Sai-me da frente!
É este! É ele!
Ladrão, a minha mala!
Só falo inglês!
O tipo correu para ali!
És americano uma treta!
Estupor de árabe, a minha mala!
É uma "comédia de enganos"...
Sou só parecido!
Eu desenho interiores, porra.
Marion!
Vá, Marion, sai daí.
O Mathieu nem me quer tocar,
enojo os homens todos,
eu sou medonha!
- Ela fala de quê?
Quis dar-lhe um beijo
mas só choramingava,
assim não dá...
Se está apaixonada pelo tipo dela!
Não tens nenhuma psicologia.
Que é que te deu para
quereres fazer este cretino?
Bom, deixo-as.
Lamentamos muito o erro,
as nossas desculpas.
Vocês foram impecáveis.
Têm a certeza que não foi ele?
- Claro que temos.
Não sei o que diz
mas com essa voz devia cantar...
Bebes um chá?
- Lamento aquilo da saboneteira...
Também eu lamento.
Deixei-a cair sem querer
no lavatório.
E partiste-a?
O desgraçado chega a casa e...
- Eu sei, sou asquerosa.
Quiseste um substituto...
As ciumadas é que nos lixam,
quando nós temos é tudo.
Somos burguesas de merda,
como diria a mãe.
Com problemas
de burguesas de merda.
Quando penso haver gente
a morrer debaixo de bombas...
Vá, não recomeces.
Outro dia li um artigo...
Nem queiras saber.
Usamos quatro vezes
mais papel que os homens
por nos limparmos
quando fazemos xixi,
e agora sempre que faço
apercebo-me.
De quê?
- De tudo o que destruímos.
Mana, adoro-te; és chata
como a potassa, mas adoro-te.
Falas com o brinquedo?
- Não, contigo.
Falo contigo.
Obrigada, mana.
- És mais parva...
Bom, vou-me embora.
- Ter com o teu homem?
Não sei.
Não te conheço.
Que queres dizer?
Estás bêbedo?
Estava sentado no fast food
de mãos dadas com o fairy
imediatamente antes
de pegar fogo àquilo...
Não um gay, um "fado".
Ou um vegetariano
esquizofrénico...
Que odeia fast food.
E apercebi-me duma coisa
tão, mas tão básica...
Não te conheço.
- Não me conheces?
Resumindo as 4 horas
de discussão que se seguiram,
não é fácil ser-se um casal
e ainda menos aceitar
o outro tal como é,
com todos os seus defeitos
e passado.
Desenhaste um "M"?
O Jack confessou
o pavor à rejeição
se se pusesse inteiramente nu
diante de mim.
Apercebeu-se depois de vivermos
dois anos que não me conhecia,
nem eu a ele.
E que para nos amarmos mesmo
tínhamos de saber
a verdade acerca do outro,
por dura de engolir
que fosse às vezes.
E contei-lhe a verdade,
que nunca o tinha enganado.
E também que acabava de estar
com o Mathieu, nessa tarde.
Não ficou nada fulo comigo
porque não tinha havido nada.
Confessei-lhe que, para mim,
o mais difícil era decidir ficar
com alguém para sempre,
a ideia de ser este o homem
com quem ia passar
o resto da vida,
de decidir fazer o esforço para
ficar e resolver os problemas,
não disparar porta fora
ao mais pequeno problema,
é-me muito difícil.
Disse-lhe não ser capaz de ter
um só homem até ao fim da vida.
Era mentira, mas disse-a.
Perguntou-me se sou um esquilo
que junta homens como nozes,
para os Invernos rigorosos.
Achei-lhe graça...
Depois disse uma coisa
que me magoou.
O tom mudou drasticamente.
Depois percebi mal o que disse,
achei que já não me amava
e que queria acabar tudo.
Sempre me fascinou alguém
nos amar loucamente
e, no minuto seguinte,
não sentir nada.
Isso dói tanto...
Mal sinto que um me vai deixar
deixo-o eu primeiro,
antes de ouvir tudo até ao fim.
E é assim,
um a mais, um a menos,
outro romance perdido.
E deste gostei mesmo...
Quando penso que se acabou,
que não mais o vou ver assim,
que talvez nos encontremos
e conheçamos os respectivos,
agindo como se nunca
tivéssemos tido nada...
E depois aos poucos pensemos
cada vez menos no outro,
até nos esquecermos
por completo...
Quase...
É sempre a mesma coisa,
separação, depressão,
pielas, quecas,
ir com um e depois com outro,
tentando esquecer o que era o certo,
e depois de meses de vazio voltar
a procurar o amor verdadeiro...
Procurar desesperadamente,
e após dois anos de solidão
encontrar um outro
e jurar que este é que é,
até esse também desaparecer...
Chega um dia em que não nos
recompomos de outra separação.
E mesmo que essa pessoa
nos chateie 60% do tempo,
não conseguimos viver sem ela.
Mesmo que nos acorde todos
os dias espirrando-nos para a cara...
Bem, preferimos os espirros dela
aos beijos de todos os outros.
Tradução de
Correia Ribeiro
Ripadas por:
PT-Subs Rips